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terça-feira, 15 de abril de 2014

Assexuais vivem bem sem sexo, mas podem ter um relacionamento

Yannik D´Elboux
14/04/2014

Para uma pequena parcela da população, o sexo é uma prática completamente sem sentido. As pessoas chamadas assexuais, apesar de não terem nenhuma anormalidade, não sentem interesse em fazer sexo.

Como o conceito de assexualidade ainda é recente, muitos nunca ouviram falar desse termo e com frequência julgam a indiferença ao sexo como problema. "Sou normal, não tenho traumas nem doenças que me impeçam de fazer sexo, simplesmente não sinto vontade", explica Claudia Mayumi Kawabata, 33 anos, que trabalha como orçamentista em uma gráfica em São Paulo (SP).

Assim como outras pessoas na mesma situação, Claudia percebia que não era igual a maioria, porém não sabia a razão. "Sempre me achei diferente, pois, além de não sentir atração sexual, também não sinto atração estética", conta.

Ela só foi descobrir o que significava assexualidade em 2011, o que lhe deu liberdade para se aceitar. Desde 2013, Claudia é uma das moderadoras da comunidade A2 na internet, grupo que reúne mais de 700 usuários e busca divulgar a existência da assexualidade, além de promover a troca de experiências sobre o assunto.

Ainda não se tem ideia da quantidade existente de pessoas assexuais. "Por ser uma sexualidade praticamente desconhecida, não temos números confiáveis, nem no Brasil nem no mundo", afirma a pedagoga e pesquisadora Elisabete Regina Baptista de Oliveira, que está desenvolvendo uma tese de doutorado sobre assexualidade pela Faculdade de Educação da USP (Universidade de São Paulo). "A única pista que temos é de que 1% da população não tem interesse por sexo", acrescenta.

Segundo Elisabete, esse número provém de dois estudos realizados nas décadas de 1940/1950 e 1990 nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha, porém não representa um bom retrato da realidade, já que muitas pessoas que poderiam se identificar como assexuais não conhecem esse conceito.

Sem desejo

A ginecologista e sexóloga Sylvia Maria Oliveira Cunha Cavalcanti, presidente da comissão de Sexologia da Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia), afirma que a assexualidade costuma ser bastante rara. "Não é uma coisa muito comum porque o ser humano é o mais sensualizado de todos os animais. O sexo para nós não se restringe à reprodução, é uma forma de comunicação, de expressar os sentimentos".

Para a médica, o desinteresse sexual pode surgir por diversos motivos, desde aspectos biológicos, como alterações hormonais, até psicossociais, como uma educação repressora, decepção com o parceiro, experiências negativas, entre outros. Porém, para alguns não há uma causa. "Existem pessoas que realmente não se interessam, o sexo é algo absolutamente sem nenhum valor para elas", diz Sylvia.

A ausência de desejo pode significar um problema, sobretudo naqueles que antes possuíam ímpeto sexual. Nos assexuais, segundo Elisabete Oliveira, o desinteresse é uma característica permanente ao longo da vida desde a puberdade. "Trata-se de perspectiva: a falta de desejo pode ser vista como um transtorno ou como mais uma cor no arco-íris da diversidade sexual", analisa a pesquisadora.

Para a ginecologista e sexóloga, o desinteresse nos assexuais não precisa de tratamento se não estiver causando nenhum incômodo ou estresse. "Se não é um problema para a pessoa, se ela estiver satisfeita assim, não há o que fazer, não tem o que ser tratado. Não ter vontade também é um direito da pessoa", diz Sylvia Maria.

Românticos e arromânticos

Apesar de não sentirem atração sexual, os assexuais podem ou não ter interesse no relacionamento amoroso. Aqueles que desejam parceria amorosa costumam ser chamados de românticos e os que não se interessam por esse envolvimento de arromânticos.

"Não foi a falta de interesse por sexo a minha principal fonte de questionamentos na adolescência, mas, sim, a minha falta de interesse amoroso", conta Saulo Albert, 20 anos, estudante de Direito, de Vitória da Conquista (BA), que se identifica como assexual arromântico.

Saulo, também um dos moderadores da comunidade A2, diz que nunca teve vontade de namorar ou se relacionar sexualmente. Esse comportamento geralmente não é bem visto em um mundo no qual o amor e o sexo estão por toda parte, das músicas às novelas. "Passamos a aceitar que a vida com um parceiro amoroso é a grande fórmula da felicidade", critica Saulo.

O estudante baiano acredita que, assim como as pessoas, os caminhos para a felicidade também são diferentes. "Eu me sinto amado e acolhido pelas pessoas ao meu redor, por isso o amor [romântico] não é um sentimento que me faz falta. Isso, para mim, é mais do que suficiente", declara.

Mesmo sem vontade, alguns assexuais acabam tendo relações sexuais quando namoram para poder satisfazer o parceiro. Foi o caso de Claudia Mayumi, assexual romântica, que já morou com um namorado por dois anos e tem uma filha de 13 anos. "Antes de saber que era 'assex', tentei ter uma vida sexual ativa, mas isso me deixava mal. Depois de cada relação sexual entrava em conflito comigo mesma, pois tinha de fingir para agradar a outra pessoa", revela.

Para Claudia, a vida flui melhor quando ela está só. "Sou feliz sem sexo. Quando estou sozinha, me sinto completa; quando estou em algum relacionamento, eu me sinto frustrada e vazia", constata.

Não sonhar com o casamento não significa viver de forma isolada ou preferir a solidão. "Os assexuais dão muita importância aos seus relacionamentos em família e com os amigos, diferentemente de pessoas não assexuais que priorizam seus relacionamentos amorosos acima de todas as coisas", diz a pesquisadora Elisabete Oliveira.


Disponível em http://mulher.uol.com.br/comportamento/noticias/redacao/2014/04/14/assexuais-vivem-bem-sem-sexo-mas-podem-ter-um-relacionamento.htm. Acesso em 14 abr 2014.

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Vida sem sexo

Adriana Giachini 
14/11/2012
          
O sexo faz parte da vida humana. Já na bíblia (que acredita-se ter sido escrita entre 1445 e 450 a.C) consta que, um dia, homem e mulher tornarão-se uma só carne. Outrora um tabu, o assunto hoje é tratado a exaustão e, às vezes, chega a ser banalizado.

Está na televisão, no cinema, na literatura e, claro, na vida real. Fala-se em iniciação sexual, em orgasmo, traição, doenças sexualmente transmissíveis, remédios estimuladores, taras e kamasutra ... o silêncio só impera quando o assunto é quem não gosta de sexo e nem pretende praticar.

Para muitos, não gostar é impossível. Para o Manual Estatístico e Diagnóstico de Distúrbios Mentais (DSM), da Associação Americana de Psiquiatria, a ausência do desejo sexual é distúrbio (existem vários). No entanto, os assexuais estão aí para comprovar que a vida sem sexo é uma realidade (e não uma doença) na qual o “problema” não está na cama – nem naquilo que não se faz entre quatro paredes. O maior obstáculo é o preconceito.

“Viver sem sexo numa sociedade que considera que o desejo sexual é universal e que a atividade sexual é indispensável para a saúde e felicidade não é nada fácil”, diz a pedagoga e socióloga Elisabete Regina Baptista de Oliveira.

Mestre em sociologia da educação, e doutoranda do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), ela estuda há um ano a assexualidade para sua tese de doutorado. “Busco conhecer as trajetórias de pessoas assexuais no processo de auto-identificação”, explica.

A pesquisa de Elisabete está sendo feita na Faculdade de Educação da USP e a tese será defendida em 2014. “Meu interesse surgiu a partir da constatação de que, apesar de haver comunidades de assexuais no Brasil, não havia pesquisas acadêmicas sobre o tema no País. 

Nos Estados Unidos, e em outros países, os assexuais estão se organizando em movimentos para ter visibilidade nos meios de comunicação. No Brasil, as interações entre os assexuais restringem-se às poucas comunidades existentes no Orkut e na Comunidade Assexual A2 (www.assexualidade.com.br) ”, justifica.

Uma pesquisa recente feita no Reino Unido, com mais de 18 mil pessoas, e analisada por cientistas da Universidade de Brock, no Canadá, estima que 1% da população seja assexual. Um número que, em termos mundiais, representa 70 milhões de pessoas. Gente que apesar de perfeitamente capaz defende o direito de não transar. E é feliz assim.

Quarto sexo

A informação primordial sob o tema é entender a luta dos assexuais. São homens e mulheres, de idades variadas, que levantam a bandeira da abstinência – sem que ela seja uma imposição como ocorre, por exemplo, com os celibatários. Para eles, a assexualidade é uma quarta orientação sexual – assim como ser heterossexual, homossexual ou bissexual.

“Eu vejo que a assexualidade é uma interpretação da falta de desejo, antes sempre considerada um distúrbio. Na verdade, ainda não existe uma definição totalmente acabada da assexualidade. Mas em linhas gerais, ser assexual significa não ter nenhum – ou pouquíssimo – interesse pela atividade sexual. E esse comportamento, não traz infelicidade, angústia ou desconforto”, explica Elisabete.

Pelo direito de não transar, os assexuais começam a ser organizar, especialmente em comunidades na internet.

O site mais conhecido é o da Aven (Asezual Visibility and Education Network) – que tem realizado passeatas mundo a fora sob o slogan “It´s o.k. To be A” (algo como “tudo bem ser assexual”). 

No Brasil, o grupo de assexuados ganha força em páginas como www.assexualidade.com.br (primeiro do País a discutir o tema) e o www.redeassexual.com (lançado no começo de setembro).

São espaços para discussão e também desabafos. Ali, muitos assexuais lamentam não serem compreendidos sequer pelos familiares. E compartilham histórias de vida tendo como elo comum o desejo de serem aceitos como são. A maioria, entretanto, confessa manter a opção sexual em segredo, com medo de represálias, seja no ambiente familiar, entre amigos ou mesmo no trabalho. “Os assexuais não se identificam com a forma com que a sexualidade está colocada na sociedade. E esse processo pode até levar a pessoa ao isolamento”, diz Elisabete.

A pesquisadora tem a aprovação de quem vive a assexualidade diariamente. “A falta de informação é que gera o preconceito. Acredito que se as escolas falassem sobre a diversidade sexual, ajudaria bastante. Mas, e infelizmente, no momento nem psicólogos e médicos tem conhecimento da assexualidade”, acredita a web designer Shanna Capell, criadora do site www.redeassexual.com, que está no ar desde 1º de setembro.

Segundo ela, que é assexual, a página na internet tem como objetivo “informar, debater e dar mais visibilidade ao tema”. Aos 28 anos, Shanna confidencia que, apesar do desejo de aceitação e da esperança em encontrar um parceiro, mantém sua assexualidade escondida da família e da maioria dos amigos. “Acho que cada um deve avaliar bem se vai contar e quando.

Nos EUA há um projeto (asexualawarenessweek.com) para, entre outras coisas, incentivar os assexuais a falarem, aumentando a visibilidade do tema. Eu vejo que o ser humano é complexo e diverso. E é importante dizer que o assexual sofre pela discriminação e não pela falta de sexo.”

Aliás, é bom explicar que a ausência do desejo sexual não significa que os assexuais não queiram relacionamentos amorosos – nem que não tenham prazer, por exemplo, como a masturbação.

Nas comunidades dedicadas ao tema, a explicação é que eles podem ser divididos entre os gostariam de manter relacionamentos, desde que não envolvam atividade sexual (são os chamados de românticos); os que aceitam transar para satisfazer seus parceiros e os que não têm interesse algum no tema. Para alguns, especialmente deste último grupo, até mesmo o beijo causa repulsa.

Nadando contra a maré

Não seria exagero afirmar que, para a sociedade moderna, o sexo é quase uma exigência – e especialmente no mundo ocidental. Como exemplo dessa “sexomania”, pode-se destacar que o maior best seller da literatura atual – a trilogia “50 tons de Cinza” – nada mais é do que um romance erotizado. Os livros, da escritora britânica Erica Leonard James, já venderam mais de 40 milhões de cópia no mundo e virarão filme.

Até a indústria farmacêutica – que recentemente lançou a versão do viagra para mulheres – se dedica ao tema com especial “carinho”, de olho em seu potencial lucrativo. Não à toa. Para muita gente, o sexo é tão importante como comer e dormir. E dá-lhe argumentos para comprovar a afirmação que faz bem para o corpo. Dirão: faz bem saúde e para ego.

Sem contar que é fundamental para a perpetuação da espécie. “O desejo sexual foi construído historicamente (sobretudo pelas ciências médicas) como universal, ou seja, todas as pessoas, independentemente da época, da cultura, do meio social devem sentir desejo sexual, de preferência desejo heterossexual. 

Mas já sabemos que a sexualidade não está somente no corpo biológico. Ela se constrói nas relações sociais, que são permeadas por determinadas culturas. Hoje os assexuais contestam este postulado histórico. Essas pessoas têm nos mostrado, nos últimos 10 anos, que existe muita coisa que ainda não sabemos sobre a sexualidade humana.”

Para a pesquisadora, os assexuais são a prova viva de que a necessidade sexual não pode ser equiparada a outras necessidades biológicas, como alimento ou água. “Isso é o que a mídia propaga; isso é o que as ciências biológicas propagam, isso é o que a indústria do consumo propaga. A sexualidade não está somente no corpo biológico, como eu já disse. Se a pessoa acredita que o sexo é fundamental, ela vai construir sua vida em torno dessa crença, e pode se sentir infeliz quando estiver impossibilitada de fazer sexo, ou de ter um relacionamento amoroso. Se a pessoa acredita que para ela o sexo não é importante – ou totalmente dispensável – ela vai viver sua vida bem e ajustada em torno dessa crença, ou sentir-se infeliz se for obrigada a fazer sexo.”

Os desafios dos assexuais

_ Viver numa sociedade que considera que o desejo sexual é universal e que a atividade sexual é indispensável para a saúde e felicidade.
_ Viver numa sociedade que apregoe que não fazer sexo – ou não desejar o sexo – não é normal
_ Viver numa sociedade que ensina que não é possível ter relacionamentos amorosos prazerosos que não envolvam a atividade sexual.
_ Viver numa sociedade que apregoe que o sexo é necessariamente consequência do amor.
_ Viver numa sociedade que considera que não é possível ser feliz sozinho.
_ Viver numa sociedade que priorize a atividade sexual, quando existem tantos outros aspectos importantes na vida.
_ Viver numa sociedade que não acredite na diversidade humana
_ Viver numa sociedade que não respeita o direito individual de tomar decisões em relação ao uso de seu corpo.

Assexual ou assexuado

Nas comunidades virtuais brasileiras, as duas denominações são encontradas, porém, defende-se que o termo mais correto é assexual uma vez a perspectiva trabalhada é a de orientação sexual. A palavra assexual segue a mesma formação de outras palavras que nomeiam outras orientações sexuais, como heterossexual, homossexual e bissexual.

Pesquisa

A socióloga Elisabete Regina Baptista de Oliveira mantém um blog na internet sobre a assexualidade e no qual divulga pesquisas recentes que estejam relacionadas ao tema. Entre os tópicos, está um artigo produzido na área de biologia e escrito pelos cientistas Wendy Portillo e Raul Paredes, do Instituto de Neurobiologia da Universidade Autônoma do México.

Nele, os autores relatam que em diversas espécies de mamíferos, a ciência observa a existência de machos aparentemente normais, mas que não seguem o padrão de conduta sexual da maioria – mesmo quando estimulados por fêmeas sexualmente receptivas. Esses animais, conhecidos como não copuladores (NC), de acordo com os autores do artigo, poderiam ser equivalentes aos assexuais humanos – ainda que o ser humano seja portador de uma estrutura psicológica diferente.

As espécies de animais nos quais foram identificados machos não copuladores são as ovelhas e algumas espécies de roedores, como ratos, cobaias, camundongos e hamsters. Os machos não copuladores correspondem entre 1% e 5% - porcentagem próxima à estimativa de alguns cientistas para humanos que não têm interesse pela atividade sexual.

Segundo os estudiosos, estas deficiências podem ser causadas por alterações no sistema nervoso central. O conjunto de pesquisas estudadas sugere que a falta de interesse por sexo no mundo animal tem um componente biológico importante que pode modificar o sistema nervoso central e, consequentemente, sua função. Ainda segundo os pesquisadores não existem estudos sobre interesse sexual em fêmeas mamíferas.

Disponível em http://metropole.rac.com.br/_conteudo/2012/11/capa/10568-vida-sem-sexo.html. Acesso em 29 nov 2012.