João Ozorio de Melo
7 de setembro de 2012
Em uma decisão inédita nos EUA, que está causando furor nos
ânimos conservadores do país e perplexidade no sistema prisional, um juiz
federal de Boston ordenou às autoridades de Massachusetts que mandem fazer uma
cirurgia de troca de sexo em um detento condenado à prisão perpétua, sem
direito a liberdade condicional, pelo assassinato de sua mulher em 1990. E que
paguem a conta com recursos públicos, segundo o Law Blog e a CBS News (com a
AP).
O juiz Mark Wolf, um conservador indicado pelo ex-presidente
Ronald Reagan, classificou sua própria decisão como "sem
precedentes". Mas argumentou que ela se sustenta na Constituição e em
recomendações médicas. "Essa é a única maneira de proporcionar um tratamento
médico adequado" a Michelle Kosilek (que antes era Robert), escreveu o
juiz, com base em recomendações de médicos do Departamento de Correções do
estado.
Em sua decisão de 126 páginas, o juiz disse que negar a
cirurgia a Kosilek seria uma violação da 8ª Emenda da Constituição dos EUA, que
proíbe punição cruel.
Os tribunais americanos têm ordenado às autoridades das
prisões que avaliem os detentos transgêneros, para determinar suas necessidades
de tratamento médico. Em geral, têm recomendado tratamento com hormônios e
psicoterapia. O juiz Mark Wolf foi o primeiro a ordenar a cirurgia de troca de
sexos em um prisioneiro.
"Não seria normal tratar um prisioneiro, que sofre um
grave distúrbio de identidade de gênero, diferentemente de inúmeros detentos
que sofrem de formas mais familiares de doença mental", ele escreveu.
"As autoridades prisionais não podem deixar de fazê-lo só porque o
distúrbio de identidade de gênero é uma doença mental não entendida pelo
público, em geral, e que requer um tratamento que é impopular", declarou.
A decisão baseada na lei e nas recomendações médicas de Wolf
criou um desconforto político no país. O próprio juiz reconheceu, em sua
decisão, que Kosilek, um assassino condenado, vai receber um tratamento que é
negado aos cidadãos cumpridores da lei. Os seguros-saúde não cobrem esse tipo
de cirurgia e muitos americanos não dispõem de recursos para fazê-la. A
cirurgia do prisioneiro vai custar cerca de US$ 20 mil, diz a rede CBS de
televisão.
Na verdade, cerca de 40 milhões de americanos não dispõem de
seguro-saúde. Segundo uma reportagem do New York Times, mais de 3 mil pessoas
morrem no país, a cada duas semanas, por não disporem de seguro-saúde. Isso
equivale a um 11 de setembro a cada duas semanas, disse o jornal.
"Pode parecer estranho que os cidadãos dos Estados
Unidos não têm, geralmente, o direito constitucional ao tratamento médico
adequado, mas a 8ª Emenda da Constituição garante aos prisioneiros tal
tratamento", ele escreveu. E ressaltou que a Suprema Corte dos EUA
decidiu, em 2011, que os prisioneiros têm direito a nada menos do que é
compatível com o conceito de dignidade humana.
As autoridades prisionais se opuseram à cirurgia, com o
argumento de que não poderiam garantir a segurança ao prisioneiro, se ele
trocasse de sexo. Kosileck paga sua pena em uma prisão masculina em Norfolk,
Massachusetts. As autoridades também disseram que não sabem onde vão encarcerar
Kosilek depois da cirurgia. O juiz refutou esses argumentos, dizendo que são
apenas pretextos para não lidar com o problema. Aliás, disse o juiz, onde a
cirurgia vai ser feita e onde Kosilek vai ficar depois da cirurgia é problema
do sistema prisional.
Disponível em
http://www.conjur.com.br/2012-set-07/juiz-manda-cirurgia-troca-sexo-prisioneiro-eua.
Acesso em 24 set 2013.
Pensava que era somente no Brasil que políticos e criminosos levavam vantagem.
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