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quinta-feira, 24 de abril de 2014

A guerra declarada contra o menino afeminado

Giancarlo Cornejo

Na escola havia una psicóloga que me torturava. Ela nos aplicava exames que eu não entendia (e ainda não entendo o sentido): desenhávamos pessoas; a nossa família; fazíamos listas de nossos defeitos e virtudes. Ela sempre se queixava com meus pais. Me lembro que uma vez  quando ela chamou a mim e aos meus pais. Vi claramente meu nome em seu caderno de anotações, e no verso dele um X em uma opção que dizia: “problemas de identidade sexual”. Eu não estava presente quando ela conversou com meus pais, mas o que ela disse a eles, e o que eu mais ou menos já intuía, os chateou muito.

Parte desta minha narrativa escrevi inspirado pelo belo ensaio de Eve Sedgwick “How to bring your kids up gay” (1993 [2007]). Nesse ensaio, Sedgwick propõe que a figura do menino afeminado concentra com particular virulência a patologização da homossexualidade. De fato a psicóloga que mencionei declarou que eu tinha um transtorno de identidade de gênero. Este tipo de teorias de gênero foram propostas inicialmente por psicólogos como Richard C. Friedman, para quem “o homossexual saudável é aquele que já é um adulto e (b) age masculinamente” (Sedgwick 1993: 156, tradução minha). Sedgwick, além disso, se lembra que:

O movimento gay nunca foi a fundo para atender os assuntos relativos aos meninos afeminados. Há uma razão desonrosa para essa posição marginal ou estigmatizada a qual, inclusive, os homens gays adultos que são afeminados têm sido relegados no movimento social. Uma razão mais compreensível que a “afeminofobia”  é a necessidade conceitual do movimento gay de interromper uma longa tradição de ver o gênero e a sexualidade como categorias contínuas e coladas – uma tradição de assumir que qualquer pessoa, homem ou mulher, que deseja um homem deve por definição ser feminina, e que qualquer pessoa, homem ou mulher, que deseje uma mulher deve, pela mesma razão, ser masculina. Que uma mulher, como uma mulher, possa desejar a outra; que um homem, como um homem, possa desejar outro: a necessidade indispensável de fazer estas poderosas e subversivas afirmações pareceu, talvez, requerer que se diminuísse a ênfase relativa dos vínculos entre os gays adultos e aqueles meninos em desacordo com o gênero (normativo)… Existe o perigo, no entanto, que este avanço possa deixar o menino afeminado mais uma vez na posição do abjeto inquietante – desta vez o abjeto inquietante do próprio pensamento gay… o eclipse do menino afeminado no discurso gay adulto representaria mais que um vazio teórico prejudicial; representaria um nó de ódio homofóbico, ginecofóbico e pedofóbico internalizado e aniquilante e um elemento central para a uma análise gay afirmativa. O menino afeminado viria a funcionar como o segredo das vozes desautorizadoras de muitos homens gays adultos politizados” (1993: 157-158, tradução minha)

O menino afeminado é um segredo nas vozes e pensamento gay, e isso, pelos motivos apontados por Sedgwick, talvez se deva a um terror à indeterminação de gênero. Finalmente dissociar a homossexualidade da (menos respeitável) transgeneridade provavelmente tem sido uma das formas pela qual a homossexualidade tem aparecido como menos ameaçadora, e foi certamente, uma das formas pelas quais ela foi retirada da lista de patologias do “Manual Diagnóstico e Estatístico dosTranstornos Mentais” (DSM-III). Basta recordar que o DSM-IV, publicado em 1980, foi o primeiro a incluir uma nova entrada: “o transtorno de identidade de gênero na infância”. Não obstante, ou talvez por isso mesmo, minha intenção seja resgatar estas conexões e vínculos entre a transgeneridade e a homossexualidade. Vale ressaltar que estes limites ou fronteiras tem sido amplamente problematizados no caso das lésbicas masculinizadas (butch) e de transgêneros masculinos, como os trabalhos de Judith Halberstam (1998 e 2005) mostram. No entanto, no caso das feminilidades masculinas estas não parecem ser disputadas por gays (Bryant 2008, Valentine 2007). No que escrevo a seguir só poderei dar pistas de como a patologização da figura do menino afeminado cria um tropo[1] discursivo que torna impossível desassociar a transgeneridade da homosexualidade (masculina).

Quase todos meus professores me adoravam, mas me lembro que os que lecionavam educação física eram particularmente hostis a mim. Um destes professores falou com meu pai, porque estava preocupado comigo, e disse a ele (a meu pai) que eu era muito afeminado, e que todos meus colegas zombavam de mim. Meu pai, ao chegar em casa, me repreendeu, e não duvidou em me culpa pela hostilização sistemática pela qual eu passava no colégio. Quando este professor chamou meu pai para falar sobre o meu afeminamento, tornou-se inevitável e óbvia a patologização do meu corpo, como das minhas performances de gênero. O que não era tão óbvio é que, naquele momento, este jovem e atlético professor estava reconhecendo a sua própria impotência para modificar meu afeminamento, sua impotência para me fazer o homem que se supunha eu deveria ser, e sua impotência para marcar claramente os limites entre ele e eu. Me lembro que este não era um professor particularmente hostil a mim. De fato, sempre me convidava para jogar futebol, ou para correr com ele e seu grupo, para fazer longas caminhadas, para fazer abdominais. Na verdade, era bem atencioso comigo. No entanto, eu recusava todos aqueles convites, eu não me deixava impressionar por todos os seus esforços, e certamente eu não lhe dava muita atenção.

Como Sedgwick afirma, e meu pai nunca pode sequer considerar: “Para um menino afeminado protogay identificar-se com o “masculino” pode implicar em seu próprio apagamento”. (1993: 161, tradução minha). O que a cultura me demandava era que me desvanecesse.

Halberstam cita uma potente pergunta retirada da obra de Gertrude Stein intitulada Autobiografia de todo o mundo (de 1937): “De que te serve ser um menino se vais crescer para ser um homem?” (2008:23) De que me servia ser um menino se minha infância era pensada como uma transição a um espaço e a um nome que me parecia inabitável? Por que este menino não podia ter outros futuros?

Por muitos meses sentia demasiada angustia, tinha insônia, me doía a cabeça e o copo, chorava antes de ir dormir, me encontrava querendo dizer coisas que não sabia o que eram exatamente, mas que tinha de dizê-las. Era Natal de 1996, e eu tinha onze anos, e estava só com minha mãe e meu irmão menor. E comecei a chorar, a chorar, a chorar com gemidos muito fortes. Então eu disse para minha mãe que tinha algo para dizer a ela, e o que balbuciei foi: “Mãe, acho que eu tenho atração por homens”. Minha mãe também começou a chorar, porque ela entendeu o que eu quis dizer. Logo, ela nos levou ao cinema para ver uma estúpida comédia de Arnold Schwarzenegger, um suposto símbolo de masculinidade heterossexual branca. Mas será que por acaso minha mãe suspeitava que ele também podia ser um ícone homoerótico?

Se esse menino (que eu fui) viveu meses e anos de dor, angustia, pânico (homossexual) foi porque a díade segredo/revelação é constitutiva do que chamamos hoje homossexualidade (Sedgwick 1998). Este segredo em questão me ameaçava com meu próprio apagamento, mas não apenas com a materialidade que eu havia sido, mas com um apagamento que aniquilava qualquer possibilidade de futuro, e com uma  materialidade que fazia com que o amor  (de qualquer tipo) fosse impossível para mim.

Não posso negar que compartilhar o segredo me causou algum tipo de alívio. Provavelmente se não o houvesse feito naquele momento teria integrado a lista de adolescentes gays que se suicidam. Mas, em que consistia o alívio? Este cenário não questiona (necessariamente) a privatização da homossexualidade nem sua paródica espectacularização como segredo. Estou mais inclinado a pensar, seguindo Mario Pecheny (2002 [2005]), que cita o trabalho de Andras Zempleni, que não é a revelação de uma verdade interna o que mais alivia, mas, ao compartilhar um segredo (e talvez este em particular) se compartilha também a angustia e a dor que encarna a demanda de ocultar-lo/exibi-lo.

Esta pode ser vista como a cena em que saio do armário, mas me recuso a chamá-la e pensá-la assim. Nenhum armário foi destruído, nem os monstros que o habitavam foram domados e aniquilados. O pedido ou súplica que fiz à minha mãe não foi que me ajudasse a sair do armário, mas que o fizesse mais habitável para mim. Eu não sai do armário, na verdade, ela entrou nele.

Neste ponto se faz mais que necessária a seguinte pergunta: Por que uma guerra é declarada contra uma criança? Há uma potente citação de Sedgwick que pode nos dar algumas pistas neste sentido:

A capacidade do corpo de um menino de representar, entre outras coisas, os medos, fúrias, apetites, e perdas das pessoas ao redor… é aterrorizante, quem sabe, em primeiro lugar para elas, mas com um terror que o menino já aprendeu com grande facilidade e, de todos modos, com muita ajuda. (1993 p. 199, tradução minha).

Toda esta dor, toda a angustia que senti nessa época da minha vida pode também ser pensada como melancolia. E aqui eu gostaria de fazer uma contribuição à teoria da melancolia de gênero de Butler (2001). Uma diferença entre a melancolia heterossexual e a homossexual, é que como eu na minha infância, e a maioria de sujeitos não heterossexuais que conheço temos chorado (ou choramos) por não sermos heterossexuais. Alguém poderia argumentar que não é que choremos ou tenhamos chorado por não sermos heterossexuais (e por não podermos amar e desejar sexualmente a mulheres no caso de “ser” homens), mas que choramos por não ter os privilégios que a heterossexualidade implica. Mas estas duas posições são (tão) diferentes assim uma de outra?

Aqueles “tratamentos psicológicos” procuravam, supostamente, fazer com que minha homossexualidade fosse impronunciável, mas faziam, na verdade, que ela proliferasse e que tudo tivesse a ver com ela. Como Butler (2004) argumenta, a homossexualidade em certos contextos pode constituir-se como uma palavra contagiosa.

De fato em nenhuma parte deste ensaio seria mais pertinente fazer referência a seguinte (e  muito citada) passagem de Michel Foucault:

A sodomia… era um tipo de ato interdito e o autor não era mais que seu sujeito jurídico. O homossexual do século XIX torna-se um personagem: um passado, uma história e uma infância, um caráter, uma forma de vida; assim mesmo uma morfologia, com uma anatomia indiscreta e, quem sabe, uma misteriosa fisiologia. Nada daquilo que ele é escapa a sua sexualidade. Ela está presente em todo seu ser: subjacente em todas suas condutas, posto que constituí seu principio insidioso e indefinidamente ativo; inscrita sem pudor em seu rosto e seu corpo porque consiste em um segredo que sempre se trai… A homossexualidade apareceu como uma das figuras da sexualidade quando foi rebaixada da prática da sodomia a uma sorte de androginia interior, de hermafroditismo da alma. O sodomita era um reincidente, o homossexual é, agora, uma espécie. (1977[2007]: 56-57).

As inumeráveis psicólogas a quais fui levado por meus pais esperavam de mim uma confissão, a confissão de minha verdade interior, uma verdade que era eminentemente sexual. Mas esta “verdade interna” não era tão minha. Nos termos de Foucault: “aquele que escuta não será só o dono do perdão, o juíz que condena ou absolve; será o dono da verdade”. (1977[2007]: 84). Esta era a “verdade” de uma cultura heteronormativa, não a minha. E como Halperin (2000) argumenta, a homofobia é uma pretensão de conhecimento. Isso faria visível que a homofobia tem um fundamento essencialmente prazeroso também, um prazer novo da modernidade sobre o que Foucault comenta:

Frequentemente se diz que temos sido capazes de imaginar prazeres novos.  Ao menos inventamos um prazer diferente: o prazer na verdade do prazer, prazer em saber-la, em expor-la, em descobri-la, em fascinar-la ao vê-la, ao dizê-la, ao cativar e capturar os outros com ela, ao confiná-la secretamente, ao desmascará-la com astucia; prazer específico no discurso verdadeiro sobre o prazer”. (1977[2007]: 89).

Eu não fui o único patologizado por estes professores, psicólogas e psiquiatras, o foram também meus pais, e especialmente minha mãe. Figuras como as do “pai ausente” ou “mãe super protetora” não tardaram a aparecer como explicações de (pois teria que ser explicado) meu afeminamento. Esther Newton cita a obra de Robert Stoller para quem a figura do menino afeminado é produto da grande proximidade e presença da mãe e pouca do pai. Assim, “a verdadeira vilã é a mãe que se ‘gratifica’ muito com seu filho” (Newton 2000: 191, tradução minha). De fato, quem me acompanhava às sessões com diferentes psicólogas era minha mãe. A ela se dirigiam, e sobre ela recaiam as atribuições de culpa e responsabilidade. E de que a culpavam realmente? Talvez por atribuir a ela aquele que é considerado o pior dos crimes: matar a seu próprio filho. Nas palavras de Edelman “[Se] representa a homossexualidade masculina através da figura de uma mãe que mata seu filho, e quem, portanto participa na destruição de continuidade familiar (patriarcal)”. (1994: 167, tradução minha).

Como a homossexualidade de uma criança se transfigura em seu assassinato? Creio que Stockton acerta ao postular que “a frase “menino gay” é uma lápide para marcar o lugar e o momento em que a vida heterossexual de alguém morre” (2009: 7. Tradução minha). Em outras palavras, o berço de um menino mariquinha é a lápide de um menino heterossexual.

A categoria “mulher” é reiterada uma e outra vez nestas intervenções disciplinarias sobre meu corpo de uma maneira heteronormativa e misógina, que já Guy Hocquenghem sublinhou: “‘A mulher’, que por outro lado não tem como tal nenhum lugar na sociedade, designada como o único objeto sexual social, é também a falta atribuída à relação homossexual”. (2009: 54)

Minha mãe era assim patologizada por seu generoso afeto, que por estes “profissionais da saúde” será chamado super proteção e excessiva arogância, e que geraria (em mim) um quadro de neuroses que estaria associado a um ódio em relação às mulheres, que seria no fundo uma projeção de um ódio fecundo em relação à minha mãe. Minha mãe seria essencialmente patologizada também por um outro excesso: por um excesso de masculinidade, que se expressava em sua relativa independência, em sua voz, em suas atitudes (ou na ausência delas), e em ser a principal provedora econômica da minha casa. Não era só era meu gênero aquele a ser disciplinado, o dela também o era.

Na sua míope vontade de saber, o que nenhuma destas psicólogas pôde nem por um segundo considerar, e que Sedgwick sabia, e no que eu quero acreditar, é que “estas misteriosas habilidades para [que um menino afeminado possa] sobreviver, de filiação e de resistência podem derivar de uma firme identificação com a abundancia de recursos de uma mãe” (1993: 160, tradução minha).

Bibliografia
BRYANT, Karl. 2008. In Defense of Gay Children? ‘Progay’ Homophobia and the Production of Homonormativity. En: Sexualities, vol. 11, n. 4. 455-475.
BUTLER, Judith. 2001. Mecanismos psíquicos del poder. Teorías sobre la sujeción. Madrid: Ediciones Cátedra.
BUTLER, Judith. 2004. Lenguaje, poder e identidad. Madrid: Síntesis.
EDELMAN, Lee. 1994. Homographesis: Essays in Gay Literary and Cultural Theory. New York & London: Routledge.
FOUCAULT, Michel. 1977 (2007). Historia de la Sexualidad 1: La voluntad de saber. México DF: Siglo Veintiuno.
HALBERSTAM, Judith. 1998. Female Masculinity. Durham & London: Duke University Press.
HALBERSTAM, Judith. 2005. In a Queer Time and Place. Transgender Bodies, Subcultural Lives. New York & London: New York University Press.
HALBERSTAM, Judith. 2008. Masculinidad femenina. Barcelona & Madrid: Egales.
HALPERIN, David. 2000. San Foucault: Para una hagiografía gay. Córdoba: Ediciones Literales.
HALPERIN, David. 2004. How to Do the History of Homosexuality. Chicago & London: The University of Chicago Press.
HOCQUENGHEM, Guy. 2009. “El deseo homosexual”. En: El deseo homosexual/ Terror anal. Hocquenghem, Preciado. España: Melusina.
PECHENY, Mario. 2002 [2005]. “Identidades discretas”. En: Identidades, sujetos y subjetividades. Comp: ARFUCH. Buenos Aires: Prometeo Libros. 131-153.
NEWTON, Esther. 2000. Margaret Mead Made me Gay: Personal Essays, Public Ideas. Durham y Londres: Duke University Press.
SEDGWICK, Eve. 1993. Tendencies. Durham: Duke University Press.
SEDGWICK, Eve Kosofsky. 1993 [2007]. “How to Bring Your Kids Up Gay”. En: Fear of a Queer Planet: Queer Politics and Social Theory. Ed: Warner. Minneapolis & London: University of Minnesota Press. 69-81.
SEDGWICK, Eve. 1998. Epistemología del armario. Barcelona: Ediciones de la Tempestad.
STOCKTON, Kathryn Bond. 2009. The Queer Child, or Growing Sideways in the Twentieth Century. Durham & London: Duke University Press.
VALENTINE, David. 2007. Imagining Transgender: An Ethnography of a Category. Durham & London: Duke University Press.
[1] É uma figura de linguagem onde ocorre uma mudança de significado, seja interna (em nível do pensamento) ou externa (em nível da palavra).

OBS.: O texto foi apresentado no ST coordenado por Larissa Pelúcio e Berenice Bento no Seminário Internacional Fazendo Gênero 2010. Giancarlo Cornejo, sociólogo peruano, permitiu que publicássemos no Ponto Q sua reflexão-homenagem a Eve Kosofsky Sedgwick, criadora da Teoria Queer que morreu em abril de 2009. A tradução é de Larissa Pelúcio.



Disponível em http://www.ufscar.br/cis/2011/04/a-guerra-declarada-contra-o-menino-afeminado/. Acesso em 17 abr 2014.

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Criança pode escolher ser menino ou menina? Veja o que os especialistas dizem

Anelise Zanoni
16/08/2010

Assim que veio ao mundo, Shiloh foi recebida por flashes. Estampou capa de revistas, teve o semblante comparado com os pais e desfilou, ao lado da mãe, modelitos de vestidos e sapatinhos de boneca.

Primeira filha biológica dos atores Angelina Jolie e Brad Pitt, a menina se transformou agora no centro de um polêmico debate: aos quatro anos, quer ser um menino.

O desejo de usar calça jeans masculina, camisetões e bermudas — justificado pela famosa mãe como um gosto próprio da pequena, que, segundo ela, "pensa que é como os irmãos" — foi acatado. Hoje, Shiloh é confundida com o irmão mais novo quando está na rua, porque teve o cabelo cortado e se veste como um guri.

— Alimentar essa vontade da criança pode revelar a perturbação da identidade sexual dos próprios pais. O transtorno de gênero pode afetar diversas áreas da vida da menina e trazer problemas futuros, como quadros de depressão e dificuldade de interação social — explica o psicanalista gaúcho Roberto Barberena Graña, especializado em crianças e adolescentes.

As possíveis consequências na vida de uma criança que vive um gênero oposto ao seu (masculino ou feminino) são explicadas por questões sociais. Desde que nascem, ou quando estão na barriga da mãe, os bebês são inseridos em uma categoria definida: menino ou menina. É quando todos o classificam de acordo com a biologia e passam a comprar roupas com cor relacionada ao sexo e brinquedos diferenciados. A criança fica acostumada com esses conceitos e é tratada de acordo com o gênero que tem. Mas, quando decide ser diferente e assumir outro gênero, uma série de mudanças ocorre a sua volta.

— A distinção entre homem e mulher é básica para a compreensão de nós mesmos enquanto seres humanos. Ela regula o modo como os indivíduos são tratados, os papéis que desempenham na sociedade e as expectativas sobre o modo de se comportar e se sentir — afirma a professora de Educação da Universidade de Londres Carrie Paechter, autora do livro Meninos e Meninas (Artmed, 192 páginas).

Ela explica que, nos anos iniciais, a família é a base para o desenvolvimento da compreensão infantil do que homens e mulheres, meninos e meninas fazem e de como essas atividades podem variar de acordo com o sexo de cada um. Crianças menores demonstram tendência à generalizações e tiram conclusões sobre o masculino e o feminino a partir daquilo que enxergam — é possível que Shiloh, por exemplo, veja com encanto o mundo que cerca os irmãos.´

Os pais, entretanto, não precisam se preocupar se o filho gosta de brincar com bonecas ou se a menina prefere se divertir com carrinhos ou espadas. A preferência só se torna preocupante se for corriqueira, obsessiva, diz Graña.

— Os pais participam mais ou menos ativamente na produção do transtorno. O comportamento compulsivo deve ser bem observado, e o incentivo leva à construção de um problema maior, ligado ao lado social e ao desenvolvimento da criança. Se os padrões puderem ser analisados precocemente, é possível corrigi-los — afirma Graña.

Pulando de um lado para outro

Sexo é trabalho da genética, gênero se constrói. Para que os dois andem em harmonia na vida de uma criança, é preciso ter identidade de homem ou de mulher e perceber os símbolos e significados do que é masculino e feminino.

Só que, quando sexo e gênero se contrapõem para a criança, uma série de desafios surge, principalmente na vida dos pais.

Para o psicanalista Roberto Barberena Graña, autor do livro Transtornos da Identidade de Gênero na Infância (Editora Casa do Psicólogo, 282 páginas), o caso de Shiloh, por exemplo, pode estar ocorrendo devido a uma a distorção na matriz familiar do gênero. Ou seja, uma lacuna na identidade sexual do pai ou da mãe (ou dos dois) ou nas gerações passadas da família pode contribuir para o desejo da menina de ser e se vestir como um guri.

— Ela vive, com certeza, um momento pré-transexual, o que poderá evoluir para o transexualismo adulto — explica o especialista.

É importante dar liberdade para a criança escolher suas roupas e brinquedos. Entretanto, segundo Graña, quando há compulsão por algo do sexo oposto, há transtorno, que pode afetar áreas do desenvolvimento e trazer dificuldade de interação social, estado de retraimento, quadros de depressão, tentativa de suicídio infantil (ligada principalmente a acidentes domésticos), psicose, problemas na sala de aula, agitação e hiperatividade.

Para evitar os reflexos, ele indica a busca de um profissional para fazer uma avaliação mais precisa. Quanto mais cedo, melhor.

— Aos dois ou três anos, os pais já podem observar algum transtorno e buscar ajuda. Quanto mais precoce o diagnóstico, melhor a evolução clínica. O ideal é não esperar até a puberdade — avalia o especialista.

Os sinais mais comuns são o desejo compulsivo e repetitivo por atividades, brinquedos e roupas do sexo oposto. Meninos que desejam sempre vestir as roupas da mãe ou das irmãs, que se encantam por maquiagens, gurias que não querem saber das bonecas ou que preferem usar cuecas e brigam para não usar as roupas de menina, merecem ser observadas com mais atenção, diz o psicanalista.


Disponível em http://zerohora.clicrbs.com.br/rs/vida-e-estilo/donna/noticia/2010/08/crianca-pode-escolher-ser-menino-ou-menina-veja-o-que-os-especialistas-dizem-3004697.html. Acesso em 28 out 2013.

quinta-feira, 1 de março de 2012

Garoto de 5 anos vive como uma menina e é diagnosticado com transtorno de identidade de gênero

Extra Online
20/02/12 15:24 Atualizado em20/02/12 15:27 

Um garoto de 5 anos que vive como uma menina é uma das pessoas mais jovens diagnosticadas com transtorno de identidade de gênero. Desde os 3 anos, Zach Avery, que vive em Essex, na Inglaterra, recusa-se a se vestir como um garoto. Segundo os pais dele, Theresa e Darren Avery, Zach ficou obcecado com a personagem de TV Dora, a exploradora.

Preocupados com o comportamento do filho, os pais levaram Zach ao médico. Depois de várias consultas e observações, ele foi diagnosticado por especialistas com transtorno de identidade de gênero. A escola em que o menino estuda, inclusive, disponibilizou um banheiro neutro, para crianças de todos os sexos.

A mãe de Zach conta que o filho sempre se comportou como o menino, mas, de repente, no fim de 2010, ele começou a agir como uma garota. “Ele se virou para mim um dia, quando tinha 3 anos, e disse: ‘Mamãe, eu sou uma menina’. Presumi que ele estava apenas passando por uma fase. Depois, ele passou a ficar chateado quando alguém se referia a ele como um menino”, conta Theresa à reportagem do jornal Mail Online.

Disponível em <http://extra.globo.com/noticias/mundo/garoto-de-5-anos-vive-como-uma-menina-e-diagnosticado-com-transtorno-de-identidade-de-genero-4029526.html#ixzz1nmRaDc00>. Acesso em 29 fev 2012.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

A realização de um sonho

Saulo Pithan 
quinta | 19/01/2012 07:42:00

Desde o dia 16 de dezembro do ano passado, a autônoma Fabiane da Rosa Luiz, de 32 anos diz estar vivendo uma nova vida. Aquilo que ela prefere chamar de “nascer de novo” começou desde que ela se deitou em uma mesa cirúrgica do Hospital das Clínicas, em Porto Alegre (RS), para se submeter a um procedimento pouco comum, que durou mais de quatro horas.

Do centro cirúrgico, ela saiu diferente: sem os testículos e o pênis. Fabiane, que faz questão de esquecer o nome de batismo – Fábio da Rosa Luiz - conseguiu depois de muito esforço realizar o seu maior sonho. Passou pela cirurgia de extração dos órgãos sexuais masculinos.
Os procedimentos cirúrgicos constituíram o passo mais contundente da transformação de Fábio em Fabiane, primeiro transexual masculino do Vale do Araranguá a realizar uma cirurgia de mudança de sexo custeada pelo Sistema Único de Saúde. Essa prática já existe desde 2008 no Brasil, mas apenas agora ela conseguiu realizar o sonho de se tornar mulher.

Para Fabiane, a realização da cirurgia representa o último ato de uma peça ruim em que ela encarna o personagem errado. "Desde criança, me entendo como menina", diz. Cedo, refutou o nome Fábio: preferia Fabiane. Nascida em Araranguá, na pequena comunidade de Rio dos Anjos, teve que esconder e reprimir todos os seus desejos. “Sentia atração por homens. Nunca gostei de gays. Eu não conseguia gostar do meu órgão sexual e quando tinha sete anos de idade já sabia que algo estava errado comigo. Eu não aceitava ter o corpo de menino, tendo alma e gostos de menina,” conta.

No primeiro dia de aula, foi parar na fila das meninas. "Eu não entendia por que meu lugar era junto aos meninos". A escola, aliás, foi o principal palco do descompasso com o corpo nos primeiros anos. Nas aulas de educação física, o garoto queria compor o time das meninas na prática de modalidades esportivas. O futebol, exclusividade masculina, ela deixava de lado e preferia ficar sentada no canto ao ter que correr atrás da bola. “A professora mesmo assim insistia em fazer eu jogar. Então sempre era alvo de deboche dos colegas e todos riam do meu jeito feminino,” afirma.

O drama do personagem bipartido cresceu à medida que seu corpo se desenvolvia. A partir da adolescência, com as mudanças próprias da fase, tudo se complicou. Com uma amiga que na época trabalhava em uma farmácia, teve acesso a hormônios femininos, que afinaram a voz, e fizeram nascer pequenos mamilos. Sem a devida orientação médica, acabou impondo mais dor ao corpo que queria transformar. "Tomei doses excessivas de hormônios e sofri muito com isso. Eu sabia dos riscos que corria, mas a vontade de me tornar mulher era muito maior", diz.

Fabiane recorda que foi alvo de muito preconceito. Quando resolveu mudar-se com a mãe para Maracajá, após a morte do pai, teve que enfrentar outro terrível drama. Ao passar pelas ruas da pequena localidade de Vila Beatriz para ir ao trabalho, já aos 24 anos e com características femininas bem marcantes por conta das altas doses de hormônios que ingeria, era insultada e chegou a ser apedrejada por crianças na rua.

“Nunca vou me esquecer deste dia. Foi um dos mais tristes da minha vida. Eu voltava do trabalho e as crianças saíram correndo atrás de mim, chamando de maricona e jogando pedra brita. Obviamente que incentivadas pelos pais. Me senti um cão de rua e desde aquele dia, recebi um grande apoio de minha mãe e consegui adquirir confiança para seguir adiante e lutar pelo sonho de me transformar em uma mulher,” desabafa.

Transtorno, não doença

A incompatibilidade entre corpo e mente não é uma peculiaridade de Fabiane. Segundo ela, a incômoda sensação de ocupar a estrutura física errada é comum aos transexuais. Após permanecer por longos dois anos frequentando grupos de tratamento, sendo esta a primeira etapa do processo para a cirurgia, diz ter aprendido muito sobre o assunto. "A gente sente vergonha, constrangimento e, muitas vezes, não consegue nem ao menos saber quem na verdade é. Não é uma questão de comportamento sexual, mas de identidade de gênero. Trata-se de um transtorno de gênero, não uma doença", relata.

Para Fabiane, possuir órgãos masculinos era um transtorno. Cultivar seios, um desejo. É algo completamente distinto da homossexualidade. "Nela um homem, por exemplo, se aceita enquanto homem, mas seu desejo sexual recai sobre outro homem. Já o transexual não aceita o corpo que tem, não se vê refletido nele”, esclarece.

Esse é o perfil das centenas de transexuais que aguardam na fila de espera pela mudança no corpo. Fabiane diz que agradece a Deus por ter conseguido, mas conta que nada foi fácil. Depois de ter resolvido correr atrás do seu maior sonho, teve que enfrentar barreiras como a falta de esclarecimento do sistema de saúde local. Em Maracajá, por exemplo, nem os médicos da rede básica de saúde e nem psicólogos do município sabiam sobre os procedimentos. Foi depois de muito pesquisar na internet que conseguiu contato com o Hospital das Clínicas em Porto Alegre, para onde foi tentar a sorte.

Para conseguir emitir os laudos que autorizam a cirurgia bancada pelo SUS, teve que passar pelo centro de triagem em Porto Alegre, que é o único no Sul do país, fora ele existem apenas mais três. A emissão do laudo encerra um processo que se estende por dois anos, durante os quais as condições físicas, mentais, sentimentais e sociais do candidato à cirurgia são esquadrinhadas até semanalmente por psicólogos, psiquiatras, endocrinologistas e assistentes sociais.

O objetivo, segundo ela, é rastrear pistas que permitam prever casos em que o paciente não está preparado para o procedimento cirúrgico e tudo o que ele acarreta. Um diagnóstico errado de transexualismo pode, como é fácil prever, desencadear problemas irreversíveis e há até registros de suicídio.

Acompanhamento familiar

Em sua longa jornada rumo ao ato final, Fabiane não contou apenas com a companhia dos profissionais de saúde e assistência social. A seu lado, a mãe, os amigos e o atual companheiro, que prefere não revelar sua identidade. Eles estão juntos há pouco mais de dois anos. Aguardava com ansiedade pela cirurgia e não esconde que o procedimento trouxe alívio para ambos.

"Hoje, não somos vistos como um casal heterossexual, porque, em geral, as pessoas não compreendem o que é a transexualidade", diz. "Ela nasceu num corpo inadequado, e a cirurgia tirou dos ombros dela um peso desnecessário. Quando conheci, dentro do meu táxi, nunca imaginei que fosse um homem. Na verdade sempre a tratei como uma mulher, mas eu queria viver com uma mulher e a cirurgia me deu essa oportunidade. Tanto pra mim quanto pra ela".

Com o laudo do transexualismo em mãos, Fábio já deu entrada no processo para mudança de nome. Depois da aprovação por um juiz, passará oficialmente a se chamar Fabiane da Rosa Luiz. Por enquanto, a sensação de felicidade já é plena. “Tenho minha vida que sempre quis, um companheiro que amo, uma casa, e assim que estiver totalmente recuperada da cirurgia volto a trabalhar normalmente como toda mulher. Posso dizer que nasci de nova e depois de 32 anos vou conseguir a minha felicidade de volta", finaliza.

Disponível em <http://www.atribunanet.com/noticia/a-realizacao-de-um-sonho-74799>. Acesso em 19 jan 2012.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

Menino inicia tratamento de mudança de sexo aos 8 anos

Vírgula
01/10/2011 09h00

Com direito a tratamento à base de hormônios, o menino Thomas Lobel, da Califórnia, está mudando de sexo e vem causando polêmica. Ele, que tem 11 anos e é filho de um casal de lésbicas, iniciou o processo aos 8 anos de idade. 

As mães do menino, que agora se chama Tammy, defendem a decisão do garoto, alegando que era melhor iniciar o processo de mudança de sexo já na infância, pois na puberdade tudo seria mais complicado e, nesse período, o número de suicidas com transtorno de identidade é muito maior. 

Segundo Pauline Moreno e Debra Lobel, uma das primeiras coisas que Tammy aprendeu a falar foi “Sou uma menina”. Outro fator decisivo para o incentivo das mães foi o fato de aos 7 anos ele ameaçou mutilar o próprio órgão sexual. Foi aí que o transtorno de gêneros foi diagnosticado e no ano seguinte iniciaram a medicação - implantada em seu braço esquerdo e que impedirá o desenvolvimento de ombros largos, voz grave e pelos faciais no menino. 

Segundo informações do Daily Mail, o tratamento hormonal permitirá à Tammy ter tempo de decidir se é isso mesmo o que quer. Caso decida parar de tomar a medicação, será possível passar pela puberdade como um garoto normalmente, sem, inclusive, afetar a sua fertilidade. Mas ao resolver se tornar uma mulher definitivamente, os remédios ajudarão no desenvolvimento de características físicas femininas, como o crescimento de seios. 

A cidade de Berkeley, onde Tammy vive, é uma das quatro nos Estados Unidos (Boston, Seatle e Los Angeles são as outras) onde há um hospital com programas para crianças transexuais. Lá elas são assistidas por profissionais de saúde mental, endocrinologistas e pediatras especializados. 

Disponível em <http://virgula.uol.com.br/ver/noticia/inacreditavel/2011/09/30/285355-menino-inicia-tratamento-de-mudanca-de-sexo-aos-8-anos>. Acesso em 18 jan 2012.

sábado, 7 de janeiro de 2012

Brasil: transexual sofre mais preconceito que gays

Portal Terra
13 de outubro de 2007 • 15h13 • atualizado às 15h13

Para a professora universitária e assistente social Esalba Silveira, o transexual brasileiro sofre mais preconceito que os homossexuais. Entretanto, ela avalia que, apesar de ser um país latino-americano, o Brasil ainda é mais tolerante que seus vizinhos.

Integrante do Programa de Transtorno de Identidade e Gênero (Protig), do Hospital das Clínicas de Porto Alegre, Silveira foi uma das palestrantes da mesa redonda que abordou a questão da transexualidade durante o 25º Congresso Brasileiro de Psiquiatria, realizado na capital gaúcha.

Em entrevista ao Terra, a assistente social atribuiu o maior preconceito contra a transexualidade ao fato da sociedade não fazer grande distinção entre os transexuais e os travestis.

Silveira explicou que o travesti está mais ligado a uma mudança externa, principalmente na forma de se vestir. Já os transexuais vivem um conflito interno, entre o sexo biológico com que nasceram e o gênero ao qual sentem pertencer.

Quanto ao fato do Brasil parecer menos preconceituoso que seus vizinhos, Silveira acredita que a influência das religiões de origem africana contribuiram para isso. "As religiões africanas são mais flexíveis. (Nelas) a homossexualidade não é tão vista como pecado."

Acompanhamento antes da cirurgia 

Ela explicou como o programa, do qual participa, trabalha para ajudar a construir a identidade dos transexuais. Segundo ela, é feito um acompanhamento psicológico e assistencial das pessoas e seus familiares.

Apenas após dois anos de acompanhamento, e comprovado o transtorno de gênero, o indivíduo está apto a candidatar-se para a cirurgia de mudança de sexo, que é financiada por um convênio entre o governo do Estado e o Sistema Único de Saúde (SUS), do governo federal.

Mesmo assim, antes disso, os transexuais conseguem realizar avanços como a mudança da cédula de identidade. Segundo ela, isso ajuda as pessoas que sofrem do transtorno de gênero a incluirem-se socialmente de forma mais ampla, já que facilita sua entrada no mercado de trabalho com um nome condizente com sua aparência física.

Surgimento na infância

Silveira lembra que não existem muitos dados concretos sobre a origem da transexualidade, mas conta que esse transtorno normalmente manifesta-se ainda na infância. "A criança se interessa mais por brinquedos e roupas de crianças do outro sexo."

A professora alerta que o mero interesse não é fator alarmante. "Se um menino jogo bola, depois brinca de boneca, e em seguida vai andar de bicileta, não há nada de errado. O problema começa a surgir quando trocar a bola e a bicicleta pela boneca torna-se uma rotina."

Nesses casos, Silveira afirma que a persistência dos pais para fazer essa criança abandonar esses hábitos não ajudam em nada. "Apenas trazem prejuízo para essa criança" ao aumentar seu conflito.

Presença no mundo

O Brasil não tem levantamentos apurados do número de transexuais no País. Mas Silveira conta que, mundialmente, entre os homens, o transtorno de gênero ocorre entre 1 para 37 mil e 1 para 100 mil.

Já entre as mulheres essa taxa cai bastante, e tem incidência entre 1 para 103 mil e 1 para 400 mil. A professora destaca ainda que esses números ocorrem em todos os grupos sociais.

Para ela, a falta de um estudo sobre a quantidade de transexuais brasileiros não chega a prejudicar. "Mas toda informação que venha a agregar é bem vinda."


Disponível em <http://noticias.terra.com.br/ciencia/interna/0,,OI1986239-EI298,00-Brasil+transexual+sofre+mais+preconceito+que+gays.html>. Acesso em 10 dez 2009.

sábado, 31 de dezembro de 2011

Transexual é condenado por empurrar para frente de trem advogado que se vestia como mulher

BBC BRASIL
Atualizado em  23 de dezembro, 2011 - 11:11 (Brasília) 13:11 GMT

David Burgess, também chamado por amigos e família de Sonia Burgess, de 63 anos, foi empurrado para a frente de um trem que se aproximava na estação de King's Cross em outubro de 2010. Senthooran Kanagasingham, também conhecido como Nina, foi condenado à prisão perpétua pela Justiça na última quinta-feira e deve cumprir pelo menos sete anos da pena.

Kanagasingham era amigo de Burgess, um famoso advogado defensor dos direitos humanos e dos direitos dos imigrantes. Antes de sua morte, Burgess já havia sinalizado que temia pelo estado mental do amigo, e inclusive havia indicado um médico para que ele se consultasse.

Burgess disse a amigos próximos que Kanagasingham estava ficando psicótico e "implodindo" e acrescentou que temia pelos efeitos dos hormônios receitados para Kanagasingham.

O transexual, de 35 anos, estava passando por um tratamento para mudança de sexo na época em que empurrou Burgess para debaixo do trem. A defesa alegou que Kanagasingham sofria de esquizofrenia paranóica.

'Calmo'

Testemunhas do momento em que Kanagasingham empurrou Burgess afirmaram que ele parecia "calmo" e, quando outros passageiros o cercaram, ele disse: "Sou culpado, sou culpado, me rendo". Um bilhete foi encontrado na mochila usada por Kanagasingham onde o transexual afirmava estar "deprimido e sofrendo de transtorno de identidade de gênero". 

O promotor do caso, Brian Altman, afirmou que Burgess, que tinha três filhos, tinha uma "reputação brilhante e invejável". Os filhos da vítima compareceram ao julgamento, vindos do Canadá e da Coreia do Sul, onde vivem atualmente.

Dechem, uma das filhas, declarou que Burgess queria "romper as fronteiras e permitir que indivíduos fossem o que quisessem desde que não ferissem ninguém". "Em relação a Senthooran Kanagasingham, esperamos que ele receba a ajuda que precisa, isto é o que Sonia gostaria que acontecesse e, na verdade, ela estava tentando ajudá-lo", afirmou uma declaração divulgada pela família de Burgess.

Disponível em <http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2011/12/111223_condenacao_morte_kings_cross_fn.shtml>. Acesso em 27 dez 2011.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Uma análise do texto “Desdiagnosticando o gênero”, de Judith Butler

Glória W. de Oliveira Souza
inédito


Resumo: A autora analisa o texto de Judith Butler que aborda a questão da despatologização da transexualidade nos Estados Unidos. Alguns observam o ensaio da norte-americana como apoio irrestrito a esta determinação. Mas a autora discorda desta visão, ao detalhar os argumentos de Butler, para afirmar que, ao contrário do se pensa, há uma defesa da manutenção da patologização no DSM-IV e no CID-10 como conquista estratégica da população transexual, principalmente àquelas carentes de recursos financeiros. Aponta ainda que, apesar do ensaio estar focado no universo dos EUA, há grandes semelhanças com a situação da população transexual brasileira, onde, em razão da carência e informação, prevalecem comportamentos automedicáveis, coadjuvados por aproveitadores na transformação corporal. Assim, mesmo reconhecendo a inadequação do diagnóstico como doença mental, a manutenção da patologização é um atalho para a atuação do Estado junto às minorias necessitadas. Assim, a autonomia proposta por Butler se junta ao propósito estratégico e, desta forma, não atuam de forma contrária, mas sim num sentido comum que é a permissão para que a transexualidade seja inserida cultural e socialmente como coisa humana.




quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Desdiagnosticando o gênero

Judith Butler
Physis Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, 19 [ 1 ]: 95-126, 2009


Resumo: A autora analisa o debate atual sobre a questão da despatologização da transexualidade nos Estados Unidos. Afirma que, se por um lado o diagnóstico de transtorno de identidade de gênero continua a ser valorizado por facilitar um percurso economicamente viável para a transformação corporal, por outro, a oposição ao diagnóstico se faz necessária, dado que ele insiste em considerar como doença mental o que deveria ser entendido como uma possibilidade, entre outras, de autodeterminação do gênero. Finalmente, a autora argumenta que estas posições não são necessariamente antagônicas - indicando a complexidade e o paradoxo deste debate -, já que, no seu ponto de vista, a “transautonomia” não será alcançada sem a construção de uma rede jurídica, assistencial e social que lhe dê suporte e permita que a transexualidade possa ser vivida.