Luna D'Alama
09/06/2013
A dificuldade de pais e professores em falar sobre sexo
começa muitas vezes na própria vida e acaba se estendendo aos filhos e alunos.
As dúvidas, de ambos os lados, surgem logo na primeira infância das crianças,
que querem saber de tudo. E os adultos se questionam: "Preciso falar
alguma coisa? Devo tomar iniciativa para introduzir um assunto? Como responder
a uma pergunta, o que dizer e até onde ir?"
O problema não para por aí, e só aumenta, com a chegada da
adolescência e da iniciação sexual, entre os 15 e 17 anos, em média.
Para esclarecer assuntos ainda considerados tabus e ajudar
os mais velhos a falar sobre sexo e sexualidade com crianças e adolescentes, a
sexóloga Laura Muller, que participa do programa Altas Horas, na Globo,
escreveu seu quarto livro, "Educação sexual em 8 lições", que será
lançado no dia 18 em São Paulo.
"Me baseei em ações e palestras que fiz para pais e
professores. Eles reclamavam de que não havia uma bibliografia clara e simples,
e não conseguiam lidar com o tema. A maior dificuldade é falar: as pessoas têm
medo de que uma conversa estimule o sexo, ou receio de dizer algo errado. Mas
ninguém tem todas as respostas", destaca a especialista, que reconhece que
também não sabe tudo.
Segundo Laura, o mais importante é apresentar limites e
possibilidades aos mais jovens. Quando uma criança de até 5 anos, por exemplo,
pergunta de onde veio, como entrou na barriga da mãe ou se os pais namoram
pelados, o casal deve explicar o que se passa, usando a linguagem infantil e
deixando claro que essas coisas pertencem ao mundo dos adultos e farão parte da
vida dos filhos no futuro.
"O mais importante é não ter medo de lidar com o tema,
não é fácil mesmo. Nós, adultos, não tivemos educação sexual na adolescência,
por isso é preciso buscar informações de qualidade onde for possível,
atualizar-se e não ter vergonha de ultrapassar essa barreira", diz a
autora.
Dúvidas ao longo do tempo
A sexóloga explica que, na primeira infância, as perguntas
sobre sexo costumam ser "O que é?", "Como é feito?" e
outras curiosidades simples, ainda bastante distantes da prática.
Até os 5 anos, os pais se preocupam mais se as crianças
estão tocando as partes íntimas, e se fazem isso na frente dos outros, afirma
Laura. O importante, nesse caso, é explicar para o menor que isso não pode ser
feito o tempo todo, que ele está na fase de brincar e se divertir, acrescenta a
especialista.
"A partir do momento em que a criança se aproxima da
adolescência, surgem questões mais elaboradas, sobre as mudanças do corpo,
sobre como se faz sexo, como usar camisinha, como evitar a gravidez e doenças
sexualmente transmissíveis (DST), além de dúvidas sobre masturbação, desejo,
excitação, sexo oral ou anal, e orgasmo", enumera Laura.
Com esse "empurrão" hormonal, vem também a
primeira menstruação e a primeira ejaculação espontânea. Em média, isso ocorre
aos 12 anos, mas entre 9 e 16 ainda é considerado um período normal.
De acordo com a sexóloga, os adolescentes em geral vivem
quatro grandes dilemas nessa difícil fase de transição: sexual (fazer ou não, e
como), profissional (qual carreira seguir), existencial (quem eu sou, do que
gosto e qual é o meu grupo) e tóxico (como lidar com álcool, cigarro e drogas).
“A maior dificuldade é falar: as pessoas têm medo de que uma
conversa estimule o sexo, ou receio de dizer algo errado. Mas ninguém tem todas
as respostas"
Laura Muller,
sexóloga
"A casa deve ser um complemento da escola, um porto
seguro, e os pais precisam estar abertos ao diálogo, apoiar uma educação sexual
de qualidade, conversar sobre prática, prazer, afeto e diversidade",
aponta Laura.
Os limites, segundo a sexóloga, vão até o ponto em que algo
não fere a pessoa e seu parceiro tanto física quanto emocionalmente. Além
disso, não se deve fazer nada só para agradar ao outro, nem se sentir
pressionado pelo companheiro ou por colegas.
"O jovem vai estar pronto para o sexo quando estiver
bem informado e amadurecido. É preciso se perguntar: 'Estou pronto? Quero
mesmo?'", ressalta.
E não deve haver nenhuma distinção de ensinamentos para
meninos e meninas, segundo Laura.
"Às vezes, as pessoas acham que é preciso criar diferente,
mas a educação deve ocorrer da mesma forma. O que difere são as fases de cada
um, cada gênero vai ter um grau de amadurecimento conforme a experiência de
vida e outros fatores, mas as dúvidas são muito parecidas", diz.
Oito lições
O livro é dividido em oito capítulos, cada um com uma lição
diferente. O primeiro aborda os conceitos de sexo, sexualidade e outras
definições básicas.
"Sexo é diferente de sexualidade. Sexo é o ato em si,
já sexualidade é o jeito de cada um ser no mundo, homem ou mulher, de se
relacionar com as emoções, os sentimentos e o mundo ao redor. O sexo é apenas
um aspecto da sexualidade – que existe desde a infância", compara a
autora.
Laura explica, ainda, que há um terceiro conceito, o de
gênero, que é a identidade sexual de cada pessoa, um conjunto de jeitos de ser
que pode depender ou não do sexo com o qual se nasce.
"Precisamos de uma flexibilização desses significados,
dos papéis, e refletir o que realmente é da mulher e do homem, com tolerância e
múltiplas possibilidades", acredita.
“A casa deve ser um complemento da escola, um porto seguro,
e os pais precisam estar abertos ao diálogo, apoiar uma educação sexual de
qualidade (...)"
Laura Muller,
sexóloga
O segundo capítulo do livro, por sua vez, é destinado à
história da sexualidade humana, pois o que vivemos, destaca Laura, é fruto de
uma série de questões culturais, de repressão sexual (principalmente feminina),
do surgimento da Aids e da emancipação da mulher. Com essa retrospectiva, é
possível entender como o ser humano chegou até aqui e por que o sexo ainda é um
tabu.
Em seguida, vem um capítulo sobre o papel dos pais e
professores na educação sexual de crianças e adolescentes. Nos quatro capítulos
seguintes, do quarto ao sétimo, Laura divide as recomendações por faixa etária:
de 0 a 5 anos, de 6 a 11, de 12 a 14, e de 15 a 17.
O livro termina com uma seção que tem como objetivo fazer
com que os adultos reflitam sobre a própria educação e vida sexuais.
"É preciso olhar para si antes de educar os outros, ver
quais são seus valores e crenças. Os adultos de hoje, por exemplo, não usavam
redes sociais quando eram adolescentes, então precisam entender um pouco mais
sobre o uso da internet nos relacionamentos, com quem os filhos falam, o que
publicam", afirma Laura.
Por outro lado, segundo a sexóloga, os jovens têm que
compreender que o sexo pertence ao mundo privado, e não ao público, razão pela
qual deve haver limites.
"Muitas vezes, não nos damos conta do quanto expomos
coisas que precisam ficar na intimidade", enfatiza.
Laura, que já publicou dois livros com respostas para 500
perguntas cada (o primeiro para homens e mulheres e o segundo para jovens,
educadores e pais) e um terceiro sobre as dúvidas que recebeu no Altas Horas (para pessoas de 12 a 80 anos),
planeja daqui para frente algo mais reflexivo na área da sexualidade, destinado
ao mundo adulto.
Disponível em
http://g1.globo.com/bemestar/noticia/2013/06/livro-mostra-como-falar-de-sexo-em-cada-idade-na-faixa-de-0-17-anos.html.
Acesso em 10 jun 2013.