Mente Cérebro
abril de 2012
Quem nunca teve muita vontade de dizer poucas e boas ao
chefe, a um amigo ou parente mas na hora h usou toda a energia para evitar
fazer isso? Ou então cedeu ao ímpeto e perdeu algo importante – talvez um
relacionamento ou o emprego? Agora, imagine se você sempre fizesse tudo que
passasse pela cabeça. Talvez a possibilidade seja tentadora, mas provavelmente
você já teria tido problemas profissionais, dificilmente manteria um
relacionamento afetivo estável ou amizades e com certeza se envolveria muitas
vezes em brigas de todo tipo – o que seria um risco até para sua integridade
física. Afinal, não por acaso a capacidade de autocontrole em situações sociais
é essencial para um convívio razoavelmente harmônico.
O fato é que quase sempre precisamos refrear nossos impulsos
para que, por exemplo, um pequeno desentendimento entre colegas ou na família
não se torne algo enorme, que cause ruptura permanente. Da mesma forma, também
deveríamos resistir a certas tentações se um relacionamento estável for
importante. E quem sempre diz o que pensa não raro coloca pedras no próprio
caminho – por exemplo, em uma entrevista de emprego.
Em todas essas situações utilizamos o autocontrole para
seguir as normas sociais. Mas nem sempre é fácil manter o domínio de nossas
reações. E como acontece com a maioria das características humanas, há grandes
diferenças individuais no que se refere à capacidade de filtrar comportamentos
para não deixar que a exaltação tome conta de nós. Em nossa sociedade, quem tem
bom domínio de si mesmo é em geral mais respeitado por outros do que pessoas
consideradas imprevisíveis e explosivas – o que certamente traz inúmeras
vantagens.
Pessoas com bom autocontrole são, em geral, mais
bem-sucedidas no trabalho e mantêm relacionamentos estáveis, como comprovam
estudos do psicólogo social Roy Baumeister e de seus colegas da Universidade
Estadual da Flórida em Tallahassee, nos Estados Unidos. Ele reconhece que,
apesar de a autonomia emocional ser tão importante para o convívio, durante
muito tempo seus fundamentos neurobiológicos foram ignorados. Hoje, os
pesquisadores que se dedicam a esse estudo investigam principalmente duas
questões: 1. Os processos cerebrais responsáveis por nossa capacidade de
autocontrole social; 2. As características neurobiológicas que possam esclarecer
as diferenças individuais relacionadas a essa capacidade.
Alguma vez um bom amigo traiu sua confiança? É provável que
você tenha exposto a ele claramente sua opinião ou talvez tenha até terminado a
amizade. Ou você se irritou ultimamente com uma multa por ter dirigido rápido
demais na estrada? De fato, quando desrespeitamos regras, podemos ser punidos
pelas pessoas à nossa volta ou por instituições públicas. Por esse motivo,
quase sempre respeitamos as normas e controlamos impulsos egoístas para evitar
as sanções.
Sabendo disso, neurocientistas aproveitam o fato de as
reações serem mais fortes quando somos ameaçados com punição por desrespeito ao
que está estabelecido ou em situações nas quais somos observados por outras
pessoas e reproduzem essas condições nos experimentos. Uma equipe de
pesquisadores coordenada pelo cientista econômico Ernst Fehr, da Universidade
de Zurique, e pelo psiquiatra Manfred Spitzer, da Universidade de Ulm, estudou
recentemente o que acontece no cérebro nessas ocasiões. Eles compararam o
comportamento e a atividade cerebral de adultos saudáveis em duas situações: na
primeira, o participante recebia 1 euro por rodada e deveria decidir a cada vez
que porcentagem queria ceder para outro participante. No Segundo cenário a pessoa
devia tomar a mesma decisão, sabendo, porém, que o recebedor poderia considerar
a oferta injusta e punir com pontos negativos aquele que a propunha.
Conforme esperado, os voluntários se mostraram muito mais
generosos diante da possibilidade de punição. Enquanto no primeiro caso quase
ninguém optou por doar mais de 20 centavos, a maioria dos participantes do
outro grupo dividiu pela metade a quantia que lhe coube.
Como revelou a tomografia por ressonância magnética
funcional (TRMf), as áreas pré-frontais foram mais intensamente ativadas quando
havia a possibilidade de castigo. Quanto mais divergente o comportamento do
participante sob as duas condições, maior se mostrava a diferença no cérebro.
Aqueles que responderam mais intensamente à punição por uma oferta muito
sovina, cedendo muito mais dinheiro, apresentaram intensa ativação do lobo
frontal.
Os pesquisadores acreditam que isso ocorre porque os
participantes precisam exercer maior controle sobre seus impulsos egoístas para
ceder uma quantia mais elevada do que gostariam. O córtex pré-frontal
desempenha aqui um papel claramente importante.
O resultado é também interessante se considerarmos estudos
que mostraram uma ativação reduzida de áreas pré-frontais em criminosos
psicopatas. Sua pouca capacidade de controlar o próprio comportamento apesar da
ameaça de sanções pode estar associada a déficits nessas áreas.
Disponível em
http://www2.uol.com.br/vivermente/noticias/a_ciencia_do_autocontrole.html.
Acesso em 04 jun 2013.