Mostrando postagens com marcador cognitivo. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador cognitivo. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Cooperar ou desertar

Tiago José Benedito Eugênio

Boas conversas surgem em uma mesa de bar ou diante das estantes de livros. É comum no final de um happy hour as pessoas dividirem as despesas e, mais comum ainda, alguém não ter dinheiro para ajudar a pagar a conta. Nessa hora, sempre existe um amigo que coopera e empresta o dinheiro. "Prometo que pago você amanhã, obrigado" é a resposta mais corriqueira para tal ato de camaradagem. Doce ilusão, o tempo passa e o devedor nunca mais toca no assunto, enquanto que quem emprestou nunca esquece. Será que em outra situação, no futuro, este devedor receberá ajuda do seu amigo?

Ou, então: um amigo chega à sua casa. Diante dos seus livros, você faz uma apresentação dos assuntos que está estudando e trabalhando. Após alguns comentários, seu amigo avista um livro que lhe chama atenção. Depois de folhear e elogiar o livro, ele o pede emprestado e promete que devolverá, assim que terminar de lê-lo. Os meses se passam e o livro emprestado não é devolvido. Você comunica o seu amigo, envia um e-mail dizendo que está precisando da obra. Mas ele diz que sempre se esquece de devolvê-lo ou, então, simplesmente ignora seu pedido e não responde. O que sente o indivíduo que gentilmente emprestou o livro? Ele emprestará outro livro para seu amigo?

Há uma infinidade de situações como essas, afinal, a cooperação e a trapaça estão no centro do comportamento social humano. Mas, afinal, por que o ser humano apresenta essa bipolaridade? Por que em algumas situações nos comportamos como mocinho, em outras, somos o vilão da história? Até meados do século XX, a sociedade e sua ordem eram compreendidas como uma entidade orgânica e coesa, e seus cidadãos, meras partes. Nesta vertente, os indivíduos eram negligenciados e a mente que importava era aquela pertencente ao grupo. A negação da autonomia da cultura em relação às mentes individuais também foi articulada pelo fundador da sociologia, Emile Durkheim (1858-1917), que escreveu: "A causa determinante de um fato social deve ser buscada entre os fatos sociais que o precederam, e não entre os estados de consciência individual" (Pinker, 2004, p. 46). Assim, justificavam-se as diferenças entre os grupos étnicos exclusivamente com base nas diferenças culturais. Logo, a partir desta perspectiva, o comportamento social do ser humano não poderia ser explicado por mecanismos e propriedades inatas da mente.

Até meados do século XX, a sociedade e sua ordem eram compreendidas como uma entidade orgânica e coesa

Perspectiva evolucionista

Nas últimas décadas, contudo, tem havido uma renovação fascinante da literatura no que concerne à origem e à evolução desse sistema de normas nas sociedades. Uma série de evidências aponta que o comportamento humano parece também ser um produto de forças e propósitos evolutivos, isto é, influenciado pelas predisposições biológicas moldadas durante a evolução da espécie para lidar com as demandas ecológicas impostas, sobretudo, aos nossos ancestrais. Interpretações modernas sobre a evolução da ordem social e cooperação têm-se centrado no estudo comparativo com outras espécies e na evolução de estratégias reprodutivas dos indivíduos, as quais dependem do tamanho, estruturação dos grupos e dos padrões de interação entre os integrantes do grupo. Essa perspectiva vislumbra a ordem social como um subproduto da evolução das estratégias individuais engendradas por um longo processo histórico-evolutivo.

Nesse sentido, as normas sociais, sob esta nova óptica, são vistas, portanto, como um produto e não causa das ações dos indivíduos. O cerne desta perspectiva encontra-se nas ideias de Charles Darwin sobre a evolução das espécies. Para Darwin (1859/1996), o ambiente seleciona os indivíduos que detêm características que trazem mais benefícios do que custos - concedendo-lhes mais chances de sobrevivência e de reprodução -, e isso implica uma seleção natural, a qual é responsável pela modificação das espécies ao longo do tempo e do espaço. A seleção natural é, dessa forma, o processo através do qual variantes favorecidas em uma população sobrevivem e se reproduzem mais. Nesse processo, o ambiente seleciona os indivíduos - passando esse conjunto de traços para as gerações seguintes (Cronin, 1995).

Do abstrato ao lógico
Imagens: ShutterStock
Para testar suas hipóteses, primeiramente, os pesquisadores aplicaram em estudantes universitários a tarefa de seleção de Wason. Esse teste consiste na apresentação de quatro cartões mostrando, por exemplo, os caracteres "A", "B", "3" e "4"; é explicado que cada carta possui, em uma face, uma letra e, na outra, um número, e a regra condicional é: "Se uma carta tem uma vogal de um lado, tem um número par do outro. Nesse caso, o participante deve dizer quais cartas ele deve virar, no mínimo, para confirmar a regra". As primeiras constatações foram de que em relações que envolviam o raciocínio lógico e abstrato a maioria dos estudantes não acertava na escolha dos cartões. Entretanto, o desempenho dos estudantes mudava quando a hipótese condicional se referia a uma regra social não abstrata. Nessa versão, foi solicitado aos estudantes que se imaginassem como um barman, o qual deveria cumprir uma lei que proíbe a venda de bebidas alcoólicas para menores de 20 anos. Dessa forma, as cartas representavam os fregueses: "bebendo cerveja", "bebendo refrigerante" (que equivaleriam às letras "A" e "B", respectivamente), com "16 anos" e com "22 anos" - que equivaleriam as "3" e "4", respectivamente. Esse experimento permitiu aos pesquisadores concluírem que, na espécie humana, teriam evoluído adaptações específicas que tornariam o homem mais habilidoso para detectar possíveis trapaças no seu meio social a partir de contratos sociais e não abstratos.

Se aceitarmos os pressupostos da teoria da evolução, os quais alegam que características, tais como órgãos e dentes, são produtos da seleção natural, por que não admitir que a nossa mente também seja um produto do processo evolutivo? Esta é a proposta central da Psicologia Evolucionista, que se utiliza de conceitos e da lógica darwinista para compreender como as pressões ambientais moldaram o cérebro humano ao longo do tempo. Nesse sentido, a perspectiva evolucionista amplia o estudo do comportamento humano para além da análise física e de suas causas próximas - mecanismos fisiológicos - e passa a considerar e investigar também os mecanismos psicológicos evoluídos. Para tanto, se debruça sobre o seu surgimento na história da vida, adotando o método comparativo com outras espécies, entre indivíduos e entre os sexos, e procura compreender a sua função ou o valor para a sobrevivência e reprodução do indivíduo.

● A mente e o contratualismo ●
A Teoria da Mente é proposta inicialmente pelos primatologistas Premack e Wooddruff em 1978 e é definida, em Psicologia, como a capacidade para imputar estados mentais aos outros e a si próprio. Nesse sentido, ela é essencial quer para a autorreflexão como para a coordenação da ação social. A Teoria do Contrato Social ou contratualismo é uma teoria sobre o contrato social que se difundiu entre os séculos XVI e XVIII e que tenta explicar os caminhos que levam as pessoas a formar Estados e/ou manter a ordem social. Thomas Hobbes (1651), John Locke (1689) e Jean-Jacques Rousseau (1762) são os mais famosos filósofos do contratualismo.

Sob o ponto de vista evolutivo, o ato de cooperar implica em custos para o executor e em benefícios gerados para quem recebe a ajuda, enquanto a trapaça é compreendida quando alguém não retribui um favor ou àqueles que retribuem, mas oferecem muito menos do que recebem; ou, ainda, quando alguém usufrui de um benefício sem pagar os devidos custos. É dessa forma que podemos compreender a cooperação e a trapaça como extremos de um continum que envolve as relações e os jogos sociais. Desta forma, os mecanismos psicológicos existentes atualmente teriam evoluído para resolver problemas vivenciados por nossos ancestrais caçadores- coletores há milhões de anos e são esses mecanismos que, modelados pelo ambiente, subjazem o comportamento humano.

Partindo do pressuposto que somos seres essencialmente sociais, é esperado que, durante a evolução da espécie humana, tenha evoluído um sistema de normas de convivência a fim de regular as interações assim como as trocas sociais entre os indivíduos. Assim, mecanismos emocionais e cognitivos, tais como detecção de trapaça, senso de justiça, vigilância; teoria da mente e reputação, teriam originado e evoluído para regular nossa natureza humana social benevolente e egocêntrica.

Teoria do Contrato Social

Os pesquisadores John Tooby e Leda Cosmides, da Universidade da Califórnia, em Santa Bárbara, nos Estados Unidos, propuseram a Teoria do Contrato Social para explicar a evolução dos mecanismos reguladores das trocas sociais e da cooperação na espécie humana. Para tanto, levantaram a hipótese da existência de adaptações cognitivas específicas para regular as trocas sociais, entre elas: capacidade de identificar e reconhecer diferentes indivíduos; relembrar diversos aspectos históricos de interações com os indivíduos; detectar possíveis sujeitos violadores das regras sociais na população; expressar e compreender os desejos e as necessidades dos outros e representar os custos e benefícios nas trocas sociais dos mais diversos itens (veja quadro Do abstrato ao lógico).

● Teoria dos jogos●
É uma teoria matemática utilizada para o estudo da tomada de decisão e interação de dois ou mais indivíduos. Para isso, faz uso de diferentes jogos para compreender as estratégias dos indivíduos para alcançar o melhor desempenho, maximizando os seus ganhos. A aplicação dessa teoria à Psicologia tem sido importante para o estudo empírico do comportamento social, sobretudo da cooperação em humanos.

Após os estudos com o teste de seleção de Wason, novas questões foram feitas pelos psicólogos evolucionistas. Por exemplo, o que afeta a cooperação em um grupo? Quais são os mecanismos psicológicos e emocionais evoluídos para coibir a trapaça? Para responder a essas questões, pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, em Natal, estudaram o comportamento moral de crianças por meio de um jogo, conhecido como bens públicos - um dos famosos modelos propostos pela Teoria dos Jogos. Nesse jogo, cada criança recebia três chocolates e decidia quantos ela doaria para um fundo comum. Para cada chocolate doado era acrescentado mais dois no bem comum e, no final do jogo, este era dividido igualmente entre todos os indivíduos. As crianças foram separadas em grupos pequenos e grandes. Foi observado que nos grupos menores a generosidade foi maior, pois os indivíduos monitoravam o comportamento dos colegas. Entretanto, nos grupos maiores, em que não é fácil perceber quem doa, a cooperação caiu rapidamente, mostrando que o egoísmo prevalece quando o indivíduo não percebe um ambiente propício para a cooperação (Alencar, Siqueira e Yamamoto, 2008).

Uma série de evidências aponta que o comportamento humano parece ser um produto de forças e propósitos evolutivos

O estudo feito em campo reproduz de forma elegante um descompasso temporal, uma vez que no ambiente ancestral da espécie humana a organização social provavelmente era igualitária, sem privilégios para alguns membros e nem ocorrência de trapaceiros. O tamanho reduzido do grupo proporcionava uma fiscalização mais rigorosa do comportamento de cada um (Broom, 2006). Nesse sentido, a fiscalização era importante para coibir os trapaceiros; aqueles indivíduos que usufruem do benefício, mas não pagam o custo devido pelo mesmo (Trivers, 1971). Com o tempo, entretanto, os grupos foram crescendo e, por consequência, a identificação dos trapaceiros se tornou uma tarefa mais difícil (veja quadro Vigilância).

A capacidade de expressar e compreender os desejos e as necessidades dos outros é outra adaptação cognitiva específica para regular as trocas sociais. Premack e Woodruff (1978) estudaram o comportamento de chimpanzés que, assim como os humanos, pensam em seus coespecíficos. Assim, cunharam a expressão "Teoria da Mente", que significa a capacidade para imputar estados mentais aos outros e a si próprio. Neste sentido, ela é essencial quer para a autorreflexão como para a coordenação da ação social.

Com humanos, é empregado o clássico experimento "Problema da Sally-Anne", no qual é exibida uma cena para os sujeitos. Primeiramente, Sally entra, guarda uma bola em um local, por exemplo, atrás do sofá, e sai da cena. Entra em cena a Anne, que retira a bola de trás do sofá, a coloca em outro local, por exemplo, dentro de uma caixa, e sai. Sally retorna em busca da bola - nesse ponto a cena é interrompida. Em seguida, pergunta-se para o sujeito: "Onde Sally irá procurar pela bola?"

Vigilância

Pistas sutis de vigilância parecem também influenciar o comportamento dos indivíduos. Rigdon e colaboradores (2009) solicitaram para alguns sujeitos compartilharem um recurso de forma arbitrária com outros, que deveriam aceitar de forma passiva a oferta. Devido a esse caráter, esta situação é conhecida na literatura como jogo do ditador. Os pesquisadores, no momento da tomada de decisão, entregaram para os "ditadores" um cartão com três pontos - dispostos como uma face (figura a). Em outra condição, os ditadores viam o mesmo estímulo, no entanto, rotacionado 180º (figura b). Observou-se que os participantes ditadores alocaram mais recurso para os receptores quando eram submetidos à condição de vigilância. Os pontos distribuídos como se fosse uma face parecem ativar a área fusiforme do cérebro - responsável pelo reconhecimento de faces - sendo, portanto, suficiente para modificar o comportamento social dos ditadores.

Imagens: ShutterStock
a = Pontos dispostos como uma face (condição de vigilância). b = Pontos rotacionados 180o (condição neutra). Adaptado de Rigdon et al., (2009)

Recurso cognitivo

Os pesquisadores observaram que, até três anos de idade, as crianças apresentam dificuldades de entender que diferentes pessoas podem ter representações distintas de uma mesma realidade. Nesse caso, essas crianças respondem, em geral, que Sally irá procurar a bola dentro da caixa. Todavia, quando a mesma pergunta era feita para crianças com mais de seis anos, quase todas as crianças respondiam corretamente, que Sally iria procurar no local onde tinha deixado a bola, isto é, atrás do sofá. No que se refere à idade crítica no desenvolvimento da "Teoria da Mente", há divergências entre os pesquisadores (Ottoni, Rodriguez & Barreto, 2006).

No entanto, é inegável que, com tal recurso cognitivo, o ser humano pôde, por exemplo, planejar estratégias e tomar decisões críticas numa situação social. Além disso, tornou-se possível ao Homo sapiens prever que ideia os outros estariam formando a seu respeito, bem como tornou mais sofisticadas as relações e a comunicação intra e intergrupo, habilitando-o a entender artifícios da expressão humana como a ironia, a dissimulação, o sofrimento, o interesse e a falsidade.

Pode ser verdade que nossa moralidade é, em última análise, um meio pelo qual os indivíduos induzem o moralismo no próximo para satisfazer seus próprios interesses (Cartwright, 2000) e que, por mais niilista que seja isso, somos hospedeiros de genes egoístas usurpadores, cujo objetivo maior é sobreviver e se reproduzir. Mas assumir isso não nos inviabiliza o planejamento e a criação de contextos que burlem os desígnios da nossa essência genética e egocêntrica. Somos seres humanos imbuídos em um mundo social: viemos ao mundo equipados com predisposições para aprender a cooperar, a distinguir o justo e virtuoso do traiçoeiro, a praticar e prezar pela lealdade, a conquistar boa reputação diante dos nossos semelhantes, intercambiar produtos e informações, a dividir o trabalho e a modelar sua individualidade e vínculos sociais a partir das reações do outro. Nisso, somos uma espécie única.

Referências
Alencar, A. I., Siqueira, J. O, & Yamamoto, M. E. (2008). "Does group size matter? Cheating and cooperation in Brazilian school children". Evolution and human behavior, 29, 42-48. Broom, D. M. (2006). "The evolution of morality". Applied Animal Behavioral Science, 100, 20-28. Cartwright, J. (2000). Evolution and human behavior. London: MacMillan Press. Cosmides, L. & Tooby, J. (1992). "Cognitive adaptations for social exchange". In: H. J. Barkow, L. Cosmides & J. Tooby. The adapted mind: Evolutionary psychology and the generation of culture (p. 163-228). New York: Oxford University Press. Cronin, H. (1995). A formiga e o pavão: altruísmo e seleção sexual de Darwin até hoje. Campinas: Papirus. Darwin, C. (1859/1996). The origin of species. Oxford: Oxford University Press. Hamlin, J. K., Wynn, K., & Bloom, P. (2007). "Social evaluation by preverbal infants". Nature, 450, 557-559. Nowak, M. A., Page, K. M., & Sigmund, K. (2000). "Fairness versus reason in the ultimatum game". Science, 289, 1773-1775. Pinker, S. (2004). Tábula rasa: a negação contemporânea da natureza humana. São Paulo: Companhia das Letras. Ottoni, E. B., Rodriguez, C. F. & Barreto, J. C. (2006). "Teoria da Mente e compreensão da representação gráfica de conteúdos mentais (balões de pensamento)". Interação em Psicologia, 10, 225-234. Rigdon, M., Ishii, K., Watabe, M. & Kitayama, S. (2009). "Minimal social cues in the dictator game". Journal of Economic Psychology, 30, 358-367. Trivers, R. (1971). "The evolution of reciprocal altruism". Quarterly Review of Biology, 46, 35-57.


Disponível em http://portalcienciaevida.uol.com.br/esps/Edicoes/73/artigo244856-1.asp. Acesso em 25 ago 2013.

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Bases biológicas da orientação sexual e da identidade de gênero

Daniel Pessoa
10 outubro, 2009

Homens e mulheres revelam padrões de diferenças comportamentais e cognitivas que refletem as diversas influências hormonais no desenvolvimento do cérebro.

Alguns estudos têm apontado para a importância do hipotálamo como área do cérebro responsável pela regulação do comportamento reprodutivo. Tem se mostrado que o hipotálamo de ratos machos é maior que o de ratos fêmeas, estando esta diferença sob controle hormonal. Estas diferenças também têm sido identificadas no hipotálamo humano, e estariam relacionadas à orientação sexual e identidade de gênero. Aparentemente, transexuais masculino-femininos apresentam hipotálamos menores que os de indivíduos masculinos.

Em ratos, a privação de hormônios masculinos, através da castração ou bloqueio hormonal, imediatamente após o nascimento, leva a uma redução nos comportamentos sexuais masculinos (montar durante a cópula) e a um aumento nos comportamentos sexuais femininos (lordose – arqueamento das costas durante o coito). A administração de hormônios masculinos a ratos fêmea levam a um resultado similar, com aumento de monta e diminuição de lordose.

Isto também parece ocorrer em seres humanos. A análise do comportamento lúdico de meninas com HCA (hiperplasia das adrenais), em comparação com seus irmãos e irmãs, mostrou uma “masculinização” de seus comportamentos. A HCA faz com que grandes quantidades de hormônios masculinos sejam produzidas.

No passado, a ciência já serviu como pretexto para deflagração de preconceitos e conceitos distorcidos. A ciência não é perfeita, afinal é realizada por seres humanos. Vamos torcer para que os cientistas não se esqueçam do passado e que a ética prevaleça em suas pesquisas e interpretações.


Disponível em http://pessoadma.wordpress.com/2009/10/10/bases-biologicas-da-orientacao-sexual-e-da-identidade-de-genero/. Acesso em 11 ago 2013.

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

História da ciência e a diversidade de orientações sexuais: natureza, cultura e determinismo

Valter Forastieri
Candombá - Revista Virtual, v. 1, n. 1, p. 1 – 15, jan – jun 2005

Resumo: Este artigo é uma revisão de como a ciência vem tratando a questão da existência de uma variedade de tipos de orientações sexuais. A orientação sexual, um padrão peculiarmente humano, é caracterizada pelo comportamento sexual mais aspectos cognitivos referentes à atração, fantasias e desejos sexuais. A tentativa de explicação desse fenômeno criou disputas entre biólogos e psicólogos, a controvérsia natureza versus cultura. No início do século XX, o determinismo cultural da psicanálise foi a base de explicação da orientação sexual, mas, com o passar das décadas, foi perdendo espaço para o determinismo biológico, impulsionado pela revolução biotecnológica.


quinta-feira, 4 de julho de 2013

Como as mulheres mexem com a cabeça dos homens

 Daisy Grewal

Romances, filmes e roteiros para televisão estão repletos de cenas em que um rapaz procura inutilmente interagir com uma jovem bonita. Em muitos casos, o conquistador em potencial acaba fazendo algo tolo em suas incansáveis tentativas de impressionar a moça. É como se o cérebro do homem, de repente, não estivesse funcionando direito. E segundo uma pesquisa recente é exatamente o que acontece.

Há algum tempo, pesquisadores começaram a investigar como a interação com representantes do sexo oposto afetava aspectos cognitivos dos homens. Um estudo de 2009 demonstrou que após breve contato com uma mulher atraente os homens experimentam um declínio momentâneo do desempenho mental.

Para compreender por que isso ocorre, a pesquisadora Sanne Nauts e seus colegas da Universidade Radboud de Nijmegen, na Holanda, realizaram dois experimentos com a participação de estudantes universitários de ambos os sexos. No primeiro, avaliaram seu desempenho cognitivo aplicando um teste de Stroop. Desenvolvido em 1935 pelo psicólogo Ridley Stroop, o instrumento é usado para avaliar a capacidade de elaborar informações que competem entre si. O teste consiste em mostrar uma série de nomes impressos em cores diferentes. Por exemplo, “azul” pode estar impresso em verde, “vermelho” em laranja, e assim por diante. Os participantes devem nomear, o mais rápido possível, as cores nas quais as palavras estão escritas. O teste é cognitivamente exigente e quando as pessoas estão mentalmente cansadas, tendem a completar essa tarefa de modo mais lento.

No estudo de Sanne Nauts, após terem completado o teste de Stroop os voluntários realizaram outra prova, apresentada como dissociada da anterior. Os pesquisadores pediram aos universitários que lessem em voz alta uma série de palavras em holandês diante de uma webcam. Os cientistas explicaram que durante a “tarefa de leitura labial” um observador – ao qual era atribuído um nome qualquer, masculino ou feminino – estaria acompanhando o desempenho dos participantes através de uma câmera. Os voluntários não interagiam de modo algum com essa pessoa, que não era identificada nem por fotografia. Tudo que sabiam – sobre ele ou ela – era o nome.

Logo depois de concluírem a leitura, os participantes foram submetidos a outro teste de Stroop. O desempenho das mulheres nessa segunda avaliação foi muito semelhante ao do primeiro, não importando o sexo do misterioso observador. Mas, entre os homens que julgaram ter sido observados por uma mulher, o desempenho foi pior nesse segundo teste. E essa deterioração cognitiva ocorreu independentemente de eles terem interagido com a suposta observadora.

Numa segunda etapa da pesquisa, Sanne Nauts e seus colegas iniciaram novamente o experimento aplicando o teste de Stroop em voluntários que haviam sido levados a pensar que precisariam fazer uma leitura em voz alta, como no primeiro experimento – na verdade, porém, eles nem sequer chegaram a realizar essa atividade; o importante era que acreditassem que teriam de cumpri-la. Metade dos voluntários foi induzida a crer que seria observada por um homem, e a outra parte, por uma mulher. Em seguida, todos foram convidados a realizar outro teste de Stroop.

Mais uma vez, o desempenho das mulheres não apresentou diferença, independentemente do gênero do suposto observador. Já entre os rapazes, aqueles que acharam que seriam acompanhados por uma mulher tiveram desempenho significativamente pior no segundo teste.

Enfim, parece evidente que, quando nos encontramos em situações nas quais nos sentimos inseguros, intimidados ou estamos particularmente preocupados com a impressão que causaremos, podemos ter dificuldades concretas para raciocinar claramente. No caso dos homens, o simples fato de pensar em interagir com uma mulher seria suficiente para ofuscar um pouco o cérebro. Se ela for bonita, então, “pior” ainda.


Disponível em http://www2.uol.com.br/vivermente/noticias/como_as_mulheres_mexem_com_a_cabeca_dos_homens.html. Acesso em 29 jun 2013.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Resistência a mudanças

Mente Cérebro

Casa nova, escola nova, outra empresa, às vezes outra cidade ou até país. Abraçar o novo implica, por um lado, abandonar o familiar, a rotina confortável e as expectativas usuais e, por outro, lançar-se ao desconhecido. Não é à toa que pessoas diferentes têm respostas diversas a mudanças. Para começar, o valor do ambiente que se tornou familiar é extremamente pessoal: depende da sua história particular naquele contexto, das suas experiências, das memórias formadas ali, enfim, do valor associado ao que se está deixando. Para uns, deixar para trás uma escola onde se era oprimido pode ser um alívio; para outros, que conviviam bem, pode ser um abandono forçado do que foi a segunda casa. Se as lembranças despertarão saudade ou, ao contrário, a sensação de “já vai tarde”, é simplesmente reflexo das experiências pessoais de cada um. 

Mas a resposta ao novo também depende do que temos por trás de uma faceta do nosso temperamento: a maneira automática como o cérebro reage ao novo e desconhecido. Curiosamente, embora novo e desconhecido sejam virtualmente sinônimos, o cérebro tem dois sistemas separados de resposta a eles. Um, centrado na amígdala (não, não é a da garganta...), organiza uma reação de ansiedade e temor que leva a um distanciamento do desconhecido (e a protestos generalizados de “Não quero ir para uma escola nova!!!”). O outro, centrado no estriado ventral, gera, ao contrário, desejo, motivação e expectativas positivas sobre o que é novo. (“Hmmm, garotas novas...”) Em algumas pessoas, o sistema que gera angústia frente ao desconhecido é mais forte do que em outras – e também mais forte do que o outro sistema que simultaneamente nos atrai ao desconhecido. 

Por tudo isso também é possível ter sentimentos aparentemente contraditórios em relação a uma mudança para um novo emprego, por exemplo: sentir-se ao mesmo tempo angustiado, empolgado e aliviado, ou destemido, mas saudoso. 

Toda mudança é, contudo, um estresse, ou seja, um problema que o cérebro acha que precisa resolver. E, como todo estresse, a resposta depende de o problema ser voluntário ou não: você desejou mudar decasa, trabalho ou cidade, ou a mudança foi imposta? Estresses voluntaries – a sarna que a gente mesmo arranja para se coçar, de um simples quebra-cabeça a um projeto de pesquisa, da reorganização do armário à mudança para outro continente – ativam o estriado ventral e são portanto altamente prazerosos e motivadores. Mas se o relatório ou a transferência caem de paraquedas no seu colo, de maneira totalmente involuntária, o estresse tem tudo para ser simplesmente... estressante. 

Mas ainda há salvação. Mais importante do que ter o controle de fato sobre a situação é sentir-se em seu controle: abraçar a mudança jogada em seu colo como algo que você, afinal, considera bom e, se possível... francamente desejável, algo que você mesmo teria escolhido. Aqui ajuda muito ter o que se chama um “estilo cognitivo positivo”: ser capaz de uma abordagem otimista, proativa, da situação. Isso vem naturalmente para alguns, que sempre conseguem enxergar o melhor e transformar limões azedos em limonadas refrescantes. Mas também os que têm tendências naturalmente pessimistas podem praticar atitudes positivas e buscar conscientemente enxergar as vantagens do novo. O primeiro requisito é tornar-se ciente dos seus sentimentos, para então poder agir sobre eles.

Disponível em <http://www2.uol.com.br/vivermente/noticias/resistencia_a_mudancas.html>. Acesso em 17 out 2012.