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sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Os novos lucros do sexo

João Varella
edição 824 - 26.JUL.13

O esquadrão antibombas foi chamado com urgência ao estacionamento do Walmart da cidade de Aurora, no Estado americano do Colorado, em maio deste ano. Um homem com cerca de 30 anos, portando uma mochila, deixou gotejar um líquido suspeito e foi abordado por policiais. A área foi isolada, o supermercado fechado e a tensão tomou conta da região. Quando técnicos especializados finalmente abriram a mochila, se depararam com vibradores e géis lubrificantes, entre outros acessórios sexuais comprados no próprio Walmart. O alarme falso se explica pelo fato de o gigante do varejo americano, que faturou US$ 443 bilhões no ano passado, apostar no aumento das vendas nesse segmento.

Os testes começaram em 2008, em uma loja da zona rural do Estado de Iowa. Desde então, gradativamente, os produtos vêm sendo espalhados pelas mais de quatro mil lojas da rede no país. O Walmart está de olho no mercado de apetrechos eróticos, estimado em US$ 15 bilhões ao ano, que vão de máscaras e lingeries a algemas e chicotes. São os chamados sex toys, que constituem uma parte substancial do mercado do sexo no mundo. A indústria de filmes pornográficos fatura cerca de US$ 10 bilhões. A venda de pílulas anticoncepcionais chega a US$ 16 bilhões. E os comprimidos para combater a disfunção erétil, liderados por marcas como o pioneiro Viagra, Levitra e Cialis, respondem por US$ 5 bilhões.

No total, a indústria do prazer movimenta uma montanha de dinheiro estimada em US$ 46 bilhões por ano e que deve ao menos duplicar em 2020. A tradicional varejista de Bentonville, no Arkansas, não está sozinha nessa aventura. Como ela, grandes empresas estão aproveitando essa nova revolução sexual. São companhias como a varejista virtual Amazon, a loja de grife Armani e a varejista de cosméticos Eudora, do grupo Boticário. Elas estão se beneficiando da reinvenção da indústria do sexo. É fácil ver sinais de que o tema, antes considerado tabu, agora se tornou corriqueiro nas mais diversas rodas sociais, de todos os gêneros e bolsos.

O filme de Pernas para o Ar 2, da Globo Filmes, que retrata uma executiva protagonizada pela atriz Ingrid Guimarães se aventurando no mundo dos acessórios sexuais, levou quatro milhões de pessoas aos cinemas brasileiros neste ano e arrecadou R$ 44 milhões. É o filme nacional mais assistido em 2013. Por seu turno, a literatura erótica ajudou a consolidar a ideia de que entre quatro paredes tudo é válido para apimentar e tornar mais prazerosa a relação. A trilogia 50 tons de cinza, da escritora britânica E. L. James, apelidada de “Pornô para Mamães”, já vendeu 70 milhões de cópias no mundo. Estima-se que tenha gerado vendas de US$ 440 milhões para a americana Random House, que edita a obra em inglês, alemão e espanhol, o equivalente a um terço de sua receita em 2012.

No Brasil, editado pela Intrínseca, do economista Jorge Oakim, ultrapassou a casa dos quatro milhões de exemplares. Essa mudança comportamental abriu caminho para que grandes empresas investissem na área. É claro que antes de entrarem nesse mercado apoiaram suas decisões em muitas pesquisas com os consumidores. O conservador Walmart é um exemplo disso. Antes de colocar acessórios sexuais em suas prateleiras de higiene feminina, a rede, fundada por Sam Walton, teve de ser convencida pela centenária empresa Church & Dwight, maior fabricante de camisinhas dos Estados Unidos e de vibradores populares. Ela encomendou, em 2008, um estudo à Universidade de Indiana sobre o uso de vibradores pela população americana.

Mais da metade (52%) das mulheres respondeu já ter usado e 80% delas afirmaram que o fizeram em uma relação sexual com o parceiro. Foi o suficiente para convencer a gigante do varejo a investir no negócio. A aposta no filão do erotismo feita pela Eudora, marca do grupo paranaense Boticário, criada em 2011, também foi precedida por pesquisas com quatro mil consumidoras, que embasaram o lançamento de uma linha de produtos eróticos batizada de Entre 4 Paredes.“Constatamos um potencial enorme de consumidoras dispostas a comprar acessórios sem ter de passar por uma luz vermelha ou aqueles ambientes carregados dos sex shops”, diz Rodrigo Navarrette, gerente de perfumaria e cuidados com a pele da Eudora.

A empresa de Curitiba descobriu que a sensualidade feminina se divide em quatro momentos: casual (dia a dia), descolada (quando quer marcar presença), poderosa (relacionada com glamour) e, no ápice dessa escala, entre quatro paredes. Navarrette se diz animado com o segmento, que trouxe agradáveis surpresas nas últimas semanas. “Lançamos um massageador íntimo recentemente e vendemos em dois dias o que esperávamos vender em 20.” Além do massageador, a linha é composta de géis íntimos, velas corporais, perfumes e jogos de cartas eróticos, vendidos aos clientes pelas mesmas consultoras que vendem os cosméticos da Eudora.

Siga o líder - O impulso do Walmart fez com que varejistas americanas concorrentes, como Walgreens, Target, Kroger e Safeway, também passassem a abrir espaço em suas prateleiras aos vibradores e correlatos. A CVS, segunda maior cadeia de farmácias dos EUA, aumentou em cinco vezes o espaço para a venda de acessórios sexuais. Todos eles fizeram estreias discretas e raramente discutem o tema abertamente. Um porta-voz do Walgreens, a maior cadeia de farmácias do país, disse à revista Newsweek que a empresa “se adapta às tendências e mudanças do interesse dos consumidores” e prefere oferecer “produtos discretos”.

Na Europa, o maior símbolo de que o sexo não é mais um tabu no mundo dos negócios é a megastore da grife italiana Giorgio Armani, em Milão. Sem perder a elegância, a Armani optou por vender nessa loja produtos da empresa OhMiBod, conhecida por ter criado um vibrador de design minimalista, dotado de uma tecnologia que sincroniza a intensidade do aparelho de acordo com a música que está tocando no celular. Os aparelhos custam entre US$ 80 e US$ 130. “Sinto que estamos em meio à revolução sexual 2.0”, disse Suki Dunham, fundador da OhMiBod, à rede de tevê americana NBC. Na internet não foi diferente.

A Amazon estreou no segmento com 37 mil itens em 2005. Sem alarde, sem investimento de marketing e sem preconceito, o portfólio foi se ampliando e hoje oferece mais de 60 mil produtos. A maior varejista online do mundo tem de tudo: vibradores de diversos formatos e tamanhos, bonecas infláveis, itens fetichistas como correntes, entre muitos outros. Os consumidores recebem suas encomendas em uma caixa da Amazon como qualquer outra, driblando assim qualquer tipo de constrangimento. Mas não foi sempre assim. Há não mais que uma década, os sex shops, como são conhecidos os templos do erotismo, eram ambientes lúbricos e soturnos.

Estavam localizados, geralmente, próximos a ruas populares, embora fossem pouco visíveis, quase escondidos do grande público. “Agora os comerciantes estão transformando suas sex shops em butiques sensuais, que oferecem um ambiente mais agradável aos clientes”, diz Paula Aguiar, presidente da Associação Brasileira de Empresas do Mercado Erótico (Abeme). Segundo a entidade, o mercado brasileiro de acessórios eróticos deve faturar R$ 1,5 bilhão neste ano em mais de dez mil pontos de venda. Um exemplo dessa tendência são as duas lojas da Siricutico, em São Paulo. Criada pelas sócias Débora Freitas e Priscila Luisi, o estabelecimento simula o ambiente de um quarto feminino para ressaltar o clima intimista.

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“Somos uma loja de bairro, nossos vendedores chamam os fregueses pelo primeiro nome”, afirma Débora, que é arquiteta. A aposta no público feminino faz sentido. Segundo a Abeme, 76% do público das butiques sensuais são mulheres. Elas predominam nas vendas porta a porta (88%), nos sex shops tradicionais (65%) e até mesmo nos canais virtuais (60%). Quem também vai aprofundar o investimento em canais de varejo nesse mesmo estilo é a Hot Flowers, maior fabricante de produtos eróticos do Brasil, com faturamento anual de R$ 25 milhões, que hoje conta com 12 lojas. Todas usam a marca Hot Flowers, embora sejam de seus parceiros comerciais.

O modelo adotado por Edvaldo Bertipaglia, fundador e presidente da empresa, é similar ao do sistema de franquia. Mas ele não cobra taxas nem os obriga a adotar um visual padronizado nas lojas. Seu próximo movimento é incentivar a abertura de mais 20 pontos de vendas até o fim deste ano. “A tendência é essa, vamos seguir o exemplo da Apple”, diz Bertipaglia, referindo-se à bem-sucedida estratégia da companhia fundada por Steve Jobs de criar lojas próprias. Dentro dessa mudança geral de comportamento, um papel importante é desempenhado pelas redes sociais. Aplicativos como Badoo e Grindr transformam os celulares em verdadeiros radares do sexo, com os quais é possível detectar por meio do GPS onde há pessoas dispostas a uma relação sem compromisso.

Se não bastasse isso, aplicativos do Facebook também estão ajudando pessoas interessadas em sexo casual. Um dos mais usados no Brasil é o Pegava Fácil, da start-up pernambucana 30Ideias. Com ele, o usuário marca os amigos nos quais gostaria de “pegar” de maneira sigilosa. Se o sentimento é mútuo, o programa aponta isso, o que facilita bastante a aproximação dos envolvidos. Josemando Sobral, um dos criadores, disse ter se inspirado no aplicativo americano Bang With Friends, mas percebeu que com esse nome o programa não teria êxito por aqui. “O Bang tem uma conotação sexual muito direta, o que não é o estilo do brasileiro”, diz Sobral. Ele conseguiu arrebanhar 40 mil usuários no seu aplicativo.

Camisinha, o acessório - Os fabricantes de preservativos também tiveram de se reposicionar nessa nova fase da indústria do sexo. Especialistas são unânimes em apontar que o medo de contrair uma doença sexualmente transmissível (DST), que atingiu a geração anterior, já não afeta os jovens de hoje. Agora, as empresas que disputam esse mercado, cujo faturamento anual no País é de R$ 246 milhões, o vendem como um acessório sexual. “Segurança ainda é o princípio básico, mas adicionamos recursos que aumentam o prazer, como texturas e efeitos quentes”, diz Denise Santos, gerente de marketing no Brasil da multinacional americana DKT, dona da marca Prudence. O grupo australiano Ansell, dono da marca Blowtex, aposta em um preservativo chamado Skin, que de tão fino e sensível dá a sensação de não se usar nada, e no Turbo, que esquenta a genitália feminina.

“A percepção do público mudou e quem não inovar não vai ficar nesse mercado”, afirma Bruno Koudela, gerente de marketing da empresa no Brasil. A líder de mercado Hypermarcas, dona da marca pioneira dos preservativos no Brasil, Jontex, criada em 1936, e das linhas de camisinha Lovetex e Olla, também investe na estratégia de agregar valor às camisinhas. Ultrapassado o puritanismo que durante muito tempo associava o sexo ao pecado e cerceava as manifestações públicas de erotismo, a revolução sexual adquire novas feições nos dias de hoje. O que era proibido passou a ser permitido e visto com naturalidade. O direito ao prazer em todas as suas manifestações se transformou numa realidade, abrindo uma avenida de oportunidade de negócios. Empresas visionárias já se aperceberam disso e estão ganhando dinheiro com essa nova era. E isso é só o começo.

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A reinvenção da pornografia

A redescoberta do mercado de sexo trouxe mudanças para a indústria de filmes pornográficos. A profusão de conteúdo adulto disponível gratuitamente na internet gerou um baque no setor de entretenimento adulto. Em 2006, as performances de atores e atrizes filmados em DVD geravam receita estimada de US$ 90 bilhões. Seis anos depois, geravam a bagatela de US$ 10 bilhões. Esse cenário foi sentido pela icônica produtora de filmes pornôs Brasileirinhas, cuja principal renda até o começo da década era a venda de DVDs em bancas e para videolocadoras. Em cinco anos, o faturamento da empresa caiu pela metade. O diretor da Brasileirinhas, Clayton Nunes, resolveu seguir a máxima “se não pode vencer o inimigo, junte-se a ele”.

Hoje, os sites da empresa contam com cinco milhões de visitas mensais e oferecem serviço de assinatura. O principal deles é o reality show “A Casa das Brasileirinhas”. Atrizes pornôs são confinadas em uma casa cheia de câmeras e devem realizar provas sexuais. No começo, o programa era conduzido por Alexandre Frota. No mês passado, ele foi substituído pelo ator pornô Kid Bengala. “Entrego o que o público do Big Brother quer realmente ver”, diz Nunes. Atualmente, a “Casa das Brasileirinhas” tem seis mil assinantes. Os clientes são sorteados para participar da casa e fazer sexo com as participantes. “Tivemos que nos reinventar”, afirma Nunes. Ele fala não só por si, mas por toda a indústria de filmes eróticos.


Disponível em http://www.istoedinheiro.com.br/noticias/124824_OS+NOVOS+LUCROS+DO+SEXO. Acesso em 07 out 2013.

sábado, 3 de agosto de 2013

Cresce influência da indústria sobre manual de psiquiatria

Rafael Garcia
31/03/2012

O processo de reformulação do manual mais importante da psiquiatria está sofrendo cada vez mais influência da indústria farmacêutica, afirma um novo estudo.

Dentro da força-tarefa responsável pela quinta edição do livro, o número de pesquisadores que declararam ter conflito de interesses subiu de 57% para 69%, em relação à quarta edição.

A obra sob crítica é o DSM (Manual de Estatísticas e Diagnósticos), da APA (Associação Psiquiátrica Americana), que vem sendo alvejada por criar novos transtornos mentais.

Segundo Lisa Cosgrove, eticista da Universidade Harvard, o aumento dos laços com o setor privado é uma surpresa, pois a comissão encarregada de editar o manual impôs novas regras para minimizar o problema.

Na tentativa de evitar que empresas pressionem por alterações que favoreçam a venda de seus medicamentos, a associação instituiu que todos os membros da força-tarefa do DSM-5 devem relatar ligações com laboratórios.

Pesquisadores que atuam como conselheiros em empresas ou que tenham realizado pesquisas patrocinadas por elas são agora obrigados a revelar suas ligações.

Sheldon Krimsky, da Univesidade Tufts, que assina o trabalho com Cosgrove, sugere que a nova política fracassou, pois só "transformou um problema de 'viés secreto' em um de 'viés aberto'".

Os resultados foram publicados na revista "PLoS Medicine". O presidente da APA, John Oldham, emitiu um comunicado questionando o trabalho.

Além de analisar dados sobre os 29 membros da força-tarefa responsável pelo manual, Cosgrove e Krimsky fizeram um levantamento sobre os 141 pesquisadores que participam dos grupos de trabalho representando sub-áreas da psiquiatria.

"Três quartos dos grupos de trabalho têm a maioria de seus membros ligados à indústria", diz o estudo. "Os painéis onde há mais conflito são aqueles sobre problemas mentais para os quais o tratamento farmacológico é a intervenção de praxe."

Mudanças nos critérios de diagnóstico de depressão, por exemplo, podem fazer mais pessoas serem encaixadas no transtorno.

Segundo Cosgrove e Krimsky, o grau de conflito de interesses pode estar subestimado, pois a APA não exige que psiquiatras revelem participação nos "bureaus de oradores" de empresas.

Esses profissionais, que fazem apresentações públicas sobre medicamentos, podem listar essa atividade só como "honorários", sem especificar do que se trata.

"Quando fizemos uma busca de internet pelos nomes dos 141 integrantes do painel, descobrimos que 15% deles tinham revelado estar em 'bureaus de oradores' ou painéis de conselheiros de farmacêuticas", escrevem os autores.

Outro lado

O presidente da Associação Psiquiátrica Americana, John Oldham, nega que os esforços para reduzir a influência da indústria farmacêutica sobre o manual de diagnóstico DSM tenham redundado em fracasso.

"O artigo de Cosgrove e Krimsky não leva em conta o nível em que os integrantes da força-tarefa e dos grupos de trabalho do DSM-5 minimizaram ou cortaram suas relações com a indústria", declarou Oldham em comunicado divulgado pela associação.

"Em 2012, 72% dos 153 integrantes relataram não ter tido relações com empresas farmacêuticas no ano anterior", afirma ele.

Cosgrove e Krimsky dizem ter consultado versões das fichas dos psiquiatras que estavam disponíveis no site da força-tarefa de atualização do manual médico (www.dsm5.org) em 12 de janeiro.

A Associação Psiquiátrica Americana não informa com que frequência as fichas dos participantes do projeto estão sendo atualizadas. Faltam dados.

Oldham também afirma, porém, que os dados usados no estudo da dupla na revista "PLoS Medicine" não são suficientes para comparar as influências da indústria de medicamentos sobre as duas edições do DSM em questão, a quarta e a quinta. O problema, diz ele, é que as políticas sobre o tema mudaram muito de lá para cá.

"Na época da publicação do DSM-4, em 1994, nem os periódicos científicos, nem os simpósios, nem a força-tarefa exigiam que conflitos de interesse fossem revelados", diz o psiquiatra, sugerindo que os número antigos podem estar subestimados.


Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/1069893-cresce-influencia-da-industria-sobre-manual-de-psiquiatria.shtml. Acesso em 03 ago 2013.

domingo, 9 de setembro de 2012

Mercado do sexo: a fantástica indústria do fetiche

Simão Mairins
06 de setembro de 2012

Em 79 d.C., mais precisamente no dia 24 de agosto, o vulcão Vesúvio destruiu completamente as cidades de Herculano e, a mais notória, Pompeia, ambos centros importantes do Império Romano. A história daquela noite ficou, então, literalmente sepultada durante cerca de 1.500 anos, até que, durante escavações para uma obra de desvio do curso do rio Sarno, trabalhadores esbarraram em antigos muros em ruínas.

Na época, alguns profissionais chegaram a ser chamados para averiguar os achados, mas acabaram optando, inexplicavelmente, por não investigá-los. No século XVIII, entretanto, a região voltou a ser escavada e a história do dia em que o Vesúvio acordou veio à tona, explicando o motivo pelo qual os primeiros a se deparar com as ruínas (durante a repressora Idade Média) preferiram não tocá-las.

A cidade era um imenso centro dedicado ao prazer, e o sexo, em todas as suas formas imagináveis (e talvez até inimagináveis, para os mais puritanos!), inundava as ruas e clubes naquele fatídico 24 de agosto. Explorações realizadas nos últimos três séculos extraíram do que restou de Pompeia afrescos eróticos, taças com cenas de sexo em alto relevo, várias esculturas com representações do deus grego da fertilidade, Príapo, e até postes construídos com conotações fálicas.

Uma cidade como Pompeia seria inconcebível nos dias de hoje. Depois de quase dois milênios de transformações culturais e redefinições de paradigmas, práticas como aquelas passaram a ser socialmente reprimidas. Mas o mundo, evidentemente, não matou o erotismo e ainda inventou a pornografia.

Tabu ou não, o fato é que pequenos mundos devotados ao prazer são mais comuns hoje do que se pensa e, como quase tudo em sociedades capitalistas, acabaram sendo responsáveis por movimentar negócios e, nesse caso específico, construir sólidos e importantes mercados.

Pequenas pompeias modernas

Dedicadas especialmente a adeptos de um estilo de vida liberal, algumas iniciativas têm ganhado espaço no Brasil e no mundo. Em São Paulo, por exemplo, estão localizadas algumas das mais famosas casas de swing do país.

Espaços normalmente bem amplos, as casas de swing são aparentemente boates como todas as outras. Por dentro, entretanto, agregam espaços reservados para que dois ou mais casais se encontrem, shows de strip-tease e ambientes dedicados à realização de fetiches (mais ou menos como os afrescos de Pompeia), além de, é claro, permitir que as pessoas façam sexo em qualquer lugar do clube (sim, também como nas ruas de Pompeia).

Com o crescente número desses estabelecimentos, as casas têm procurado inovar, acrescentando serviços e buscando se diferenciar na qualidade de requisitos cruciais nesse tipo de negócio. Um clube localizado na região de Moema, em São Paulo/SP, por exemplo, aposta no quesito higiene ao extremo, oferecendo, entre outras coisas, dispositivos com gel antibactericida nas cabines reservadas e antisséptico bucal nos banheiros.

Outro fator importante é o sigilo. Normalmente, quem frequenta casas de swing não quer se expor fora daquele ambiente. Por isso, uma série de cuidados deve ser levada em conta e o grau de importância dado por cada empresa a esse quesito pesa bastante na decisão dos clientes.

Um mecanismo adotado para garantir maior discrição é dar preferência à entrada apenas de casais. Em alguns casos, inclusive, há necessidade de cadastro prévio para entrada nos clubes. Além disso, nos que recebem pessoas desacompanhadas, os preços são bem mais caros para quem entra sozinho (na maioria das casas, o ingresso de homens solteiros custa entre quatro e cinco vezes mais que o de casais).

Perdidos em um barco

O swing e demais formas de sexo em grupo não são, entretanto, exclusividade das casas noturnas especializadas. Há, por exemplo, agências de turismo dedicadas exclusivamente à organização de "cruzeiros liberais". A CasalFirstTour é uma delas. Há sete anos atuando no segmento, ela organiza viagens para casais swingers com destinos nacionais e no exterior.

No Brasil, normalmente, os destinos mais procurados são regiões de serra ou praias nobres, de preferência bem afastadas de grandes aglomerações urbanas. Já no exterior, a agência explica que o Caribe e a Europa são os locais mais procurados pelos clientes brasileiros.

Uma das últimas viagens organizadas pela CasalFirstTour teve como destino a cidade de Balneário Camboriú, apresentada na divulgação como "a mais liberal do Brasil". O pacote incluía desde hospedagem em um hotel fechado apenas para o grupo até transporte para a praia do Pinho (naturista), além de uma noite em uma famosa casa de swing da cidade.

"A agência foi criada há sete anos com o objetivo de oferecer tranquilidade, ambiente agradável, conforto e discrição aos casais liberais que procuram opções de lazer fora dos clubes convencionais do segmento. As viagens são planejadas com muita cautela, para que possam atingir excelência e qualidade no atendimento", dizem os donos da empresa.

Brinquedos

Outro segmento bastante forte no mercado erótico é o de "brinquedos". A empresa Adão&Eva Toys é uma das mais conhecidas fabricantes e importadores desse nicho no Brasil. O diretor comercial da companhia, André Luiz Marques, explica que, por lidar com a imaginação e a fantasia das pessoas, a marca precisa criar coisas novas e atrativas. "Viajamos para outros países e visitamos feiras especializadas, onde encontramos novas tendências, novas tecnologias, novos materiais", explica André.

"Alguns fatores são cruciais na hora de criar um produto. O primeiro é o material. Temos diversos tipos, como vidro, plástico, látex e silicone. Além disso, a tecnologia empregada nas funções é também um ponto importante. Todos querem um produto que faça mil e uma coisas", conta André.

Para quem pensa que atuar nesse segmento é fácil, André destaca que a coisa não é tão simples quanto parece. "No segmento erótico ainda lidamos com o preconceito e tabus. Veja como exemplo nossa dificuldade para fazer propaganda. Muitos canais têm a porta fechada para o nosso segmento - revistas, rádios, televisão. Alguns termos não podem ser utilizados, algumas imagens também. Quando chega o dia dos namorados todos querem matéria, o assunto tem destaque. Mas além dessa época é difícil de se ter espaço", conta o diretor.

Mesmo com as dificuldades, a situação é boa para o segmento. Nos últimos cinco anos, o faturamento tem crescido em torno de 15% anualmente.

Mercado de preservativos: mais que saúde

Embora massivamente incentivado por campanhas governamentais e já absorvido como uma questão de saúde pública, o uso de preservativos por muito tempo enfrentou certas resistências por ser visto por alguns casais, e principalmente por homens, como um limitador do prazer. Justamente para quebrar essa barreira os fabricantes começaram uma corrida pelo desenvolvimento de produtos mais atrativos. E aí surgiu uma infinidade de opções: camisinhas mais sensíveis, retardantes, com sabor, com cheiro e muito mais.

Agora visto não mais somente como um mecanismo de segurança, mas também enquanto um "algo a mais" na relação, o preservativo ganha cada vez mais mercado. "Hoje, o grande desafio da categoria é criar preservativos diferenciados, ou seja, ao mesmo tempo que oferece segurança, o produto também proporciona prazer. Por isso cresce o consumo dos preservativos retardantes, sensitive, hot e outros, e por outro lado, vemos a queda do preservativo lubrificado comum. Estamos preparados para atender este novo perfil de consumidor, que vê no preservativo um item essencial na hora do sexo, não só para sua segurança, mas também para aumentar o seu prazer", conta Bruno Koudela, gerente de marketing da Blowtex.

Motéis: luxo, comodidade e expansão da experiência

Casais heterossexuais tradicionais interessados apenas em uma noite de sexo em um ambiente diferente. Jovens namorados. Casais homossexuais. Swingers. Essa é apenas uma pequena segmentação dos diferentes públicos que os motéis atraem e precisam saber atender. Por isso, uma tendência forte nesse setor hoje, principalmente nos estabelecimentos de luxo, é a ampliação do mix de serviços e produtos.

O Union Motel, localizado em João Pessoa/PB, é um empreendimento relativamente novo, mas tem se destacado bastante em âmbito nacional por adotar uma postura pouco tradicional para o segmento, tanto no que diz respeito aos serviços prestados quanto pela imagem pública que tem construído.

Eleito como um dos dez melhores motéis do Brasil, a empresa procura fazer jus ao título investindo na diversificação de sua oferta, direcionando sua comunicação não mais apenas aos homens, mas também às mulheres, e tentando transformar uma ida ao motel em mais que uma simples noite (ou dia) de sexo.

"Apesar de sermos conhecidos pela irreverência das nossas peças publicitárias, nos preocupamos em não fazer algo vulgar ou machista, que possa desvalorizar as mulheres. Nas suítes, elas encontram produtos de excelente qualidade de marcas conhecidas, fazendo com que elas se sintam à vontade e valorizadas como sempre devem ser", conta Jeorge Segundo, administrador do Union.

Sobre os serviços, Jeorge destaca que a empresa resolveu "investir, por exemplo, em um totem de atendimento eletrônico para atender os clientes sem um porteiro, dando uma maior sensação de discrição. Passamos a entender bem não só de hotelaria e hospedagem, mas da área gastronômica para trazer um conceito de Motel Gourmet, bem como de lavanderia profissional. Temos uma estrutura diferenciada, desde a arquitetura aos equipamentos, como home theater, notebook, área externa com banheira ou ofurô em todas as suítes. A maior de nossas suítes, por exemplo, a Porto Ravel, tem 300m², com piscina com água aquecida, cinema, sauna, sala de estar, quarto duplo e até mesmo uma boate, proporcionando entretenimento aos nossos consumidores", conta Jeorge.

A revolução da web

No ano passado a internet ajudou a revolucionar uma parte importante do Oriente na chamada Primavera Árabe, que mobilizou milhares de pessoas na Europa e na América, e também no movimento Occupy Wall Street, reafirmando com bastante ênfase seu potencial transformador. O mercado erótico, evidentemente, assim como vários outros segmentos das economias, não ficou alheio a esse poder. No ciberespaço, a indústria pornô ganhou novo fôlego: comprar em uma sexshop ficou mais sigiloso e, para as marcas, surgiu uma nova forma de chegar aos seus públicos.

Ao passo que algumas das principais produtoras de filmes pornôs fechavam suas portas, uma infinidade de sites e blogs começou a ganhar a rede, fazendo com que canais eróticos e pornográficos, juntos, se tornassem o nicho mais acessado em todo o mundo.

Para se ter uma ideia da dimensão do mercado movimentado pelas páginas com conteúdo adulto na internet, apenas no Sexlog - site brasileiro que se apresenta como "rede social de sexo e swing" - há mais de 2 milhões de pessoas cadastradas, responsáveis pelo compartilhamento de cerca de 10,5 milhões de fotos e a troca de mais de 600 milhões de mensagens. Do total de usuários, boa parte paga para usufruir de serviços extras.

Já no site Xvideos.com, que tem servidores na Holanda, mas tem usuários praticamente no mundo todo, são postados diariamente cerca de 2.000 vídeos, segundo estimativas da própria empresa. Estruturado também como uma espécie de rede social de vídeos, bastante parecida com o Youtube em sua dinâmica, fatura com publicidade.

Ao mesmo tempo, o público de sexshops ganhou a oportunidade de comprar sem o desconfortável risco de ser visto entrando em uma loja. "A compra on-line oferece ao consumidor total discrição, desde o momento em que ele está procurando produtos até a entrega, que são realizadas em caixas pardas sem constar o nome da loja na caixa ou na nota fiscal", conta Daniel Passos, diretor-geral da Loja do Prazer, sexshop totalmente on-line.

Para o marketing, a internet tem se demonstrado também um importante canal. A marca de preservativos Prudence, por exemplo, realiza anualmente a promoção "Testadores de Camisinhas Prudence", que premia consumidores com produtos da marca por meio de um concurso cultural. "A cada ano nos surpreendemos ainda mais. Este ano, a internet movimentou muito a promoção – fosse postando contos eróticos para concorrer à história vencedora, fosse divulgando e acompanhando os textos no hotsite. Com grande interação nas redes sociais, a página da marca no Facebook alcançou quase 100 mil seguidores ao término da campanha", comenta Denise Santos, gerente de marketing da DKT do Brasil, empresa detentora da marca Prudence.

E aí: você vai continuar achando que Pompeia simplesmente desapareceu do mapa? 

Disponível em <http://www.administradores.com.br/informe-se/administracao-e-negocios/mercado-do-sexo-a-fantastica-industria-do-fetiche/60110/>. Acesso em 07 set 2012.