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quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Bisturi não é varinha de condão

Após encontro de alguns leitores do blog Cantinho-da-Glória, estes resolveram entrevistar a criadora e administradora do blog, Glória W. de Oliveira Souza. O objetivo era saber sobre a criação da ferramenta, que está hospedada pelo Google e conhecer, um pouco mais, como pensa a autora que resolveu abordar um tema pouco difundido na internet.


Cantinho-da-Glória – Qual é a sua formação?

Glória W. de Oliveira Souza – No meu sort bio costumo apontar que sou Comunicóloga. Educadora. Jornalista. Consultora Empresarial. Designer de Vitrina. Visual Merchandiser. Artista Plástica. Crítica de Arte. Pesquisadora. Possuo graduação em Educação Artística (1978); Artes Plásticas (1979) e Jornalismo (1984). Mestrado em Comunicação Social (1999). Doutorado (incompleto) em Design e Arquitetura. Sócia-diretora da Canalw Difusão do Conhecimento. Responsável pelos blogs gwConsultoria e Cantinho-da-Gloria. Docente universitária e membro de organização nacional e internacional na área de comunicação social.

CG – Por que você resolveu criar o blog sobre a temática da transexualidade?

GS – A partir do momento em que percebi que o assunto não estava sendo devidamente explorado, principalmente pelas mídias tradicionais e digitais. Havia muitas informações difundidas de forma inadequada. Em vez de ajudar a esclarecer, confundia ainda mais os leitores.

CG – Você poderia dar um exemplo?

GS – Um assunto que ainda persiste, infelizmente, que é a confusão entre identidade de gênero e orientação sexual.

CG – Qual é a diferença?

GS – De maneira bem simplória, para melhor compreensão, diria que identidade de gênero é como a pessoa se identifica em relação do gênero, independente de sua constituição biológica. Admito a existência de três tipos de identidade de gênero (externalizável): feminina, masculina e androgênica. Já orientação sexual, que indica por quais gêneros ela sente-se atraída, seja física, romântica ou emocionalmente, e é internalizável. Pode ser assexual, bissexual, homossexual e heterossexual. Ao aprofundar no tema, produzi uma Grade Diagnóstica da Sexualidade (GDS), onde também identifico a categoria da corporeidade (referente a anatomia biológica) onde aparecem as figuras de fêmeas, machos e intersexos.

CG – E existe diferença entre travesti e transexual?

GS – De maneira bem simples diria que a travestilidade, geralmente, é representada por pessoas designadas homens no nascimento, mas que procuram a construção do feminino, através de suas vestimentas e pode incluir, ou não, também procedimentos estéticos e cirúrgicos. É raro, mas também existem travestis em pessoas designadas mulheres ao nascer. Já a transexualidade  diz respeito ao indivíduo que sofre com a sensação de desconforto ou impropriedade de seu próprio sexo biológico. Para tanto, faz uma transição para um gênero diferente ao do nascimento e, de formas diferentes, perseguem a cirurgia de transgenitalização, o que não ocorrem com as travestis. E, por isso, a população transexual conta com ações específicas promovidas por profissionais e gestores.

CG – Como assim?

GS – Os transexuais contam com o suporte do Conselho Federal de Medicina, que regulamentou a prática da cirurgia de transgenitalização. O Ministério da Saúde instituiu o processo transexualizador, que define regras para a mencionada cirurgia seja patrocinada pelo governo federal. E isso ocorre porque esses gestores compreendem a transexualidade como um fator de saúde, ou seja, precisa ser tratado para o bem estar da pessoa, conforme reza a Constituição e por ser admitida pela Organização Mundial de Saúde como doença. Eis um dos benefícios da patologização. É vista, pelos envolvidos, como tratamento preventivo (medicina preventiva) e não curativo (medicina curativa).

CG – E quanto transexuais existem no Brasil?

GS – Ninguém sabe ao certo. Há muitas especulações. Aliás, só especulações. Estimativa difundida mundo afora, e que são adotadas sem questionamentos, apontam números conflitantes, pois ninguém sabe como surgiram. São dados milagrosos e a ciência não trabalha com milagres. Então o que vemos são superlativos nos números, de acordo com o interesse de cada um. Estou concluindo um estudo que indicam existir no Brasil não mais do que cinco mil pessoas transexuais. Meu estudo abarca o período de 2000 a 2014.

CG – Como surgiu o blog? Já tinha alguma experiência no tema?

GS – Pesquisei muito rapidamente sobre a temática na rede e percebi que havia um vazio. Então decidi utilizar uma ferramenta de fácil acesso e que eu não interferisse no conteúdo com minhas observações pessoais. Seria tendenciosa. Escolhi então por difundir o assunto tão somente com as postagens que encontrava na internet fazendo republicação. A única mudança que me permiti foi fazer uma edição visual, adequando ao modelo sugerido pelo Google, mas sem alterar o conteúdo. O objetivo do blog é deixar que o leitor criasse sua própria opinião sobre a matéria postada, tanto é que as referências estão no fim de cada texto. Quanto a experiência, participei como autora com o capítulo “Um olhar de dentro: apontamentos iniciais acerca da transexualidade”, parte do livro “Minorias sexuais: direitos e preconceitos” (2012), organizado por Tereza Rodrigues Vieira. 

CG – E como foi a recepção ao blog?

GS – Não foi aquilo que eu desejava. O blog surgiu em setembro de 2011 e em setembro do ano passado, fiz um levantamento. Das quase 800 postagens, nesse período o acesso foi de um pouco mais de 26 mil no Brasil; quase 21 mil na Russia e 10 mil nos Estados Unidos. O acesso chegou mais via Facebook. A postagem mais vista não chegou a 500 acessos.

CG – Seria por causa da temática do blog?

GS – Não creio. O que se recomenda, nas redes digitais, é que se tente aproximar o máximo possível do público-alvo desejado. E a transexualidade é um nicho. Julgo que, apesar do assunto estar mais presente na mídia atualmente, o assunto não é tão atrativo e nem necessário para o dia-a-dia das pessoas.

CG – Não é necessário? Explica.

GS – Para as pessoas que não fazem parte deste universo, quer diretamente como os viventes; bem como os que têm relação indireta, como médicos, psicólogos, assistentes sociais e outras categorias profissionais, o assunto tem importância apenas enquanto informação. Mas nem mesmos os seres viventes do fenômeno se interessam em aprofundar o conhecimento sobre o tema. O foco deles têm sido outro.

CG – Quer dizer que os próprios transexuais não se interessam pelo assunto?

GS – Infelizmente sim. Para quê ler se as informações circulam mais rapidamente pela forma oral, redes sociais, encontros casuais. E o resultado disso (falta de interesse) é a disseminação de informações, muitas vezes, equivocadas, prevalecendo mais as versões do que os fatos. E não devemos nos esquecer de que a temática tem forte apelo emocional. Tanto é que é muito elevado o índice de automedicação, devido, principalmente de que sonhos e informações muitas vezes se conflitam. Então se acredita no primeiro milagreiro que promete corpo perfeito sem esforços e em pouco tempo. E aí o bicho pega...

CG – Explica melhor...

GS – Costumo dizer que tenho encontrado muitas pessoas que fazem parte desse universo e que se pautam pelos “três is”: ignorância informativa (que difere da comportamental); ingenuidade e inocência. Como é uma população muito carente, a necessidade de acreditar em sonhos é muito presente. Muitas delas procuram a cirurgia de transgenitalização por julgar que, após a feitura da mesma, a vida delas mudará radicalmente, quanto a aceitação da família, proposição de emprego, contração de matrimônio e dissipação todo e qualquer tipo de bullying social. Ledo engano. Tenho repetido para essas pessoas que bisturi não é varinha de condão.

CG – Como identificar quem é travesti ou transexual?

GS – Não é fácil e nem simples. No capítulo do livro que participei, digo que isso só será possível por intermédio dos microssinais e nanossinais, devido aos avançados estudos das neurociências, que vem abrindo caminho para melhor conhecer essa população. Swaab, em sua obra recente (2014), “We are our brains: a neurobiography of the brain, from the womb to Alzheimer’s”, aponta que a transexualidade ocorre no cérebro nos primeiros meses de gravidez, no útero. Portanto, a transexualidade é cerebral e não construção social, como muitos apregoam. Ninguém se torna transexual, nasce-se transexual.

CG – Quais são as carências desta população?

GS – De todo o tipo. As mais gritantes estão no campo familiar, escolar, social (incluindo aqui necessidade de renda), afetivo e, principalmente, na auto-compreensão do próprio fenômeno. A confusão que a sociedade faz na identificação e classificação do ser transexual também atingem aos próprios seres viventes. Tanto que é comum encontrarmos seres que desejam fazer mudanças corporais e buscar identificação com o gênero oposto ao biológico, mas fogem de terapias, que poderiam ajudar na compreensão da situação em que vivem. O comportamento pode demonstrar o medo da perda dos sonhos desejados e que talvez não seja tão verdadeiro.

CG – Por que isso ocorre?

GS – Primeiro vivemos numa “sociedade espermatozóica”, onde só têm valor quem é o primeiro ou o mais “saudável”. Este termo é usado como antônimo de doença. Transexualidade não é doença. Tanto é que, quando da descoberta e diagnóstico adequados, é fator de felicidade e não sofrimento. Mas faz parte do CID (Classificação Internacional de Doenças), instrumento da Organização Mundial da Saúde (OMS), no item F64-0. Também está no DSM (Manual de Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais), criado por psiquiatras norte-americanos e que é seguido como uma bíblia pelo resto do mundo. Tanto é que muitos dos profissionais que tratam do tema – inclusive no Brasil – usam o termo “transexualismo”, cujo sufixo, de origem grega, exprime a ideia de, dentre outros fenômenos, doença. É preciso, portanto, que todos que estejam envolvidos com esta população tenham um olhar mais atualizado. Isto não significa aceitar tudo e nem rejeitar tudo. É preciso mais aprofundamento.

CG – Como isso seria possível?

GS – Primeiro ver o fenômeno a partir da medicina holística, que é a abordagem de tratamento médico baseada na teoria de que os organismos vivos e o meio ambiente (não confundir com ecologia) funcionam juntos como um todo integrado, sob os aspectos físico, psicológico e social. A partir daí, somar-se ao que eu chamo de “duplo agá” (HH): humanismo holístico. O humanismo é uma filosofia moral que coloca os humanos como principais, numa escala de importância. Mas isso não ocorre na prática. Só vemos isso em discursos de quem detém o poder, qualquer que seja. Esse novo enfoque requer sensibilidade, desprendimento e estudo, assim seria possível ver “os olhos brilharem” dos transexuais quando abordarem suas próprias situações. Mas o que prevalece, hoje, são os medos e sonhos.

CG – Os profissionais envolvidos com essa população têm receio em buscar esse “novo olhar”?

GS – Eu trocaria a palavra ‘receio’ por desconhecimento. Adicionaria ainda o preconceito que vigora, infelizmente, em muitos desses profissionais que atuam junto a este público. O preconceito é velado, mas ele “grita silenciosamente”. André Oliveira, pesquisador sobre comportamento, diz que as pessoas, precisamente as urbanas, são conservadoras e liberais. São defensoras de valores superestabelecidos como a família, o casamento, a segurança e a carreira. Entretanto, por outro lado, querem testar coisas novas, e tem dificuldade em lidar com a homossexualidade, novas relações familiares e as drogas. Aliás, eu não gosto de utilizar o termo ‘preconceito’, prefiro definir este ato como “bullying dissimulado”, pois se trata de uma situação que se caracteriza por agressões intencionais, verbais ou físicas, feitas de maneira repetitiva, mas de forma sutil, quase imperceptível.

CG – Você pode falar um pouco mais sobre esse desconhecimento?

GSEm conversas informais com vários profissionais e estudantes de várias áreas, percebi que o tema da transexualidade sequer é mencionado em uma única aula. Isso é preocupante quando ocorre, principalmente, em cursos como medicina e psicologia. Estou formatando uma pesquisa para ver se isso se confirma. O resultado disso é o que ouvi, certa vez, de uma profissional de psicologia ao me dizer: ”se uma pessoa chega para mim e diz que é transexual, quem sou eu para dizer que não é”. Ela se esquece de que dentro desta população há pessoas com transtornos diversos – corrigíveis – projeções, traumas e outras manifestações que podem ser passageiras e não configurar, necessariamente, caso de transexualidade. Não se trata de rejeitar o sujeito auto-declarante, mas de permitir um diagnóstico minimamente técnico-científico.

CG – Mas esse conhecimento não passa por uma educação melhor?

GSMas educado todo mundo o é e o tempo todo. É que há certa confusão entre educação e escolarização. O pai que bate na mãe está educando o filho. Os que furam a fila de um banco estão educando os demais para a mesma prática ou coisa pior. A mãe que trai o marido ou esconde uma fruta na sacola dentro de um supermercado está educando os filhos sobre as mesmas práticas. Portanto, tudo é educável. O que se deve é melhorar as formas e formatos da escolarização (em todos os níveis) para torná-la atraente e dentro das necessidades dos aprendizes. Hoje a escolarização (do maternal a pós-graduação) é um martírio. Só há adesão devido a obrigação e imposição.

CG – Muitos transexuais, inclusive, abandonam os estudos devido ao preconceito, não?

GSPode ter sido. Hoje isso já não é mais desculpa. Qualquer pessoa pode continuar – ou iniciar – a escolarização de dentro de casa, em qualquer momento e qualquer nível escolar. Certa vez encontrei uma pessoa transexual que passava mais de cinco horas diárias na frente do Facebook e tinha abandonado os estudos devido ao que você disse. Então sugeri que ela reservasse meia hora por dia para qualquer tipo de curso. Resultado: ela deixou de conversar comigo, ficou com raiva. Então tenho minhas dúvidas quando identifico esses comportamentos vitimizados, tentando me fazer crer que todo o mal contra ela vem da sociedade.

CG – Acredita que uma campanha sobre isso não ajudaria, como fazem contra o preconceito?

GSDa maneira como é feita hoje, não, não acredito que ajuda a mudar nada. Só reforça o que existe. As campanhas, qualquer que seja o tema, precisam mudar de estratégia e técnica. Deixar de ser racionais na linguagem (quer textual, quer icônica) e partir para apelos emocionais. É isso que fazem a propaganda e publicidade de produtos. E dentro do foco pretendido. Se a necessidade é tratar sobre trabalho, não há porque o foco ser na sexualidade. O que é preciso é demonstrar a qualificação da população objeto da campanha. Costumo brincar que, para uma vaga de recepcionista, por exemplo, o que menos importa são as identificações sexuais (gênero ou orientação), mas sua qualificação para atender e receber. Ninguém irá pedir para levantar a saia ou abaixar as calças para decidir se aceitará ou não ser atendido por aquela pessoa. Aliás, termino o capítulo no livro que já mencionei que não há transexualidade abaixo da linha do umbigo. E sabe por quê? Porque está no cérebro.

CG – Qual é a sua análise sobre as políticas públicas para travestis e transexuais?

GSNão acredito que existam. O termo está sendo muito utilizado. Virou um mantra, principalmente por parte de gestores. Podemos entender a nomenclatura como uma espécie de planejamento por parte de um ente público. Mas como pode se planejar se não tem elementos concretos que possa alimentar esse plano? Um documento público da Prefeitura de São Paulo deixou isso em evidência. É uma pena. Planejamento sem elementos que alimentam os preceitos do plano, não é planejamento, é especulação. Não é de se espantar que os resultados sejam frustrantes. Para ambas as partes. Grosso modo, conforme Graças Rua, política pública envolve decisão sobre diversas ações estratégicas (planejamento racional – policy) e os atores receptores (público-alvo – politics). E a pergunta que fica é: como praticar políticas públicas sem conhecer o perfil e as necessidades do público-alvo? E por falar em público-alvo, a sua pergunta abarca duas populações distintas. Portanto, cada uma requer uma política própria.


CG – Pode dar detalhes?


GS – Sim, duas populações: a de travestis e a de transexuais. Cada uma requer um planejamento, diagnóstico e prognóstico próprios. São fenômenos diferentes, apesar das semelhanças. Um exemplo vivo foi a criação do Ambulatório para Travestis e Transexuais (ASITT) pelo governo do Estado de São Paulo junto ao CRT. Uma boa ideia mal aplicada. Em entrevista informal não gravada, um dos diretores me disse que o serviço foi parar lá no CRT porque foi rejeitado em outras oito unidades médicas do Estado. Teria dito o secretário da saúde da época (2009): “vocês já estão acostumados a lidar com uma população estigmatizada”. Com essa visão, o serviço foi implantado no local. Só que os profissionais daquela unidade têm suas expertises na área curativa (transexualidade requer atendimento preventivo) e são especialistas no atendimento aos portadores de HIV há mais de 30 anos. E agora? Resultado: visão distorcida do fenômeno (o protocolo de atendimento deixa isso evidente – portaria 1/2010); briga de poder entre os profissionais (“para mim, este ambulatório, em sua concepção, surge de fontes que, entre si, são antagônicas. Ele é o resultado do encontro de águas conflituosas”. As palavras estão em Guimarães A., Bagoas, n. 10, 2013), e inúmeros conflitos entre os usuários do ASITT e portadores de HIV, sem falar em uma crise sem precedentes, envolvendo pacientes e profissionais, ocorrida ano passado dentro do ASITT. Repito: uma boa ideia mal utilizada, devido a disputa de egos, briga por poder, interferência ideológica e escassez de mão-de-obra e material que compreendessem as premências desta população.

CG – Você disse que o Ministério da Saúde estabeleceu o processo transexualizador? O que é isso?

GS – Resumidamente é uma regulamentação feita pelo ministério a partir das resoluções do Conselho Federal de Medicina relativa ao atendimento, no nível do governo, sobre o tratamento ambulatorial e cirúrgico para a população transexual. A última regulamentação é de 2013 e trata do acompanhamento clínico (considerado de média complexidade), pré e pós-operatório (alta complexidade). O paciente precisa ter entre 21 e 75 anos e participar, por no mínimo, dois anos de acompanhamento antes da operação e um ano no pós-operatório. Esses atendimentos são feitos em unidades hospitalares nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Goiânia e em todos há equipe multiprofissional composto por médicos psiquiatra, endocrinologista, clínico, ginecologista obstetra, cirurgião plástico, urologista, além de psicólogo, assistente social e enfermeiro.

CG – Quais são os avanços em termos de legislação para esta população?

GS – Eu não tenho esses dados. Mas não creio que combates em relação ao bullying, criação de empregos, compreensão familiar, imposição de novos conhecimentos sejam efetivos por meio da legislação. O Brasil possui mais de 180 mil leis – o que dá uma média de 18 leis por dia – muito das quais obsoletas, inaplicáveis, irreais, inúteis e inconstitucionais. Uma sociedade não se muda por decreto, mas por reeducação social e disponibilidade de escolarização.

CG – Para finalizar...

GS – Agradecer a oportunidade da conversa e esperando que, a partir deste bate-papo, o blog possa contribuir mais para a difusão do conhecimento desta temática, que faz parte de todas as sociedades. 

terça-feira, 28 de julho de 2015

Fonoaudiologia e transgenitalização: a voz no processo de reelaboração da identidade social do transexual

Lorena Badaró Drumond
Fonoaudióloga Mestranda em Psicologia - UFES 


Resumo: Nos consultórios de fonoaudiologia é crescente a demanda de transexuais, principalmente masculinos, em busca da adequação da voz ao gênero pretendido por eles. Segundo Silveira (2006), transexual é o indivíduo que tem convicção de não pertencer ao seu sexo biológico. Rejeita o próprio corpo e suas características genitais por desenvolver uma identidade de gênero relativa ao sexo oposto ao seu. O tema da homossexualidade será abordado a partir do olhar da fonoaudiologia, mais restrito à questão da saúde, e da psicologia, no sentido da construção social. Através da revisão de literatura, a presente pesquisa se propôs buscar compreender o papel que a voz ocupa na construção da identidade social dos transexuais masculinos e em que se baseiam as demandas apresentadas por esse público não só na clínica fonoaudiológica mas também em relação à estética corporal.


sábado, 16 de agosto de 2014

Modelo transexual está na disputa pelo título de Miss Inglaterra

Extra Online
14/01/12 

Jackie Green se tornou a mais jovem transexual inglesa após fazer uma operação de mudança de sexo na Tailândia em seu aniversário de 16 anos.

Agora, aos 18, Jackie foi convidada por olheiros que não sabiam de sua história a participar do Miss Inglaterra, noticiou o site do The Sun. A aspirante a modelo quer usar a oportunidade para falar sobre bullying e transexualidade.

"Fiquei impressionada quando os olheiros me chamaram. O Miss Inglaterra é um concurso de muito prestígio. Eu adoraria ganhar. Eu tenho tanta chance quanto qualquer outra mulher", disse Jackie.

O desejo de Jackie de trocar de sexo vem desde os 4 anos de idade. Aos 10 anos, ela já tinha cabelos longos e usava uniformes femininos para ir à escola.

Aos 12, sua mãe, Susie, levou a menina a uma clínica nos Estados Unidos para que começasse a tomar hormônios e interrompesse a puberdade. O próximo passo foi fazer uma segunda hipoteca da casa para pagar a mudança de sexo, que custou cerca de R$ 75 mil. Por causa de bullying, Jackie chegou a tentar o suicídio cinco vezes.

"Eu tenho que agradecer a minha mãe. Ela salvou minha vida", declarou.

Jackie está em uma rodada preliminar do concurso, onde o público decide quais candidatas disputarão a semifinal.


Disponível em http://extra.globo.com/noticias/mundo/modelo-transexual-esta-na-disputa-pelo-titulo-de-miss-inglaterra-3670400.html. Acesso em 31 jul 2014.

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Delegado de Goiânia muda de sexo e deve assumir a Delegacia da Mulher

Rafael Mesquita 
Quinta, 23/01/2014

O ex-delegado de Trindade e Senador Canedo, na Região Metropolitana de Goiânia, Thiago de Castro Teixeira foi submetido a uma cirurgia para mudança de sexo e, com autorização da Justiça, mudou nome e registro civil para Laura.

De acordo com a assessoria de imprensa da Polícia Civil, a instituição não irá se pronunciar sobre o caso, já que trata-se de uma questão pessoal da agora delegada Laura e não altera administrativamente a polícia. Ainda de acordo com a direção da instituição, a delegada está de licença e quando retornar será lotada em outra delegacia.

Existe a possibilidade de ela assumir a Delegacia da Mulher de Goiânia, o que ainda não está confirmado pela direção da Polícia Civil. Segundo a advogada especialista em direito homoafetivo e presidente da Comissão de Direito Homoafetivo da OAB-GO, Cíntia Barcelos, com a mudança de sexo, a situação jurídica de Laura não se altera e, por isso, ela poderá continuar com o cargo na Polícia Civil.

Ainda segundo a advogada Cíntia Barcelos, o que deve mudar é o comportamento da sociedade em relação ao assunto. A presidente da Comissão de Direito Homoafetivo da OAB-GO ainda acredita que o caso poderá servir de exemplo para outras pessoas que têm o mesmo desejo, mas muitas vezes preferem não mudar de sexo por convenções sociais.

Disponível em http://cbn.globoradio.globo.com/editorias/pais/2014/01/23/DELEGADO-DE-GOIANIA-MUDA-DE-SEXO-E-DEVE-ASSUMIR-A-DELEGACIA-DA-MULHER.htm. Acesso em 29 jul 2014.

terça-feira, 6 de maio de 2014

Lutadora transexual é liberada para competir em evento de MMA feminino

UOL
04/04/2013

A lutadora transexual Fallon Fox, de 37 anos, foi liberada pela Comissão Atlética da Flórida para competir contra uma mulher no Championship Fighting Alliance (CFA), marcado para o final de maio. O evento estava inicialmente previsto para abril, mas foi cancelado em solidariedade a Fox, que não havia obtido licença para lutar.

A dificuldade em conseguir a liberação para lutar na Flórida aconteceu devido à análise da documentação de sua licença junto à Comissão Atlética da Califórnia, onde apresentou exames para comprovar que é transexual.

A entidade da Flórida alegou que foi preciso investigar supostas discrepâncias nas informações submetidas pela lutadora. Nesta semana, o inquérito foi concluído, e não foi constatado nada que pudesse impedir Fallon Fox de competir.

Assim, a lutadora transexual foi liberada para atuar no estado da Flórida. Ela irá enfrentar Allana Jones no dia 24 de maio, pela semifinal do Grand Prix do peso pena feminino do CFA na cidade de Coral Gables, na região metropolitana de Miami.

Fallon Fox passou por uma cirurgia para mudança de sexo em 2006. Como amadora e profissional, a lutadora acumula um cartel de cinco vitórias e nenhuma derrota, tendo nocauteado no primeiro round em todos os confrontos.

"Estou muito feliz porque eles chegaram à conclusão correta. Eu não tinha muitas dúvidas de que isso aconteceria. Tinha certeza de que eles iriam perceber que eu não estava tentando enganá-los", comemorou Fallon Fox ao site Outsports.


Disponível em http://esporte.uol.com.br/mma/ultimas-noticias/2013/04/04/lutadora-transexual-e-liberada-para-competir-em-evento-de-mma-feminino.htm. Acesso em 06 mai 2014.

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Crossfit proíbe transexual de competir entre mulheres e é processado

UOL
07/03/2014

Uma mulher transexual abriu processo contra uma competição de crossfit após ser proibida de competir na categoria feminina. A atleta alega ter sido discriminada e pede US$ 2,5 milhões na Justiça de indenização.

Personal trainer, Chloie Jonnson tentou participar dos CrossFit Games, concurso da modalidade destinado a determinar o homem e a mulher mais forte. Ela solicitou sua inscrição na categoria feminina, mas a competição sustenta que a atleta nasceu como homem e deveria competir no masculino.

Em carta do advogado da companhia ao representante de Jonnson, o CrossFit alega que tomou a decisão para "proteger os direitos de todos os competidores e da competição em si".

O advogado de Jonnson, porém, defende que a atleta é identificada como mulher desde a adolescência e que seu atual status foi reconhecido legalmente pelo estado da Califórnia. Jonnson passou por cirurgia para troca de gênero em 2006 e desde então tem se submetido a terapia hormonal.

O defensor ainda revelou que um companheiro de time de Jonnson enviou um e-mail anônimo para a organização do torneio perguntando sobre atletas transexuais na competição. O CrossFit Games respondeu que os competidores deveriam disputar o evento na categoria do gênero de seu nascimento.

"[Jonnson] Não tem nenhuma vantagem sobre outra mulher. Ela tem tomado estrogênio por um longo tempo. Ela é mulher, é legalmente mulher. Uma empresa como o CrossFit está fazendo negócios na Califórnia. A lei impede a discriminação com base na identidade de gênero", disse Waukeen McCoy, advogado de Jonnson.

A terapia de reposição hormonal para transexuais femininas inclui tratamento anti-androgeno, que anula os efeitos da testosterona para reduzir as características masculinas do corpo. Ainda consiste na aplicação dos hormônios estrogênio e progesterona para feminizar o corpo.

Outro problema levantado por McCoy é a questão da privacidade dos atletas transexuais. Eles teriam suas vidas particulares expostas ao competirem em seu gênero de nascimento, já que alguns praticantes nunca revelaram ter realizado cirurgia de troca de sexo.

"Se serei forçada a não ser eu mesma, quero que isso seja feito para o bem de todas as pessoas transexuais e atletas. Não por causa da política discriminatória de uma empresa", disse Jonnson em comunicado à imprensa.


Disponível em http://esporte.uol.com.br/ultimas-noticias/2014/03/07/crossfit-proibe-transexual-de-competir-entre-mulheres-e-e-processado.htm. Acesso em 05 mai 2014.

domingo, 4 de maio de 2014

Homens falam se teriam relação com uma transexual

Patricia Zwipp
23 de abril de 2014

Será que os homens topariam se relacionar com um transexual, que fez cirurgia de readequação sexual (conhecida popularmente como cirurgia de troca de sexo), como as modelos Roberta Close e Lea T e a ex-BBB Ariadna? Os entrevistados pelo Terra foram unânimes na resposta: “não”. No entanto, um deles até admitiu certa possibilidade. “Se descobrisse depois de me envolver e estivesse apaixonado, continuaria”, opinou o analista de projetos Roberto Costa*, de 32 anos.

Todos garantiram que preconceito não está em jogo. “Apesar de respeitar muito a opção sexual dos outros, não conseguiria me relacionar com transexual. Apesar de operada, a pessoa para mim continuaria sendo um homem”, comentou o publicitário Caio Sanches*, 41 anos. “Não seria igual a uma mulher de verdade. Não tenho nada contra transexuais, mas não me relacionaria”, explicou o contador Douglas Arruda*, 25 anos. “Não é preconceito, mas não é o natural, homens devem ficar com mulheres e mulheres com homens, não tem meio termo”, acrescentou o aposentado Mário Santos*, de 69 anos.  

Quando o assunto é se envolver primeiro e descobrir a mudança de sexo depois, a maioria disse que se separaria, alegando que essa situação deve ser esclarecida antes do envolvimento amoroso. “Eu me separaria não só pelo fato de ser transexual, mas sim porque uma questão como essa não pode ser omitida e me sentiria enganado”, garantiu o engenheiro Claudio Souza*, de 35 anos.

Não saber da readequação sexual realmente incomoda os entrevistados. Todos se sentiriam constrangidos ou desconfortáveis caso alguém descobrisse que já ficaram com uma pessoa que mudou de sexo, sem que soubessem da condição. “Ficaria incomodado, pois não seria algo que aconteceu com o meu consentimento”, declarou Claudio. O contador Douglas, apesar de não gostar dessa situação, declarou que não tentaria desmenti-la e “falaria que peguei mesmo” para acabar logo com o assunto.

Será que é possível identificar uma transexual operada? Essa questão dividiu a opinião dos participantes. Claudio e Roberto acham que não notariam a diferença, enquanto Douglas e Mário acreditam que poderiam diferenciar. Já Caio não tem tanta certeza: “Acho que, na maioria dos casos, identificaria. Mas, com o avanço da medicina, não descarto a hipótese de passar despercebido.”


Disponível em http://mulher.terra.com.br/vida-a-dois/homens-falam-se-teriam-relacao-com-uma-transexual,bfd5fd8d05a85410VgnVCM3000009af154d0RCRD.html. Acesso em 02 mai 2014.

segunda-feira, 7 de abril de 2014

TJSP nega reparação por discriminação sexual

Tribunal de Justiça de São Paulo
02/04/2014

A 2ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo reformou sentença que havia condenado um estabelecimento comercial de São Bernardo do Campo a indenizar um homem que, travestido de mulher, foi impedido de utilizar o banheiro feminino do local.

De acordo com os autos, o autor utilizou uma vez o sanitário feminino, mas não pôde ingressar nele novamente após reclamação das clientes. Os seguranças sugeriram, então, que ele utilizasse o banheiro de portadores de necessidades especiais, destinado a pessoas de ambos os sexos, mas o homem não concordou e, posteriormente, ajuizou ação indenizatória por entender que tinha enfrentado uma situação constrangedora. A decisão de primeira instância determinou que o estabelecimento pagasse a ele R$ 5 mil por danos morais.

A relatora do recurso, Marcia Tessitore, entendeu que os funcionários não agiram de forma discriminatória. “O autor em nenhum momento sofreu preconceito negativo e não foi tratado como ser inferior, mas sim como diferente em relação ao sexo feminino, o que de fato é, pois ainda que sua autoimagem seja feminina, na realidade pertence ao gênero masculino, com todos os atributos de tal gênero, já que não é transexual (não há notícia de ter realizado a cirurgia de transgenitalização).”

Os desembargadores Luiz Beethoven Giffoni Ferreira e José Carlos Ferreira Alves integraram a turma julgadora e também deram provimento à apelação.


Disponível em http://www.tjsp.jus.br/Institucional/CanaisComunicacao/Noticias/Noticia.aspx?Id=22275&ArticleId=22275. Acesso em 07 abr 2014.

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Pedido para mudança de nome e gênero antes de cirurgia é autorizado

Última Instância
16/12/2013

A 4ª Vara Cível do Foro Regional do Jabaquara, na cidade de São Paulo, deferiu pedido da DP-SP (Defensoria Pública de São Paulo) e autorizou que uma transexual retifique seu registro civil de Bruno para Bruna*, e altere seu sexo de masculino para feminino, ainda que ela não tenha realizado a cirurgia para mudança de sexo.

De acordo com os autos, apesar de ter nascido com o sexo fisiológico masculino, a transexual tem psique feminina. Por conta disto, ela sofre constrangimentos frequentemente uma vez que, apesar de ter aparência feminina, possui documentos com o nome masculino.

“Bruna* vê-se constrangida a identificar-se socialmente pelo nome constante em sua certidão de nascimento. A alteração de seu prenome é, portanto, reconhecimento de sua autonomia e capacidade de autodeterminação”, afirmam os Defensores Públicos Luis Fernando Bonachela e Priscila Simara Novaes, que atuaram no caso.

Os Defensores apontaram também que ela encontra-se na fila de espera para realização da cirurgia de redesignação sexual; laudo médico atesta que ela já recebe hormônios femininos há mais de 5 anos, como etapa preparatória para aquela cirurgia.

Para Fábio Fresca, juiz responsável pela decisão, as condições psíquicas da transexual são suficientes para justificar o pedido de retificação de seu prenome civil, sendo secundária a preocupação com o aspecto físico e a efetiva realização do procedimento cirúrgico de transgenitalização.

“O sexo psicológico é, sem maior dificuldade, aquele que dirige o comportamento social externo do indivíduo. É ele quem define como o indivíduo se mostra perante a sociedade”, disse Fresca.

(*) Os nomes utilizados nesta matéria são fictícios


Disponível em http://ultimainstancia.uol.com.br/conteudo/noticias/68117/pedido+para+mudanca+de+nome+e+genero+antes+de+cirurgia+e+autorizado.shtml. Acesso em 10 fev 2014.

sábado, 22 de fevereiro de 2014

A tutela jurídica da pessoa transexual

Marina Carneiro Leão de Camargo

Resumo: O presente trabalho analisa o fenômeno da transexualidade frente ao Direito, com base no princípio da dignidade da pessoa humana, que, por força da Constituição Federal de 1988, ilumina todo o ordenamento jurídico. Para tanto, traz uma reflexão acerca das categorias de gênero e sexo no que se refere à construção de corpos femininos e masculinos através dos discursos. A partir disso, situa-se a experiência transexual no processo por meio do qual são prescritos comportamentos aos indivíduos e naturalizadas as diferenças entre os corpos sexuados. Aborda-se, por fim, a tutela jurídica da pessoa transexual, através da legalização das cirurgias de transgenitalização e da possibilidade de alteração do registro civil no tocante ao prenome e ao sexo, em virtude da identidade de gênero, tendo por fundamento os direitos da personalidade e os direitos fundamentais.



quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Uma análise legal e jurisprudencial acerta da alteração do registro civil do transexual no Brasil

Alana Lima de Oliveira; Camilla Guedes Pereira Pitanga Santos
RIDB, Ano 3 (2014), nº 1

Resumo: O presente artigo tem por objetivo discutir o direito à alteração da identificação civil do transexual. Para tanto, apresenta-se, inicialmente, uma sucinta abordagem sobre a definição da transexualidade no Brasil, para em seguida destacar os aspectos das subjetividades trans, seus efeitos legais e jurídicos no que toca à mudança dos designativos de sexo e nome do registro civil e suas repercussões na jurisprudência brasileira.



segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

UFMG discute nesta semana ampliação da cirurgia de mudança de sexo no Brasil

Letícia Orlandi
07/01/2014

Antes restrito aos homens que querem mudar de gênero, o procedimento da transgenitalização para mulheres, mais complexo e de caráter experimental, também pode ser realizado a partir dos 18 anos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Uma nova portaria, publicada no Diário Oficial da União em 21 de novembro, acata a decisão judicial que, em setembro, determinou que o Ministério da Saúde tomasse as medidas necessárias para facilitar o acesso a cirurgias de transgenitalização e adequação sexual.

Os hospitais tiveram 30 dias para se adequar às novas regras, incluindo a criação dos Serviços de Atenção Especializada com médicos das áreas de endocrinologia, ginecologistas, urologistas, obstetras, cirurgiões plásticos, psicólogos e psiquiatras, além de enfermeiros e assistentes sociais. Com a portaria, transexuais e travestis também terão acesso gratuito à prótese de silicone para mama e à terapia hormonal.

Em 2012, o Ministério da Saúde incluiu pela primeira vez o público travesti em sua campanha de incentivo ao uso da camisinha no carnaval. Com a nova portaria, que inclui acesso gratuito à prótese de silicone para mama e à terapia hormonal para transexuais e travestis, especialistas acreditam que o preconceito também poderá diminuir

De acordo com a psicóloga Anne Rafaele Telmira, pesquisadora do Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT da UFMG, essa mudança permite uma nova abertura aos transexuais na saúde pública. “Ela vai redefinir e ampliar o processo de transexualização das transexuais femininas e dos transhomens, que são um novo fenômeno, assim como as travestis, que não eram contempladas com o serviço do SUS”, opina.

O tratamento hormonal também é oferecido somente a partir dos 18 anos, já que os jovens transexuais de menor idade podem ter dificuldades com a adaptação aos medicamentos. “Isso é uma questão muito importante tanto para os transhomens quanto para as transexuais femininas, porque eles começam a se hormonizar muito cedo, enquanto o corpo se desenvolve, e isso pode trazer problemas para a saúde”, alerta a psicóloga.

Além disso, o paciente terá o direito de receber um acompanhamento psicoterápico antes e depois da cirurgia, já que a mudança de identidade pode comprometer sua situação no meio social. Para Anne Rafaele Telmira, apesar da relevância dessa orientação, alguns tópicos ainda precisam ser trabalhados. “Deve haver um acompanhamento no sentido de autoimagem e a questão da inserção na família, mas existem pontos que ainda não foram contemplados, como o acesso ao mercado de trabalho”, observa.

Atualmente, quatro hospitais universitários do país realizam o procedimento cirúrgico pelo SUS: Hospitais das Clínicas de Porto Alegre e Goiânia, Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina de São Paulo e Hospital Pedro Ernesto da UERJ. Para mais informações, acesse o site do Conselho Federal de Medicina: www.cfm.org.br.

Nesta semana, o programa de rádio Saúde com Ciência, produzido pela Faculdade de Medicina da UFMG, discute o tema Transexuais e o SUS: nova portaria. O programa vai ar de segunda a sexta-feira, às 5h, 8h e 18h, na rádio UFMG Educativa, 104,5 FM. Ele ainda é veiculado em 37 emissoras de rádio em Minas Gerais e é possível conferir as edições pelo site do Saúde com Ciência. Nesta quarta-feira, o assunto será o processo psiquiátrico envolvido na questão; na quinta será abordada a cirurgia para transexuais masculinos e na sexta o debate será sobre o preconceito.


Disponível em http://sites.uai.com.br/app/noticia/saudeplena/noticias/2014/01/07/noticia_saudeplena,147051/ufmg-discute-nesta-semana-ampliacao-da-cirurgia-de-mudanca-de-sexo-no.shtml. Acesso em 07 jan 2014.

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

'A vitória é nossa', diz transexual do RS que provocou mudanças no SUS

Caetanno Freitas
23/11/2013

Ao ficar sabendo sobre as mudanças para o atendimento de transexuais e travestis pelo Sistema Único de Saúde (SUS), publicadas nesta quinta-feira (21) pelo Ministério da Saúde, o serígrafo Renato Fonseca, de 46 anos, viu cada vez mais próximo o fim da longa fila de espera que o atormenta há sete anos. Ele é uma das vozes mais graves entre o grupo com cerca de 30 pessoas que ingressou, no Rio Grande do Sul, com uma representação no Ministério Público Federal (MPF) para que o SUS contemplasse transexuais masculinos em cirurgias de trocas de sexo no Brasil.

Nascido Rosane Oliveira da Fonseca, Renato esperava há muito tempo pela oportunidade de fazer a cirurgia de troca de sexo. Agora, com as novas diretrizes do Ministério da Saúde, válidas para todo país, o procedimento poderá ser marcado a qualquer momento.

“Fizemos tudo juntos, a vitória é nossa. A gente vive tapado com roupas em pleno verão. Queremos a liberdade. Estou desde ontem (quinta) vibrando muito. É uma alegria enorme”, descreve ao G1.

Renato adianta que na próxima segunda-feira (25) o grupo estará no Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) para dar início ao processo de marcação das cirurgias.

“Esperamos que o hospital agilize. A gente passa tanto tempo em avaliação com psicólogos e psiquiatras para que eles tenham certeza da nossa certeza que, quando chega uma notícia dessas, a ansiedade é quase incontrolável”, afirma.

O procurador regional da República da 4ª Região, Paulo Leivas, foi um dos que ajuizaram a ação para que o SUS incluísse na sua lista de procedimentos a cirurgia de transgenitalização, ou mudança de sexo, em meados de 2002. Cinco anos depois, o Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região deu parecer favorável e notificou a União, que recorreu da decisão. As possibilidades de reversão judicial foram esgotadas em 2009. Desde lá, a medida estava sendo descumprida, conforme o procurador.

“A União desistiu dos recursos por causa de uma declaração do então ministro da Saúde (José Gomes Temporão), que declarou ser favorável ao direito dos transexuais. Ou seja, a decisão transitou em julgado. O SUS começou a oferecer o procedimento a transexuais femininos e ignorou os masculinos até hoje”, explica.

O Programa de Transexualidade do HCPA é coordenado pelo cirurgião Walter Koff, também professor de urologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Ele também exaltou as mudanças anunciadas pelo Ministério da Saúde. “Temos 32 pacientes na fila esperando essa portaria para poder retirar mamas, ovários e útero. Isso vai ser muito importante.”

O HCPA é um dos quatro centros brasileiros capacitados para realizar esse tipo de tratamento. A instituição já fez 168 cirurgias de redesignação do sexo masculino para feminino.

Novas diretrizes do Ministério da Saúde

A Portaria 2.803 de 19 de novembro de 2013, publicada nesta quinta-feira (21) no Diário Oficial da União, estabelece que os transexuais masculinos – pessoas que são fisicamente do sexo feminino, mas se identificam como homens – tenham as cirurgias de retirada das mamas, do útero e dos ovários cobertas pelo sistema público. Eles também passam a ter direito à terapia hormonal para adequação à aparência masculina. Esse grupo não estava incluído na portaria que regia o processo de mudança de sexo pelo SUS até então.

Já as transexuais femininas – pessoas que nascem com corpo masculino, mas se identificam como mulheres – também terão um tratamento adicional coberto pelo SUS: a cirurgia de implante de silicone nas mamas. Desde 2008, elas também têm direito a terapia hormonal, cirurgia de redesignação sexual – com amputação do pênis e construção de neovagina – e cirurgia para redução do pomo de adão e adequação das cordas vocais para feminilização da voz.

A partir de agora, também terão direito a atendimento especializado pelo SUS os travestis, grupo que não tem necessariamente interesse em realizar a cirurgia de transgenitalização. A portaria define que o tratamento não será focado apenas nas cirurgias, mas em um atendimento global com equipes multidisciplinares.

Polêmica da idade mínima

As novas regras estabelecem a idade mínima de 18 anos para início da terapia com hormônios e de 21 anos para a realização dos procedimentos cirúrgicos.

Essas são as mesmas idades estabelecidas pela Portaria 457, de 19 de agosto de 2008, regra que regia o processo de mudança de sexo até então.

Em 31 de julho deste ano, o Ministério da Saúde chegou a publicar uma portaria para definir o processo transexualizador pelo SUS – suspensa no mesmo dia da publicação – que estabelecia a redução da idade mínima para hormonioterapia para 16 anos e dos procedimentos cirúrgicos para 18 anos, o que foi revisto nas novas regras.

Segundo o Ministério da Saúde, essa revisão foi decidida para adequar as normas à resolução 1955, de setembro de 2010, do CFM.

Para Koff, o ideal para o paciente é passar pelo tratamento o quanto antes. “Vamos reivindicar que se abaixe a idade mínima para a cirurgia e para o tratamento com hormônios. Quanto antes, melhor. Como esse processo começa na infância, quando eles têm 16 anos, já estão no fim da puberdade e têm condições de tomar a decisão”. Segundo ele, o tratamento precoce pode evitar sofrimentos no âmbito social e afetivo.


Disponível em http://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2013/11/vitoria-e-nossa-diz-transexual-do-rs-que-provocou-mudancas-no-sus.html. Acesso em 23 nov 2013

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Aspectos da psicossexualidade e da personalidade de pacientes autodenominados transexuais masculinos e femininos avaliados pelo teste projetivo de Szondi

Elisa Del Rosario Ugarte Verduguez
Universidade de São Paulo - SP
Área de Concentração: Endocrinologia
São Paulo, 2009

Resumo: O transexualismo é um transtorno da identidade sexual, associado a uma forte e persistente identificação com o sexo oposto. Há poucos estudos referentes à utilização de testes psicológicos para auxiliar no diagnóstico do transexualismo. O objetivo deste estudo foi avaliar os aspectos da psicossexualidade de pacientes autodenominados transexuais através do teste de Szondi: Estudo retrospectivo e prospectivo no quais os pacientes com transtornos da identidade de gênero foram avaliados através de entrevistas livres; com aplicação dos critérios diagnósticos de transexualismo da DMS-IV da Associação Psiquiátrica Americana, seguido da aplicação dos testes projetivos de Szondi e H-T-P. O teste de Szondi foi aplicado por 8 vezes em cada indivíduo para avaliação quantitativa das proporções psicossexuais Dur e Moll. OS pacientes com diagnóstico de transtorno específico da identidade de gênero (transexualismo) foram acompanhados em psicoterapia de grupo por pelo menos 2 anos. Casuística: 105 indivíduos autodenominados transexuais (78 masculinos); grupo controle: 109 indivíduos (55 homens) autodenominados heterossexuais. Após aplicação dos critérios diagnósticos para transtorno da identidade de gênero do DMS-IV da Associação Psiquiátrica Americana e acompanhamento psicoterápico foram definidos como transexuais 41 indivíduos do sexo masculino e 17 indivíduos do sexo feminino. Na análise estatística as variáveis obtidas nos testes Szondi e H-T-P foram avaliadas por testes não paramétricos. Resultados: No grupo masculino, houve predomínio da proporção Moll total assim como na proporção Moll no vetor sexual e no do ego nos transexuais em comparação aos heterossexuais e aos portadores de transtorno da identidade de gênero não especificado (p<0,05). A sensibilidade do teste Szondi para identificação feminina nos transexuais masculinos foi de 80%, a especificidade de 86% e a acurácia de 83% enquanto que a sensibilidade do teste H-T-P foi de 88%, a especificidade de 54% e a acurácia de 72%. No grupo feminino houve predomínio da proporção Dur total assim como na proporção Dur do ego nas transexuais em comparação as heterossexuais e as portadoras de transtorno da identidade de gênero não especificado (p<0,05). A sensibilidade do teste Szondi para identificação masculina nos transexuais femininos foi de 94%, a especificidade de 67% e a acurácia de 85% enquanto que no teste H-T-P a sensibilidade foi de 94%, a especificidade foi de 33% e a acurácia de 73%. No período pós-cirúrgico todos os pacientes portadores de transtorno específico da identidade de gênero se mostraram satisfeitos, com alguma frustração pela limitação do processo transexualizador, por terem realizado a cirurgia, porém com melhora significativa dos vínculos sócio-familiares. Discussão: A validação de testes psicológicos para o diagnóstico dos transtornos de identidade de gênero é de grande importância visto o número crescente de pacientes com queixas de transtorno sexual que procuram tratamento. No estudo atual analisamos as propriedades do teste Szondi e do teste H-T-P num grupo de pacientes com transtornos da identidade de gênero classificados através dos critérios vigentes. Verificamos que a acurácia do teste Szondi foi maior que a do teste H-T-P no diagnóstico dos transtornos específicos da identidade de gênero a custa de uma maior especificidade frente a uma sensibilidade semelhante. Além disto, a detecção de transtornos psíquicos pelo teste Szondi, que podem ser causa ou efeito do transtorno da identidade de gênero, permite alertar o psicoterapeuta na indicação da cirurgia de transgenitalização. Conclusão: O teste Szondi mostrou ser um excelente teste auxiliar para o diagnóstico do transexualismo em ambos os sexos.

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Lea T põe o dedo nas feridas do sistema de gêneros

Rita Colaço
28/01/2013

Ontem no Fantástico, revista semanal da Rede Globo, foi apresentada uma entrevista com a top model transexual Lea T, que recentemente se submeteu à cirurgia de transgenitalização.

Em seu depoimento, ela afirmou estar ainda um tanto sensível, em decorrência não apenas da intervenção cirúrgica tomada enquanto um ato médico, mas, sobretudo pelos seus aspectos psíquicos, emocionais.

Mesmo destacando esse aspecto, onde se encontra a perceber e refletir sobre sutilezas de sua nova realidade, Lea T foi capaz de proferir umas verdades incômodas.

Uma das mais contundentes, em minha opinião, foi declarar que não é a presença ou ausência de um desses órgãos que vai trazer a felicidade da pessoa.

Antes do ato transgenitalizador, disse, toda a sua expectativa de felicidade estava alicerçada na realização da cirurgia. Agora, feita a intervenção, se deu conta de que o ser humano é mais, muito mais do que a sua genitália.

No rastro dessa percepção de que existe possibilidade de vida saudável psiquicamente falando que não seja necessariamente a cirurgia, Lea também fez referência ao conteúdo de dominação simbólica existente na necessidade psíquica de se trangenitalizar, ao reconhecer que esse processo, não à toa chamado de “readequação”, visa muito mais à satisfação da sociedade do que à própria pessoa trans.

“Readequado” o ser no âmbito da norma de gênero, nada é transformado e toda a ditadura do binarismo pode continuar incólume, a enjeitar, humilhar, segregar, todas aquelas pessoas que por essa ou aquela razão não se enquadrem nas exíguas fronteiras do “masculino” e do “feminino”, como concebidos em nossa cultura.

Lea não falou em nome das pessoas trans. Falou apenas por si mesma. Pelo que está a pensar e sentir nesse momento ainda delicado de sua cirurgia recente.

E, em nome próprio, falando somente a partir de sua experiência, disse que não recomendava a cirurgia a ninguém, pois era um processo bastante doloroso.

Houve, porém, quem visse na entrevista transmitida pela Rede Globo dois dias antes do Dia da Visibilidade da pessoa Trans, um verdadeiro desserviço, na medida em que a emissora “apenas deu voz a uma única transsexual e fez com que sua verdade passasse a ser, aos olhos da sociedade, a verdade d@s milhares que lutam, todos os dias, contra a patologização, o preconceito e a precariedade”.

Respeito o direito de quantos opinem, mas, em verdade, não consigo ver onde é que a fala, pessoal, íntima e em muitos aspectos explicitamente provisória de Lea T. possa contribuir negativamente para a luta das pessoas transsexuais em prol do reconhecimento sociojurídico, do direito a uma vida digna, fora da ótica da patologia.

Em minha perspectiva de olhar, Lea T. fez exatamente o contrário.

O fato de ser quem é e ter falado no veículo que falou dota a sua fala pessoal de aspecto politico. Mas isso não pode servir de argumento suficiente para continuar a impedir um debate atrasado em mais de trinta anos - pelo menos.

A questão de o veículo de comunicação em tela não aceitar transmitir outros pontos de vista sobre o tema, é aspecto que compete aos movimentos trans e LGBT enfrentar.

Por que o movimento LGBT, o movimento trans, ninguém jamais ousou questionar a ordem simbólica que levou e leva milhares de transexuais pobres à morte pelo uso indevido de silicone industrial? Por que todos se limitaram e se limitam a reivindicar a cirurgia como a grande panacéia para todas e todos?

Quem supõe que “o problema não é usar silicone industrial, mas a transfobia”, não consegue ver que tanto a transfobia quanto o uso do silicone industrial e a cirurgia de transgenitalização, quando tratada como a única “solução”, como meio eficaz à “readequação”, são efeitos, sintomas de nosso sistema de gêneros.

Disponível em http://brasiliaempauta.com.br/artigo/ver/id/1473/nome/Lea_T_poe_o_dedo_nas_feridas_do_sistema_de_generos. Acesso em 28 out 2013.