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sábado, 29 de setembro de 2012

Interpretando o gênero

Linda Nicholson
Estudos Feministas, ano 8, 2.º semestre, fevereiro/2000

Resumo: Neste artigo a autora desconstrói significados dominantes de dois conceitos centrais da critica feminista: gênero e mulher. Muito do feminismo posterior aos anos 1960 ancorou-se na distinção entre sexo e gênero. Embora essa discussão tenha tido alguma utilidade (como a de permitir que as feministas desafiassem a ideia de um determinismo biológico), ela também permitiu que as feministas preservassem um tipo de pensamento dualista sobre a identidade da mulher e que analisassem a diferença entre mulheres como algo que pudesse ser separado daquilo que todas as mulheres compartilham. A autora argumenta que o marco teórico binário possibilitou a muitas feministas enfatizar profundas diferenças entre as experiências culturais dos homens e das mulheres. Porém, como o pensamento binário não é completamente estático nem permite uma perfeita articulação entre experiências masculinas e femininas e corpos masculinos e femininos, empregá-lo em nossas análises pode resultar em sérios problemas. O marco binário também não consegue captar o nível de desvio das normas do gênero que existe em muitas de nós, reforçando tanto estereótipos culturais em relação ao significado das experiências masculinas e femininas, bem como atuando politicamente na superessão de maneiras de ser que desafiam os dualismos do gênero. 

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quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Eu sou homem

Mariana Sanches
MC - setembro de 2012

Resumo: Nascidos em corpo de mulher, eles lutam para se transformar fisicamente e pelo direito de usar o nome masculino na faculdade, no trabalho e na carteira de identidade. (...) "A influência da religião no judiciário impede decisões em favor da troca de nome", diz Roberto Coutinho Borba, juiz de direito. (...) "Quando me chamavam por Joana, fingia que não era eu", relata Rodrigo, aluno do Senac. "Os meninos trans sofrem mais porque têm que se inserir em um meio machista", aponta Maria Lucia Pereira, psicóloga.

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Infidelidade masculina: mito ou realidade?

Fiona Woods
6 de junho, 2012

Será que isso é verdade? E se a infidelidade é cometida com outra mulher, será que é matematicamente possível que os homens sejam os campeões na traição amorosa?

À primeira vista, as estatísticas não são muito favoráveis aos homens. Em uma pesquisa feita nos Estados Unidos em 2006, a American General Social Survey, quase duas vezes mais homens do que mulheres admitiram ter tido relações sexuais com pessoas que não eram suas esposas ou maridos.

O último estudo de grande porte sobre comportamento sexual realizado na Grã-Bretanha, a National Survey of Sexual Attitudes and Lifestyles (Natsal), feita em 2000, concluiu que 15% dos homens tinham tido relacionamentos "sobrepostos" no ano anterior - em comparação com apenas 9% das mulheres.

Ponto de Vista

A pesquisadora Catherine Mercer, chefe de análises do estudo Natsal, disse que a discrepância pode ser explicada, em parte, porque as mulheres estão menos inclinadas a admitir a infidelidade do que os homens.

"Não podemos observar diretamente a infidelidade, então temos de nos basear no que as pessoas nos dizem, mas sabemos que existem diferenças entre os gêneros na forma como as pessoas relatam comportamentos sexuais", disse Mercer.

Mas os números poderiam ser explicados de outra forma.

Por exemplo, a diferença entre as estatísticas para a infidelidade de homens e mulheres poderia resultar de uma situação onde um número menor de mulheres cometem adultério, porém, aquelas que são infiéis o fazem com mais frequência.

"As dificuldades de se medir a infidelidade
Petra Boynton, Psicóloga, especializada em sexo e relacionamentos

O primeiro problema é como você coloca a pergunta. Algumas pesquisas fazem isso de maneira acusatória.
Em segundo lugar, quando você está falando sobre a infidelidade, o que você realmente quer dizer? As pessoas têm conceitos diferentes. Beijar é infidelidade? Algumas pessoas dizem que ver pornografia ou falar no Facebook é infidelidade.
Quando falamos sobre relacionamentos e sexo, temos obssessão por gênero. Estabelecemos esses parâmetros fixos. Poderíamos pensar em termos de idade, ou tipo de relacionamento, ou cor do cabelo.
Por que estamos tão interessados em dizer que homens são mais infiéis do que mulheres? Por que tem de ser um ou o outro? E por que falar sobre isso? Essas questões nos remetem ao estereótipo negativo de que os homens são mais sexuais, mais promíscuos e menos confiáveis. E de que as mulheres são mais virtuosas.
É bem possível que homens exagerem e que mulheres minimizem (sua infidelidade). Historicamente, tem sido perigoso, às vezes, para as mulheres, admitir infidelidade. E em algumas partes do mundo esse ainda é o caso - para homens e mulheres."

Todas as evidências do estudo Natsal, no entanto, indicam que mulheres, de maneira geral, têm menos parceiros sexuais do que os homens - e não o contrário.

Outra possível explicação para a diferença nos índices teria a ver com idade. "Nós sabemos que, em média, os homens tendem a ser ligeiramente mais velhos do que suas parceiras mulheres", disse Mercer.

"Se você imagina um cenário onde um homem casado tem um caso com uma mulher mais jovem, que pela probabilidade tende a ser solteira, porque é mais jovem, ele teria sido infiel, mas ela não".

Se uma pessoa considera ou não que uma mulher que tem relações sexuais com um homem casado está sendo cúmplice em adultério, isso vai depender dos seus conceitos morais.

Também é importante notar que alguns relacionamentos são abertos e, em relacionamentos desse tipo, sexo com outros parceiros não seria considerado infidelidade. Mas não há flexibilidade nas estatísticas para acomodar essas nuances.

Mercer, inclusive, nem usa a palavra 'infidelidade' em sua pesquisa. Ela prefere usar termos mais neutros, como "sobreposição" ou "simultaneidade" de relacionamentos.

"Infidelidade é uma palavra tendenciosa, ao passo que pensar em sobreposição de parceiros é mais apropriado quando estamos pensando sobre o contexto epidemiológico desses dados", ela disse.

"Estamos pensando, por exemplo, sobre a transmissão de infecções transmitíveis sexualmente e HIV", explica.

Homens que pagam por sexo podem também explicar seus índices mais altos de "relacionamentos sobrepostos". O último estudo Natsal revelou que cerca de 4% dos homens tinham pago por sexo nos cinco anos anteriores.

Se partimos do pressuposto de que há um número menor de mulheres vendendo sexo do que o número de homens pagando por ele, a prostituição pode também explicar algumas das discrepâncias.

Isso também pressupõe, é claro, que muito menos mulheres pagam por sexo do que homens. Estudos anteriores não perguntaram às mulheres se elas pagam por sexo, então não há dados concretos. Mas isso será perguntado no próximo estudo Natsal.

Há uma outra falha na metodologia. Estudos anteriores não perguntaram explicitamente se os entrevistados tinham relacionamentos sobrepostos. Em vez disso, os estudos pediram as datas das primeiras e últimas relações sexuais dos entrevistados com seus parceiros mais recentes.

Com bases nas respostas, os pesquisadores analisaram as datas em busca de sobreposições. Mercer explicou que esse método pode dar a impressão de que houve infidelidade quando na verdade ela não ocorreu.

"Imagine uma situação onde um casal começa a namorar na escola, se separa e depois volta a namorar alguns anos mais tarde".

"Nesse ínterim, cada um teve outros parceiros. A data de sua primeira relação sexual ainda vai ser quando estavam na escola. A data da relação sexual mais recente bem pode ser na semana anterior. Mas as datas (de suas relações sexuais) com os outros parceiros vão indicar que foram infiéis quando na verdade não foram".

Longe de Casa

Será que algum desses estudos seria capaz de nos dizer que tipo de homem está mais propenso a ser infiel?

O coordenador da pesquisa American General Social Survey, Tom Smith, identificou vários fatores.

"Entre os grupos que estão mais propensos a ser infiéis estão os menos religiosos e as pessoas que ficam separadas (da parceira ou parceiro) por longos períodos - viajando ou trabalhando longe de casa", disse Smith.

Mercer, por sua vez, disse que jovens tendem a relatar mais relacionamentos sobrepostos do que outros grupos etários.

O que nos dá o perfil da pessoa mais propensa ao crime da traição: homem jovem sem religião que passa grandes períodos longe de casa.

Disponível em <http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2012/06/120605_infidelidade_masculina_mv.shtml>. Acesso em 08 jun 2012.

terça-feira, 5 de junho de 2012

Militantes do 'masculinismo' dizem que é hora de defender direitos dos homens

Tom de Castella
7 de maio, 2012

Há décadas, grupos feministas fazem campanha por mais direitos para as mulheres. Como resultado, a discriminação contra a mulher vem sendo rigorosamente questionada - ao menos em países ocidentais.

Mas agora, um número cada vez maior de ativistas argumenta que os homens não desfrutam desse tipo de proteção.

Muitos deles dizem também que a mídia permite que mulheres transformem homens em objetos e os ridicularizem de uma forma que seria impensável se os papéis fossem invertidos.

Guarda dos Filhos

Entre os defensores dessas ideias está o professor de filosofia David Bernata, da Universidade da Cidade do Cabo, na África do Sul.

No polêmico The Second Sexism (O Segundo Sexismo, em tradução livre), Bernata argumenta que, em todo o mundo, homens correm mais riscos de serem forçados a fazer serviço militar, serem alvo de violência, perderem a guarda de seus filhos e cometerem suicídio.

As leis que regulam os direitos sobre a guarda dos filhos são talvez o alvo mais conhecido das atividades dos militantes pelos direitos dos homens.

Na Grã-Bretanha, imagens de homens divorciados vestidos de super-heróis escalando prédios em Londres foram destaque na mídia em anos recentes.

"Quando o homem é o principal responsável por cuidar das crianças, suas chances de obter a guarda dos filhos são menores do que quando a mulher é a principal responsável", diz Bernata.

"Mesmo quando o caso (pedido de custódia pelo homem) não é contestado pela mãe, ele ainda tem menos chances de obter a guarda do que quando o pedido da mulher não é contestado."

Educação

Os aticistas afirmam ainda que a educação é mais uma área onde os homens estão ficando para trás.

Em 2009, exames feitos pelo Programme for International Student Assessment, um programa internacional de avaliação de estudantes, revelaram que, em todos os países industrializados, os homens estão em média um ano atrás das mulheres em alfabetização.

O levantamento também concluiu que a maioria dos estudantes em cursos de graduação nas universidades hoje é composta por mulheres, segundo Bernata.

"Quando as mulheres são pouco representadas entre presidentes de companhias, isso é considerado discriminação. Mas quando meninos ficam para trás na escola, quando 90% das pessoas em prisões são homens, ninguém pergunta se os homens estariam sofrendo discriminação."

"Se quisermos alcançar a igualdade entre os sexos, a discriminação contra os homens tem de ser levada tão a sério quanto a discriminação contra a mulher", argumenta o filósofo.

Em países desenvolvidos como a Grã-Bretanha, a igualdade de salários é o barômetro. Segundo o Instituto Nacional de Estatísticas do país, a discrepância salarial entre os sexos ainda é bastante pronunciada: advogadas ganham em média US$ 12 mil (R$ 23 mil) a menos do que advogados, presidentes de empresas ganham US$ 22 mil a menos do que seus equivalentes do sexo masculino e médicas ganham US$ 14 mil a menos do que médicos.

Mas esse quadro começa a mudar. No ano passado, a organização que controla admissões de estudantes em universidades britânicas concluiu que mulheres com idades entre 22 e 29 anos ultrapassaram os homens em salários pela primeira vez.

E uma pesquisa feita pelo Chartered Management Institute concluiu que gerentes do sexo feminino com idades entre 20 e 30 anos estão ganhando 2,1% a mais do que seus colegas do sexo masculino.

'Masculinismo'

Por tudo isso, ganha peso o argumento, entre alguns homens, de que eles precisam criar suas próprias estruturas de apoio.

A ONG The Men's Network (A Rede dos Homens), com sede na cidade inglesa de Brighton, tem como objetivo ajudar "todos os homens e meninos da nossa cidade a realizar ao máximo o seu potencial".

A campanha Movember, por exemplo, propõe que homens deixem a barba crescer durante um mês. Os idealizadores do movimento querem chamar a atenção para o fato de que doenças que afetam os homens, como cânceres da próstata e do testículo, não são levadas tão a sério como as que afetam mulheres.

Alguns argumentam que é hora de os homens criarem o equivalente masculino ao feminismo: o 'masculinismo'.

O fundador da International Association of Masculinists (Associação Internacional dos Masculinistas), o americano Aoirthoir An Broc, disse que há milhares de ativistas homens lutando contra as leis de divórcio indianas, que eles consideram desiguais.

"Desde o surgimento da pílula, as mulheres vêm ouvindo que podem e devem ter orgasmos. E porque não estão tendo, dizem que a culpa é do homem."
Tom Martin, ativista britânico

An Broc, um designer gráfico especializado em websites que vive em Cleveland, nos Estados Unidos, disse ter planos de fundar o primeiro abrigo para homens vítimas de violência doméstica no país.

Ele disse que existe uma presuposição de que as mulheres são sempre inocentes e de que os homens são sempre os agressores. Como resposta, ele criou o slogan "Todos os homens são bons" para combater a percepção negativa.

"Nós dizemos que todos os homens são homens, todos os homens são bons, todos os homens merecem amor e respeito independentemente de sua raça, sexualidade, religião. Não acreditamos em definições culturais dos homens", afirma.

Algumas das preocupações dos militantes pelos direitos dos homens são semelhantes às de militantes mulheres: a questão da imagem do corpo masculino é uma delas.

Eles dizem também que, enquanto o feminismo combate a discriminação contra as mulheres, conceitos ultrapassados em relação aos homens não são questionados.

O caso do ativista Tom Martin chamou a atenção da imprensa na Grã-Bretanha no ano passado após ele ter processado o Departamento de Estudos de Gênero da London School of Economics por discriminação sexual.

Ele diz que tornou-se um defensor radical dos direitos dos homens quando trabalhava em uma casa noturna no bairro boêmio do Soho, em Londres. "Eu via que os fregueses homens sofriam abusos o tempo todo."

Martin conta que os homens tinham de fazer fila e pagar para entrar enquanto as mulheres entravam de graça. Eles eram maltratados pelos seguranças, mas mulheres eram tratadas com respeito. Mas o pior, na opinião dele, é que as mulheres usavam os homens, convencendo-os a pagar bebidas para elas.

No centro disso tudo, diz Martin, está o sexo. "Desde o surgimento da pílula, as mulheres vêm ouvindo que podem e devem ter orgasmos. E porque não estão tendo, dizem que a culpa é do homem."

Martin conclui que "cabe às mulheres sua satisfação sexual, isso não é responsabilidade do homem".

O psicólogo e escritor Oliver James, ex-consultor do Ministério do Interior britânico, acha que os homens estão se sentindo "ameaçados sexualmente".

Para ele, as mulheres hoje em dia não têm inibições em expressar suas expectativas sexuais em relação ao parceiro. E não hesitam em avaliar a performance sexual do homem em público.

Debate Antigo

Já as feministas, por sua vez, dizem que o movimento pelos direitos dos homens não traz novidades. "É o velho argumento de que o feminismo foi longe demais", diz a colunista do jornal britânico The Guardian, Suzanne Moore.

As discrepâncias salariais entre os sexos e o fato de que homens ainda dominam postos de liderança na vida pública mostram onde está a discriminação real, segundo ela.

Moore reconhece que há problemas na forma como meninos são educados mas diz que não se pode fazer "generalizações afirmando que todos os homens sofrem discriminação".

Kat Banyard, autora do livro The Equality Illusion (A Ilusão da Igualdade, em tradução livre), diz que os homens se enganam ao temer o feminismo quando, na verdade, o movimento oferece a eles a possibilidade de se libertarem dos conceitos ultrapassados de masculinidade.

Argumentar que os homens agora são vítimas da luta entre os gêneros é absurdo, ela diz. "Durante milhares de anos, mulheres foram subjugadas como cidadãs de segunda classe. Começamos a mudar isso nos últimos dois séculos e ainda temos um longo caminho a percorrer. Os militantes (pelos direitos) dos homens estão negando a História".

Os defensores dos direitos dos homens têm dificuldade em mudar sua imagem "mal humorada", argumenta o radialista Tim Samuels, que apresenta o programa Men's Hour (Hora do Homem, em tradução livre) na BBC Radio 5 Live.

Samuels diz que a maioria dos homens não se vê como parte de um movimento.

"O movimento dos homens tende a ser reduzido a alguns sujeitos escalando prédios vestidos de super-homem enquanto ao das mulheres é dada credibilidade."

Disponível em <http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2012/05/120503_militantes_direitos_homens_mv.shtml>. Acesso em 02 jun 2012.

domingo, 18 de março de 2012

Bissexualidade praticada

Breno Rosostolato
11/03/2012

Homens, vocês não são mais os mesmos, e muito menos vocês, mulheres. Cada vez mais percebo mudanças significativas nos comportamentos entre os sexos. O que sempre foi justificado como uma guerra entre homens e mulheres tornou-se uma exacerbação e predominância do sexo frágil, se ainda podemos dizer isso. E, querem saber, de fato, sempre foi assim.

“Por trás de um grande homem existe uma grande mulher”. Esta antiga frase é muito apropriada se pensarmos que decisões foram e são tomadas pelas mulheres. Os homens acreditam que suas vontades são prioritárias, mas na verdade executam as delas. É difícil pensar, por exemplo, que os reis possuíam uma autonomia e não consultavam suas rainhas antes de uma tomada importante de decisão. Inclusive, as mulheres possuem papel central em muitos momentos históricos, e seu poder de decisão foi fundamental. Cleópatra, soberana no Egito; Joana d'Arc, combatente francesa que liderou o exército em vários momentos; Anita Garibaldi, a heroína dos dois mundos; Evita Peron, política argentina; Margareth Tatcher, a Dama de Ferro inglesa; e a nossa primeira presidente mulher, Dilma Rousseff. Ficaria um bom tempo aqui lembrando de tantos outros nomes.

Só que não é das mulheres em si que gostaria de discutir, mas sobre o efeito feminino nos homens e as consequências dessa influência. O lado feminino nos homens, enfim, passa a ser admitido, e, se não o é, nitidamente o comportamento, hábitos e costumes masculinos se metamorfosearam por conta dessa releitura.

Os homens têm se cuidado mais. Idas frequentes ao cabeleireiro, depilações, cremes para as mãos, pés, rosto. Produtos de cosméticos e de higiene próprios para o público masculino. Os pelos já não são mais uma marca da virilidade e da masculinidade. Virilidade essa que já é rediscutida nas clínicas sobre fertilidade. Os homens estão admitindo seu grande pesadelo: a impotência sexual. E, o mais significativo: buscam ajuda. Deixam o constrangimento de lado e reconhecem que precisam de orientação. As clínicas de cirurgia plástica são outro exemplo. Constatamos que os homens também se sacrificam em busca de um modelo de beleza. Ora, isso é admitir que outros homens são bonitos. E, o melhor, podemos dizer isso e não ter nossa orientação sexual questionada.

A nova condição masculina vem sendo recriada pela feminilidade, e, com isso, os homens evidenciam suas fragilidades, suas dores e anseios. Estamos emocionalmente transformados, a ponto de não precisarmos reprimir essa afetividade, que ainda é escravizada pela cultura e a educação do macho. Já repararam que falamos e discutimos a homossexualidade cada vez mais? Um dos alicerces para tal emancipação da verdade é a atmosfera feminina.

Os homens estão explorando mais sua sexualidade, experimentando novos prazeres e se permitindo mais uma subjetividade e desejos adormecidos. Sensíveis, choram por um amor, sofrem por ciúmes e temem a rejeição. Precisam de aprovações. Eles querem ser bonitos, desejados, são vaidosos, deixam de ser egoístas no sexo. Estão aprendendo, enfim, a escutar os benefícios do diálogo. Intervenção das mulheres.

Muito se fala das mudanças masculinas, mas a metamorfose feminina acompanha esse momento entre os sexos. É nítida a emancipação e a autonomia delas. Homens, admitam, elas são guerreiras. Trabalham, cuidam de casa, dos filhos, dos maridos com maestria. Independentes e bem resolvidas, elas fazem acontecer. Talvez esta mesma autonomia, cada vez mais em evidência, seja o motivo de tantos crimes cometidos contra as mulheres, pois a sociedade ainda apresenta uma dificuldade muito grande em aceitar e se adaptar ao novo e já consolidado momento sociocultural.

Homens e mulheres apresentarão sempre diferenças, algumas imutáveis, mas a essência masculina e feminina são muito parecidas, porque experimentamos o fenômeno da igualdade. Neste sentido, somos bissexuais, e o melhor de refletirmos sobre tudo isso é que essa simbiose provoca uma constante aprendizagem, que tende a se ramificar, originando muitas outras vertentes sociais e metamorfoseando as relações interpessoais.

Proponho, inicialmente, pensar na bissexualidade, não na perspectiva do desejo sexual mas na maneira como cada um integra em seu caráter características masculinas e femininas e, num segundo momento, a questão mais importante: enaltecer esses fenômenos sociais e culturais como oriundos e proporcionados pelo universo feminino.

É notório que as diferenciações de gênero não têm a ver apenas com posicionamentos sexuais mas com aspectos construídos e perpetuados na história da humanidade. Paradigmas e tabus que, hoje, caem por terra. É preciso compreender que os opostos se completam. Atenuar as diferenças e aceitar cada vez mais as semelhanças é a realidade inevitável entre mulheres e homens.  O respeito e o crescimento individual acontecem à medida que colocamos essa nova percepção em prática.

Disponível em <http://www.jb.com.br/sociedade-aberta/noticias/2012/03/11/bissexualidade-praticada/>. Acesso em 13 mar 2012.

quarta-feira, 7 de março de 2012

Enfim, a emancipação masculina

Eliane Brum
27/02/2012 10h12 - Atualizado em 27/02/2012 10h50

Lembro de um evento psicanalítico ocorrido em Porto Alegre, anos atrás, sobre “Masculinidade”. De repente, apareceu um engenheiro por lá, adentrando o mundo dos psis. Ele queria entender, como homem, a sua falta de lugar no mundo. Não sei se conseguiu, mas sua presença foi um belo movimento para fora do território conhecido, onde as contas já não fechavam, rumo ao insondável. Ainda tateando sobre esse tema tão fascinante, penso que a melhor notícia para todos nós é a confusão sobre o lugar do homem. Sobre isso, Laerte Coutinho, entrevistado no Roda Viva(TV Cultura) de 20/2, fez uma grande observação: os homens nunca fizeram a revolução masculina.

Para começar, quem é Laerte? Se você não ouviu falar dele, está perdendo uma revolução encarnada numa pessoa. Antes, porém, é importante sublinhar que ele talvez seja o maior cartunista brasileiro. Para mim, é um gênio. E não é uma opinião solitária. Não aquele gênio banalizado dos manuais 171 vendidos nas livrarias, mas gênio mesmo, daqueles que nasce um a cada muitos e muitos e muitos anos. Só para recordar, são dele histórias em quadrinhos como “Piratas do Tietê” e personagens como Overman, Deus e Fagundes, o Puxa-Saco. A minha vida, pelo menos, seria mais pobre se eu não pudesse ler todo dia as tirinhas do Laerte publicadas na Folha de S. Paulo.

Em 2010, Laerte passou a se vestir de mulher – publicamente. Tipo ir à padaria de saia e meia-calça. Laerte se tornou ora ele, ora ela, ele/ela no mesmo corpo e na mesma cabeça. E, desde então, não para de dar entrevistas nas quais parte dos entrevistadores tenta, com certo grau de ansiedade, encaixá-lo/a em alguma definição. A novidade, no sentido libertador do novo, mesmo, é que Laerte se coloca para além das definições. Nem acho que cross-dresser (homem que gosta de se vestir de mulher – ou vice-versa – sem necessariamente ser gay) serve para enquadrá-lo/a. Acho que todos nós ganharíamos – “héteros, gays, bissexuais, transgêneros, travestis, transexuais, assexuais etc etc” – se abolíssemos a necessidade de caber em algum verbete. Seres humanos não são como aqueles jogos de montar para crianças pequenas, em que é preciso encaixar o retângulo no retângulo, o triângulo no triângulo e assim por diante. A única definição que vale a pena é justamente a indefinição. Sou aquele/a que é sem se dizer. Ou sou aquele/a que é sem precisar dizer o que é.

E essa é a novidade de Laerte, que é homem, é mulher, é masculino, é feminino e é também alguma coisa além ou aquém disso. Que se veste de mulher, mas fala e caminha como um homem. Que na infância gostava de costura e de futebol. Que vai jantar de saia e unhas vermelhas com uma namorada, mas pode também ter um namorado. Que enfia um pretinho básico sem se tornar efeminado. Que começa a entrevista de pernas cruzadas e, lá pelas tantas, se empolga e abre as pernas sem se importar que no meio delas more um pinto. Laerte é novo/a porque nos escapa. É um homem novo, mas também pode ser uma mulher nova.

Em janeiro, Laerte foi protagonista de uma polêmica ao ser repelido/a no banheiro feminino de uma pizzaria paulistana por uma cliente que se sentiu incomodada com sua ambígua figura. Surgiram então ideias esdrúxulas, como a de fazer um terceiro banheiro para os que não se enquadrariam nas definições tradicionais. Se o terceiro banheiro vingar, vou começar a frequentar os três, porque começo a achar uma afronta a exigência de que eu tenha de me definir para fazer xixi. Por agora, acho tão ultrapassado haver banheiros separados por qualquer coisa, que nem pretendo me estender nesse assunto. Era apenas para contar um pouco quem é Laerte para aqueles que ainda o/a estão perdendo. E desembarcar no tema que me interessa mais.

A certa altura da entrevista, ele/ela fez a seguinte observação: “Existiu a tal da revolução feminina, que é um dos marcos da humanidade. O que não aconteceu é a revolução masculina”. Laerte referia-se ao fato de que as mulheres já fizeram mil e uma rebeliões e continuam se batendo por aí. Marlene Dietrich, por exemplo, causou comoção por usar calças, mas isso em 1920! Quase um século depois, Laerte nos empapa de assombro por ir ao supermercado de saia. Isso diz alguma coisa, não?

Eu acho que não é nada fácil ser homem hoje em dia porque não se sabe o que seja isso. Mas, se essa dificuldade fez o engenheiro do primeiro parágrafo ousar se sentar na plateia de um seminário de psicanalistas para se entender, esta é também a melhor notícia possível para um homem. A princípio, os homens nunca precisaram fazer nenhuma revolução para conquistar direitos porque supostamente tinham todos eles garantidos desde sempre. Uma posição cômoda, mas apenas na aparência. Podiam fazer o que bem entendiam. Desde que fossem “homens”. E aí é que morava – e ainda mora, em muitos casos – a prisão. Podiam tudo, desde que fossem uma coisa só.

Ser forte e competitivo; sustentar a casa e a família; ter todas as respostas, muitas certezas e nenhuma dúvida; gostar de futebol e de vale-tudo; dar tapas nas costas do colega; falar bastante de mulher, mas jamais de intimidade; nunca demonstrar sensibilidades; dar mesada para a esposa; fazer o imposto de renda; resolver o problema do encanamento... Que peso incomensurável. Era isso ser homem por muitos séculos, sem falar nas guerras. E era preciso estar satisfeito com isso porque, afinal, você estava no topo da cadeia alimentar da espécie, ia reclamar do quê?

Acontece que, hoje, nenhuma das características citadas define o que é ser um homem. Assim como nenhuma característica – tradicional ou não – define o que é ser uma mulher. Do mesmo modo que a anatomia também não é mais capaz de definir o que é ser um homem e o que é ser uma mulher. E nem a escolha da carreira ou a posição na sociedade. Se há algo que define o que é ser um homem e o que é ser uma mulher, este algo está fora das palavras. E isso é o que torna Laerte fascinante: ele se apropriou da confusão e tornou-se a indefinição.

Graças às mulheres, e também aos homens que ousaram sair do armário (e aqui não me refiro somente à orientação sexual), os homens começam a autorizar-se a vagar sem rumo por aí, cada um do seu modo. Até porque não há caminhos já trilhados para seguir, já que não é mais possível apenas refazer os passos do pai ou do avô – nem é suficiente se contrapor totalmente a eles e segui-los pelo avesso. O que há são vidas a serem inventadas.

É claro que muitos homens se arrastam pelas ruas lamentando a perda de lugar. Sem saber o que fazer da existência nem de si, alguns arrotam alto ou espancam gays na tentativa pífia de mostrar que ainda sabem o que são. Perder o lugar e confundir-se não é fácil, não é mesmo. Mas é um espaço inédito de liberdade. É possível arrancar o terno de chumbo e descobrir que pele existe embaixo dele. E faz parte estar ainda em carne viva.

Acho que os homens alcançaram, finalmente, um começo de emancipação. E espero que as mulheres tenham a grandeza de estar à altura desses novos homens que começam a surgir. E enfiem a saudade do macho provedor na lata de material reciclável. Porque há muitas mulheres que ainda suspiram de nostalgia do macho provedor, mesmo se achando modernas e liberadas. Pode até ser que esse seja um bom arranjo para alguém, mas já não há garantias. Faz parte da jornada amorosa acolher a confusão dos homens que amamos porque tudo deve ser mesmo muito novo e muito assustador para eles.

Uma amiga contava, dias atrás, que seu marido passou uns tempos arrebatado pela agente do FBI da série americana “Fringe” (ótima, aliás!). Ocorre que Olivia Dunham, a dita agente, é uma loira linda, inteligente e destemida. E ocorre que o marido da minha amiga não estava encantado no sentido erótico convencional: ele não queria transar com Olivia Dunham, mas “ser” a agente do FBI.

Os leitores com menos imaginação e ainda presos ao velho mundo pensaram nesse instante: o cara é gay. Não, ele não é. Ele pode preferir transar com mulheres – e, no caso, faz minha amiga muito feliz – e se identificar com a agente Olivia Dunham como outros se identificam com os personagens sempre “muito machos” de Sylvester Stallone ou até com o Neymar. Há espaço para tudo. E para todos. Se podemos ter fantasias infinitas, para que se limitar, seja nós o que formos? Minha amiga, que é sábia, achou muito divertido. E, assim, teve a experiência de namorar Olívia Dunham algumas vezes. Ainda não é para qualquer um/a, mas que pena que não é.

Lembram da frase mítica? “Uma terra onde os homens são homens, e as mulheres são mulheres”. Ufa, o faroeste se foi e ninguém sabe bem o que é ser homem nem o que é ser mulher nos dias de hoje. E não, os homens também não são de Vênus, nem as mulheres de Marte. Ou será que era o contrário?

Se estivermos à altura do nosso tempo, descobriremos que há infinitas possibilidades – e não uma só – de sermos seja lá o que for. Como alguém disse no twitter: “Na vida, não limite-se. Laerte-se!”.

Disponível em <http://revistaepoca.globo.com/Sociedade/eliane-brum/noticia/2012/02/enfim-emancipacao-masculina.html>. Acesso em 29 fev 2012.

sábado, 28 de janeiro de 2012

Masculino e feminino na família contemporânea

Teresa Creusa de Góes Monteiro Negreiros e Terezinha Féres-Carneiro
Estudos e Pesquisas em Psicologia, UERJ, RJ, ano 4 N. 1, 1º semestre 2004


Resumo: Este trabalho tem como objetivo discutir questões referentes aos papéis de gênero nas relações familiares contemporâneas, onde coexistem o “modelo antigo” e o “modelo novo” de família, ressaltando a tensão existente nos registros identificatórios da “nova” mulher e do “novo” homem. Lançando mão de contribuições teóricas da psicologia social e da psicanálise, utilizamos os conceitos de papel, identidade, ideais, identificação e expectativas para compreender as mudanças na família e a transformação do masculino e do feminino na contemporaneidade.