Alejandra Martins
10 de
novembro, 2013
"Senti que, com 11 anos, havia me tornado
feminista".
Em 24 de outubro de 1975, milhares de mulheres no país
nórdico saíram às ruas para chamar a atenção para seus baixos salários e a
falta de reconhecimento de seu papel na sociedade.
"Nem minha mãe, nem suas amigas, nem funcionárias do
comércio, nem as professoras trabalharam, cozinharam ou cuidaram de seus filhos
naquele dia", contou Rudolfsdottir à BBC Mundo, que ficou sozinha em casa
com sua irmã menor.
Nada menos do que 90% das mulheres do país se somaram aos
protestos e atos públicos naquele dia.
As empresas não tiveram outra alternativa a não ser receber
um grande número de crianças que foram levadas ao trabalho por seus pais, já
que muitas escolas, fábricas e lojas fecharam.
"Foi um chamado à ação. Muitos sentem que a
solidariedade mostrada neste dia abriu caminho para a eleição, cinco anos
depois, de Vigdis Finnbogadottir, a primeira presidente eleita democraticamente
no mundo", ressaltou Rudolfsdottir, que coordena o programa sobre estudos
de gênero da Universidade da ONU na capital islandesa, Reykjavík.
As manifestações de 1975, seguidas de ações semelhantes em
2005 e 2010, mostram a luta por trás das mudanças que explicam porque a
Islândia é, pelo quinto ano consecutivo, o país número um em igualdade de
gênero, segundo o ranking anual do Fórum Econômico Mundial.
Mas qual é o segredo deste país de pouco mais de 300 mil
habitantes, e o que a América Latina pode aprender com o modelo islandês?
Creches baratas
A acadêmica acredita que para encontrar as causas para a
menor disparidade de gênero na Islândia é preciso olhar para as ações do
movimento das mulheres, marcado pela paralisação de 1975.
"Em suma, o movimento lutou duramente para criar na
sociedade as estruturas necessárias para que as mulheres pudessem participar da
política e do mercado de trabalho".
Na Islândia, 82,6% das mulheres em idade economicamente
ativa trabalham e respondem por 45,5% da força de trabalho. Ao mesmo tempo,
elas têm uma das taxas de fertilidade mais altas da Europa, com 2,1 filhos por
mulher. Como conseguem?
Uma das chaves é o acesso a creches de baixo custo.
"As creches são administradas pela municipalidade de Reijavík
e o preço mensal é muito baixo. Tenho dois filhos, passei 15 anos no Reino
Unido e um dos grandes problemas para que as mães voltassem ao trabalho era o
preço das creches", aponta.
Outra mudança na lei do país que facilitou a vida das
mulheres é a ampliação da licença paternidade.
"No total, o casal tem nove meses de licença",
disse à BBC Mundo Thordur Kristinsson, professor de Estudos Sociais em
Reikjavík.
"Três meses exclusivos para a mulher, três exclusivos
para o pai e outros três que podem ser divididos como o casal desejar",
explica.
Para Kristinsson, estas regras têm uma vantagem adicional: "As empresas já não podem ver as mulheres como um fator
de risco por causa da maternidade. Os homens também são um fator de
risco".
"E, além disso, os chefes também saem de licença
paternidade. Se um pai não usufrui de seus três meses em casa, as pessoas
estranham, o encaram como irresponsável".
Igualdade total, nem na Islândia
O ranking do Fórum Econômico Mundial combina as pontuações
de cada país em diferentes áreas, como empoderamento político, educação e
saúde.
Cerca de 70% dos graduados são mulheres, ainda que a
proporção seja bem menor em áreas como engenharia. Na política, as mulheres
ocupam 405 dos assentos no Parlamento e 50% dos ministérios.
As conquistas do país nórdico nas área de educação e
política colocam-no no topo da lista, mas uma das autoras do relatório, Saadia
Zahidi, diz que é preciso investir mais na área da saúde.
Para Annadís Rudolfsdottir, ainda há muito por fazer.
"A diferença de salários entre homens e mulheres é de cerca de 10% e uma
pesquisa recente com três mil mulheres revelou que 24% delas dizem ter sido
vítimas de violência sexual ao menos uma vez desde os 16 anos.
Que lição podem tirar os governos da América Latina do
exemplo islandês?
"América Latina é a região em que mais países
conseguiram fechar as brechas que existem entre homens e mulheres nas áreas de
saúde e educação", disse Zahidi.
"Das mulheres em idade universitária, 29% conseguem
completar o ensino superior, em comparação com 22% dos homens".
A analista do Fórum Econômico mundial recorda que há muito
tempo os países nórdicos reconheceram que que não podem ser competitivos se não
aproveitarem todo o talento disponível na sociedade.
As mulheres da América Latina têm a oportunidade de mudar as
estruturas necessárias para poder combinar trabalho e criação dos filhos, assim
como nos países nórdicos.
Do contrário, os países latino-americanos correm o risco de
ficaram estancados em uma situação similar à do Japão, onde as mulheres vão à
universidade como os homens, mas não se veem em posição de liderança ",
indica.
Para Annadís Rudolfsdottir, além do exemplo da Islândia, é
preciso olhar para dentro.
"Eu começaria por perguntar às próprias mulheres de
cada país na América Latina que obstáculos concretos estão impedindo sua maior
participação no mercado de trabalho".
Disponível em
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2013/11/131108_islandia_mulher_fl.shtml.
Acesso em 05 dez 2013.