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sexta-feira, 1 de junho de 2012

Transexualidade: uma verdade incontestável

Breno Rosostolato
01/04/2012

O transexualismo é uma realidade para muitas pessoas que buscam sua felicidade na mudança definitiva de sexo e identidade. É a contradição de uma imagem fictícia e uma verdade incontestável. Pessoas que apresentam um comprometimento emocional e insatisfação sexual por conta da incompatibilidade quanto “àquilo” que são de fato e o que o corpo apresenta. O que me chama a atenção é que a  transexualidade não é um fenômeno, porque não é extraordinário, mas uma constatação de que discutir sexualidade vai muito além do sexo. É compreender mais sobre a constituição de identidade do que, meramente, órgãos sexuais. O transexual prova que seu destino não é traçado na maternidade, me permita assim o poeta.

Conforme o CID-10 (classificação estatística internacional de doenças e problemas relacionados com a saúde), trata-se de um desejo de viver e ser aceito enquanto pessoa do sexo oposto. Este desejo é reprimido por conta de um sentimento de mal-estar ou de insatisfação em relação aos próprios genitais, envergonha-se evitando tocá-los. As frustrações no ato sexual são inevitáveis. De fato, os comprometimentos emocionais por conta desta confusão na identidade de gênero pode levar a um embotamento afetivo, a um isolamento social e a uma condição cada vez mais marginalizada. A identidade de gênero é a maneira como a pessoa se sente, se identifica e se apresenta para si e para os outros e independe do sexo biológico. O conflito do transexual é não se sentir completamente uma mulher porque o corpo masculino não corresponde à subjetividade feminina ou vice-versa.

Existem ainda algumas variações sexuais que num primeiro momento podem confundir-se com o transexualismo: o travestismo e o crossdresser. No travestismo, as pessoas se vestem como o sexo oposto e possui um ingrediente prazeroso em sentir-se como tal. O crossdresser é parecido com o travestismo, mas não implica, necessariamente, na orientação homossexual. Caso mais conhecido é o cartunista Laerte, exemplo de crossdresser.

A questão é que sentir-se masculino ou feminino difere de sentir-se homem ou mulher, até porque estas últimas classificações são estereotipadas e reforçam a dicotomia social. O que determina a existência de uma pessoa é identificar-se com seus desejos, encontrar-se com as próprias referências e assumi-las, ou seja, masculino ou feminino.

No caso dos transexuais admite-se a diferença sexual alicerçada pela identidade de gênero. Logo, ter um pênis ou uma vagina pode ser uma exigência pessoal. É então que a cirurgia de redesignação de sexo ou transgenitalização é o caminho mais provável e, na maioria dos casos, providencial. No Brasil, desde 1997 este procedimento é gratuito. Mas é bom salientar que cada caso é estudado com muito cuidado e adotando todos os critérios possíveis e necessários, principalmente no que diz respeito à psicoterapia e aos requisitos médicos.

Depois de confirmado o diagnóstico de transexualismo, uma vez que a pessoa pode apresentar outros transtornos de personalidade concomitantes, iniciam-se os procedimentos fundamentais para a cirurgia. Hormonioterapia ajuda o indivíduo, aos poucos, a renunciar às características sexuais contrárias de sua real identidade sexual. No caso do transexual homem para mulher, hormônios antiendrogênios que promovem um atenuamento na voz e na pele, aumento de gordura e crescimento de mamas, e eliminam pelos através da eletrólise, uma depilação definitiva. Quanto à cirurgia, são retirados os testículos e o pênis (penectomia). A vaginoplastia aproveita os tecidos internos e constitui uma neovagina. Ainda, o nariz é afinado e o pomo de adão retirado.

No transexual mulher para homem são administrados hormônios androgênios que promovem crescimento dos pelos, engrossamento da voz e ganho de massa muscular, e na cirurgia é feito o procedimento de mastectomia (retirada das mamas); histerectomia (retirada do útero) e oforectomia (retirada dos ovários). A faloplastia consiste em enxertos feitos para constituir um neofalo e, com ajuda de uma prótese, deixá-lo ereto.

O impacto é grande na vida das pessoas que se submetem a estes procedimentos e, ainda assim, mesmo depois de todo este sacrifício, deve-se superar uma etapa não menos dolorosa: o preconceito. O transexual ainda possui muita dificuldade em se relacionar com alguém que compreenda o conflito vivido e a nova existência. No entanto, a sociedade deve acolher estas pessoas que desmistificam os determinismos genéticos, quebram estereótipos e classificações sociais, e provam que a identidade sexual não é uma característica secundária. Para o transexual, entre ser ou não ser, felicidade rima com reconhecimento e aceitação. 

Disponível em <http://www.jb.com.br/sociedade-aberta/noticias/2012/04/01/transexualidade-uma-verdade-incontestavel/>. Acesso em 23 mai 2012.

domingo, 18 de março de 2012

Bissexualidade praticada

Breno Rosostolato
11/03/2012

Homens, vocês não são mais os mesmos, e muito menos vocês, mulheres. Cada vez mais percebo mudanças significativas nos comportamentos entre os sexos. O que sempre foi justificado como uma guerra entre homens e mulheres tornou-se uma exacerbação e predominância do sexo frágil, se ainda podemos dizer isso. E, querem saber, de fato, sempre foi assim.

“Por trás de um grande homem existe uma grande mulher”. Esta antiga frase é muito apropriada se pensarmos que decisões foram e são tomadas pelas mulheres. Os homens acreditam que suas vontades são prioritárias, mas na verdade executam as delas. É difícil pensar, por exemplo, que os reis possuíam uma autonomia e não consultavam suas rainhas antes de uma tomada importante de decisão. Inclusive, as mulheres possuem papel central em muitos momentos históricos, e seu poder de decisão foi fundamental. Cleópatra, soberana no Egito; Joana d'Arc, combatente francesa que liderou o exército em vários momentos; Anita Garibaldi, a heroína dos dois mundos; Evita Peron, política argentina; Margareth Tatcher, a Dama de Ferro inglesa; e a nossa primeira presidente mulher, Dilma Rousseff. Ficaria um bom tempo aqui lembrando de tantos outros nomes.

Só que não é das mulheres em si que gostaria de discutir, mas sobre o efeito feminino nos homens e as consequências dessa influência. O lado feminino nos homens, enfim, passa a ser admitido, e, se não o é, nitidamente o comportamento, hábitos e costumes masculinos se metamorfosearam por conta dessa releitura.

Os homens têm se cuidado mais. Idas frequentes ao cabeleireiro, depilações, cremes para as mãos, pés, rosto. Produtos de cosméticos e de higiene próprios para o público masculino. Os pelos já não são mais uma marca da virilidade e da masculinidade. Virilidade essa que já é rediscutida nas clínicas sobre fertilidade. Os homens estão admitindo seu grande pesadelo: a impotência sexual. E, o mais significativo: buscam ajuda. Deixam o constrangimento de lado e reconhecem que precisam de orientação. As clínicas de cirurgia plástica são outro exemplo. Constatamos que os homens também se sacrificam em busca de um modelo de beleza. Ora, isso é admitir que outros homens são bonitos. E, o melhor, podemos dizer isso e não ter nossa orientação sexual questionada.

A nova condição masculina vem sendo recriada pela feminilidade, e, com isso, os homens evidenciam suas fragilidades, suas dores e anseios. Estamos emocionalmente transformados, a ponto de não precisarmos reprimir essa afetividade, que ainda é escravizada pela cultura e a educação do macho. Já repararam que falamos e discutimos a homossexualidade cada vez mais? Um dos alicerces para tal emancipação da verdade é a atmosfera feminina.

Os homens estão explorando mais sua sexualidade, experimentando novos prazeres e se permitindo mais uma subjetividade e desejos adormecidos. Sensíveis, choram por um amor, sofrem por ciúmes e temem a rejeição. Precisam de aprovações. Eles querem ser bonitos, desejados, são vaidosos, deixam de ser egoístas no sexo. Estão aprendendo, enfim, a escutar os benefícios do diálogo. Intervenção das mulheres.

Muito se fala das mudanças masculinas, mas a metamorfose feminina acompanha esse momento entre os sexos. É nítida a emancipação e a autonomia delas. Homens, admitam, elas são guerreiras. Trabalham, cuidam de casa, dos filhos, dos maridos com maestria. Independentes e bem resolvidas, elas fazem acontecer. Talvez esta mesma autonomia, cada vez mais em evidência, seja o motivo de tantos crimes cometidos contra as mulheres, pois a sociedade ainda apresenta uma dificuldade muito grande em aceitar e se adaptar ao novo e já consolidado momento sociocultural.

Homens e mulheres apresentarão sempre diferenças, algumas imutáveis, mas a essência masculina e feminina são muito parecidas, porque experimentamos o fenômeno da igualdade. Neste sentido, somos bissexuais, e o melhor de refletirmos sobre tudo isso é que essa simbiose provoca uma constante aprendizagem, que tende a se ramificar, originando muitas outras vertentes sociais e metamorfoseando as relações interpessoais.

Proponho, inicialmente, pensar na bissexualidade, não na perspectiva do desejo sexual mas na maneira como cada um integra em seu caráter características masculinas e femininas e, num segundo momento, a questão mais importante: enaltecer esses fenômenos sociais e culturais como oriundos e proporcionados pelo universo feminino.

É notório que as diferenciações de gênero não têm a ver apenas com posicionamentos sexuais mas com aspectos construídos e perpetuados na história da humanidade. Paradigmas e tabus que, hoje, caem por terra. É preciso compreender que os opostos se completam. Atenuar as diferenças e aceitar cada vez mais as semelhanças é a realidade inevitável entre mulheres e homens.  O respeito e o crescimento individual acontecem à medida que colocamos essa nova percepção em prática.

Disponível em <http://www.jb.com.br/sociedade-aberta/noticias/2012/03/11/bissexualidade-praticada/>. Acesso em 13 mar 2012.