G1
08/03/2014
Um dos maiores desejos da agente de prevenção Riany
Rodrigues Sabará, de 21 anos, é ganhar uma flor no Dia Internacional da Mulher. A entrega de rosas é algo corriqueiro em ambientes
de trabalho e até nas ruas durante a data, mas a jovem nunca foi presenteada.
Riany é transexual e se prepara para a fazer a readequação genital, conhecida
como cirurgia de troca de sexo. Apesar de se encarar como uma mulher, ela ainda
enfrenta a falta de compreensão das pessoas quando o assunto é identidade de
gênero.
Desde outubro de 2012, Riany sai de Piracicaba (SP), onde
vive e trabalha, e vai a São Paulo (SP) todas as sextas-feiras para receber
tratamento psiquiátrico e psicológico no Hospital das Clínicas pela primeira
fase de preparação para a cirurgia, que ainda não tem data para acontecer.
Nesta etapa, os transexuais passam por consultas e discussões em grupo sobre o
desejo de realizar a cirurgia, traumas e tudo que envolve o processo de
alteração dos órgãos genitais.
"Desde os 17 anos procuro maneiras de realizar a
cirurgia e há dois anos consegui o tratamento, mas não tem sido fácil. Depois
do período com os psicólogos, vou passar pela parte física com o uso de
hormônios para interromper a produção hormonal masculina e colocar a feminina
no lugar e depois virá a cirurgia", contou.
Para Riany, a cirurgia irá apenas "oficializar" a
sua identidade. "Já me sinto uma mulher desde que nasci. Quando eu era
pequena, olhava no espelho e não reconhecia o garoto no reflexo como sendo eu.
Acho que depois da cirurgia ninguém mais vai poder me impedir de ir ao banheiro
feminino, não vão usar mais o meu nome de batismo nas repartições públicas e
nem dizer que não sou mulher", disse.
A mãe, segundo Riany, é uma das pessoas que mais apoia o
processo que antecede a cirurgia. "Ela criticava, mas aí um dia eu falei
pra ela: 'imagina se você tivesse um pênis no meio das pernas? É assim que eu
me sinto.' Depois disso ela começou a me ajudar com passagem e até mesmo com
dinheiro para as viagens", contou.
Riany trabalha na Organização Não-Governamental Centro de
Apoio e Solidariedade à Vida (Casvi) no projeto Esquinas da Noite, que faz
trabalho de prevenção com garotas de programa (travestis, transexuais, homens e
mulheres). Antes da instituição, já foi faxineira e babá. Com o dinheiro das
limpezas ela fez a primeira modificação corporal efetiva, quando colocou
silicone nos seios.
Preconceito
O banheiro é, segundo Riany, uma das maiores "resistências"
do preconceito na sociedade. Desde a época da escola, quando passou a usar
roupas e acessórios femininos, a jovem protagoniza discussões pelo simples fato
de usar o banheiro.
"No colégio, eu usava o banheiro feminino escondida e
ainda hoje tenho problemas para usar banheiros públicos. Eu fui faxineira dos
terminais de ônibus e entrava e saía dos banheiros. Depois que mudei de
emprego, os guardas não me deixam mais entrar no feminino. É uma
humilhação", disse.
A perseguição na escola, a resistência e a indiferença de
familiares e o preconceito nas ruas já fizeram a transexual até mesmo pensar em
suicídio na adolescência. Apesar de não pensar mais na morte como alternativa,
ela ainda considera difícil se "encaixar no mundo". "Às vezes eu
penso que nesse mundo não tem lugar pra mim. Em lugar nenhum."
Dia da Mulher
Riany contou que chega a ser parabenizada no 8 de março, mas
nunca recebeu flores. O gesto, aliás, nunca aconteceu com ela nem mesmo em
outras ocasiões. "Quem não gosta de flores? Mas eu nunca tive uma relação
séria, é muito difícil para um homem assumir que namora uma trans, pois eles se
importam muito com a opinião dos outros."
Disponível em
http://g1.globo.com/sp/piracicaba-regiao/noticia/2014/03/transexual-que-espera-cirurgia-sonha-em-ganhar-flores-pelo-dia-da-mulher.html.
Acesso em 15 mar 2014.
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