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quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Transexual constrangida no Enem diz que não obteve boa pontuação

Alex Araújo
05/01/2014

A transexual Beatriz Marques Trindade Campos, de 19 anos, uma das estudantes que fizeram a edição de 2013 do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), diz que não obteve uma boa pontuação no teste. Ela consultou a nota depois que o Ministério da Educação divulgou o resultado na noite desta sexta-feira (3).

Antes do início do teste, a jovem teve dificuldades na hora de ser identificada para fazer as provas por ser transexual e afirma que sofreu constrangimento. Os fiscais ficaram surpresos por causa do nome masculino que consta na carteira de identidade. "Perguntaram se era eu mesma, coisas assim, mas no final deixaram entrar", contou, ao G1, em entrevista depois do primeiro dia do exame, em 26 de outubro. No segundo dia, como os fiscais eram os mesmos, não houve problemas na entrada.

Segundo Beatriz, o processo de identificação não foi o que a atrapalhou na prova, já que ela chegou ao local para fazer o Enem com bastante antecedência. “Eu não estudei para o Enem. Fiz as provas com os conhecimentos adquiridos no ensino médio”, falou Beatriz.

Beatriz disse ter alcançado 600 pontos, o que, na opinião dela, é uma pontuação baixa e não deve garantir a vaga em uma universidade de Belo Horizonte.

Ela já estuda direito em uma faculdade particular em Sete Lagoas, na Região Central de Minas Gerais, mas pretendia se transferir para uma instituição de ensino superior na capital mineira através do Prouni.


Disponível em http://g1.globo.com/minas-gerais/noticia/2014/01/transexual-constrangida-no-enem-diz-que-nao-obteve-boa-pontuacao.html. Acesso em 06 jan 2014.

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

A pessoa transexual e o princípio da dignidade da pessoa humana: aplicação da principiologia constitucional.

Luiz Alberto David Araújo


A questão dos direitos das pessoas transexuais está intimamente ligada à aplicabilidade da principiologia constitucional. Primeiramente, é preciso distinguir o transexual do homossexual. Entende-se por transexual aquele que apresenta um sexo psicológico distinto de seu sexo biológico. Além disso, apresenta uma vontade irreversível de atingir seu sexo psicológico; não aceita seu sexo biológico e tenta de todas as formas assumir seu sexo psicológico. O homossexual, por seu lado, em apertadíssima síntese, manifesta o desejo sexual de manter relações com pessoas do mesmo sexo. São problemas diversos, com conseqüências jurídicas diversas.

Imaginemos alguém que acorda, olha-se no espelho e encontra um corpo masculino quando, na verdade, esperava (e desejava) encontrar um corpo feminino. Seu sexo psicológico é de mulher e seu corpo é de homem. Seus pensamentos são femininos, sua vontade é feminina, suas vestes são femininas, mas seu corpo é masculino. Esse é o dilema básico do transexual.

Podemos dizer que para amenizar esse conflito a pessoa transexual poderá tentar um tratamento psicológico. Ineficaz o tratamento, resta, apenas, a cirurgia de redesignação de sexo. Tal cirurgia consiste na melhor adaptação possível da pessoa ao seu sexo psicológico. Ao menos aparentemente, a pessoa transexual poderá eliminar o conflito ao, exibir um corpo que estará em conformidade com seu sexo psicológico. Dessa forma, juntando o sexo psicológico com o novo sexo redesignado, haverá uma unidade, necessária à felicidade desse grupo de pessoas.

A cirurgia, nos termos da Resolução n. 1.482, de 10 de dezembro de 1997, do Conselho Federal de Medicina, não se limita apenas a promover a adaptação do transexual ao seu sexo psicológico; abrange também o acompanhamento, quer fonoaudiológico, quer psicoterapêutico, hormonal etc. Haverá a cirurgia, que será precedida e sucedida de tratamentos necessários para a boa adaptação à nova realidade.

Sendo assim, a cirurgia de redesignação de sexo constitui um instrumento necessário para que a pessoa transexual possa integrar-se socialmente e viver de acordo com suas opões sexuais, como decorrência do direito à intimidade e à vida privada, bens garantidos constitucionalmente no art. 5.º, inciso X, da Lei Maior.

É com fundamento no art. 5.º, inciso X, pois que garante a intimidade e a vida privada, que podemos asseverar que a pessoa transexual tem direito a fazer a sua opção sexual, uma vez constatada, mediante perícia, a sua transexualidade. A operação de redesignação de sexo, portanto, já vem sendo admitida pela doutrina e pela jurisprudência. A princípio, chegou-se a cogitar que poderia haver lesão corporal, mas a jurisprudência se firmou no sentido de reconhecer o estado de necessidade do paciente transexual.

Assim, a cirurgia é admitida e está disciplinada em Resolução do Conselho Federal de Medicina. Realizada a cirurgia, surgem novos problemas, que devem ser enfrentados pelo Direito. A pessoa transexual tem um nome masculino e, pela cirurgia, passa a ter um corpo feminino. Ou, inversamente, tem um nome feminino e, com a cirurgia, torna-se dona de um corpo masculino. Como então resolver o problema, já que um nome masculino para um corpo feminino (ou vice-versa) causará uma série de problemas ao transexual?

Podemos fazer outra pergunta, simples, que revelará o conflito e a sua intensidade  da pessoa transexual redesignada: a que banheiro público, por exemplo, a Roberta Close deverá dirigir-se? O Poder Judiciário entendeu de não lhe permitir a alteração de nome. Portanto, estamos falando de uma pessoa chamada Luiz Roberto e do sexo masculino. Em que banheiro público, uma pessoa chamada Luiz Roberto, do sexo masculino, deve entrar? A resposta dada pelo Poder Judiciário é: masculino. Imaginemos agora, o constrangimento dessa pessoa ao ser obrigada a entrar no banheiro masculino...

A redesignação de sexo deve, assim, fazer-se acompanhar da alteração de nome. O sistema infra-constitucional (Lei de Registros Públicos) não tem previsão específica para o problema. Há um projeto de Lei (n. 70-B, de 1995), que tramita pelo Congresso Nacional, no qual a alteração seria permitida. No entanto, embora concordando com a modificação do nome (para ajustá-lo ao sexo redesignado), o projeto prevê que deve constar a inscrição “transexual” no documento da pessoa. Todos os documentos trariam, então, um “terceiro tipo de sexo”: o transexual. O projeto, nesse particular, fere por completo o princípio da dignidade da pessoa humana e o da intimidade, bens garantidos constitucionalmente. Como imaginar alguém com uma carteira de identidade onde conste que é transexual?

Entendemos que a redesignação de sexo deve vir acompanhada da alteração, requerida judicialmente, do prenome do indivíduo, que deve ser o mais próximo do anterior (por exemplo: Roberto/Roberta; Carlos/Carla etc.), bem como do seu sexo. Assim, duas serão as alterações: passará a pessoa a ter novo nome e novo sexo, que constarão de seus novos assentos.

Desde logo, algumas objeções podem ser apontadas. A primeira delas é a concernente a não haver previsão legal específica. Ora, tal objeção deve ser superada pela interpretação principiológica. Devemos ver os princípios constitucionais como transmissores de valores, ou seja, condutores da valoração constitucional, tendo como trajeto a via constituinte/intérprete. Assim, o princípio nada mais é que um condutor que levará a valoração constitucional para o intérprete para que, na hora da aplicação da regra, valha-se da valoração para a aplicação correta do comando constitucional.

No caso da Constituição brasileira de 1988, temos, logo no art. 1.º, a constatação de que somos um Estado Democrático de Direito, e, em seus fundamentos, encontramos a dignidade da pessoa humana. Ora, como entender que o sistema deva preservar a dignidade se mantemos uma pessoa infeliz, com uma divergência entre seu sexo psicológico e seu sexo biológico? Como imaginar uma pessoa com corpo de mulher, pensando que é homem? Como imaginar uma pessoa com corpo de homem, pensando que é mulher? A solução está na redesignação de sexo e em sua adaptação à nova realidade. Após, portanto, a redesignação de sexo, deverá ocorrer a adaptação dos registros, averbando-se o novo nome e o novo sexo.

Assim, a primeira objeção, consistente na inexistência de lei específica que permita a alteração de nome, deve ser rejeitada, pois o sistema constitucional, preservando a dignidade da pessoa humana e garantindo o direito à intimidade (art. 5.o, X) deve prevalecer sobre a regra infraconstitucional. A alteração do nome e do sexo deve seguir os ditames assegurados pela principiologia constitucional.

Outra objeção seria a de que teria havido apenas a alteração superficial do sexo, e não alteração dos órgãos internos, e que tais pessoas não teriam a alteração completa de seus sexos. Nesse particular, precisamos entender que há vários conceitos de sexo. Vejamos nos esportes. Qual o conceito de sexo para o mundo dos esportes? Alguém biologicamente mulher pode ser proibido de competir por ter uma taxa de hormônios fora do parâmetro fixado. Nesse caso, qual foi o critério utilizado? O sexo biológico? A resposta é negativa. Partiu-se da idéia do equilíbrio hormonal. 

Portanto, já se aplicam outros conceitos de sexo. Realmente, quando há a operação, os órgãos internos continuam da mesma forma, sendo a alteração superficial. Mas essa alteração superficial já é suficiente para tornar o indivíduo mais feliz, mais adaptado, vivendo uma vida mais digna. E, no caso, o sexo psicológico deve prevalecer, aliado a transformação (parcial, mas real) de seu sexo antigo, para o redesignado. Não se pode afirmar que houve uma transformação completa de homem em mulher (ou vice-versa), mas a transformação havida, aliada ao sexo psicológico do indivíduo, deve permitir que seja considerado com o seu sexo redesignado. Além da mudança de nome, deve haver a mudança de sexo.

Uma outra ordem de objeção poderia ser a que permitisse eventual fraude. Em princípio, parece pouco crível que alguém passe por uma cirurgia delicadíssima, por tratamento hormonal e acompanhamento psicológico, apenas para fugir de seus credores. Mesmo assim, todavia, seu pedido de retificação de assento civil deverá vir acompanhado de todas as suas certidões, para que sejam evitadas quaisquer fraudes.

Por fim, o argumento da proteção de terceiros. Muitas pessoas poderiam envolver-se com o transexual redesignado sem saber de seu passado. Nesse particular, havendo o envolvimento afetivo do casal, o sistema legislativo não poderia impedir o matrimônio. Caso, no entanto, o parceiro soubesse do fato, querendo, poderia alegar erro essencial na pessoa do cônjuge, e anular o casamento. É claro que seria mais prudente que o transexual redesignado conversasse e expusesse toda a situação para o seu parceiro, pois sendo assim, este parceiro não poderia alegar eventual erro.

A conversão do sexo do transexual, com a averbação de seu registro civil, poderia ainda criar problemas para menores envolvidos. Imaginemos que o transexual já foi casado e tenha filhos. Se os filhos forem menores, entendemos que a cirurgia e a averbação não deveriam ocorrer, pois haveria, nesse caso, interesses de menores, que poderiam sofrer com a adaptação. Superada a menoridade, não haveria mais problemas nem para a cirurgia nem para a averbação. No caso, esta não geraria a alteração do registro dos filhos, sob pena de terem dois pais ou duas mães.

Em resumo, toda a questão da proteção do transexual deve estar relacionada com o princípio da dignidade da pessoa humana e sob essa ótica deve ser enfocada, moldando a atividade do intérprete e do juiz. O sistema constitucional tem como finalidade facilitar a felicidade das pessoas e não impedir e servir de obstáculo para tal objetivo.


Disponível em <http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/index.php/buscalegis/article/viewFile/14183/13747>. Acesso em 29 jul 2010.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Biblioteca 1: A proteção constitucional do transexual



ARAUJO, Luiz Alberto David. A proteção constitucional do transexual. São Paulo: Saraiva, 2000. 162 páginas.

Analisa os Direitos Constitucionais das minorias sexuais, a cirurgia de redesignação do sexo como forma de integração social, a questão da filiação e alteração no nome decorrente da mudança de sexo.


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segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Justiça permite transexual não operado a trocar nome no interior de SP

Patrícia Araújo 
Do G1, em São Paulo
12/12/08 - 08h37

A foto do homem barbudo que desde 1984 ilustra o registro de identidade deve desaparecer nos próximos dias. Junto com ela, o nome Márcio Antônio Lodi também será trocado. No lugar deles, a transexual Audrey Vitória Lodi espera ver o nome que adotou desde 1994 e a sua imagem feminina pela primeira vez em um documento. “Vai ser a realização de um sonho de criança”, disse. 

Nesta quinta-feira (11), foi publicado no Diário Oficial da Justiça a decisão do juiz Paulo Sérgio Rodrigues, da 4ª Vara Cível de São José do Rio Preto, cidade a 438 km de São Paulo, que autorizou a mudança de nome da transexual de 44 anos.
A decisão não teria maior importância, exceto para a própria Audrey, se não fosse o fato de ela ainda não ter feito a operação de mudança de sexo. De acordo com Dimitri Sales, assessor jurídico da Coordenadoria de Assuntos de Diversidade Sexual (Cads), de São Paulo, transexual é aquela pessoa que não aceita seu corpo biológico. "Seja essa pessoa operada ou não", disse Sales. 

Decisão inédita

“Essa decisão é inédita aqui no estado de São Paulo. Já há decisões nesse sentido no Rio Grande do Sul e no Rio de Janeiro, mas aqui não havia”, afirmou Rogério Vinícius dos Santos, advogado da transexual que baseou o pedido de retificação de registro civil em uma disposição do Código Civil que diz que o primeiro nome de uma pessoal pode ser alterado se for vexatório. “Ele é visivelmente uma mulher, mas tinha um nome masculino. Isso é extremamente vexatório.” 
Catadora de material reciclável, casada há quatro anos também com um catador, a renda mensal na casa de Audrey varia de R$ 300 a R$ 500.
Como em São José do Rio Preto a operação de mudança de sexo ainda não é feita pelo Sistema Único de Saúde (SUS), a transexual não conseguiu fazer a cirurgia. “Estou há dez anos na luta por essa cirurgia e já fiquei até com depressão por causa disso. Com essa decisão do meu nome, estou me sentindo mais mulher. A cirurgia ajuda a gente no lado íntimo, mas, no material, o nome ajuda muito”, disse. 

Constrangimento 

Ela conta que já passou por situações constrangedoras por causa dos documentos com o nome de Márcio. “Eu morro de vergonha de apresentar meus documentos. Uma vez, quando eu fui demitida do meu trabalho de porteiro, não quiseram dar meu seguro desemprego por causa da minha identidade. Olharam para a foto, o nome, e disseram que não podia ser eu”, lembra. 

O documento, segundo ela, prejudicou inclusive a possibilidade de um emprego. “Quando eu chego aos lugares e mostro meus documentos, ninguém quer contratar. Eu explico que sou transexual, mas tem gente que não acredita”, conta. Com o novo documento, ela acredita que vai conseguir logo assinar a carteira profissional. “Já até mandei um currículo escrito com meu nome feminino para uma empresa de reciclagem da cidade. Agora, tudo vai ser mais fácil.” 

E é justamente nesse possível novo emprego que Audrey vê a forma de conseguir realizar o seu maior sonho. “Com o emprego, vou conseguir juntar dinheiro e, no final de 2009, faço minha operação.” Ela afirma que precisa economizar pelo menos R$ 6 mil para conseguir fazer a cirurgia. “Com um emprego, se não conseguir juntar (o dinheiro), posso fazer um financiamento. Quero passar meus 45 anos me sentindo inteira”, disse. 

No caso de Audrey, o advogado entrou com o processo em outubro deste ano e, em menos de dois meses, a decisão foi proferida. “Fiquei impressionado com a rapidez. O promotor não se opôs aos meus argumentos e o juiz deu a decisão logo.” Santos acredita que, com isso, a Justiça abre precedente para outras decisões iguais no estado. 
Disponível em http://g1.globo.com/Noticias/SaoPaulo/0,,MUL920007-5605,00-JUSTICA+PERMITE+TRANSEXUAL+NAO+OPERADO+A+TROCAR+NOME+NO+INTERIOR+DE+SP.html. Acesso em 29 jul 2010.