Aline Pinheiro
20 de fevereiro de 2014
Se quiser ouvir o que a população pensa sobre a adoção por
casais homossexuais, Portugal terá de fazer não um, mas dois referendos. Para o
Tribunal Constitucional, o assunto envolve situações diferentes que, se
abordadas no mesmo questionário, podem causar confusão nos eleitores. Por esse
motivo, a corte derrubou a proposta de referendo já aprovada pelo Parlamento.
A decisão da corte foi tomada num controle prévio de
constitucionalidade da resolução sobre o referendo. A manifestação do Tribunal
Constitucional foi pedida pelo presidente da República portuguesa, Aníbal
Cavaco Silva, antes que ele pudesse colocar em prática a consulta popular.
Agora, cabe ao Legislativo desistir da proposta ou reformular as questões e dar
andamento ao referendo.
O Tribunal Constitucional encontrou dois pontos controversos
na consulta popular. Um deles se refere diretamente às questões feitas aos
cidadãos. De acordo com a proposta, os eleitores teriam de responder às
seguintes perguntas: “Concorda que o cônjuge ou unido de fato do mesmo sexo
possa adotar o filho do seu cônjuge ou unido de fato?" e "Concorda
com a adoção por casais, casados ou unidos de fato, do mesmo sexo?”.
Para os juízes, as duas questões tratam de situações
bastante diversas e, se apresentadas no mesmo pacote, podem confundir o
eleitor. A primeira pergunta se refere ao que é chamado de coadoção, que é
quando um companheiro ou cônjuge adota o filho de outro. Projeto de lei nesse
sentido foi aprovado no ano passado pela Assembleia Parlamentar de Portugal,
mas ainda não saiu do papel por falta de acordo político.
No julgamento, o tribunal considerou que, nos casos de
coadoção, está em jogo não apenas o direito de gays adotarem uma criança, mas a
substituição de uma situação familiar anterior por uma nova. Já no segundo
caso, a discussão parece mais simples. É basicamente se duas pessoas do mesmo
sexo que vivem juntas têm o direito de adotar um filho.
A adoção por casais homossexuais tem ocupado as mesas de
debate em Portugal há vários anos, mas a discussão ganhou corpo em 2010, quando
foi aprovado o casamento civil entre duas pessoas do mesmo sexo. Na ocasião,
não houve acordo sobre a adoção e a lei que permite o casamento gay passou a
prever expressamente que a autorização para a união não significa que os
homossexuais podem adotar uma criança. Desde então, grupos políticos vêm tentando
aprovar novos projetos que legalizem a adoção por casais gays.
A Corte Europeia de Direitos Humanos não tem uma posição
clara sobre o direito de os homossexuais adotarem uma criança, mas já julgou,
em mais de uma ocasião, que pessoas na mesma situação têm de ter os mesmo
direitos. Quer dizer, na teoria, se cônjuges heterossexuais podem adotar um
filho, dois homens ou duas mulheres, desde que sejam casados, podem também. A
legislação de Portugal ainda não foi discutida pela corte europeia.
A decisão do Tribunal Constitucional de Portugal:
http://s.conjur.com.br/dl/portugal-referendo-adocao-gays.pdf
Disponível em http://www.conjur.com.br/2014-fev-20/tribunal-constitucional-portugal-barra-referendo-adocao-gays.
Acesso em 26 fev 2014.