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quarta-feira, 12 de março de 2014

A manifestação da sexualidade na internet: o caso ChatRoulette

Nayara Fernanda Takahara da Cruz 
Maurelio Menezes
Universidade Federal de Mato Grosso, Mato Grosso, MT
XXXV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Fortaleza, CE – 3 a 7/9/2012

Resumo: Um dos pontos de vista para se conhecer a história da humanidade é o estudo da sexualidade durante as eras pelas quais o homem passou. Viajar por esse rico caminho e poder tomar conhecimento de como o sexo vem sendo visto e praticado desde os primórdios da civilização até a atualidade, equivale a decifrar enigmas e visualizar com propriedade as manifestações humanas que se sucederam até hoje. Dissertar sobre a história do sexo e o seu manifesto na Internet é percorrer pela trajetória humana desvelando conceitos silenciados e trazendo à tona discussões adiadas, na tentativa de entender as mudanças que emergem há todo momento para o virtual. O estudo do caso ChatRoulette revela novos modos de fazer, de pensar e de se vincular socialmente através do sexo. Tais manifestações ocorrem e se consolidam como manifestos ciberculturais do tempo presente.



quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Obscenidade e censura, sexo e poder

Caio Lamas
Escola de Comunicações e Artes - Universidade de São Paulo, São Paulo, SP
XXXV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Fortaleza, CE – 3 a 7/9/2012

Resumo: Pretendemos neste artigo, através de revisão bibliográfica, expor alguns conceitos que permitam entender a intricada e complexa relação entre a obscenidade e a censura, o sexo e o poder. Partindo da revolta de setores da população à pornochanchada, percorremos um caminho que, através de autores como Coetzee, Bataille e Foucault, procura problematizar tanto o que vem a ser a censura, a pornografia e o erotismo, como os dispositivos por meio dos quais o poder lidou com o sexo ao longo da história do Ocidente.






quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Aspectos bioéticos da cirurgia de redesignação sexual sob a ótica da realização do direito fundamental à saúde

Maria Claudia Crespo Brauner; Laíse Graff
Direitos Fundamentais & Justiça
Ano 6, Nº 18, jan/mar. 2012

Resumo: Este estudo introduz alguns aspectos bioéticos da cirurgia de redesignação sexual destinada ao tratamento às pessoas transexuais, sob a ótica da concretização do direito fundamental à saúde. O sofrimento psíquico vivenciado pelos transexuais decorre especialmente do conflito entre suas características anatômicas e sua identidade sexual. Considerando a transexualidade como um transtorno capaz de gerar significativo sofrimento, cabe questionar sobre as formas e os limites da intervenção médica para seu tratamento, em especial a cirurgia de reatribuição sexual, tomando como base princípios e conceitos oferecidos pela Bioética. Estando reconhecida como doença diagnosticável e passível de tratamento, trata-se sobre a disponibilização de tratamento aos transexuais como forma de realização do direito à saúde.



quarta-feira, 4 de setembro de 2013

Fora do sujeito e fora do lugar: reflexões sobre performatividade a partir de uma etnografia entre travestis

Richard Miskolci; Larissa Pelúcio
Gênero - Niterói, v. 7, n. 2, p. 255-267, 1. sem. 2007

Resumo: O artigo discute a recepção brasileira da teórica queer Judith Butler, com especial atenção ao seu conceito de performatividade. A partir de uma análise do caráter metafórico de suas exemplificações sucessivas nas obras de Butler e de sua adaptação à nossa realidade sócio-histórica, intentamos um exercício de aplicação do conceito de forma coerente com seu caráter normativo e programático original. Assim, utilizamos uma etnografia entre travestis como meio exemplificador do caráter reiterativo de normas sociais do conceito de performatividade.

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Brincadeiras perversas

Cleo Fante
janeiro de 2008

A violência e seus impactos são temas freqüentes nos debates nacionais e internacionais, especialmente quando se desdobram em tragédias que envolvem estudantes e instituições escolares. É fato que tais acontecimentos trazem à luz questões até então negligenciadas no passado, como a violência entre os estudantes.

Os trotes universitários, muitas vezes humilhantes e violentos, por exemplo, ainda são pouco discutidos e só ganham visibilidade quando os meios de comunicação veiculam cenas de barbárie. A literatura mostra a existência desse costume em diversos países. No Brasil, datam da criação das instituições acadêmicas. Como herança de Coimbra, os trotes em algumas instituições brasileiras já fizeram – e continuam a fazer – inúmeras vítimas. O primeiro registro de morte – de um aluno da Faculdade de Direito – ocorreu em Recife, em 1831.

Ainda hoje, essas práticas são consideradas por muitos como ritos de passagem – e esperadas com certa ansiedade tanto por calouros quanto por seus parentes. Entretanto, aqueles que se dedicam ao estudo do tema concordam que se trata de um ritual de exclusão e não de integração. Deve ser considerado como um mecanismo de dominação fundamentado por discriminação, intolerância, violência e preconceitos de classe, etnia e gênero. O abuso de poder é sua marca principal.

Em razão de atitudes agressivas e abusos psicológicos, sob a alegação de que se trata de “brincadeiras”, muitos estudantes se convertem em “bodes expiatórios” do grupo, desde a sua entrada no ensino superior até a sua conclusão e, em alguns casos, essa situação se estende na vida profissional. Os que se negam a participar da “interação” são sumariamente coagidos, intimidados, perseguidos ou mesmo isolados do convívio e das atividades dos demais.

Em muitas situações, o trote, que seria um ato pontual, se prolonga numa série de ações repetitivas e deliberadas. Sobre as vítimas dessa perseguição recaem prejuízos, que podem afetar várias áreas de sua vida afetiva, acadêmica, familiar, social e profissional. Sentimentos de insegurança, inferioridade, incompreensão, revolta e desejos de vingança podem resultar em stress intenso, depressão, fobias e culminar em suicídio e assassinatos. Outros não resistem à pressão e abandonam a vida acadêmica, carregando consigo a dor e a frustração de ter pertencido a uma instituição que nada fez para romper com essa cultura.

Por outro lado, existem os que se resignam e aceitam submeter-se às diversas formas de opressão e tortura, ou se tornam cúmplices delas: respaldados na tradição dos trotes, justificarão seus atos de posterior dominação. Há ainda aqueles que apenas presenciam o que acontece aos colegas, mas, mais tarde, também se sentirão aptos a reproduzir a experiência.

Estamos, assim, diante de uma dinâmica repetitiva de abusos, já que aquele que foi vítima tende a ser algoz no futuro – seja no ambiente acadêmico, profissional, social ou na instituição familiar.

No ambiente profissional essas práticas ocorrem tantas vezes que chegam a ser vistas como “normais”. De acordo com a freqüência e a intensidade os atos podem se caracterizar como assédio moral. Há grande probabilidade de que suas conseqüências afetem a saúde mental de trabalhadores, comprometendo a auto-estima, a vida pessoal e o rendimento profissional, resultando em queda da produção, faltas freqüentes ao trabalho, licenciamentos para tratamento médico, abandono do emprego ou pedidos de demissão, alto grau de stress, depressão e, em casos extremos, suicídio.

No contexto familiar, a violência pode ser vista como “prática educativa” ou forma eficaz de controle, validada pela maioria que a presencia ou a vive, incluindo a própria vítima. Tanto no contexto profissional quanto na família há estreita ligação de dependência – afetiva, emocional ou financeira – entre os protagonistas. Isso faz com que as vítimas em geral se calem e carreguem consigo uma série de prejuízos psíquicos.

Pesquisas mostram que grande parte daqueles que sofreram abusos psicológicos na infância utilizará na vida adulta essas práticas na educação de seus filhos, acreditando ser esse o procedimento mais adequado. Outros se tornarão submissos, passivos, indefesos, acreditando ser merecedores dos maus-tratos. Muitos ainda reproduzirão a violência no espaço socializador imediato à família, ou seja, na escola.

Assassinato psíquico

É na análise das relações entre os adultos e na observação das interações de grupos de crianças na escola que se alarga nossa percepção sobre o círculo vicioso de abusos. O que antes se acreditava ocorrer apenas nas relações entre os adultos – descritas como padrões relacionais disfuncionais, abusive relationships – se verifica também entre as crianças com idade igual ou semelhante. Trata-se do bullying escolar: um conjunto de comportamentos marcados por atitudes abusivas, repetitivas e intencionais e pelo desequilíbrio de poder.

Bullying é um termo de difícil tradução na língua portuguesa, assim como a dor e o sofrimento daqueles que são vítimas desse fenômeno antigo, mas apenas recentemente identificado. Pode ser considerado um problema mundial que ocorre em todas as escolas, independentemente de serem públicas ou privadas, de sua localização ou dos turnos de funcionamento. Trata-se de uma forma quase invisível, que sorrateiramente vai diminuindo o outro, como se fosse uma espécie de “assassinato psíquico”. Suas conseqüências afetam todos os envolvidos, porém, os maiores prejudicados são mesmo as vítimas diretas, que suportam silenciosas o seu sofrimento.

Alguns motivos justificam o silêncio: o medo de represálias e de que os ataques se tornem ainda mais persistentes e cruéis; a falta de apoio e compreensão quando se queixam aos adultos; a vergonha de se exporem perante os colegas; o sentimento de incompetência e merecimento dos ataques; o temor das reações dos familiares, que muitas vezes incentivam o revide com violência ou culpabilizam as vítimas.

Apesar de os educadores saberem da existência dessa forma de violência, nenhuma ação efetiva foi adotada até os anos 70, por acreditarem ser “brincadeira própria da idade” ou do processo de amadurecimento do indivíduo. Infelizmente, muitos ainda têm esse olhar, o que colabora significativamente para sua disseminação.

O despertar para a gravidade desse comportamento teve início há cerca de duas décadas, primeiro na Suécia e anos depois na Noruega, onde a questão se tornou tema de estudos científicos. O pesquisador norueguês Dan Olweus, professor da Universidade de Bergen, reconhecido internacionalmente como pioneiro nas investigações sobre o fenômeno, observou os altos índices de suicídio entre os estudantes e constatou a relação com o bullying na escola.

Aos poucos, o tema despertou interesse em outros países, inclusive no Brasil. Nossos estudos sobre a temática são recentes, datam de 2000, motivo pelo qual muitos ainda desconhecem o tema, sua gravidade e abrangência. Apesar dos recentes estudos, pesquisas revelam que 45% dos estudantes brasileiros estão envolvidos diretamente no fenômeno.

Assim como no mundo dos adultos, os autores de bullying planejam meticulosamente seus ataques. Escolhem dentre seus pares uma “presa” que pareça vulnerável – aquela que não oferecerá resistência, não revidará, não denunciará e nem conseguirá fazer com que outros saiam em sua defesa.

Desferem seus golpes de modo a humilhar, constranger, difamar, menosprezar, excluir a vítima e intimidá-la de forma direta ou indireta. Para isso, se utilizam de várias estratégias, como apelidos pejorativos, comentários maldosos, calúnias, gozações, piadas jocosas relacionadas à sexualidade, insinuações, assédios, ameaças, danificação ou furto de pertences, empurrões, chutes, socos, pontapés, invasões e ataques virtuais, entre outras.

Esse tipo de comportamento preocupa pais e educadores de todo o mundo, especialmente por envolver crianças muito novas. O bullying pode ser identificado a partir dos 3 anos, quando a “intencionalidade desses atos já pode ser observada”.

As meninas agem de forma ainda mais velada e cruel. Enquanto os garotos escolhem aleatoriamente seus alvos, elas elegem as próprias amigas e “executam o plano” no horário do lanche ou de lazer. Infernizam a vida da colega e desferem contra ela diversas formas de maus-tratos. Uma das mais freqüentes e dolorosas é a exclusão social: ficam “de mal” ou fingem não reconhecer a vítima. Intimidam, constrangem, exigem que traga algo de casa para a escola de que muitas vezes não dispõem, visando ridicularizá-la ou isolá-la. Fofocam, inventam mentiras, ameaçam e contam seus segredos aos outros.

Riso e aplauso

Independentemente da idade dos envolvidos e do local onde ocorrem os assédios, parece haver entre aqueles que presenciam a situação certo grau de tolerância ou até mesmo de conivência. Em alguns casos, alegam que a vítima “merece” hostilidade por causa do seu comportamento provocativo ou passivo. Alguns chegam mesmo a rir e incentivar o que ocorre ao “bode expiatório” – uma atitude que fortalece a ação dos autores e sua popularidade. Outros temem ser o próximo alvo, preferindo, assim, fazer parte do grupo de agressores, o que garante a sua segurança na escola.

Com a conivência do grupo e a omissão dos adultos, os “valentões” tendem, cada vez mais, a abandonar sentimentos de generosidade, empatia, solidariedade, afetividade, tolerância e compaixão. Falhas na formação do caráter se tornam mais acentuadas e, infelizmente, muitos pais e educadores não percebem – ou fingem não perceber – o que se passa.

Com o tempo, as forças do indivíduo que sofre os abusos são minadas, seus sonhos desaparecem, aos poucos ele vai se fechando e se isolando. Esse talvez seja o pior momento na vida das vítimas: o abandono de si mesmo.

Muitos não superam as humilhações vividas durante os anos de escola e podem tornar-se adultos abusivos, depressivos ou compulsivos. Tendem a apresentar problemas na vida afetiva, por não confiar nos parceiros. Na vida laboral, podem desenvolver dificuldade de se expressar, principalmente em público, evitar assumir postos de liderança e apresentar déficit de concentração e insegurança, principalmente quando precisam resolver conflitos ou de tomar decisões. Ou seja, tornam-se presa fácil do assédio moral. Quanto à educação dos filhos, há grandes probabilidades de que se mostrem superprotetores, projetando sobre eles seus medos, desconfianças e inseguranças.

É importante, porém, lembrar que estamos nos referindo a um comportamento repetitivo, deliberado e destrutivo, diferentemente de um comportamento agressivo pontual, numa situação em que a criança, na disputa de um brinquedo ou de seu espaço, ataca o outro com mordidas e socos ou com xingamentos e ameaças. Não nos referimos aqui às divergências de pontos de vista, de idéias contrárias e preconceituosas que muitas vezes redundam em discussões, desentendimentos, brigas ou conflitos sociais ou às disputas profissionais, em que o colega é visto como empecilho para uma promoção, por exemplo. Também não aludimos a pais que, em sua ignorância, aplicam “corretivos” nos filhos quando estes os desafiam, desobedecem ou desapontam.

Referimos-nos a uma ação violenta gratuita e recorrente, baseada no desequilíbrio de poder. É a intencionalidade de fazer mal e a persistência dos atos que diferencia o bullying de outras formas de violência. É por meio da desestabilidade emocional das vítimas e no apoio do grupo que os autores ganham simpatia e popularidade. A busca por sucesso, fama e poder a qualquer preço, o apelo ao consumismo, à competitividade, ao individualismo, ao autoritarismo, à indiferença e ao desrespeito favorecem a proliferação do bullying. E seu potencial de destruição psíquica não cessa com o fim da escolaridade ou da adolescência: se desdobra em outros contextos, num movimento contínuo e circular.

O que se sabe é que esse movimento não pode mais ser ignorado. É necessário estudá-lo à luz das diversas ciências, para que possamos compreendê-lo melhor. É imprescindível a adoção de medidas emergenciais por parte de autoridades, instituições, empresas, famílias, enfim, da sociedade, uma vez que seus prejuízos afetam a todos os níveis e contextos sociais. Ignorar a situação é abrir espaços para muitos protótipos de tiranos, que estão hoje em pleno desenvolvimento. Afinal, no futuro, não serão estes que ingressarão nas universidades, que desempenharão cargos importantes em grandes empresas, que aplicarão leis e penas, que serão manchete em noticiários - sobre violência, que nos representarão no poder e serão responsáveis pela educação das crianças?

Conceitos-chave

Sentimentos de insegurança, inferioridade, incompreensão, revolta e desejos de vingança causados por essa situação podem resultar em stress intenso, depressão, fobias e culminar em suicídio e assassinatos. Muitos não resistem à pressão e abandonam a vida acadêmica, carregando consigo a dor e a frustração de ter pertencido a uma instituição que nada fez para romper com essa cultura. Outros se resignam e aceitam submeter-se à opressão e tortura, ou se tornam cúmplices delas: respaldados na tradição dos trotes, justificarão seus atos de posterior dominação.

É a intenção de fazer mal e a persistência dos atos que diferencia o bullying de outras formas de violência. Em razão de atitudes agressivas e abusos psicológicos, sob a alegação de que se trata de “brincadeiras”, muitos estudantes se convertem em “bodes expiatórios” do grupo, desde a sua entrada no ensino superior até a sua conclusão e, em alguns casos, essa situação se perpetua na vida adulta.

Humilhação e cabeças raspadas para “domesticar” novatos

Há muito tempo a violência entre estudantes tem sido um traço característico das relações escolares. Entretanto, seu foco era direcionado ora para a violência contra a escola e seus representantes (no caso das rebeliões estudantis), ora para os próprios pares (como nos trotes).

No que se refere às rebeliões, registros mostram sua ocorrência já no século XVII, na França. A de 1883, no Liceu Louis-le-Grand, em conseqüência da expulsão de um aluno, tornou-se célebre. As revoltas de estudantes contra os pedagogos eram constantes e marcadas por atos de violência, inclusive com a utilização de instrumentos como bastões, pedras, espadas e chicotes.

Já a origem dos trotes estudantis é incerta; porém, existem registros de sua ocorrência na Idade Média. Um dos documentos mais antigos desse tipo data de 1342 e refere-se à Universidade de Paris. Nas instituições européias, era comum separar os novatos dos veteranos. Aos novos alunos era negada a possibilidade de assistir às aulas junto com os demais, no interior das salas: eles eram obrigados a se dirigir aos vestíbulos (pátios de acesso ao prédio) – daí o uso do termo vestibulando para identificar aqueles que estão prestes a entrar para a universidade.

Sob a alegação de profilaxia e necessidade de manter a higiene, os novatos tinham a cabeça rapada e, na maioria das vezes, suas roupas eram queimadas. Essa prática, no entanto, logo se converteu numa espécie de culto à humilhação.

Freqüentemente, os trotes assumiam conotações sexuais, transformando-se em humilhantes orgias para aqueles que eram submetidos a elas. Com o tempo, os trotes ganharam ainda mais requintes de crueldade. Foram registrados, sobretudo, nas universidades de Heidelberg (Alemanha), Bolonha (Itália) e Paris (França), situações em que os calouros eram obrigados pelos veteranos a beber urina e a comer excrementos antes de serem declarados “domesticados”.

O julgamento dos monstros fedorentos

No início do século XX, na Alemanha, era comum que calouros fossem obrigados a vestir roupas feitas de falsa pele de animal, com orelhas, chifres e presas. Fantasiado, o jovem era arrastado pelos colegas até cinco ou seis “juízes”, sob olhares atentos de uma grande platéia. Era insultado e tratado como “monstro fedorento” por “assistentes” que em dado momento recebiam ordens para “depená-lo”, cortando-lhe as orelhas com tesouras e os chifres com serras; os dentes eram arrancados com tenazes. O nariz era limado e as nádegas, “polidas”; o novato era sacudido, empurrado e, por fim, açoitado com varas. Durante a tortura, o calouro tinha de se reconhecer culpado de inúmeros “pecados”, sobretudo sexuais. E, como penitência, era obrigado a oferecer um banquete aos veteranos.

Tragédia na escola

Os maus-tratos repetidos podem ao longo do tempo causar graves danos ao psiquismo e interferir negativamente no processo de desenvolvimento cognitivo, emocional, sensorial e socioeducacional. Quando os ataques são crônicos, as vítimas podem se tornar agressoras; em casos extremos, muitas vezes resultam em tragédias escolares, como as de Columbine (1999) e Virginia Tech (2007), nos Estados Unidos, as de Taiúva (2003) e Remanso (2004), no Brasil, e a da Finlândia (2007).

PARA CONHECER MAIS
Fenômeno bullying: como prevenir a violência nas escolas e educar para a paz. Cléo Fante. Verus, 2005.

Bullying, como combatê-lo? Prevenir e enfrentar a violência entre jovens. A. Costantini. Itália Nova, 2004.

Centro Multidisciplinar de Estudos e Orientação sobre o Bullying Escolar (Cemeobes): www.bullying.pro.br


Disponível em http://www2.uol.com.br/vivermente/reportagens/brincadeiras_perversas.html. Acesso em 03 ago 2013.

domingo, 28 de julho de 2013

Bendita dúvida!

Way Herbert
agosto de 2010

Manter o foco para atingir objetivos. Essa é uma das orientações que mais se ouvem nos cursos de treinamento de profissionais das mais diversas áreas e se leem em livros de gestão empresarial e até nos manuais de autoajuda. É preciso estabelecer metas claras, mas, principalmente, é fundamental ter força de vontade. Este último conceito, aliás, é bastante enfatizado nos programas de recuperação de dependentes químicos, nos quais as pessoas devem se comprometer com o desejo de se manter afastadas da adicção. Ou seja: é preciso estar disposto a se recuperar – e focar nesse ponto.

Mas agora talvez a ciência possa ajudar. O psicólogo Ibrahim Senay, da Universidade de Illinois em Urbana-Champaign, descobriu uma forma intrigante de criar em laboratório uma versão de obstinação e disposição – e explorar possíveis conexões com a intenção, motivação e estabelecimento de metas. Ele identificou algumas características necessárias não só para abstinência de longo prazo, mas também para atingir qualquer objetivo pessoal, desde perder peso até aprender a tocar violão.

Senay conseguiu esse resultado explorando a “autoconversação”. A acepção do termo é exatamente essa: trata-se daquela voz interna que articula aquilo que você está pensando, expondo em detalhes opções, intenções, esperanças, medos etc. O pesquisador acredita que a forma e o sentido dessa conversa consigo mesmo expressos na estrutura da frase podem ter grande importância na formulação de planos e ações. Além disso, a autoconversação deve ser uma ferramenta para revelar intenções e reafirmar o que desejamos.

Senay testou esse conceito com um grupo de voluntários que trabalhavam com anagramas – por exemplo, mudando a palavra “prosa” para “sopra, ou “fala” para “alfa”. Mas, antes de começar a tarefa, metade dos voluntários era instruída a ponderar se de fato queria e achava que cumpriria a tarefa, enquanto a outra parte simplesmente era informada de que ia trabalhar nos anagramas em alguns minutos. A diferença é sutil, mas marcante, pois ao começarem a atividade os primeiros voltavam seu pensamento à curiosidade (não só em relação à tarefa, mas também à própria disposição em realizá-la); já os integrantes do segundo grupo basicamente se predispunham a cumprir o que lhes seria pedido. Seria a mesma diferença entre se perguntar “será que vou fazer isso?” e afirmar “eu vou fazer isso”.

Os resultados foram intrigantes. As pessoas que antes haviam se questionado sobre o desejo de participar do trabalho se mantiveram mais criativas, motivadas e interessadas nele, completando um número significativamente maior de anagramas, em comparação ao dos voluntários que apenas foram instruídos a cumprir a atividade. Por que as intenções de pessoas tão determinadas – e sem muito espaço para questionamentos – sabotam metas preestabelecidas em vez de favorecê-las? “Talvez porque as perguntas, por sua própria natureza, transmitem a ideia de possibilidade e liberdade de escolha, e meditar sobre elas pode estimular sentimentos de autonomia e motivação intrínseca, criando uma mentalidade que favorece o sucesso”, sugere Senay. Ou seja: saber que não somos “obrigados” a algo nos coloca numa posição de maior responsabilidades sobre nossos atos.

Senay elaborou outro experimento para analisar a questão de forma diferente: recrutou voluntários sob o pretexto de que estavam sendo convocados para um estudo sobre caligrafia. Alguns deveriam escrever as palavras “Eu quero ” várias vezes; e outros, “Será que eu quero?”. Depois de preparar os voluntários com essa falsa tarefa de caligrafia, Senay pediu que trabalhassem nos anagramas. E, exatamente como no caso anterior, os participantes mais determinados (que haviam escrito a frase afirmativa) tiveram pior desempenho que aqueles que tinham redigido a sentença interrogativa.

Pouco depois, Senay realizou mais uma versão desse experimento, mas dessa vez claramente relacionado a hábitos de vida saudável. Em vez de propor o uso de anagramas, avaliou a intenção dos voluntários de iniciar e manter um programa de exercícios físicos. Nesse cenário real ele obteve o mesmo resultado básico: aqueles que escreveram a frase interrogativa “Será que eu quero?” mostraram comprometimento muito maior com a prática regular de exercícios do que os que escreveram no início do teste a frase afirmativa “Eu quero.”.

Além disso, quando foi perguntado aos voluntários se achavam que estariam mais motivados a ir à academia com maior frequência, os que foram preparados com a frase interrogativa justificaram declarando, por exemplo: “Quero cuidar mais de minha saúde”. Aqueles que escreveram a frase afirmativa deram explicações como: “Porque me sentiria culpado ou envergonhado de mim mesmo se não o fizesse”, mostrando-se mais perseguidos e culpados do que realmente comprometidos.

Esta última descoberta é crucial: indica que pessoas mais flexíveis, com menor receio de rever os próprios conceitos, estavam mais intimamente motivadas, buscando uma inspiração positiva interior – e não tentando prender-se a um padrão rígido, autoimposto em algum momento. Essa inspiração interna faltou aos aparentemente “mais decididos”, o que explica, pelo menos em parte, a fraca determinação para futuras mudanças, ainda que vantajosas a médio prazo. Considerando a recuperação de dependentes químicos e o autoaperfeiçoamento, em geral, aqueles que declaravam sua força de vontade sem contestações estavam, na verdade, fechando a mente e estreitando sua visão de futuro. Aqueles que se perguntavam sobre os rumos a seguir e conjecturavam possibilidades reafirmavam sua escolha – e se comprometiam com ela.

Disponível em http://www2.uol.com.br/vivermente/reportagens/bendita_duvida_.html. Acesso em 25 jul 2013.

domingo, 25 de novembro de 2012

Sexualidade e experiências trans: do hospital à alcova

Berenice Bento
Ciência & Saúde Coletiva, 17(10):2655-2664, 2012

Resumo: Depois dos estudos das masculinidades, não é possível pensar a produção das identidades de gênero sem referenciá-las ao caráter relacional. Esta mudança deveu-se à incorporação da perspectiva relacional nesse campo de estudos e à crítica ao conceito de gênero assentado em uma suposta natureza feminina e masculina para construir as interpretações sobre o lugar dos corpos da ordem de gênero. Os objetivos desse artigo são: 1) apontar como um determinado conceito de gênero pode visibilizar múltiplas expressões de gênero, a exemplo das identidades trans (transexuais, travestis, cross dress, drag queen, drag king, transgêneros) ou invisibilizá-las e contribuir para sua patologização. O segundo objetivo será apresentar narrativas de homens trans e de mulheres trans, que nos contarão suas vivências sexuais. Os saberes médicos-psi advogam a inexistência de sexualidade em seus corpos, sendo este um dos indicadores para produção do diagnóstico de transexualidade. Tentarei argumentar que a base teórica que sustenta a patologização das identidades trans e a afirmação que as pessoas trans são assexuadas tem como fundamento uma concepção que atrela e condiciona as identidades de gênero às estruturas biológicas.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Que mulher é essa? Uma encruzilhada identitária entre travestis e transexuais

CARVALHO, Mario Felipe de Lima
Mestrando em Saúde Coletiva no Instituto de Medicina Social da UERJ


Resumo: Este trabalho não pretende discutir a travestilidade e a transexualidade como conceitos a serem criteriosamente definidos, diferenciados ou aproximados; mas, a partir de relatos de pessoas que se colocam como travestis e transexuais, buscar uma compreensão das condições sociais que possibilitam a construção de uma identidade ou categoria transexual como deslizamento ou resignificação da vivência travesti. É importante lembrar que hoje há um esforço dentro do movimento LGBT por uma definição fixa que diferencie travestis de transexuais, e que não é nosso objetivo resolver este debate que faz parte das disputas políticas dos movimentos sociais e das proposições de políticas públicas identitárias. Além disso, sustentamos nossa hipótese da identidade transexual como deslizamento da identidade travesti no surgimento histórico das duas categorias no movimento LGBT e no âmbito médico.


sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Transexualismo masculino

Amanda V. Luna de Athayde
Arq Bras Endocrinol Metab vol 45 nº 4 Agosto 2001


O transexualismo masculino é uma condição que exige a atuação de profissionais de diversas áreas para o diagnóstico e tratamento. De vital importância é o correto diagnóstico, uma vez que o tratamento cirúrgico é irreversível e, se incorretamente indicado, pode levar até ao suicídio. Os elementos diagnósticos são essencialmente clínicos e um período-teste de observação de dois anos é recomendado antes da realização da cirurgia. Nesse período são utilizados recursos psicoterápicos e prescrita medicação anti-androgênica e estrogênica para adequação dos caracteres sexuais secundários. No presente artigo de revisão são abordados os conceitos necessários à conduta nos casos de transexualismo, bem como as opções terapêuticas disponíveis.


segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Nossos corpos também mudam: sexo, gênero, e a invenção das categorias travesti e transexual no discurso científico

Jorge Leite Junior
Tese apresentada à Banca Examinadora como exigência parcial para a obtenção do título de Doutor em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

Resumo: O objetivo deste trabalho é fazer uma reflexão sobre a construção das categorias “travesti” e “transexual” no discurso científico. Partindo da diferenciação entre o hermafrodita da antiguidade, mais associado ao campo mágico e mítico, e o pseudo-hermafrodita da medicina moderna, vemos como este segundo foi interiorizado através do discurso das ciências da psique. Desta base conceitual, durante o século XX, desenvolvem-se lentamente as categorias de “travesti” e “transexual”, compreendendo o trânsito entre os sexos e os gêneros como uma manifestação psicopatológica.