Pablo Uchoa
15 de
março, 2013
Quando a diretora operacional do Facebook, Sheryl Sandberg,
exortou as mulheres ''a fazer acontecer'' no mercado de trabalho para retomar
uma ''revolução'' feminista que, segundo ela, ''empacou'', sabia que estava
levantando uma discussão espinhosa.
Intuição semelhante deve ter tido a CEO do Yahoo!, Marissa
Mayer, quando proibiu seus empregados de trabalharem de casa, poucos meses
depois de se autoimpor uma licença-maternidade de apenas ''algumas semanas'',
ao longo da qual ela continuou exercendo sua função à distância.
Coincidência ou apenas a ponta do mesmo iceberg, as duas
executivas entraram no centro do debate sobre o avanço da mulher no mercado de
trabalho e a busca do santo graal do emprego moderno, o equilíbrio entre o
dever e o lazer.
A problemática foi colocada por Sandberg em um livro
publicado nesta semana nos EUA, que chega ao Brasil no início de abril – Faça
Acontecer: Mulheres, Trabalho e a Vontade de Liderar (Editora Companhia das
Letras).
Há três décadas, as mulheres são metade dos graduados nas
universidades, escreve. Mas apesar do avanço, elas ainda ocupam apenas 4% dos
cargos de diretores executivos das 500 empresas de maior faturamento nos EUA,
segundo a lista da revista Forbes.
O cenário é semelhante na política: apenas 17 países são
governados por mulheres, e elas ocupam apenas 20% das cadeiras de
parlamentares.
Sandberg não deixa de reconhecer as ''barreiras externas'' –
o preconceito, a discriminação, o assédio sexual – que travam o avanço das
mulheres no mercado de trabalho.
A polêmica está no que ela considera ''barreiras internas'':
uma suposta ''internalização das mensagens negativas'' recebidas de um mundo
machista, uma ''redução das expectativas'' de carreira em prol da dos maridos,
enfim, uma espécie de derrotismo feminismo diante dos desafios do mercado.
''Meu argumento é que livrar-se destas barreiras internas é
crucial para ganhar poder'', escreve Sandberg. ''Outras pessoas argumentam que
as mulheres só conseguem chegar ao topo quando as barreiras institucionais são
removidas. É a situação típica do ovo e da galinha.''
''Estou incentivando as mulheres a tratar da galinha, mas
apoio totalmente aquelas que estão focadas no ovo'', escreve.
Feminismo ou mais pressão?
A executiva da rede social quis que seu livro chegasse às
suas leitoras como um novo manifesto feminista. Junto com a obra, Sandberg está
impulsionando a criação dos chamados ''círculos para fazer acontecer'',
espécies de grupos de discussão para discutir como renovar o avanço da mulher
no mercado de trabalho.
Mas, mal chegou às livrarias, a obra já foi acusada de
colocar ainda mais pressão sobre as mulheres, ao criar expectativas irrealistas
sobre o que cada uma pode fazer, individualmente, para avançar na profissão
diante da dupla jornada em casa e principalmente da maternidade, um
''obstáculo'' que os colegas masculinos de profissão não precisam vencer.
O livro descreve o problema, mas não aponta as soluções, e
assim as respostas vão nascendo por tentativa e erro no próprio mercado de
trabalho.
Um exemplo veio em meados do ano passado, quando a CEO do
site Yahoo!, Marissa Mayer, anunciou que tiraria apenas algumas semanas de
licença-maternidade, que nesse período continuaria trabalhando de casa e que
voltaria o mais rápido possível para o escritório.
A decisão deixara os especialistas debatendo se se tratava
de progresso do feminismo ou um péssimo exemplo emanado de uma jovem mãe
viciada em trabalho.
No mês passado, Mayer voltou a criar polêmica ao proibir os
funcionários de sua companhia de trabalhar de casa – uma prática comum na
indústria de tecnologia, que muitos consideram um avanço, principalmente
naquela busca do equilíbrio entre trabalho e lazer na qual as mais prejudicadas
são frequentemente as mulheres.
A CEO alegou que, por razões de produtividade e integração,
todos precisariam estar ''fisicamente juntos'' no ambiente de trabalho.
Representatividade
Mayer e Sandberg não são as mulheres médias afetadas pelas
suas decisões ou por suas visões do lugar da mulher no mercado de trabalho.
Mayer, em particular, está sob fogo cruzado pelo fato de ter
mandado construir, pagando de seu próprio bolso, um berçário ao lado de seu
escritório para poder passar mais tempo com seu filho.
A bilionária Sandberg, que pode cercar-se de quantas babás e
enfermeiras julgar necessárias para cumprir por ela a sua função, também não
foi poupada.
À sua maneira, as duas poderosas executivas puseram mais
lenha em uma fogueira onde já queimam as opiniões da especialista em política
da Universidade de Princeton, e mãe de dois adolescentes, Anne-Marie Slaughter.
Em meados do ano passado, Slaughter, recém-saída da direção
de Planejamento de Políticas do Departamento de Estado no governo Obama,
escreveu um artigo argumentando que ''as mulheres ainda não podem ter tudo''.
Na sua experiência, argumentou, os interesses de uma mãe de
dois adolescentes e de uma alta autoridade do governo americano simplesmente
não são compatíveis.
Especialistas estão chamando este debate polarizado de um
''cabo-de-guerra'', cujo resultado, se é que haverá um resultado claro, ainda
está longe de ser indicado.
No ínterim, Sandberg, do Facebook, saiu em defesa de Mayer,
afirmando que a executiva do Yahoo! não estaria sendo tão criticada por sua
decisão – que zela pela saúde financeira da empresa que ela preside – se ela
fosse homem.
Uma capa da revista Time sobre Sandberg e seu livro estampa
os dizeres: ''Não a deteste por ela ser bem-sucedida'', titula o semanário.
Como a executiva, os editores da revista sabiam onde estavam
pisando.
Disponível em
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2013/03/130315_novo_feminismo_eua_bg.shtml.
Acesso em 14 out 2013.