Fábio Lima
21/01/2014
A identidade, o passaporte e a carteira de motorista da
transexual Aeris Houlihan, de 32 anos, atestam que ela é uma mulher. Os níveis
hormonais também são comprovadamente idênticos aos de uma pessoa do sexo
feminino. Entretanto, mesmo diante de tantas provas, para a Federação Inglesa
(FA) ela só pode praticar futebol em ligas oficiais ao lado de homens. A
jogadora vem lutando por uma liberação para defender a equipe feminina
Middleton Park Ladies, mas está esbarrando em uma legislação que os próprios
dirigentes já reconheceram estar ultrapassada.
Aeris faz terapia de reposição hormonal há nove meses e
entrou em contato com a FA em junho do ano passado portando os atestados
médicos pedindo a permissão para defender o time amador da cidade de Leeds, no
norte do país. A federação ignorou por longos meses o caso e as constantes
buscas de Houlihan por uma resposta. Quando a instituição finalmente se
manifestou, a decisão não foi nada animadora.
- A FA diz que, para uma garota transexual jogar futebol na
liga feminina deles, ela tem que fazer a cirurgia de redesignação sexual e
esperar dois anos após a operação - disse, em entrevista por e-mail ao
GloboEsporte.com.
A jogadora pretende fazer a cirurgia em março deste ano e,
de acordo com as normas vigentes, só poderá jogar em meados de 2016. Para
tentar mudar o panorama e chamar a atenção da Federação Inglesa, ela resolveu
tornar o caso público, e o drama acabou ficando conhecido internacionalmente.
Aeris convive com a esperança de que as regras mudem e, enquanto isso, segue
realizando atividades não oficiais com o Middleton Park.
- Eu ainda treino com minha equipe, e meu técnico pergunta
aos outros times se eles permitem que eu jogue partidas amistosas contra eles,
e todos dizem que posso jogar. Ouvi que a FA está para anunciar um novo
processo de mudança nos próximos dois meses, o que é algo positivo da parte
deles.
O gosto pelo futebol não é uma novidade na vida de Houlihan,
que praticava o esporte com homens normalmente até que os efeitos das mudanças
hormonais começaram a atrapalhar seu desempenho. Ela percebeu que era hora de,
literalmente, mudar de lado.
- Antes do tratamento hormonal para virar mulher eu joguei
contra homens. Era normal, já que eu era tão forte quanto um homem na época,
pois eu tinha testosterona. Contudo, após quatro meses de tratamento, minha
força diminuiu e me machucava jogando contra homens. Decidi que era hora de
entrar em um time de futebol feminino.
A decisão de se tornar uma mulher foi um processo longo e
difícil, mesmo Aeris sabendo desde cedo qual caminho gostaria de seguir. Apenas
aos 30 anos de idade ela resolveu procurar um especialista.
- Quando eu era muito jovem sabia que queria ser uma menina
e lutei muito para suprimir meus sentimentos. Há dois anos decidi que já era o
bastante, visitei meu médico e disse a ele que gostaria de me tornar uma
mulher. Após vários exames, eles me diagnosticaram com disfonia de gênero
(transexualidade). Tenho feito tratamento hormonal e bloqueio de testosterona
há nove meses e estou muito feliz com meu progresso.
Aeris também trabalha com música e relatou a experiência da
terapia hormonal em uma canção intitulada "Sleepless Nights" (Noites
sem dormir). A saga para tentar jogar futebol feminino também deverá ganhar uma
versão musical.
- Acho que será minha próxima música. Algumas pessoas usam
um diário para capturar seus sentimentos em um momento específico de suas
vidas. Quando ouço uma música que escrevi, me lembro em cores o que senti
naquele momento. Também me ajuda a tirar as coisas de meu peito. Quando escrevo
uma canção, é como se estivesse conversando com um conselheiro.
Disponível em
http://globoesporte.globo.com/futebol/futebol-internacional/futebol-ingles/noticia/2014/01/proibida-de-jogar-em-equipe-feminina-transexual-luta-para-mudar-regras.html.
Acesso em 21 jan 2014.