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terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Heterossexuais reclamam que gays têm mais direitos que eles na Inglaterra

Aline Pinheiro
11 de dezembro de 2014


O dia 10 de dezembro foi um marco na história da Inglaterra. Pela primeira vez, casais gays que vivem em união estável podem transformar o relacionamento em casamento, sem burocracia e sem custos. Muito provavelmente, também é a primeira vez que os homossexuais estão em vantagem. Em território britânico, o direito de formar união estável continua restrito a eles. Casais heterossexuais, quando querem formalizar a união na Inglaterra, só têm como opção o casamento.

A data marca a entrada em vigor de um dispositivo de uma lei aprovada no ano passado, chamada de Marriage (Same Sex Couples) Act 2013. Inicialmente, ela autorizou o casamento entre duas pessoas do mesmo sexo. Desde março, na Inglaterra, os homossexuais podem casar. Antes disso, só era permitido a eles formar união estável. A novidade agora é que o novo dispositivo facilita a conversão da união estável em casamento.

A garantia, embora bastante aplaudida, já está sendo questionada na Justiça. O descontentamento não é por a lei ter previsto direitos aos gays, mas sim ter excluídos heterossexuais. Até o ano passado, homem e mulher se casavam e gays formavam união estável. A partir deste ano, os homossexuais podem optar entre o casamento e a união civil. Já os casais de sexo opostos não têm essa segunda opção.

Um casal heterossexual levou a discussão para os tribunais britânicos pedindo o direito de formalizar o relacionamento deles, sem ter de casar. Os dois alegam ser contra a instituição do casamento, mas querem assinar um papel que reconheça a relação deles.

A Convenção Europeia de Direitos Humanos, da qual o Reino Unido é signatário, proíbe que uma pessoa seja discriminada em razão do sexo. É com base nela que a Corte Europeia de Direitos Humanos já disse que não pode ser negado aos gays o direito de formar família. A mesma corte, no entanto, disse que o casamento pode ser restrito ao relacionamento entre um homem e uma mulher, desde que o Estado preveja alguma forma de reconhecimento das relações homossexuais. A corte nunca teve de se posicionar sobre heterossexuais que se dizem discriminados.


Disponível em http://www.conjur.com.br/2014-dez-11/lei-inglesa-gays-direito-heterossexuais-nao. Acesso em 22 dez 2014.

sábado, 25 de outubro de 2014

Casamento não dá direito ao marido de forçar relação sexual com a mulher

Consultor Jurídico
3 de agosto de 2014

O matrimônio não dá direito ao marido de forçar a parceira à conjunção carnal contra a vontade. Assim entendeu a juíza Ângela Cristina Leão, da comarca de Goianira, que condenou a 9 anos, 4 meses e 15 dias de reclusão, em regime fechado, um homem que estuprou a própria mulher. O réu não pode recorrer em liberdade.

Na sentença, a juíza afirmou que embora haja, no casamento, a previsão de relacionamento sexual, o “referido direito não é uma carta branca para o marido forçar a mulher, empregando violência física ou moral. Com o casamento, a mulher não perde o direito de dispor de seu corpo, já que o matrimônio não torna a mulher objeto”.

Para a configuração do estupro não há, necessariamente, a coleta de provas físicas que demonstrem lesões ou indícios. “A palavra da vítima é uma prova eficaz para a comprovação da prática, se corroborada pelas demais provas e fatos”, como, no caso em questão, o depoimento das testemunhas sobre a conduta agressiva e usual do homem, afirmou Ângela Cristina. Pessoas próximas ao casal testemunharam que as brigas eram constantes e que a mulher tentava a separação, contra o desejo do homem. No episódio em questão, o marido, inclusive, confessou ter ameaçado a mulher com uma faca. Ele teria, também, proferido palavras de baixo calão para depreciar e constranger a vítima.

Em defesa, o marido alegou que apesar da intimidação confessa, sua mulher teria aceitado praticar o ato sexual. Contudo, a juíza explicou que mesmo sem a vítima oferecer resistência física, o crime de estupro é caracterizado, já que, “de um lado, houve a conduta opressora e agressiva do acusado; de outro, a conduta de submissão e medo da vítima”. 


Disponível em http://www.conjur.com.br/2014-ago-03/casamento-nao-direito-marido-forcar-relacao-sexual. Acesso em 25 out 2014.

terça-feira, 14 de outubro de 2014

Pais negam, mas tribunal reconhece união estável homoafetiva de filho

Consultor Jurídico
6 de agosto de 2014

A 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Maranhão reconheceu a existência de união estável de dois homens — um deles já morto — no período entre o final de 2009 e novembro de 2011. De acordo com o colegiado, a sentença que havia reconhecido a relação não merece ser reformada, pois se baseou em provas robustas e indicou os motivos que formaram o seu convencimento, conforme prevê o artigo 131 do Código de Processo Civil.

O juiz reconheceu a convivência pública, contínua e duradoura, estabelecida com o objetivo de constituição de família. Inconformados, os pais do rapaz morto apelaram ao TJ-MA alegando que seu filho não era homossexual e mantinha união estável com uma mulher. Além disso, afirmaram que ele adquiriu seus bens com esforço próprio e que possuía apenas uma relação de amizade com o apelado.

Já o homem que pediu o reconhecimento da união alegou que os próprios pais do companheiro confirmaram, em audiência, que o filho não mantinha mais qualquer relação com a mulher com a qual teria união estável.

O desembargador Paulo Velten, relator do caso no TJ-MA, chegou a destacar depoimentos de uma psicóloga, que afirmou ter certeza sobre a existência da união homoafetiva, e de um psiquiatra, que, em juízo, relatou que o morto chegou a declarar que tinha um companheiro.

O desembargador mencionou, ainda, que o corretor que vendeu o imóvel em que os dois residiam afirmou ter certeza que ambos formavam um casal homoafetivo e que a relação era pública e conhecida por todos os corretores da imobiliária.

Velten manteve a sentença que reconheceu a união estável homoafetiva, votando de forma desfavorável ao recurso dos apelantes. Os desembargadores Jorge Rachid e Marcelino Everton seguiram o voto do relator.


Disponível em http://www.conjur.com.br/2014-ago-06/pais-negam-tribunal-reconhece-uniao-homoafetiva-filho. Acesso em 14 out 2014.

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Pais que permitem mutilação genital serão processados no Reino Unido

Consultor Jurídico
22 de julho de 2014

Pais que permitirem a mutilação genital em suas filhas serão processados, afirmou o primeiro-ministro do Reino Unido, David Cameron, durante conferência promovida pelo governo britânico e pela Unicef em Londres para debater a prática, que, na maioria dos casos envolve a remoção do clitóris, e o casamento infantil. As informações são do jornal Guardian.

O anúncio acontece um dia após um levantamento revelar que mais de 137 mil mulheres no Reino Unido e no País de Gales já foram submetidas ao procedimento. Segundo dados da City University e do grupo de defesa dos direitos humanos Equality Now, o número de vítimas cresceu consideravelmente nos últimos dez anos, com o aumento da chegada de pessoas vindas de países em guerra.

Segundo o estudo, o grupo mais afetado é formado por imigrantes com idades entre 15 e 49 anos (103 mil). O número de vítimas vindas do Chifre da África — região onde é comum a prática da forma mais extrema de mutilação — aumentou em 32 mil, ainda de acordo com o levantamento.

A medida faz parte de um pacote que visa acabar com a mutilação “definitivamente”. Cameron também lançará um programa de prevenção, com orçamento de 1,4 milhão de libras. Além disso, médicos, professores e assistentes sociais serão obrigados a denunciar a prática.

“Estamos tentando alcançar um objetivo simples e nobre, que é banir a mutilação genital e o casamento infantil forçado”, afirmou o primeiro-ministro. “O contexto é muito simples. É sobre igualdade. Sou pai de três crianças, duas meninas e um garoto. O que eu quero é que minhas filhas cresçam com todas as oportunidades que o meu menino tem”, acrescentou.


Disponível em http://www.conjur.com.br/2014-jul-22/pais-permitem-mutilacao-genital-serao-processados-reino-unido. Acesso em 07 out 2014.

terça-feira, 12 de agosto de 2014

Brasil deve descriminalizar cafetinagem, diz Nucci

Felipe Luchete
10 de janeiro de 2014

A legislação ignora o direito à liberdade individual estabelecido na Constituição ao considerar crime a existência de casas de prostituição e o favorecimento a essa atividade, afirma o jurista Guilherme Nucci. Quando defendeu em uma rede social o fim da proibição a esse tipo de estabelecimento, em 2012, não faltaram comentários de que a prostituição “atinge a família, instituição sagrada para Deus” e que “cabe ao Direito disciplinar atos tortos”. Em seu 27º livro, o recém-lançado Prostituição, Lenocínio e Tráfico de Pessoas (Editora Revista dos Tribunais), Nucci diz ainda que o Estado deve tutelar quem exerce a função e até criar um programa para aqueles que desejam sair do ramo.

Embora a prostituição não seja considerada crime no Brasil, o Código Penal tipifica uma série de penalidades para quem favorece a prática. Para o autor da obra, as proibições estão mais ligadas a questões moralistas do que legais, porque grosso modo só há crime quando alguém é prejudicado. “As pessoas querem que seus valores éticos, pessoais e religiosos se espelhem na lei, o que está completamente errado. Pessoas encarregadas de tentar garantir as liberdades individuais não podem partir para esse tipo de preconceito, senão a sociedade não evolui”, afirma Nucci, juiz convocado do Tribunal de Justiça paulista e professor da PUC-SP, que compara sua tese ao adultério, retirado da legislação penal.

“Lenocínio só pode ser crime se houver violência ou fraude. É aquele cafetão que bate na mulher, tira o dinheiro dela, a escraviza. Agora, aquele sujeito que administra os negócios é um empresário como outro qualquer, dá inclusive segurança ao trabalho dela.” Ele diz que, durante a pesquisa para o livro, notou que muitos magistrados deixaram de condenar donos de casas de prostituição, com base no princípio da adequação social. Apesar de o Supremo Tribunal Federal ter negado em 2011 a aplicação desse princípio, o jurista defende que é preciso estimular o debate, já que “tudo tem seu momento certo” para ser analisado.

Ainda segundo ele, o Executivo também dá sinais flexíveis ao incluir, por exemplo, a prostituta e o garoto de programa como profissionais reconhecidos pelo Ministério do Trabalho, na Classificação Brasileira de Ocupações. “Mas isso é pouco. Precisamos de uma lei que retire o apoio da prostituição como crime e permita a fiscalização das casas de prostituição.”

Cadastro prostitucional

Para Nucci, alterar a legislação permitiria que as condições de higiene e segurança desses locais fossem fiscalizadas, que os profissionais da área tivessem de passar por exames periódicos e que eles inclusive tivessem de pagar impostos. Ele aponta que, entre cem garotas e garotos de programa entrevistados por sua equipe em São Paulo, a maioria disse ganhar entre R$ 5 mil e R$ 20 mil por mês, sem pagar Imposto de Renda.

A liberação penal levaria a um cadastro sigiloso de profissionais e a políticas públicas mais eficientes, na visão de Nucci. Quem quisesse deixar a ocupação poderia se inscrever em um programa social de reinclusão no mercado de trabalho. Comerciantes e empresas conveniados ganhariam descontos tributários para pessoas inscritas na iniciativa.

A obra aponta como a questão é tratada em 31 países. O autor do livro diz ainda que 40 delegados entrevistados não apontaram vínculo entre prostituição e outros crimes, como roubo e tráfico de drogas. Sobre o tráfico de pessoas, o jurista afirma que a maioria dos acusados apenas ajuda quem quer voluntariamente se prostituir em outro país. Casos de novela são raros, afirma.


Disponível em http://www.conjur.com.br/2014-jan-10/brasil-descriminalizar-cafetinagem-cadastrar-prostitutas-nucci. Acesso em 29 jul 2014.

domingo, 27 de abril de 2014

Mulher é o primeiro “pai” em certidão de nascimento nos EUA

João Ozorio de Melo
10 de abril de 2014

Graças a uma ordem judicial indireta, uma mulher foi registrada como pai na certidão de nascimento de uma criança em Nashville (Tennessee). Conforme o registro, Emilia Maria Jesty, gerada por inseminação artificial, é oficialmente filha de Valeria Tango (a mãe, que gerou a criança) e de Sophy Jesty (o pai). O tribunal não determinou que Sophy fosse registrada como o pai da criança. Mas decidiu que Valeria e Sophy eram legitimamente casadas, apesar de o casamento entre pessoas do mesmo sexo nunca ter sido aprovado em Tennessee.

Elas se casaram em Nova York, estado que reconhece casamentos homoafetivos há tempos. E se mudaram para o Tennessee, onde, com a ajuda do Centro Nacional pelos Direitos das Lésbicas, entraram na Justiça para obter o reconhecimento oficial do casamento e, com isso, ter direito a todos os benefícios federais previstos em lei para casais e filhos.

A juíza Aleta Trauger emitiu uma “decisão preliminar”, determinando o reconhecimento do casamento celebrado fora do estado. A Procuradoria entrou com recurso, que está em andamento. Cerca de 50 casos estão correndo nos tribunais dos 33 estados que ainda proíbem o casamento entre pessoas do mesmo sexo, de acordo com a agência Reuters.

Enquanto isso, no hospital de Nashville, em 27 de março, o casal exigia que os nomes das duas constassem na certidão de nascimento da filha. Foram muitas horas de discussões entre as mulheres, funcionários do hospital e do departamento de saúde, que se recusava a emitir a certidão. Porém, o departamento acabou cedendo às pressões, em razão da decisão judicial em Tennessee e decisões semelhantes de mais oito estados, também levadas em consideração.

Após concordar, emitiu rapidamente a certidão de nascimento, utilizando o único formulário disponível no sistema — o tradicional, que traz um campo para o nome da mãe e outro para o nome do pai. Como casamentos entre pessoas do mesmo sexo ainda não foram legalizados no estado, não há formulários para emissão de certidão só com os nomes de duas mães ou de dois pais.

Confusão

Dezenas de casais gays em diversos estados, mesmo onde a união entre pessoas do mesmo sexo já é reconhecido legalmente, lutam na Justiça para que seus nomes constem como pais na certidão de recém-nascidos. A situação está confusa em todo o país: cada estado, uma sentença.

A Califórnia já reconhece “pais do mesmo sexo” na certidão de nascimento, se forem legalmente casados; Massachusetts, também, deixando claro que vale para lésbicas e para gays. Iowa concede o benefício apenas às duas mulheres. Maryland, Nova York e Oregon também reconhece o direito de duas mulheres, mas abre uma brecha para homens, cumpridos alguns procedimentos adicionais. A maioria dos estados não reconhece coisa alguma.

Disponível em http://www.conjur.com.br/2014-abr-10/mulher-primeiro-pai-certidao-nascimento-registrada-eua. Acesso em 17 abr 2014.

segunda-feira, 14 de abril de 2014

Projeto de lei em Goiás inclui orientação sexual em BO

Consultor Jurídico
12 de abril de 2014

Um projeto de lei em tramitação na Assembleia Legislativa de Goiás propõe obrigar que boletins de ocorrência tenham campos específicos para que vítimas informem a orientação afetivo-sexual, a identificação de gênero e não só seu nome de registro, mas aquele pelo qual é conhecida. A proposta, de autoria do deputado Karlos Cabral (PT), tenta aperfeiçoar a elaboração de estatísticas no estado referentes à violência contra homossexuais, transexuais, travestis e transgêneros.

Segundo o Projeto de Lei 25/2014, a Polícia Civil seria responsável por sistematizar as informações registradas e divulgar estatísticas de crimes com motivação homofóbica. Na justificativa, o deputado diz que hoje são ínfimos os dados sobre esse tipo de crime, o que impede o combate por parte do Estado. Cabral afirma que a medida, além de benéfica, não traria impactos aos cofres públicos, já que apenas incluiria informações tanto em boletins como também em termos circunstanciados de ocorrência (TCOs).

A advogada Chyntia Barcellos, vice-presidente da Comissão Especial da Diversidade Sexual do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, defende a aprovação do projeto. “O Brasil está em primeiro lugar no ranking dos países mais homofóbicos. A necessidade de se incluir a orientação sexual, nome social, identidade de gênero e a motivação do crime, é urgente e primordial”, diz Chyntia, que também preside a Comissão de Direito Homoafetivo da OAB-GO.

“Mais do que um novo modelo de boletim de ocorrência, será necessária uma capacitação dos serventuários das delegacias para lidar com esse fato novo de modo simples e correto, evitando quaisquer violações de direitos, a fim de que se garanta ao indivíduo efetiva segurança e acolhimento”, afirma. A advogada diz que uma das metas da comissão para 2014 é propor uma delegacia de crimes de intolerância.

A proposta: http://s.conjur.com.br/dl/projeto-lei-goias-inclui-orientacao.pdf

Disponível em http://www.conjur.com.br/2014-abr-12/projeto-lei-goias-inclui-orientacao-sexual-boletim-ocorrencia. Acesso em 14 abr 2014.

terça-feira, 8 de abril de 2014

Zona de meretrício tolerada pela sociedade não é delito

Consultor Jurídico
6 de abril de 2014

“Zona do meretrício, com pleno conhecimento e tolerância das autoridades administrativas e da sociedade local, não se caracteriza o delito de casa de prostituição”. Esse foi o entendimento do juiz Silvemar Salgado, da 5ª Vara da Fazenda Municipal de Belo Horizonte, ao negar pedido feito pelo Ministério Público para o fechamento de oito hotéis da região central da capital mineira. O local é conhecido por abrigar bares, boates e hotéis.

“Se algum crime de fato tivesse ocorrido durante esses anos (favorecimento à prostituição, etc.), haveria notícia de prisão dos responsáveis ou prova de que esse fato ocorreu”, disse. Ele esclareceu que a característica da prostituição é a habitualidade da atividade, elemento não comprovado no processo. Salgado disse ainda que os hotéis não podem proibir seus hóspedes de levar pessoas aos quartos onde estão, sob pena de responsabilidade civil e criminal.

O Ministério Público, autor da ação, sustentou que os hotéis funcionam em desacordo com os alvarás de localização e funcionamento expedidos pela prefeitura — eles estão licenciados para exercer a atividade de hotéis e/ou pensões, mas funcionariam de fato como casas de prostituição. Segundo a Promotoria, a prefeitura não providencia o fim das atividades, mas apenas notifica os estabelecimentos. Além da interdição, o MP requereu a proibição de qualquer atividade sem autorização da prefeitura e também a proibição da concessão de alvarás de localização e funcionamento aos estabelecimentos.

Em novembro de 2013, em decisão semelhante, o juiz Renato Dresch, da 4ª Vara da Fazenda Municipal de Belo Horizonte, também indeferiu pedido do MP de fechamento de outros estabelecimentos. Na decisão, o juiz disse esperar que a demanda não pretendesse “higienizar o hipercentro, em razão da proximidade da Copa do Mundo, como meio de maquiar uma realidade histórica da capital para mostrar ao mundo uma situação que não corresponde à realidade”. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-MG.

Processo 1184602-20.2011.8.13.0024


Disponível em http://www.conjur.com.br/2014-abr-06/zona-meretricio-tolerada-pelas-sociedade-nao-casa-prostituicao. Acesso em 07 abr 2014.

domingo, 6 de abril de 2014

Mudança de sexo não é condição para alteração de nome

Marcelo Pinto
1º de abril de 2014

A identificação sexual é um estado mental que preexiste à forma física, logo, condicionar a mudança de sexo no registro civil a uma cirurgia seria limitar a liberdade desejada pela transexual a uma lógica formal que inviabiliza sua realização como ser humano. Com base nesse entendimento, por unanimidade, a 17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro reformou sentença para dar provimento a recurso de uma transexual, que pede para mudar seu nome civil e adotar a menção ao sexo feminino.

Ao ajuizar ação de retificação de registro civil, a transexual argumentou que, por já viver travestida de mulher, sente-se constrangida sempre que é identificada em público pelo nome de registro ou precisa apresentar seus documentos pessoais com nome e sexo masculinos. Diz não ter interesse em submeter-se a cirurgia de transgenitalização, pelos riscos do procedimento. Realiza acompanhamento psiquiátrico desde 2007, e foi diagnosticada como portadora de transtorno de identidade. Na sua petição inicial, pondera que condicionar o direito à identidade de gênero à cirurgia de mudança de sexo viola a dignidade da pessoa humana.

O juízo de primeiro grau, no entanto, indeferiu o pedido e julgou extinto o processo sem exame de mérito. A manifestação do Ministério Público seguiu o mesmo entendimento, alegando “carência da ação”, na forma do artigo 267, inciso VI do Código de Processo Civil.

Em sua Apelação, a transexual alega que não há qualquer vedação do ordenamento jurídico a sua pretensão. Ao contrário, está amparada nos princípios fundamentais da valorização da cidadania e da dignidade da pessoa humana (artigo 1°, incisos II e III da Constituição brasileira), assim como no direito à saúde, física e psíquica, inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e imagem das pessoas.

A transexual pondera que o uso do nome tem grande importância social e individual. Dessa forma, a retificação do registro civil visando adequar sua identificação a sua verdadeira identidade de gênero influirá de forma decisiva na efetivação de sua cidadania e dignidade, coibindo situações vexatórias que o submetam ao ridículo. Cita a Lei de Registro Público (Lei 6.015/73), que em seu artigo 58 estabelece, entre as exceções à imutabilidade do prenome, a possibilidade de expor seus portadores ao ridículo.

Ao acolher o recurso, o desembargador-relator Edson Aguiar de Vasconcelos afirma que o mesmo artigo 58 da Lei 6.015/73, que admite a substituição do prenome por “apelidos públicos e notórios” para proteger o indivíduo contra humilhações, constrangimentos e discriminações, deve possibilitar a troca de prenome aos transexuais.

“A alteração de nome corresponde a mudança de gênero”, pontua Vasconcelos. Segundo ele, não permitir a mudança de sexo no registro civil com base em condicionante “meramente cirúrgica” equivale a “prender nas amarras de uma lógica formal a liberdade que clama o transexual de ser e de realizar-se como ser humano”. Citando o poeta grego Píndaro, afirma que negar tal direito seria uma resistência ao convite ético “torna-te o que já és, aprendendo com a experiência da vida”.

Em seu voto, Vasconcelos cita, ainda, a Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.275, em trâmite no Supremo Tribunal Federal. A ADIN defende que o artigo 58 da Lei 6.015/73 (Lei de Registro Público) seja interpretado conforme a Constituição, a fim de reconhecer o direito dos transexuais à substituição de prenome e sexo no registro civil, independentemente da cirurgia de transgenitalização. “Esta ação sustenta a tese da existência do direito fundamental à identidade de gênero, inferido dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, inciso III), da igualdade (artigo 5º, caput), da vedação de discriminações odiosas (artigo 3º, inciso IV), da liberdade (artigo 5º caput), e da privacidade (artigo 5º, X)”, informa.

Já o desembargador Wagner Cinelli, em sua declaração de voto, acrescenta outra reflexão: a de que não se pode confundir genitália com sexo. Segundo ele, a primeira pode ser classificada pelas ciências médicas e biológicas, enquanto o segundo comporta juízo subjetivo interno da pessoa. “Aliás, um homem que, vítima de acidente, tivesse sua genitália extirpada não se tornaria, por isso, do sexo feminino”, argumenta.

Declaração de voto de Wagner Cinelli: http://s.conjur.com.br/dl/declaracao-voto-desembargador-wagner.pdf
O acórdão: http://s.conjur.com.br/dl/alteracao-nome-nao-condicionada-mudanca.pdf
A declaração de voto: http://s.conjur.com.br/dl/declaracao-voto-desembargador-wagner.pdf


Disponível em http://www.conjur.com.br/2014-abr-01/alteracao-nome-nao-condicionada-mudanca-sexo-decide-tj-rj. Acesso em 03 abr 2014.

quinta-feira, 3 de abril de 2014

TJ-PB reconhece união estável entre duas mulheres

Consultor Jurídico
28 de março de 2014

A relação pública, notória e duradoura entre duas mulheres, que mantiveram relação afetiva por mais de 20 anos, foi reconhecida na terça-feira (18/3) pela 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Paraíba. Os desembargadores reformaram sentença e confirmaram a união estável entre Iraci Pereira da Silva e Maria Nacy Barbosa, que morreu em junho de 2012. O reconhecimento posterior à morte terá efeito previdenciário, permitindo que Iraci receba pensão por morte da companheira.

Ao ajuizar a ação, ela citou a convivência no mesmo imóvel por mais de duas décadas, com as duas mulheres dividindo despesas, esforços e conta bancária, além da assistência material e afetiva. Antes de morrer, continuou, Maria Nacy teria designado Iraci como sua curadora, permitindo que companheira gerisse seus bens. Os argumentos foram acolhidos pelo relator do caso, desembargador Saulo Henrique de Sá e Benevides, que citou a necessidade de comprovar a convivência contínua, pública e duradoura do relacionamento.

De acordo com ele, no caso em questão ficou clara a comunhão de vida e de interesses, provada por meio de documentos e dos depoimentos de testemunhas. Segundo ele, “é inafastável o reconhecimento da pretensão”, pois a união entre as duas mulheres atendeu aos requisitos necessários. Ele lembrou a decisão do Supremo Tribunal Federal de equiparar as relações homoafetivas às uniões estáveis entre homens e mulheres, permitindo que as primeiras sejam tratadas como um núcleo familiar como qualquer outro. 

A decisão: http://s.conjur.com.br/dl/justica-reconhece-uniao-estavel-pos.pdf


Disponível em http://www.conjur.com.br/2014-mar-28/tj-paraiba-reconhece-uniao-estavel-homoafetiva-fins-previdenciarios. Acesso em 31 mar 2014.

segunda-feira, 3 de março de 2014

Tribunal de Portugal barra referendo sobre adoção por gays

Aline Pinheiro
20 de fevereiro de 2014

Se quiser ouvir o que a população pensa sobre a adoção por casais homossexuais, Portugal terá de fazer não um, mas dois referendos. Para o Tribunal Constitucional, o assunto envolve situações diferentes que, se abordadas no mesmo questionário, podem causar confusão nos eleitores. Por esse motivo, a corte derrubou a proposta de referendo já aprovada pelo Parlamento.

A decisão da corte foi tomada num controle prévio de constitucionalidade da resolução sobre o referendo. A manifestação do Tribunal Constitucional foi pedida pelo presidente da República portuguesa, Aníbal Cavaco Silva, antes que ele pudesse colocar em prática a consulta popular. Agora, cabe ao Legislativo desistir da proposta ou reformular as questões e dar andamento ao referendo.

O Tribunal Constitucional encontrou dois pontos controversos na consulta popular. Um deles se refere diretamente às questões feitas aos cidadãos. De acordo com a proposta, os eleitores teriam de responder às seguintes perguntas: “Concorda que o cônjuge ou unido de fato do mesmo sexo possa adotar o filho do seu cônjuge ou unido de fato?" e "Concorda com a adoção por casais, casados ou unidos de fato, do mesmo sexo?”.

Para os juízes, as duas questões tratam de situações bastante diversas e, se apresentadas no mesmo pacote, podem confundir o eleitor. A primeira pergunta se refere ao que é chamado de coadoção, que é quando um companheiro ou cônjuge adota o filho de outro. Projeto de lei nesse sentido foi aprovado no ano passado pela Assembleia Parlamentar de Portugal, mas ainda não saiu do papel por falta de acordo político.

No julgamento, o tribunal considerou que, nos casos de coadoção, está em jogo não apenas o direito de gays adotarem uma criança, mas a substituição de uma situação familiar anterior por uma nova. Já no segundo caso, a discussão parece mais simples. É basicamente se duas pessoas do mesmo sexo que vivem juntas têm o direito de adotar um filho.

O outro ponto da proposta de referendo que a corte considerou inconstitucional trata do universo de eleitores. Pela resolução aprovada, seriam ouvidos apenas os portugueses que moram em Portugal. O Tribunal Constitucional avaliou que essa restrição não é razoável, já que qualquer mudança legislativa nesse sentido pode afetar a família de portugueses que moram no exterior, pois também estão sujeitos à lei portuguesa.

A adoção por casais homossexuais tem ocupado as mesas de debate em Portugal há vários anos, mas a discussão ganhou corpo em 2010, quando foi aprovado o casamento civil entre duas pessoas do mesmo sexo. Na ocasião, não houve acordo sobre a adoção e a lei que permite o casamento gay passou a prever expressamente que a autorização para a união não significa que os homossexuais podem adotar uma criança. Desde então, grupos políticos vêm tentando aprovar novos projetos que legalizem a adoção por casais gays.

A Corte Europeia de Direitos Humanos não tem uma posição clara sobre o direito de os homossexuais adotarem uma criança, mas já julgou, em mais de uma ocasião, que pessoas na mesma situação têm de ter os mesmo direitos. Quer dizer, na teoria, se cônjuges heterossexuais podem adotar um filho, dois homens ou duas mulheres, desde que sejam casados, podem também. A legislação de Portugal ainda não foi discutida pela corte europeia.

A decisão do Tribunal Constitucional de Portugal: http://s.conjur.com.br/dl/portugal-referendo-adocao-gays.pdf


Disponível em http://www.conjur.com.br/2014-fev-20/tribunal-constitucional-portugal-barra-referendo-adocao-gays. Acesso em 26 fev 2014.

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Gays têm direito a licença casamento, decide corte da UE

Aline Pinheiro
14 de dezembro de 2013

Os homossexuais tiveram mais um importante direito reconhecido na Europa. O Tribunal de Justiça da União Europeia decidiu que, se uma empresa oferece benefícios em caso de casamento de funcionários, não pode negar esse benefício se o trabalhador for gay. Ainda que leis do país impeçam o casamento entre pessoas do mesmo sexo, os mesmos direitos trabalhistas devem ser garantidos para os homossexuais que assumem união estável.

O caso foi julgado a pedido da França. Lá, o casamento entre duas pessoas do mesmo sexo foi autorizado em maio deste ano. Antes disso, os gays podiam estabelecer apenas união civil, chamado de PACS na sigla em francês. Por conta disso, não tinham acesso a alguns direitos, que eram reservados ao casamento.

Empresas instaladas no país, por exemplo, garantiam alguns benefícios para funcionários que se casassem, como uma licença especial e um salário-prêmio. Quem apenas firmasse um termo de união civil não recebia nada. Como os gays não podiam casar, ficavam de fora dos benefícios.

Para o Tribunal de Justiça da União Europeia, a regra configura discriminação por motivo de sexo e não há qualquer justificativa plausível para ela. Ao julgar consulta feita pelo Judiciário francês, o TJ europeu avaliou que, se a única forma de união aceita entre os gays era o pacto civil, então eles deveriam receber os benefícios de casamento caso assinassem termo de união civil. Só assim teriam os mesmos direitos que os outros casais.

A decisão do tribunal mostra a dificuldade que o continente vem enfrentando para garantir aos homossexuais os mesmos direitos que todo cidadão, sem interferir demais em questões sensíveis. Em mais de uma ocasião, já foi reconhecido que casar não é um direito que deve obrigatoriamente ser estendido a todos os relacionamentos.

Ainda assim, a Justiça europeia vem reafirmando que os gays não podem perder benefícios porque são proibidos de casar. Quer dizer: pode até ser negado a eles o direito ao casamento, mas eles devem ter acesso a todas as outras garantias previstas para os heterossexuais que se casam.

A decisão: http://s.conjur.com.br/dl/ue-beneficio-trabalhista-gay.pdf


Disponível em http://www.conjur.com.br/2013-dez-14/casal-homossexual-tambem-direito-licenca-casamento-decide-corte-ue. Acesso em 26 fev 2014.

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Substitutivo do Código Penal abandona proteção à opção sexual

Luiz Carlos dos Santos Gonçalves
8 de fevereiro de 2014

A comissão de senadores[1] constituída para examinar o projeto de novo Código Penal acaba de entregar suas conclusões à presidência daquela Casa. Dali, o texto seguirá para a Comissão de Constituição e Justiça. Trata-se da segunda versão do substitutivo apresentado pelo senador Pedro Taques (PDT-MT) ao Projeto de Lei 236/2011, por sua vez originado de relatório da comissão externa de juristas, presidida pelo ministro Gilson Dipp, do Superior Tribunal de Justiça. Ao analisar esta segunda versão, a comissão de senadores procedeu a significativas alterações, entre elas o expurgo de qualquer referência à identidade de gênero ou orientação sexual em crimes como o homicídio, as lesões corporais, tortura e o racismo.

Embora existam linhas de continuidade entre o documento agora aprovado e o anteprojeto da comissão de juristas, as diferenças são expressivas. Os senadores apreciaram cerca de 800 propostas de modificação que vieram de seus colegas, de deputados federais, professores, acadêmicos, estudantes e organizações da sociedade civil. Grupos organizados de pressão não faltaram, notadamente os pró-criminalização do aborto — onde estavam vocês, feministas? — e os defensores dos direitos dos animais.

A comissão de senadores organizou audiências públicas e ouviu não apenas pessoas favoráveis ao anteprojeto, mas também críticos acerbos, como Miguel Reale Junior e Juarez Cirino dos Santos. Aquela proposição trazia contornos liberais em temas como drogas, aborto e a proteção da vida, mas não foi surpresa constatar que teses conservadoras têm grande trânsito no Brasil, mesmo na comunidade jurídica.

O texto que será agora examinado pela CCJ do Senado é tecnicamente mais aprimorado do que o apresentado pela comissão externa, que atuou premida por prazo escasso. Supre omissões — como as relativas aos crimes de invasão de domicílio, remoção de órgãos e tecidos humanos e contra a biossegurança — e corrige inconsistências — como a mantença da arcaica definição de causalidade, atual artigo 13 do CP, ao lado da menção à criação ou aumento do risco juridicamente relevante. Redesenha as regras sobre a prescrição, aproximando-as do comum encontrado em legislações estrangeiras e reorganiza os crimes de falso e contra a administração pública. Inovações ousadas — como a barganha processual e a presunção de que o encontro de certa quantidade de entorpecente faria presumir um usuário, não um traficante — foram afastadas.

Houve a preocupação em tornar proporcionais as sanções previstas, ora aumentando-as em relação ao anteprojeto — por exemplo, no homicídio doloso, cujo mínimo era de seis e agora foi a oito anos de prisão — ora diminuindo-as — como nos maus tratos contra animais, de um a quatro anos no projeto 236/2011 e de um a três no substitutivo.

Diversas tipificações propostas pela comissão externa — bullying, eutanásia, crimes de guerra, omissão de socorro contra animais — não vingaram[2].

A despeito deste esforço, persistem aperfeiçoamentos a fazer[3] — como reconheceram os senadores Eunício Oliveira, Pedro Taques e Jorge Viana —, o que nem de longe empalidece a seriedade e qualidade do trabalho efetuado. A comparação do substitutivo com o vetusto Código Penal vigente — oriundo de períodos de exceção — e com o emaranhado de leis penais hoje existentes no Brasil é muito favorável à proposição.

O substitutivo apresenta homogeneidade ideológica, ao contrário do que se criticava no anteprojeto. Enquanto o texto da comissão de juristas procurava conciliar medidas de defesa social com redução de penas e novas causas extintivas da punibilidade, a norma in fieri direciona-se para o incremento da guarda penal de diversos bens jurídicos. As penas do furto simples eram de seis meses a três anos no anteprojeto e, no substitutivo, são de um a quatro anos; a figura básica do roubo, de três a seis anos passou para quatro a dez; a fração mínima para a progressão de regime naquele texto originário era de um sexto da pena, para a nova proposição é de um quarto. A extinção da punibilidade do furto, estelionato e apropriação indébita pela reparação do dano, se aceita pela vítima, foi excluída, assim como a redução de pena no roubo praticado sem violência real.

Daí não decorre, porém, que a codificação planejada não tenha tido o cuidado de prever inovações relevantes para o respeito aos direitos fundamentais, como dão notícia o artigo 41, parágrafo 4º — direito ao recolhimento domiciliar, se não houver vaga no sistema semi-aberto — e o art. 49 — restrição às revistas íntimas dos visitantes, direito à cela individual e, para o preso provisório, direito ao voto. A duração da medida de segurança teve limites fixados, art. 95, e aos índios foram estendidas, presentes certas condições, as regras do erro de proibição, art. 33. Manteve o sistema de progressão de regime, favoreceu as penas alternativas e disciplinou de modo interessante o regime aberto, com recolhimento domiciliar.
É certo que o substitutivo receberá a crítica de que preconiza respostas ilusórias — por exemplo, o aumento das penas e do tempo mínimo de seu cumprimento — para o severo problema da (in)segurança pública no Brasil. Dirão também que, se aprovado, a situação dos nossos superlotados presídios se agravará.

Seriam críticas imerecidas.

O espaço meramente legislativo para solução de dificuldades complexas relacionadas à criminalidade é de hialina insuficiência. Leis devem ser acompanhadas de medidas administrativas, sociais e educacionais, de acesso a moradia e saúde, transporte e saneamento básico, entre outros, com qualidade padrão... (como se chama mesmo, aquela entidade sediada na Suíça?). Nesse sentido, vejam-se as recomendações do “Relatório de Desenvolvimento Humano Regional”, divulgado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento — PNUD — em 2013[4].

Todavia, assim como leis mais gravosas não são a resposta, leis menos gravosas também não se saíram bem. Fala-se muito que a Lei dos Crimes Hediondos não diminuiu a criminalidade, olvidando-se de dizer que leis como a dos crimes de menor potencial ofensivo (9.099/95) ou a que ampliou a aplicação de penas alternativas (9.714/98) também não o fizeram. Não há vetores nessa constatação de que normas jurídicas, por si sós, por melhores que sejam, contribuem apenas um pouco para a solução de problemas sociais.

Quanto aos presídios, não há necessidade de código novo para que sejam constatadas as inúmeras, seguidas e permanentes ofensas a direitos fundamentais que eles têm propiciado. Cabe ao Poder Executivo dos estados e da União construir estabelecimentos penais dignos e suficientes: não são razoáveis, no particular, os contingenciamentos de recursos orçamentários. Escrevemos, em outra sede[5], que esta é uma das grandes falhas de infraestrutura do Brasil; é, certamente, a primeira da lista na indicação de nosso estado civilizatório.

Por igual, nada justifica a inexistência de defensorias públicas fortes, com meios suficientes para assegurar o acesso à Justiça e a defesa dos direitos dos processados e condenados. Ainda: leis penais, rigorosas ou não, jamais dispensam polícias treinadas e bem remuneradas, formadas numa cultura de respeito às liberdades fundamentais e merecedoras da confiança da população, um Ministério Público atuante e cioso de seu papel de acusador constitucional, um Poder Judiciário acessível e eficiente, etc.

Outrossim, o problema dos presídios não pode ser desvinculado da gravíssima situação da segurança pública em nosso país, infelizmente um dos campeões mundiais em crimes dolosos contra a vida[6], violências contra a mulher e roubos. O unilateralismo de concepções deslegitimadoras da intervenção penal, se adotado pelo poder público, será interpretado pela população simplesmente como mais uma omissão estatal. Não convém descurar dos riscos de que uma sociedade desesperançada com a violência busque fazer justiça com as próprias mãos. Infelizmente, existem exemplos recentes.

O caminho do meio é o melhor caminho para a legislação penal e o substitutivo o trilha. Procede a intensa descriminalização e reserva a pena de prisão, em regime fechado e semi-aberto, apenas para a criminalidade de elevado potencial ofensivo[7].

Nesta fase do processo legislativo cabe, sem embargo, sugerir ao Poder Legislativo que não esmoreça na adaptação do Código Penal às generosas previsões da Constituição de 1988. A mesma Constituição que lhe dá a inatacável legitimidade para fazer as leis — inclusive e especialmente, as penais — mostra-se vigorosa na defesa da igualdade entre as pessoas “sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”, art. 3º, IV.

Preocupa que todas as menções a identidade e orientação sexual tenham sido retiradas do projeto[8]. Elas estavam ali, ladeadas por idêntica tutela oferecida contra o preconceito em face da religião, da cor, raça, procedência nacional ou regional de alguém.

Esclareça-se que a norma projetada não considera crime “a livre manifestação do pensamento de natureza crítica, especialmente a decorrente da liberdade de consciência e de crenças religiosas, salvo quando inequívoca a intenção de discriminar ou de agir preconceituosamente”, art. 486, parágrafo 3º. Vale dizer: os púlpitos permaneceriam livres, protegidos, ademais, pelo art. 5º, VI, da Constituição[9]. Coisa muito diversa são condutas que negam direitos, ferem, torturam ou matam pessoas simplesmente porque elas se entendem e se comportam sexualmente de modo distinto do preferido por outros, sem lesar ninguém. Há plena dignidade penal na previsão e no agravamento das sanções, nesses casos.

Num Substitutivo que traz a elogiável previsão de crimes contra a humanidade, que combate a exploração sexual e a pedofilia, o trabalho em condições análogas a de escravo, o tráfico de seres humanos e o desaparecimento forçado de pessoas, esta lacuna destoa do objetivo de oferecer a máxima proteção aos direitos humanos.
________________________________________
[1] Ela foi composta pelos senadores Eunício Oliveira, Presidente, Pedro Taques, Relator, Jorge Viana, Lídice da Mata, Ricardo Ferraço, Benedito de Lira, Aloysio Nunes Ferreira, Cicero Lucena, Magno Malta, Armando Monteiro, Eduardo Suplicy, José Pimentel, Ana Rita, Sérgio Souza, Vital do Rego, Eduardo Amorim e Osvaldo Sobrinho.
[2] Entre elas o “molestamento de cetáceos”, corretamente substituído pela vedação da pesca, art. 413. Sugere-se que o aumento de pena do parágrafo 2º — morte do animal — deveria ser reservado apenas à pesca em larga escala. O parágrafo 1ºdo art. 409 — promoção de confronto entre animais — poderia ser extinto, redefinindo-se o aumento de pena do § 2º para alcançar somente condutas habituais.
[3] De logo, além das mencionadas na nota anterior, podemos sugerir: i) a revisão do artigo 62, que fala em parcelamento da multa em 36 meses, solução distinta da constante no artigo 64 (60 meses); ii) a exclusão do parágrafo 4º do art. 38, que repete a regra do concurso de agentes, já constante do artigo 35; iii) a inclusão no rol dos crimes hediondos, art. 51, também do estupro e manipulação sexual de objetos contra vulneráveis; iv) os parágrafos segundo, terceiro e quarto do art. 43, deveriam estar no artigo 41, que fala na progressão de regime e não no 43, que cuida da regressão; v) a importante conduta do empréstimo vedado, art. 376, recebia mais clara definição no artigo 364 do anteprojeto e emula a dicção tortuosa do atual art. 17 da Lei 7.492/86; vi) a cláusula geral de aumento de penas do artigo 386 não condiz com as novas sanções dadas aos crimes financeiros pelo Substitutivo: um sexto a um terço seriam suficientes, em vez de metade até o dobro.
[4] As recomendações para a melhoria da segurança pública são: “ 1. Alinhar os esforços nacionais para reduzir o crime e a violência, incluindo um Acordo Nacional para a Segurança Pública como uma política de Estado; 2. Gerar políticas públicas para proteger os mais afetados pela violência e o crime; 3. Prevenir o crime e a violência ao promover o crescimento inclusivo, equitativo e de qualidade 4. Diminuir a impunidade ao fortalecer instituições de justiça com a adesão aos direitos humanos; 5. Promover a participação ativa da sociedade, especialmente das comunidades locais na construção da segurança cidadã; 6. Aumentar as oportunidades de desenvolvimento humano para os jovens; 7. Atender e prevenir de maneira integral a violência de gênero nos âmbitos doméstico-privado e público; 8. Salvaguardar os direitos das vítimas; 9. Regular e reduzir fatores que “desencadeiam o crime”, tais como álcool, drogas e armas, através de uma perspectiva integral de saúde pública; e 10. Fortalecer os mecanismos de coordenação e avaliação da cooperação internacional.” — http://www.onu.org.br/a-inseguranca-freia-o-desenvolvimento-na-america-latina-diz-relatorio-do-pnud/.
[5] Revista Brasileira de Estudos Constitucionais, ano 7, nº 25, jan/abril de 2013, Ed. Fórum, Belo Horizonte.
[6] “Relatório de Desenvolvimento Humano-Regional – 2013-214”, PNUD. A taxa no Brasil, no período de 2007/2011 foi de 21 homicídios para cada cem mil pessoas. Só para comparar com países que exercem justa influência nos estudos doutrinários penais brasileiros, a taxa de homicídios na Alemanha e na Espanha é de 0,8 a cada cem mil habitantes. Em Portugal, 1,2.
[7] Diz o mesmo relatório do PNUD: “...a percepção dos cidadãos latino-americanos de “prisão como uma solução para os problemas de segurança” limita o progresso das reformas para reduzir a população carcerária, das medidas alternativas e do incentivo à reinserção social...”.
[8] Especialmente porque se decidiu vincular a tramitação do PLC 122 — crimes de homofobia — ao debate do novo Código Penal.
[9] “VI — é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”.

Disponível  em http://www.conjur.com.br/2014-fev-08/luiz-goncalves-substitutivo-codigo-penal-abandona-protecao-opcao-sexual. Acesso em 10 fev2014.

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Escócia aprova casamento entre pessoas do mesmo sexo

Aline Pinheiro
5 de fevereiro de 2014

Em um futuro próximo, os homossexuais poderão se casar na Escócia. O Parlamento escocês aprovou, nesta terça-feira (4/2), projeto de lei que autoriza o casamento entre duas pessoas do mesmo sexo. Até hoje, os gays podiam apenas formar união civil. A lei agora depende de regulamentação do governo para começar a valer.

Com a mudança, a Escócia se torna o 11º país europeu a permitir que os homossexuais se casem. Os outros 10 estados são: Bélgica, Dinamarca, Islândia, Holanda, Noruega, Portugal, Espanha, Suécia, Inglaterra e França. Os dois últimos aprovaram a união gay no ano passado. Além dos que permitem o casamento, outros 16 países reconhecem a união estável entre duas pessoas do mesmo sexo.

Pelo texto aprovado na Escócia, os gays poderão se casar tanto nos cartórios como em instituições religiosas, desde que estas concordem com a união homossexual. A nova legislação também autoriza que transexuais casados mudem de sexo sem a necessidade de se divorciar antes. Até então, se um homem casava com uma mulher e depois se submetia a cirurgia de mudança de sexo, ele precisava assinar o divórcio antes de conseguir atualizar seus documentos.

A proposta do governo de permitir o casamento entre gays foi divulgada em setembro de 2011, quando foi aberta consulta pública sobre o assunto. Durante três meses, organizações civis e a sociedade como um todo puderam opinar sobre o assunto. E o resultado não foi nada animador. Das 76,8 mil respostas enviadas ao governo, 67% se manifestaram contra a união gay.

Em julho de 2012, no entanto, o governo escocês anunciou que, mesmo contra a vontade de uma parte da população, o casamento entre homossexuais seria liberado. Na ocasião, a vice-primeira ministra, Nicola Sturgeon, explicou que garantir a todos o mesmo direito era a única forma de sustentar um país justo e igualitário. Um ano depois, em junho de 2013, o projeto de lei autorizando a união gay foi apresentado ao Parlamento.


Disponível em http://www.conjur.com.br/2014-fev-05/escocia-aprova-casamento-entre-duas-pessoas-mesmo-sexo. Acesso em 06 fev 2014.

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Transtorno desenvolvido por assédio é doença ocupacional

Consultor Jurídico
17 de janeiro de 2014

O transtorno desenvolvido por assédio sexual é considerado doença ocupacional. Assim entendeu a 1ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho ao julgar o caso de um caixa de um supermercado de Porto Velho (RO) que, devido ao assédio sexual e moral que sofreu na empresa, desenvolveu o transtorno obsessivo compulsivo (TOC). A doença foi desencadeada porque um subgerente perseguiu o trabalhador dizendo que ele era homossexual e provocando situações constrangedoras.

Segundo o relator do recurso no TST, juiz convocado José Maria Quadros de Alencar, a doença é resultado de condições especiais do ambiente em que o trabalho era executado, equiparando-se a acidente do trabalho, nos termos do parágrafo 2º do artigo 20 da Lei 8.213/91. Além disso, afirmou que, conforme o artigo 932, inciso III, do Código Civil, o empregador responsabiliza-se diretamente pelos atos praticados por seus prepostos.

"Você não fala fino, não anda rebolando, não parece ser gay, mas você é... Fala logo que é e eu não conto para ninguém", era frase que o empregado ouvia com frequência. Por dois anos sofrendo de ele comunicou a situação à empresa. Demitido sob alegação de baixo rendimento, procurou um psiquiatra que constatou a doença.

Com dor intensa e ininterrupta nos dedos, mãos e braço, tinha paralisias temporárias, esquecimentos e surtos de agressão ao próprio corpo. O médico diagnosticou ainda insônia, visão de vultos, vozes, pesadelos, tremores, dores de cabeça e tiques nervosos, que passaram a ser controlados por remédios de tarja preta. O trabalhador relatou ainda que, devido ao tratamento controlado, seu estado orgânico fica alterado, deixando-o tonto, lerdo e sem condições sequer de falar com facilidade.

O supermercado foi condenado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 14ª Região (RO) a pagar indenização por danos morais, no valor de 50 salários mínimos (equivalente hoje a R$ 36,2 mil), a ser atualizado na época do pagamento. No entanto, considerou que o TOC não é doença profissional, pois não está no rol de doenças constantes nos incisos I e II do artigo 20 da Lei 8.213/91.

Ambiente hostil

Para o relator do TST, José Alencar, não há dúvida de que o transtorno, no caso, "trata-se de doença adquirida em função da atividade exercida em ambiente de trabalho inadequado e hostil". Ele explicou que ficou caracterizada a prática de assédios moral e sexual por um dos subgerentes do supermercado, "que nada mais é que um dos seus prepostos".

Com a decisão do TST, o processo retornará ao TRT da 14ª Região (RO) para que analise o pedido feito pelo trabalhador de recebimento de pensão mensal e garantia provisória no emprego, garantidos pela Lei 8.213/91, no caso de doença profissional equiparada a acidente de trabalho.

Assédio constante

Na reclamação trabalhista, o empregado contou que fazia serviços de zeladoria para a empresa, quando, em 2002, lhe solicitaram o currículo. Já durante a entrevista de admissão para a função de caixa, estranhou algumas perguntas feitas pelo subgerente, inclusive se era homossexual. Foi, segundo ele, o início de um longo período de constrangimentos e humilhações.

Um dos episódios aconteceu enquanto conferia preços no supermercado. Segundo ele, o subgerente aproximou-se e começou a aspirar seu perfume, junto ao pescoço, o que fez com que ele saísse bruscamente de perto, com raiva e constrangimento. Os assédios ocorriam, em sua maioria, durante conversas particulares, em que ele sofria coações morais quanto à sua sexualidade.

O trabalhador afirmou ainda que, sempre que tinha essas atitudes, o chefe dizia para que ele não contasse para ninguém, fazendo pressões psicológicas. Até que um dia, apesar de sentir vergonha, ira, ansiedade e medo de perder o emprego, o caixa falou dos constrangimentos que sofria a alguns colegas, que disseram já saber de desses episódios, pois o próprio subgerente comentava com os demais, com ironia.


Disponível em http://www.conjur.com.br/2014-jan-17/transtorno-desenvolvido-assedio-sexual-considerado-doenca-ocupacional. Acesso em 20 jan 2014.

terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Alteração de registro em união estável depende de prova

Consultor Jurídico
11 de novembro de 2013

A adoção do sobrenome de companheiro ou companheira na união estável depende de comprovação prévia da relação. A decisão é da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao julgar recurso de um casal de Minas Gerais que pretendia alterar registro civil de nascimento, para incluir o patronímico de família ao sobrenome da companheira. O caso corre em segredo de Justiça.

Segundo a relatora, ministra Nancy Andrighi, a adoção do sobrenome do companheiro na união estável não pode simplesmente decorrer de mero pedido das partes, sem exigência de qualquer prova essa união, enquanto no casamento a adoção do sobrenome do cônjuge é precedida de todo o procedimento de habilitação e revestida de formalidades.

A cautela se justifica pela importância do registro público para as relações sociais. Nancy Andrighi esclareceu que não se deixa de reconhecer a importância da admissão do acréscimo no sobrenome do companheiro por razões de caráter extralegal. Mas, prossegue, deve-se zelar pela segurança jurídica, exigindo-se um mínimo de certeza da união estável, por meio de documentação de caráter público, que poderá ser judicial ou extrajudicial.

O casal alegou judicialmente que já vivia em união estável desde 2007 e tinha uma filha. Eles ainda não haviam oficializado a união porque havia pendências de partilha do casamento anterior, motivo relacionado às causas suspensivas do casamento previsto pelo Código Civil de 2002. Segundo o inciso III do artigo 1.523, o divorciado não deve se casar enquanto não houver sido homologada ou decidida a partilha dos bens do casal.

O recurso foi interposto no STJ contra decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que concluiu pela necessidade de declaração prévia que comprovasse a união estável. O casal sustentou que o artigo 57 da Lei 6.015/73, que dispõe sobre os registros públicos, permitiria a alteração do nome, desde que houvesse a anuência da companheira.

A 3ª Turma do STJ reconheceu que o artigo citado não é aplicado quando se verifica algum impedimento para o casamento. A norma, segundo Nancy Andrighi, refletia a proteção e exclusividade que se dava ao casamento à época, franqueando a adoção de patronímico pela companheira quando não houvesse a possibilidade de casamento por força da existência de um dos impedimentos previstos em lei. “Era uma norma aplicada ao concubinato”, afirmou a ministra.

No atual regramento, conforme a relatora, não há regulação específica quanto à adoção de sobrenome pelo companheiro ou pela companheira nos casos de união estável. Devem ser aplicadas ao caso, por analogia, as disposições do Código Civil relativas à adoção de sobrenome dentro do casamento, mas a 3ª Turma entendeu que, para que isso ocorra, é necessário o cumprimento de algumas formalidades.

“À míngua de regulação específica, devem ter aplicação analógica as disposições específicas do Código Civil, relativas à adoção de sobrenome dentro do casamento, porquanto se mostra claro o elemento de identidade entre os institutos”, disse Nancy Andrighi.

O parágrafo 1º do artigo 1.565 do Código Civil dispõe sobre a possibilidade de acréscimo do sobrenome de um dos cônjuges pelo outro. A celebração do casamento, conforme a legislação, exige formalidades que não estão presentes na união estável. 


Disponível em http://www.conjur.com.br/2013-nov-11/alteracao-registro-civil-uniao-estavel-depende-prova-judicial. Acesso em 29 dez 2013.

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

Tribunal americano descriminaliza a bigamia

João Ozorio de Melo
16 de dezembro de 2013

Nos rastros da recente decisão da Suprema Corte dos EUA que derrubou a lei que definia o casamento como a união entre um homem e uma mulher, viabilizando a legalização do casamento gay nos estados, um tribunal federal de Utah abriu uma nova fronteira na revolução matrimonial: derrubou parte da lei antibigamia do estado e, com isso, descriminalizou a união de uma pessoa com mais do que um parceiro.

Os dispositivos da lei que criminalizam a bigamia são inconstitucionais, decidiu o juiz federal Clark Waddoups, em uma decisão de 91 páginas, divulgada neste sábado (14/12). De acordo com a decisão, a parte da lei que criminaliza a bigamia viola a Primeira Emenda da Constituição, que garante ao cidadão o direito à liberdade religiosa. Viola, igualmente, a 14ª Emenda constitucional, que garante ao cidadão igualdade perante a lei e o direito ao “devido processo” — tudo conforme precedentes estabelecidos pela Suprema Corte, escreveu o juiz.

O juiz afirma que a privação dos “amantes” da liberdade de optar pela coabitação viola a “cláusula do devido processo”, porque a emenda constitucional em questão proíbe o governo de “privar qualquer pessoa da vida, da liberdade ou da propriedade, sem o devido processo”. Ele também refletiu, em sua decisão, sobre “as mudanças que a nação está passando, no sentido de rejeitar regulamentações governamentais de assuntos pessoais e de grupos impopulares”.

Os advogados dos proponentes da ação citaram sete direitos constitucionais em questão: devido processo, igualdade perante a lei, liberdade de expressão, liberdade de associação, liberdade de exercício de religião, proibição de estabelecimento de religião pelo governo (Establishment Clause) e privação de direitos, privilégios e imunidades garantidas pela Constituição. “Curiosamente, o procurador-geral do estado não respondeu a qualquer delas. Em vez, disso, apresentou uma discussão acadêmica sobre os danos sociais gerados pela poligamia”, escreveu o juiz.

O juiz deixou claro, no entanto, que não está legalizando o casamento polígamo. “Os indivíduos não têm o direito fundamental de obter reconhecimento oficial do Estado de seu suposto casamento polígamo”. Esclareceu que, no caso perante o tribunal, há um casamento entre um homem e uma mulher, apenas. As demais mulheres coabitam com o casal, em um arranjo familiar que, aliás, pode conviver com adultérios. Em outras palavras, a decisão descriminaliza a bigamia, mas não legaliza o casamento bígamo. Uma decisão que foi festejada pelos defensores da bigamia como um primeiro passo.

O processo foi movido contra o procurador-geral do estado de Utah Jeffrey Buhman pelo mórmon fundamentalista Kody Brown. Ele, suas quatro mulheres e 17 filhos estrelam o “Sister Wives” (Esposas Irmãs), um programa de televisão baseado na vida real (reality television). Em sua petição, a família insistiu acima de tudo sobre a violação de seu direito de liberdade de religião, entre outros direitos constitucionais.

Como esclareceu o juiz, em sua decisão, eles são membros da igreja “Apostolic United Brethren Church”, uma cisão da Igreja Mórmon — ou a “Church of Jesus Christ of Latter-day Saints”, também conhecida como LDS. A LDS adotou a poligamia até 1890. A partir daí, quando Utah lutava por sua condição de estado, passou a proibi-la. Hoje, os membros da Apostolic United Brethren Church são conhecidos como mórmons fundamentalistas, que compartilham as raízes históricas do mormonismo.

Todavia, não há notícias, segundo o juiz, de que pratiquem a poliandria — o casamento de uma mulher com vários homens — embora essa tenha sido uma instância quando o fundador da igreja, Joseph Smith, viveu. Mas esse é um fato que gera controvérsias entre historiadores e membros da LDS.

Religião acima da lei

A decisão do juiz de Utah vem em um momento em que se acirram as discussões sobre certas idiossincrasias jurídico-religiosas dos EUA. O país, que se declara religioso, coloca, em muitos casos, a religião acima da lei, desobrigando alguns grupos de cumpri-la. Em outras palavras, cria-se exceções tais como: todos são obrigados a cumprir a lei, menos aqueles cujas crenças religiosas os impeçam de fazê-lo — para o desespero dos juízes da Suprema Corte dos EUA.

Em 1990, o juízes Antonin Scalia escreveu um voto, em nome da maioria, no qual declarou: “O direito ao livre exercício da religião não isenta um indivíduo de sua obrigação de cumprir uma lei válida e neutra, de aplicação geral, com base na alegação de que a lei prescreve uma conduta que sua religião proíbe”.

O caso (Employment Division versus Smith) se referia à demissão de Alfred Smith, um orientador de reabilitação de usuários de drogas, que foi demitido, por justa causa, por usar drogas. Entretanto, a droga que ele usava era prescrita como parte dos rituais de uma religião de nativos-americanos, à qual ele pertencia. A Suprema Corte decidiu que a lei não precisa “acomodar” crenças religiosas.

Os religiosos ficaram em pé de guerra com a Suprema Corte. O Congresso dos EUA, as Assembleias Legislativas dos estados e mesmo tribunais federais acabaram apoiando a ideia de que as pessoas, especialmente aquelas de religiões sectárias, não precisam cumprir dispositivos jurídicos que se aplicam a todos os cidadãos, se eles contrariam suas crenças.

O Congresso aprovou a Lei de Restauração das Liberdades Religiosas (RFRA – Religious Freedom Restoration Act), determinado que qualquer lei (incluindo as que tornam certas drogas ilegais) que oprima a liberdade do exercício da religião deve servir a um propósito irrefutável do governo e empregar os meios menos opressores possíveis — um padrão que normalmente resulta na invalidação da lei, pelo menos no que se refere a sua aplicação a crentes religiosos. A Suprema Corte declarou a inconstitucionalidade da RFRA, mas os estados responderam criando suas próprias leis equivalentes. Em 2000, o Congresso passou mais uma lei para restringir quaisquer regulamentações que oprimam religiões, se essas regulamentações afetam o recebimento de verbas federais.

Exemplos: o sistema de vacinação obrigatória não “pegou” em muitos estados americanos, por causa de objeções religiosas. A consequência foi surtos de coqueluche e sarampo, que se transformaram em ameaças à saúde pública. Em alguns estados, farmacêuticos podem se recusar a fabricar e vender medicamentos proibidos por suas religiões. O exemplo mais novo está fazendo manchetes dos jornais, no momento: empregadores religiosos se recusam a fornecer a seus empregados seguro-saúde que cobrem o uso de contraceptivos, embora sejam obrigados a fazer isso pela nova lei dos seguros-saúde dos EUA, o Obamacare.

Disponível em http://www.conjur.com.br/2013-dez-16/tribunal-americano-descriminaliza-bigamia-julgando-lei-inconstitucional. Acesso em 19 dez 2013.