Beatriz Mendes
07/05/2012
Silas Malafaia é um velho conhecido da comunidade gay no
Brasil. O pastor, líder da igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo, costuma
protagonizar polêmicas a envolver intolerância e preconceito. Em 2006, foi ele
o responsável por uma manifestação diante do Congresso Nacional contra a lei
criminalizadora da homofobia. Na ocasião o pastor afirmou que relacionamentos
entre pessoas do mesmo sexo são a porta de entrada para a pedofilia. “Deveriam
descer o porrete nesses homossexuais”, decretou, certa vez, em seu programa de
tevê - em rede nacional, diga-se, valendo-se de seu direito de liberdade de
expressão.
Por estes e outros motivos, foi uma surpresa para o
professor de inglês Sérgio Viula, de 42 anos, e seu namorado, Emanuel Façanha
da Silva, quando em meio a promoções de maquiagens, perfumes e bijuterias,
depararam-se com livros de Malafaia no catálogo da Avon. “Não são somente obras
devocionais ou de leitura budista, católica ou uma novena. Os livros dele são
de militância fundamentalista aberta, assim como seus programas de televisão”,
diz Viúla a CartaCapital.
O professor conta que a gota d’água foi a inclusão do livro
A Estratégia entre os títulos comercializados pela Editora Central Gospel -
cujo dono é Silas Malafaia. A obra, escrita pelo pastor americano Louis
Sheldon, levanta a teoria de que os homossexuais estão fazendo um complô contra
a humanidade.
Diante da situação, Viula – que não faz parte de nenhuma
organização LGBT - resolveu se manifestar. Seu argumento se baseou em um
tratado de direitos humanos emitido no ano passado pela Avon, comprometendo-se
a não contribuir com qualquer tipo de prática discriminatória. “Escrevi uma
carta para a empresa brasileira, falando sobre a minha indignação. Como eles
não se manifestaram de imediato, resolvi traduzir a mensagem e encaminhá-la
para a Avon dos Estados Unidos”, conta.
Pouco tempo depois, a empresa brasileira escreveu um
comunicado em sua página do Facebook, alegando que a “variedade de títulos
comercializados contempla a diversidade de estilos de vida, religião e
filosofia presentes em nosso País”. Complementou falando não ter a intenção de
promover conteúdo desrespeitoso aos direitos humanos.
“A carta contribuiu para eles entrarem em contato comigo,
mas o fator determinante foi o fato de o Emanuel ter resolvido parar de
trabalhar com a Avon”, acredita o professor. Segundo ele, o parceiro era o que
a empresa chama de “Consultor Estrela”, pois vendia produtos em grande
quantidade. Quando se deu conta de que os livros de Malafaia estavam no
catálogo, abriu mão do cargo. “A gente nunca tinha reparado nos títulos porque
ele trabalhava mais com o setor de cosméticos. Mas quando saiu da Avon,
representantes da marca o procuraram no escritório, pedindo para ele voltar”.
Nesse meio tempo, as pessoas começaram a se solidarizar com
a causa. Representantes de grupos LGBT também entraram em contato com a Avon.
Duas mulheres redigiram uma petição em inglês, divulgada no All Out, site que
publica abaixo-assinados do mundo todo. “No texto, eles explicaram quem é Silas
Malafaia e quais são as ideias propagadas por ele. O negócio está bombando, a
Avon vai ter que tomar uma atitude”, enfatiza o militante.
“Muitas pessoas também me perguntaram se valia a pena lutar
por essa questão. Eu acho que sim porque se fosse o livro do Hitler, os judeus
protestariam, se fosse um livro que negasse a existência da escravidão, os
negros ficariam indignados. Por que os gays não podem se manifestar também?”,
questiona.
Outro lado
CartaCapital pediu entrevistas à direção da Avon, mas a
empresa informou que seu posicionamento oficial é aquele já divulgado por meio
do comunicado. “Estamos avaliando as ponderações recebidas e buscando a melhor
solução para seguir atendendo nossos consumidores com base em nossos valores”.
Silas Malafaia, por sua vez, tratou a questão com desdém. Em
nota divulgada em sua página, o pastor ironizou a movimentação dos ativistas.
“Esses gays estão dando um ‘tiro no pé’, estão me promovendo com uma tamanha
grandeza que nunca pensei de ser tão citado e até defendido por jornalistas
como, por exemplo, Reinaldo Azevedo’, escreveu.
Ele afirmou ainda que essas ações dão a ele elementos para
lutar contra o Projeto de Lei 122 – aquele que criminaliza a homofobia. “Se
antes de ter leis que dão a eles privilégios, já se acham no direito de
perseguir e intimidar os que são contra seus ideais, imaginem se a lei for
aprovada”, disse.
Também incentivou os fiéis a mandarem emails para a empresa,
pedindo para os livros continuarem no catálogo. “Nós, evangélicos,
representamos pelo menos 30% das vendas de produtos Avon. Os gays talvez 2%.
Eles são tão abusados que pensam que com ameaças vão nos calar”, concluiu.
Diante do comunicado, Viula afirmou: “Malafaia é um
extremista. Inclusive, outros pastores não concordam com as atitudes dele. Dá
para ser cristão sem ser homofóbico, agora eu não sei como é possível ser
homofóbico e cristão. Essas são contradições que podem matar pessoas”.
O professor fala com autoridade: ele já trabalhou como
pastor da Igreja Batista e ajudou, na época, a fundar o Movimento pela
Sexualidade Sadia (Moses), ONG prestadora de serviços de
"assistência" a homossexuais que gostariam de mudar sua orientação
sexual. “Depois de um tempo no Moses eu percebi que aquilo era uma falácia, uma
hipocrisia. As pessoas sofriam e viviam uma vida dupla, é impossível deixar de
ser gay”, contou.
Disponível em http://www.cartacapital.com.br/sociedade/avon-silas-malafaia-e-a-propagacao-da-homofobia/.
Acesso em 04 jun 2013.