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sábado, 6 de setembro de 2014

Em busca do reconhecimento: a atuação dos grupos de interesse na produção legislativa voltada à população LGBT na Câmara dos Deputados do Brasil

Carlos Augusto da Silva Souza; Alan Michel Santiago Nina
IX Encontro ABCP 1964-2014
Brasília, 4 a 7 de agosto de 2014

Resumo: O artigo tem como objetivo avaliar a atuação dos grupos de interesse na produção legislativa relacionada às demandas LGBT’s na Câmara dos Deputados do Brasil, tendo como marco temporal a promulgação da Constituição de 1988 até o ano de 2012. Especificamente a proposta consiste em identificar as diversas propostas de projetos de lei voltados para as demandas de grupos LGBT’s propostas no período em questão, verificar o perfil ideológico dos deputados e dos partidos proponentes de tais projetos, o tramite destas propostas no âmbito das comissões e do processo legislativo e a atuação dos grupos de oposição constituídos no interior da Câmara que tem vetado a expansão das demandas dos grupos vinculados ao movimento LGBT’s. A metodologia utilizada consiste em mapear todos os projetos de lei que foram propostos no período, procurando identificar todo o percurso de tramitação destas propostas desde o início do processo decisório, o acompanhamento das decisões em sua passagem pelas comissões até a decisão final de aprovação, rejeição ou arquivamento das propostas.



quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Deputados querem barrar mudança de sexo pelo SUS

Revista Forum
02/02/2012

Se depender de membros do Legislativo, a iniciativa do Executivo sobre a cirurgia de mudança de sexo pelo Sistema Único de Saúde (SUS) não acontecerá. Miguel Martini (PHS-MG) protocolou na Mesa Diretora da Casa um projeto de decreto legislativo que interfere na identidade sexual de milhares de pessoas: a realização do chamado “processo transexualizador” – ou cirurgia de mudança de sexo – por meio do Sistema Único de Saúde (SUS).

O deputado quer suspender a Portaria 1.707, publicada em agosto deste ano pelo Ministério da Saúde, que prevê a inclusão desse tipo de cirurgia entre os procedimentos custeados pelo SUS. Caso seja aprovado pela Câmara e pelo Senado, o decreto pode frustrar a expectativa das 500 pessoas que, segundo o Coletivo Nacional de Transexuais, aguardam na fila da rede pública para trocar de sexo.

“Ora, se o SUS não tem condições de atender as mulheres durante o pré-natal, se não tem condições de fazer cirurgias, se não tem condições de atender pacientes oncológicos, como poderá fazer cirurgia para mudança de sexo, em detrimento daqueles que não têm condições de viver nem de sobreviver?”, questionou Martini, integrante da Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara.

Um dos principais representantes no Congresso do movimento Renovação Carismática, da Igreja Católica, Martini já articula o apoio da Frente Parlamentar Evangélica para derrubar a norma, o que deve deflagrar mais um embate entre religiosos e homossexuais no Parlamento, a exemplo do que já ocorre na discussão do projeto de lei que torna crime a discriminação por orientação sexual.

O presidente da Frente Parlamentar Evangélica da Câmara, João Campos (PSDB-GO), condena veementemente a possibilidade de mudança de sexo por meio de procedimento bancado pelos SUS. “Isso é um absurdo. O SUS não está tendo dinheiro para financiar políticas públicas curativas, ou de combate a epidemias, vai ter dinheiro para atender a questões pontuais, individuais, de alguns cidadãos brasileiros?”, protestou Campos, para quem a coletividade será desrespeitada se esse tipo de cirurgia for realizado pelo SUS.

“Quantas pessoas estão esperando na fila para fazer cirurgia de câncer de mama, por exemplo, e não conseguem? Isso é dissenso, uma falta de juízo, uma excrescência”, completou o deputado, acrescentando que as “conveniências” de determinados cidadãos não pode ser bancada pelo Estado sem que esteja caracterizada a necessidade. “Quem quiser [fazer a cirurgia de troca de sexo] que pague de seu próprio bolso. Além disso, homossexualidade não é doença.”

João Campos afirma que, se todas as reivindicações dos grupos homossexuais e congêneres fossem atendidas, o país viverá “uma ditadura dos homossexuais”. “Se todas as demandas dos gays do país têm de ser consideradas legais, tudo o que for contrário a elas será visto como irregularidade”, declarou o tucano.

Já o presidente do grupo Estruturação (grupo LGBT – Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros – de Brasília), Milton Santos, avalia que a objeção dos deputados revela mais uma preocupação religiosa e falta de conhecimento do que apreço pelo interesse público.

“Acho que alguns parlamentares se baseiam em fundamentos bíblicos, religiosos, para questionar direitos conquistados pelo grupo LGBT”, criticou Milton, dizendo que já enfrentou situações semelhantes envolvendo congressistas. “Em geral, o Congresso tem um olhar para a população não se baseando no que a Constituição rege. Alguns parlamentares não se preocupam em se informar a respeito de certos assuntos.”

Religião

Miguel Martini contesta que sua iniciativa seja baseada em questões religiosas. Segundo o deputado, motivos não faltam para barrar a realização de cirurgias de mudança de sexo pelo SUS.

“É um motivo lógico, de um claro bom senso, e diria que quase ético. Na medida em que o governo está buscando recursos para a saúde, com vários problemas no setor, uma coisa dessas é uma ofensa à população”, disse o líder do PHS, apelando à realidade social para reforçar sua argumentação. “Eu presido uma entidade oncológica. As pessoas com câncer não conseguem fazer as cirurgias previstas no SUS”, acrescentou.

Outra razão apontada por Martini é o custo da cirurgia de mudança de sexo (cerca de R$ 1,5 mil), além da suposta falta de premência do problema. “É uma coisa caríssima, um processo muito complexo. E quem é homossexual não tem risco de morte porque é homossexual”, alegou o deputado, dizendo ser até compreensível que países desenvolvidos, com eficiente estrutura de saúde pública, ofereçam o serviço aos cidadãos.

“Mas é inaceitável em um país com os problemas do Brasil. Isso [a operação] é um luxo, uma agressão à sociedade. Isso é um acinte contra o povo brasileiro, contra o cidadão que não tem dinheiro, não tem atendimento, está sofrendo dor, muitos estão morrendo nas filas do SUS”, arrematou o deputado, acrescentando que o procedimento contraria o artigo 129 do Código Penal Brasileiro – o Decreto Lei n.º 2.848, que define pena de detenção de três meses a um ano para quem “ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem”.

Além disso, argumenta Martini, o segundo parágrafo do artigo 129 também estabelece que a pena é de “reclusão de dois a oito anos” se a lesão corporal é resultado, entre outras hipóteses, de “perda ou inutilização de membro, sentido ou função”.

Segundo a assessoria do ministério da Saúde, o argumento de Miguel Martini é questionável. “Não há motivo para que o Estado não assista pessoas que sofrem física e emocionalmente, quando o assunto é a necessidade em saúde”, argumenta o ministério. Além disso, segundo a assessoria, o próprio Conselho Federal de Medicina reconhece que a cirurgia de mudança de sexo não é mais vista como procedimento experimental, e sim como prática clínica.


Disponível em http://revistaforum.com.br/blog/2012/02/deputados_querem_barrar_mudanca_de_sexo_pelo_sus-2/. Acesso em 25 ago 2013.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

A cura gay

Contardo Calligaris
05/07/2012

Em 1980, a homossexualidade sumiu do "Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais". Em 1990, ela foi retirada da lista de doenças da Organização Mundial da Saúde.

Médicos, psiquiatras e psicólogos não podem oferecer uma cura para uma condição que, em suas disciplinas, não é uma doença, nem um distúrbio, nem um transtorno. Isso foi lembrado por Humberto Verona, presidente do Conselho Federal de Psicologia, numa entrevista à Folha de 29 de junho.

No entanto, o deputado João Campos (PSDB-GO), da bancada evangélica, pede que, por decreto legislativo, os psicólogos sejam autorizados a "curar" os homossexuais que desejem se livrar de sua homossexualidade.

Um pressuposto desse pedido é a ideia de que os psicólogos saberiam como mudar a orientação sexual de alguém (transformá-lo de hétero em homossexual e vice-versa), mas seriam impedidos de exercer essa arte --por razões ideológicas, morais, politicamente corretas etc.

Ora, no estado atual de suas disciplinas, mesmo se eles quisessem, psicólogos e psiquiatras não saberiam modificar a orientação sexual de alguém --tampouco, aliás, eles saberiam modificar a "fantasia sexual" de alguém (ou seja, o cenário, consciente ou inconsciente, com o qual ele alimenta seu desejo).

Claro, ao longo de uma terapia, alguém pode conseguir conviver melhor com seu próprio desejo, mas sem mudar fundamentalmente sua orientação e sua fantasia.

Por via química ou cirúrgica (administração de hormônios ou castração real --todos os horrores já foram tentados), consegue-se diminuir o interesse de alguém na vida sexual em geral, mas não afastá-lo de sua orientação ou de sua fantasia, que permanecem as mesmas, embora impedidas de serem atuadas. A terapia pela palavra (psicodinâmica ou comportamental que seja) tampouco permite mudar radicalmente a orientação ou a fantasia de alguém.

O que acontece, perguntará João Campos, nos casos de homossexualidade com a qual o próprio indivíduo não concorda? Posso ser homossexual e não querer isso para mim: será que ninguém me ajudará?

Sim, é possível curar o sofrimento de quem discorda de sua própria sexualidade (é a dita egodistonia), mas o alívio é no sentido de permitir que o indivíduo aceite sua sexualidade e pare de se condenar e de tentar se reprimir além da conta.

Por exemplo, se eu não concordo com minha homossexualidade (porque ela faz a infelicidade de meus pais, porque sou discriminado por causa dela, porque sou evangélico ou católico), não posso mudar minha orientação para aliviar meu sofrimento, mas posso, isso sim, mudar o ambiente no qual eu vivo e as ideias, conscientes ou inconscientes, que me levam a não admitir minha orientação sexual.

Campos preferiria outro caminho: o terapeuta deveria fortalecer as ideias que, de dentro do paciente, opõem-se à homossexualidade dele. Mas o desejo sexual humano é teimoso: uma psicoterapia que vise reforçar os argumentos (internos ou externos) pelos quais o indivíduo se opõe à sua própria fantasia ou orientação não consegue mudança alguma, mas apenas acirra a contradição da qual o indivíduo sofre. Conclusão, o paciente acaba vivendo na culpa de estar se traindo sempre --traindo quer seja seu desejo, quer seja os princípios em nome dos quais ele queria e não consegue reprimir seu desejo.

Isso vale também e especialmente em casos extremos, em que é absolutamente necessário que o indivíduo controle seu desejo. Se eu fosse terapeuta no Irã, para ajudar meus pacientes homossexuais a evitar a forca, eu não os encorajaria a reprimir seu desejo (que sempre explodiria na hora e do jeito mais perigosos), mas tentaria levá-los, ao contrário, a aceitar seu desejo, primeiro passo para eles conseguirem vivê-lo às escondidas.

O mesmo vale para os indivíduos que são animados por fantasias que a nossa lei reprova e pune. Prometer-lhes uma mudança de fantasia só significa expô-los (e expor a comunidade) a suas recidivas incontroláveis. Levá-los a reconhecer a fantasia da qual eles não têm como se desfazer é o jeito para que eles consigam, eventualmente, controlar seus atos.

Agora, não entendo por que João Campos precisa recorrer à psicologia ou à psiquiatria para prometer sua "cura" da homossexualidade. Ele poderia criar e nomear seus especialistas; que tal "psicopompos"? Ou, então, não é melhor mesmo "exorcistas"?


Disponível em <http://www1.folha.uol.com.br/colunas/contardocalligaris/1115030-a-cura-gay.shtml>. Acesso em 09 jul 2012.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Preconceito é velado

Jornal de Brasília
Da Redação
05/04/10, às 11h10m (GMT -03;00)

A reportagem do Jornal de Brasília foi à Câmara dos Deputados saber como é a rotina de trabalho da travesti Maria Eduarda Borges, assessora parlamentar na Casa, e ouvir dos servidores públicos o que pensam sobre o preconceito e sobre ela ter assumido a sua condição sexual no trabalho depois de anos se apresentando com vestimenta masculina. Em dois anos, Maria Eduarda já fez mais de dez cirurgias para transformar o corpo e obter características femininas e na última semana, disse que vai deixar o trabalho e o País por conta do preconceito que sofre.

O deputado para quem trabalha, Celso Russomanno, acredita que a opção de sexualidade é uma questão técnica e científica, e que ele mesmo relatou um projeto, que está tramitando na Câmara dos Deputados, no qual propôs a autorização para as pessoas terem na carteira a definição do sexo referente à disposição cerebral. Sobre Maria Eduarda, Russomanno esclarece que o importante em um funcionário é a qualificação para o trabalho. "É um profissional competente, extremamente inteligente e capaz. Para mim é o que vale", garante. 

Apesar de se apresentar com um novo nome, Maria Eduarda ainda está com processo na Justiça que permitirá a troca de identidade, e ela afirma: "O mais constrangedor é o nome". Um servidor da Câmara dos Deputados, de 51 anos, que não quis se identificar, explica que quando Maria Eduarda apareceu transformada logo reconheceu nela o rosto de João Paulo.

"O rosto é praticamente a mesma coisa, apesar de o corpo ter se modificado", comenta. Sobre preconceito em relação a assessora diz não ter, entretanto, ouviu por parte de diversos colegas comentários de mau gosto. "Brasileiro é preconceituoso. Eu nunca vi ninguém dizer nada para ela, agora eu já escutei algumas pessoas falarem coisas maldosas sobre ela", garante.

O colega de gabinete de Maria Eduarda e também assessor parlamentar, Dourival Ferreira, afirma que o relacionamento no trabalho não mudou em nada desde a transformação. "Encaro com normalidade. A gente já esperava esta mudança, não foi surpresa. Para nós não alterou em nada", declara.

Jaqueline Gomes, doutora em Psicologia Social do Trabalho, explica que um dos maiores problemas enfrentado pelos travestis é a mudança de identidade. "A maior bandeira das pessoas travestis e das pessoas transexuais é pela adequação de seu registro civil (nome e sexo) à sua realidade".

Segundo a doutora Jaqueline Gomes, transexuais são diferentes de gays e lésbicas, pois teriam dificuldades com a identidade, ao contrário dos gays, que apenas se sentem atraídos por pessoas do mesmo sexo. O travesti se expressa pela maneira como fala e se veste. E, como o transexual, se adapta a maneiras femininas de se portar socialmente.


Disponível em <http://www.gestospe.org.br/web/noticias/conteudo1/?conteudo=229987820&autenticacao=0,8704689>. Acesso em 27 ago 2010.