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quarta-feira, 9 de outubro de 2013

O Rorschach e a função materna no sujeito transexual

Nadja Tröger; Catarina Bray Pinheiro
Análise Psicológica (2009), 3 (XXVII): 319-330

Resumo: O presente artigo visa analisar, à luz do método Rorschach e numa perspectiva psicodinâmica, a função materna no sujeito transexual e, implicitamente, a bissexualidade psíquica, ambas mediatizadas na relação entre a mente e o corpo. A função materna é concebida no seio do modelo bioniano ♀♂, que permite explorar a dialéctica operante entre o interno e o externo, o Eu e o Outro, o masculino e o feminino. O método Rorschach é perspectivado na sua dimensão intersubjectiva e dinâmica, de acordo com os argumentos teóricos formulados por M. E. Marques, dimensão essa que viabiliza a análise da actividade simbólica. A elaboração dos procedimentos procura, assim, integrar as dialécticas supramencionadas na relação ♀♂. É neste contexto que se inscreve a aplicação do Rorschach a dois sujeitos transexuais (MF e F-M, respectivamente). Os protocolos revelam uma busca contínua de um continente coeso na realidade externa e a dificuldade de articular o duplo no espaço mental. Verificam-se, por conseguinte, movimentos disruptivos nos eixos analisados, bem como dificuldades acrescidas de diferenciação entre o feminino e o materno. A articulação ♀♂ dá conta da não-consolidação da identidade, representando a transformação corporal a solução identitária numa realidade externa.



sábado, 5 de outubro de 2013

"Prostituição entre travestis é necessidade e não opção", diz fotógrafa carioca

Igor Zahir
01/10/2013

É com frequência que as pessoas relacionam travestis com prostituição de rua. Muita gente, ao falar do assunto, menciona de imediato a cena que se transformou em marca registrada: homens com trajes femininos (e corpos muitas vezes modificados a base de hormônios) nas esquinas, esperando clientes em busca de sexo.

O que esquecem é que, por trás disso, há pessoas com vida própria, que além de serem travestis, cuidam de casa, têm um cotidiano como qualquer outro e lutam por igualdade social. Pensando assim, a fotógrafa carioca Ana Carolina Fernandes criou a série “Mem de Sá, 100”. O projeto nasceu depois de quase três anos de observação da rotina das travestis num casarão antigo na Lapa, no Rio de Janeiro. A série, que já ficou exposta no Rio, ganha agora uma mostra na DOC Galeria, em São Paulo, a partir do dia 1º de outubro, com curadoria de Eder Chiodetto. Marie Claire conversou com Ana sobre “Mem de Sá, 100”:

Marie Claire: Quando surgiu a ideia de fazer essa série e com qual objetivo?
Ana Carolina Fernandes: Tudo começou há uns 10 anos. Através de um amigo em comum, conheci a Luana Muniz, travesti de grande influência no Rio de Janeiro, sobretudo na Lapa. Ela me convidou para ir a um show de transformistas em um clube no qual se apresentava. Fui, fiquei fascinada por aquela estética, mas na época trabalhava como correspondente do jornal "Folha de S. Paulo" no Rio e não me sentia capaz de desenvolver o projeto com o envolvimento que gostaria de ter. Fiquei amiga da Luana, nos encontrávamos às vezes e, em 2008, saí do jornal. Em 2010, nos encontramos para um café, a Luana me levou para conhecer o casarão onde ela alugava quartos para cerca de 25 travestis na Lapa e decidi que daria início ao projeto. Sempre tive fascínio pelas travestis, pela estética e universo curiosos (até então bastante desconhecidos para mim). Mas meu interesse era retratar o cotidiano, não a vida de prostituição. Em fevereiro de 2011, dei início à série.

MC: Como era a rotina de fotos?
Ana: A ideia inicial era que eu ficasse em um quarto vazio na casa, para dormir e acordar por lá. Mas isso não foi possível, pois o quarto foi alugado. Então a Luana me deu passe livre, para entrar e sair quando quisesse. Eu ia 3, 4 vezes na semana. Passava 2 semanas sem ir. Não era algo regrado, com prazo. O trabalho foi acontecendo à medida que eu estava lá. Nada foi pré-concebido, nem a ideia de virar exposição. Quando tive as fotos em mãos, mostrei para o Eder Chiodetto, que havia sido meu editor na Folha, ele adorou e passou a ser não só curador como também meu orientador no projeto.

MC: As travestis carregam em sua estética traços masculinos e femininos. Você acha que por clicá-las em suas rotinas diárias, ao invés de seu trabalho nas ruas, essas características ficaram mais aparentes?
Ana: Sem dúvida. Esse era o principal objetivo. Geralmente os fotógrafos, quando estão fazendo trabalhos humanistas, querem dar uma voz a esses grupos. Mas eu tinha interesse em dar um corpo, e não voz. O que queria era mostrar a dualidade, a beleza e a sensualidade que tinha certeza de que existia. Senti necessidade de mostrar essa relação “masculino-feminino” que as travestis trazem, seja na alma ou no corpo. A intimidade do convívio, com certeza, facilitou meu objetivo.

MC: Elas ainda lutam por igualdade social ou já não sofrem tanto preconceito como antes?
Ana: Sofrem muito, sim. A Lapa é uma espécie de gueto, de refúgio das travestis. Mas você não vê tanto elas fora dali. A sociedade ainda discrimina muito e a própria família também. É muito comum que os parentes as coloquem para fora de casa e não as aceitem. Sofrem preconceito, são olhadas de banda. É um universo à parte.

MC: É um mundo paralelo...
Ana: Com certeza. Tanto que algumas vão para a Europa, trabalham, mas são poucas. Nem todas sobrevivem emocionalmente porque, além de viverem à margem da sociedade, vivem num mundo com violência, drogas, HIV.

MC: Drogas e prostituição são realidade dessas travestis?
Ana: Todas as meninas que fotografei são prostitutas. Quanto às drogas e ao HIV, são coisas tristes, porém presentes na vida de muitas. Afinal, elas são prostitutas que, querendo ou não, acabam sujeitas ao risco, além de não realizarem um acompanhamento médico constante. Elas não têm dinheiro para médicos particulares. A Luana até luta com uma ONG por essa causa. Ela consegue com pessoas famosas e anônimas um apoio maior para ajudar as travestis nessa questão da saúde. É algo muito triste porque, quando são bonitas e bem cuidadas, tem quem queira. Quando estão acabadas pela AIDS ou pelas drogas, ficam jogadas. O resultado é abandono e degradação.

MC: As travestis que você clicou fizeram cirurgia de mudança de sexo?
Ana: Não. Elas tomaram hormônios, colocaram silicone, se vestem e agem como mulher. Mas, no trabalho delas, funciona até aí. Os homens que as procuram (muitas vezes, ricos, heterossexuais e casados) querem transar com alguém que tenha características de mulher, mas que na verdade sejam homens.

MC: Qual o maior sonho delas?
Ana: Encontrar um amor. Casar, ter uma vida digna como a de qualquer outra pessoa. Inclusive cliquei uma com um travesseiro com o nome “Cinderela”. Elas têm esse sonho de princesa: alguém que chegue e as tire dessa vida atual.

MC: Então a prostituição, no caso delas, é uma necessidade?
Ana: Sim, claro. Prostituição das travestis é totalmente necessidade e não opção. Não existe emprego para travestis em outra área. Poucas estudaram mais do que o 2º grau. Não fizeram faculdade. Não tem essa parte de educação, até porque muitas vêm de zonas pobres. Já vi casos delas trabalharem em outras profissões, enquanto não sabiam da condição delas. Quando se assumiram, perderam o rabalho. É uma situação muito difícil, delicada, e elas precisam se manter de alguma forma. Já basta não terem o apoio da família. A prostituição é uma das poucas opções que restam.

MC: Enquanto você fazia essa série, alguma história te marcou?
Ana: Duas travestis tinham um relacionamento amoroso há 2 anos e queriam formar uma família. Quer dizer, eram dois homens, que na verdade eram duas mulheres, que se relacionavam e não se consideravam homossexuais e ainda queriam adotar uma criança, formar uma família. Outra que me marcou foi uma que acabou morando na rua, mesmo após ter tido carro e vivido na Europa. Chegou ao fundo do poço por causa das drogas. Houve também um caso de uma travesti que morreu de AIDS e a família não queria deixar ela ser enterrada como mulher. A Luana teve que brigar com a família da garota, pois ela sabia que ia morrer, e afirmou em vida que queria ser enterrada como mulher.

MC: Você acha que a série vai conscientizar as pessoas e diminuir o preconceito?
Ana: Acredito que sim. Esse trabalho teve uma enorme aceitação aqui no Rio, apareceu até em uma revista norte-americana. Só espero que, com isso, as pessoas abram mais a mente, não tenham ideias tão pré-concebidas sobre a sexualidade alheia. Acho que estou, sim, conseguindo isso. Afinal, estamos em 2013, não cabe mais tanto preconceito no mundo, é um absurdo!


Disponível em http://revistamarieclaire.globo.com/Mulheres-do-Mundo/noticia/2013/10/prostituicao-entre-travestis-e-necessidade-e-nao-opcao-diz-fotografa-carioca.html. Acesso em 02 out 2013.

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Homens preferem mulheres vestidas de vermelho, diz estudo

Folha Online  
02/05/2012

As roupas vermelhas sempre foram tidas como uma forma de deixar as mulheres mais atraentes para os olhares dos homens e um estudo publicado no "Journal of Social Psychology" deu uma possível razão para isso.

Após entrevistar 120 homens com idade entre 18 e 21 anos, um grupo de psicólogos descobriu que, para eles, mulheres com roupas vermelhas são mais fáceis de levar para a cama no primeiro encontro.

Segundo os entrevistados, quando elas vestem vermelho demonstram uma "maior intenção sexual" do que quando usam cores mais neutras.

De acordo com o jornal britânico "The Telegraph", não é nem mesmo necessário que a roupa seja muito reveladora para que seja julgada dessa maneira pela mente masculina, até mesmo uma simples camiseta funciona assim.

Os pesquisados tiveram de olhar fotos de mulheres com tops nas cores vermelho, branco, azul e verde, e julgaram quais delas eram mais atraentes e quais topariam fazer sexo mais facilmente.

Depois do vermelho, a ordem das cores em que as mulheres estariam mais propensas a topar a proposta foi azul, verde e, por último, branco.

"Estudos têm demonstrado que o vermelho está ligado ao amor romântico e ao desejo, assim como a fertilidade feminina", diz o estudo feito pela University of South Brittany.


Disponível em http://f5.folha.uol.com.br/estranho/1084434-homens-preferem-mulheres-vestidas-de-vermelho-diz-estudo.shtml. Acesso em 03 ago 2013.

quarta-feira, 31 de julho de 2013

Qual o sexo do seu cérebro? Concepções de gênero, sexualidade e desvio em biomédicas contemporâneas

Marina Nucci
Diásporas, Diversidades, Deslocamentos
23 a 26 de agosto de 2010

Resumo: “Qual é o sexo do seu cérebro?”. Para responder a esta pergunta – tão inquietante e direta – não se leva mais do que cinco minutos. É este o tempo de preenchimento de um “teste de determinação do sexo cerebral”, que pode ser encontrado com facilidade em diversos sites na internet, publicado originalmente por uma das principais revistas de divulgação científica no Brasil. Vinte questões com respostas simples – “sim” ou “não” – sobre hábitos, características e preferências, conferem o resultado capaz de situar o cérebro de uma pessoa em um continuum de masculinidade e feminilidade. Quanto menor o resultado do teste, mais “masculino” seria o cérebro; um escore mediano indica um cérebro “misto”, ou seja, tanto “feminino” quanto “masculino”. Já no caso de se conseguir o número máximo de pontos, vinte, – respondendo afirmativamente a questões como “Geralmente resolvo problemas com mais intuição do que com a lógica”, “Acho fácil saber o que uma pessoa está sentindo só de olhar para seu rosto” e negativamente a “Quando criança gostava de subir em árvores” ou “Fico entediado facilmente” – é sinal de que o cérebro em questão é “muito feminino”. Mas o que quer dizer ter um cérebro “muito feminino”? Ou mesmo “pouco feminino” ou “misto”? Qual a importância do corpo – especificamente, do cérebro – e qual a importância do biológico e do “inatismo” neste cenário?

quinta-feira, 25 de julho de 2013

Cientistas criam espermatozóide a partir de célula feminina

BBC BRASIL
31/01/08

Cientistas britânicos afirmam ter criado espermatozóides a partir de células-tronco da medula óssea feminina - abrindo caminho para o fim da necessidade do pai na reprodução.

A experiência vem sendo desenvolvida por especialistas da Universidade de New Castle que, em abril do ano passado, anunciaram ter conseguido transformar células-tronco da medula óssea de homens adultos em espermatozóides imaturos.

Em entrevista à última edição da revista New Scientist, Karim Nayernia, um dos pesquisadores envolvidos no estudo, disse que agora os cientistas repetiram a experiência com células-tronco da medula óssea de mulheres, podendo "abrir caminho para a criação do espermatozóide feminino".

No trabalho, ainda não publicado, Nayernia disse à New Scientist estar esperando a "permissão ética" da universidade para dar continuidade ao trabalho, que consistiria em submeter os espermatozóides primitivos à meiose, um processo que permitiria a maturação do espermatozóide, tornando-o apto para a fertilização.

"Em princípio, eu acredito que isso seja cientificamente possível", disse Nayernia.

O estudo, afirma a revista, poderia possibilitar que um dia, casais de lésbicas poderão ter filhos sem a necessidade de um homem, já que o espermatozóide de uma mulher poderia fertilizar o óvulo da outra.

Brasil

A New Scientist ainda relata uma experiência que está sendo realizada por cientistas brasileiros no Instituto Butantan, em São Paulo.

Segundo a revista, os especialistas estariam desenvolvendo óvulos e espermatozóides a partir de uma cultura de células-tronco embrionárias de ratos machos.

A revista cita o trabalho publicado pelos brasileiros na revista especializada Cloning and Stem Cells (Clonagem e células-tronco, em tradução literal), em que os pesquisadores disseram ainda não ter provado que os óvulos masculinos poderão ser fertilizados e procriar.

"Estamos agora começando experimentos com células-tronco embrionárias humanas e, se bem-sucedidos, o próximo passo será ver se óvulos masculinos poderão ser feitos a partir de outras células", disse a coordenadora da pesquisa, Irina Kerkis.

Essas outras células, que se comportariam de maneira semelhante às embrionárias, poderiam ser encontradas na pele humana, afirma a revista.

Isso abriria a possibilidade para que casais gays masculinos também tenham filhos com 100% de seu material genético.

Nesse caso, um dos homens doaria células de sua pele, que seriam transformadas em um óvulo a ser fecundado pelo espermatozóide do parceiro.

Uma vez fertilizado, o óvulo seria implantado no útero de uma mulher.

"Eu acredito que isso seja possível, mas não sei como as pessoas encarariam isso de forma ética", disse Kerkis.


Disponível em http://g1.globo.com/Noticias/Ciencia/0,,MUL281510-5603,00-CIENTISTAS+CRIAM+ESPERMATOZOIDE+A+PARTIR+DE+CELULA+FEMININA.html. Acesso em 25 jul 2013.

sábado, 8 de junho de 2013

'Transexualidade deve ser vista como característica', diz psicólogo

G1
15/10/2011

“A transexualidade não pode ter existido antes do século 19”. A afirmação é do psicólogo Rafael Cossi, autor do livro Corpo em Obra. Transexual é a pessoa que biologicamente pertence a um sexo, mas se identifica com o gênero que não corresponde a ele.

“Foi só no Século 19 que surgiu a ideia de que masculino e feminino são radicalmente opostos e tem que haver uma correspondência entre corpo e gênero”, aponta Cossi. Segundo o pesquisador, não havia essa relação antes, e a identidade de gênero não precisaria acompanhar o sexo da pessoa. “Isso [a identificação por gênero] é totalmente uma construção social”, acredita.

Cossi conta que, desde então, a psicanálise tenta definir o que leva uma pessoa a se identificar com um gênero que seria oposto. Ele diz que uma das linhas de pensamento vê a transexualidade como uma forma de psicose, quadro que inclui alucinações e delírios.
“Isso não é necessariamente um delírio”, diz o psicólogo. “Não dá para reduzir a transexualidade à psicose”. Para ele, a transexualidade tem que ser vista simplesmente como uma característica.

“Eu acredito que, assim, essas pessoas vão ter mais liberdade, com menos preconceito, viver melhor”, diz o pesquisador.

O livro Corpo em Obra foi baseado na dissertação de mestrado de Cossi no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IPUSP). No trabalho, o autor analisou seis biografias de transexuais.


Disponível em http://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2011/10/transexualidade-deve-ser-vista-como-caracteristica-diz-psicologo.html. Acesso em 04 jun 2013.

domingo, 16 de dezembro de 2012

Homossexualidade pode ser influenciada pela epigenética

Ricardo Carvalho
12/12/2012

Do ponto de vista evolutivo, o fato de a homossexualidade ser algo bastante comum na sociedade humana, ocorrendo em cerca de 5% da população mundial, é intrigante. Como homossexuais produzem menos prole do que heterossexuais, uma possível variação genética relacionada à homossexualidade dificilmente seria mantida ao longo das gerações. "Isso é muito enigmático a partir de uma perspectiva evolucionária: como a homossexualidade pode existir em uma frequência tão alta a despeito do processo de seleção natural?", diz em entrevista ao site de VEJA Urban Friberg, do departamento de Biologia Evolutiva da Universidade de Uppsala, na Suécia. Friberg, ao lado de William Rice, da Universidade da Califórnia em Santa Bárbara, e Sergey Gavrilets, da Universidade do Tennessee, ambas nos Estados Unidos, pode ter encontrado uma resposta: o fator biológico ligado à homossexualidade não estaria na genética propriamente dita, e sim em um conceito conhecido por epigenética. Os resultados foram publicados nesta terça-feira no periódico científico The Quarterly Review of Biology

A epigenética trata de modificações no DNA que sinalizam aos genes se eles devem se expressar ou não. Esses marcadores não chegam a alterar nossa genética, mas deixam uma marca permanente ao ditar o destino do gene: se um gene não se expressa, é como se ele não existisse.

CONHEÇA A PESQUISA

Título original: Homosexuality as a Consequence of Epigenetically Canalized Sexual Development.

Onde foi divulgada: The Quarterly Review of Biology

Quem fez: William Rice, Urban Friberg e Sergey Gavrilets

Instituição: Universidade da Califórnia em Santa Bárbara, Universidade de Uppsala e Universidade do Tennessee.

Resultado: O artigo estudou um possível componente hereditário para, a partir de um ponto de vista evolutivo, explicar a homossexualidade. Os três autores montaram um modelo segundo o qual uma marca epigenética (epimarca), que regula a sensibilidade à testosterona em fetos, pode ser transmitida de mãe para filho e de pai para filha e influenciar na orientação sexual.

Essa nova teoria vai ao encontro de outra tese mais antiga, a de que a homossexualidade é definida, ao menos em parte, por um componente hereditário. Pelo menos quatro grandes estudos, publicados em 2000, 2010 e 2011, nos periódicos Behavior Genetics, Archives of Sexual Behavior ePLoS ONE, apontam para esse fator na origem da orientação sexual, a partir de estudos com gêmeos monozigóticos (também chamados de idênticos ou univitelinos, produtos da fertilização de um único óvulo) e dizigóticos (também chamados de fraternos ou bivitelinos, produtos da fertilização de dois óvulos diferentes). 

Epigenética — Imagine o material genético humano como um manual de instruções. Os genes formariam o conteúdo do livro, enquanto as epimarcas ditariam como esse texto deveria ser lido. "A epigenética altera e regula a forma como os genes se expressam", explica a geneticista Mayana Zatz, do departamento de Genética e Biologia Evolutiva da Universidade de São Paulo (USP). É por meio dos comandos epigenéticos, por exemplo, que o pâncreas fabrica apenas insulina, apesar de as células nesse órgão terem genes para a produção de muitos outros hormônios.

Acreditava-se que os traços da epigenética não eram hereditários, sendo apagados e recriados a cada passagem de geração. Como pesquisas nas últimas décadas mostraram que uma fração de epimarcas é, sim, passada de pais para filhos, Friberg, Rice e Gavrilets julgaram ter encontrado a peça que faltava para montar o quebra-cabeça. 

Sensibilidade – Os três criaram um modelo segundo o qual uma dessas epimarcas transmitidas hereditariamente é o marcador responsável por regular a sensibilidade à testosterona de fetos no útero materno. Ao longo da gestação, tanto fetos masculinos quanto femininos são expostos a quantidades variadas do hormônio, sendo que o fator epigenético estudado no artigo torna o cérebro dos meninos mais sensíveis à testosterona quando os níveis estão abaixo do normal. Isso acontece para preservar características masculinas, podendo inclusive influir na orientação sexual. O mesmo ocorre, mas inversamente, com as meninas. Quando a testosterona está acima do normal, a epimarca funciona como uma barreira, diminuindo sua sensibilidade ao hormônio. 

A partir desse modelo, a homossexualidade poderia ser explicada pela transmissão de epimarcas sexualmente antagônicas. Ou seja: quando o pai transmite seus marcadores, que tiveram a função de torná-lo mais sensível à testosterona, para uma filha. De igual maneira, esse material hereditário pode ser passado de uma mãe para um filho, tornando-o menos sensível à testosterona.

"Quando os efeitos desse mecanismos (que regulam a sensibilidade à testosterona) não são apagados entre as gerações, eles se expressam na prole do sexo oposto. Isso pode resultar em indivíduos que desenvolvem preferências sexuais pelo mesmo sexo", explica Friberg, da Universidade de Uppsala. "O que fizemos foi colocar pela primeira vez o conceito da transmissibilidade epigenética no contexto de desenvolvimento sexual."

O pesquisador faz questão de ressaltar que ainda não se pode provar que a epimarca específica da sensibilidade à testosterona é hereditária. Para tanto, testes específicos precisarão ser realizados. "Uma grande solidez do nosso estudo é que o modelo epigenético para a homossexualidade faz predições que são testáveis com tecnologia já existente. Se o nosso modelo estiver errado, pode ser rapidamente descartado", escrevem os autores no artigo do The Quarterly Review of Biology.

Outro pesquisador envolvido, Sergey Gavrilets, da Universidade do Tennessee, afirma que mesmo que a teoria da hereditariedade seja respaldada por futuros estudos, o debate está longe de acabar. "A hereditariedade explica apenas parte da variação na preferência sexual. As razões, que podem ser sociais, culturais e do ambiente, permanecerão como um tópico de intensa discussão." 

"Estudo positivo" – Carmita Abdo é coordenadora do Programa de Estudos em Sexualidade da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Ela destaca que a nova pesquisa é positiva, uma vez que contribui para a melhor compreensão dos fatores biológicos envolvidos na ocorrência da homossexualidade. "O trabalho é importante porque reforça uma ideia cada vez mais prevalente: a de que a genética — no caso a epigenética — tem influência sobre a orientação sexual."

Essa compreensão científica tem sido importante, segundo Carmita, no combate a mitos que envolveram o tema e que alimentaram interpretações preconceituosas. "Até pouco tempo atrás, achava-se que a orientação sexual era proveniente de uma escolha, como se deliberadamente o indivíduo optasse por ser homossexual. Muito do preconceito contra os homossexuais advém daí", afirma, lembrando que até o início dos anos 90 a homossexualidade era tratada como um transtorno de preferência, e não como uma característica. "Observar um fenômeno pelas lentes da ciência muda a compreensão e ajuda a deixar de lado certas discriminações. Nesse caso em particular, você remove da equação a ideia de que o homossexual é responsável por uma opção que muitos veem como negativa, pejorativa."

Ela ressalva, entretanto, que ainda existe muita incerteza no campo e que a orientação sexual precisa ser encarada como produto de vários fatores. "O estudo reforça a ideia segundo a qual existe uma predisposição que vai ser confirmada ou não a partir de uma serie de influências que vão ocorrer ao longo da vida, algumas delas de ordem cultural, educacional e social. Ele não consagra uma interpretação determinista, nem diz que tudo depende dos genes".

"Nosso objetivo é entender como as preferências sexuais se desenvolvem e evoluem"
Urban Friberg - Professor do Departamento de Biologia Evolutiva da Universidade de Uppsala, na Suécia

Qual o principal objetivo da pesquisa?
Assume-se que indivíduos homossexuais produzem menos prole do que heterossexuais. Qualquer codificação genética para homossexuais deveria, portanto, ser rapidamente removida no processo de seleção natural. Apesar disso, a homossexualidade é relativamente comum entre humanos (cerca de 5%). Além do mais, os melhores estudos disponíveis mostram que há um componente hereditário na homossexualidade. Isso tudo é muito intrigante de uma perspectiva evolucionária: como a homossexualidade pode existir em frequências tão significativas apesar da seleção contra ela? O objetivo da nossa pesquisa foi simplesmente tentar resolver esse enigma, o que nos ajuda a entender como as preferências sexuais se desenvolvem e evoluem.

Como a mudança de foco de genética para a epigenética pode ser explicada?
Nossa principal contribuição é trazer uma explicação lógica para o porquê de a homossexualidade ser algo tão frequente – e para tanto nós mudamos o foco, como causa da homossexualidade, de genes para epimarcas. Nossa teoria sugere que a homossexualidade é resultado de um mecanismo que ajuda as pessoas a desenvolver a preferência por indivíduos do sexo oposto. Quando os efeitos desses mecanismos (epimarcas) não são apagados entre as gerações, eles se expressam na prole do sexo oposto. Isso pode resultar em indivíduos que desenvolvem preferências sexuais pelo mesmo sexo.

Como a comunidade científica lida com genética e homossexualidade?
Houve diversos estudos nos quais os pesquisadores tentaram encontrar genes associados com a homossexualidade. Tais estudos falharam e nenhum gene foi identificado. O resultado disso tudo é intrigante, uma vez que a homossexualidade tem um componente hereditário. Nossa teoria, porém, é capaz de explicar por que a homossexualidade é tão comum e tem um componente hereditário, sem nenhuma codificação genética para esse traço.

Encontrar uma possível explicação biológica ajuda a combater o preconceito?
Atualmente, algumas pessoas acreditam que a homossexualidade é uma escolha pessoal e que indivíduos homossexuais podem ser ensinados a escolher de forma diferente a sua orientação sexual. Eu acredito que encontrar as raízes da preferência sexual mina tais mitos e ajuda as pessoas a melhor entender e aceitar a homossexualidade.

Disponível em http://veja.abril.com.br/noticia/ciencia/homossexualidade-pode-ser-influenciada-pela-epigenetica. Acesso em 14 dez 2012.

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Perigo para elas

Emily Anthes

Por muito tempo a dependência química tem sido considerada uma doença masculina. Aspectos culturais e sociais que propiciavam o acesso dos homens ao álcool e às drogas levaram a crer que eles são muito mais propensos a usar esses produtos. Em parte por esse motivo, há décadas as pesquisas sobre o assunto excluíam mulheres. Consequentemente, sabe-se hoje bem menos sobre a drogadição feminina, e, na prática, os programas e centros de tratamento raramente são voltados para as necessidades. Bem pouco foi considerada, por exemplo, a influência da variação hormonal no sucesso (ou fracasso) do processo de recuperação. No entanto, há sinais de que a predominância de estudos com voluntários homens tenda a diminuir, já que o uso de bebidas e substâncias ilícitas se tornou socialmente mais aceitável tanto por adolescentes quanto por mulheres adultas. Segundo estudo de 2008, desenvolvido pelo psiquiatra Richard A. Grucza, da Universidade de Washington em St. Louis, nos Estados Unidos, é na população feminina que o uso de bebidas e drogas mais tem aumentado. 

Em uma inversão das tendências predominantes no passado, adolescentes estão agora experimentando maconha, álcool e cigarros em índices mais elevados que os garotos, de acordo com os recentes resultados de uma pesquisa realizada pelo National Survey on Drug Use and Health (NSDUH), nos Estados Unidos. O estudo mostra que o uso geral de drogas ilícitas entre as moças aumentou em torno de 6% em 2007 e 2008, enquanto o índice para os jovens do sexo masculino caiu cerca de 10%. 

Além disso, uma literatura cada vez mais consistente sobre a dependência do sexo feminino mostra que as mulheres apresentam características bastante específicas. De forma singular, elas podem ser particularmente vulneráveis ao uso de substâncias que criam dependência e aos seus efeitos, pois os hormônios sexuais femininos afetam diretamente os circuitos de recompensa do cérebro, influenciando a resposta a drogas. Felizmente, alguns estudos já apontam para novos tratamentos para a toxicomania, além de fornecer informações práticas para as pessoas empenhadas em abandonar o uso.

Embora os cientistas venham investigando, ainda que em pequena escala, o uso de drogas em mulheres desde a década de 70, os progressos foram relativamente lentos antes de 1994, quando os Institutos Nacionais de Saúde americanos determinaram que a maioria das pesquisas clínicas incluísse mulheres e grupos formados por minorias. Conforme o estudo sobre as diferenças entre os gêneros se acelerou, cientistas descobriram indícios de que mulheres podem realmente ser mais vulneráveis à dependência e ao abuso de substâncias que os homens. Os pesquisadores notaram que elas passam de forma mais rápida para o uso de substâncias pesadas e têm maior facilidade de sucumbir aos danos sociais e físicos. Até mesmo as fêmeas de ratos costumam buscar e autoadministrar drogas que provocam dependência de maneira mais obsessiva e mais rapidamente que os roedores machos.

Os hormônios da reprodução estão por trás dessa sensibilidade. A remoção de ovários das ratas, de modo a lhes diminuir a produção de estrogênio, reduziu a tendência de procurarem estimulantes, como a cocaína e a anfetamina. Por outro lado, o fornecimento de estrogênio para ratas cujos ovários foram retirados pode encurtar o caminho para a dependência. Em 2004, a neurocientista Jill B. Becker, da Universidade de Michigan em Ann Arbor, e seus colegas relataram que as fêmeas de camundongos sem ovário levaram seis dias para começar a se servir repetidamente de infusões de cocaína, enfiando o focinho em um buraco. Em contraste, as que receberam suplementação do hormônio sucumbiram à mesma compulsão após quatro dias apenas. 

Os pesquisadores acreditam que o estrogênio aumenta o risco de dependência por estimular as vias de recompensa do cérebro, enfatizando a sensação prazerosa produzida pela alteração dos estados de consciência. A administração de estrogênio às ratas que tiveram seus ovários removidos aumenta os níveis de dopamina, um neurotransmissor fundamental para a percepção de recompensas, como comida, sexo e drogas.

Entretanto, o estrogênio não age sozinho em mamíferos do sexo feminino. Seu parceiro hormonal, a progesterona, parece opor-se a sua capacidade de deflagrar tendências aditivas. Em 2006, a equipe de Becker relatou que a administração tanto de estrogênio quanto de progesterona para as ratas sem ovários não acelera o consumo obsessivo de cocaína nos roedores, sugerindo que esse hormônio pode ser um antídoto para a influência do estrogênio na busca do prazer. 

Um trabalho mais recente confirma que a resposta das mulheres a drogas varia no decorrer do ciclo menstrual, conforme os níveis hormonais relativos aumentam e diminuem naturalmente. Em um estudo clínico de 2007, a neurobióloga Suzette M. Evans, da Universidade Columbia e do Instituto Psiquiatrico do Estado de Nova York, coordenou uma equipe que descobriu que os estimulantes são muito mais prazerosos para as mulheres durante a fase folicular (período de aproximadamente duas semanas, a contar do início da menstruação até próxima a ovulação, quando o organismo “se prepara” para uma possível gravidez), em comparação com a chamada fase lútea (etapa seguinte do ciclo, após a ovulação, quando o estrogênio e a progesterona estão elevados). 

A percepção da mulher quanto a outros tipos de recompensas – como dinheiro, comida e sexo – e sua relação de desejo, indiferença ou aversão a eles também pode variar durante o ciclo menstrual. Em outro estudo realizado nos Institutos Nacionais de Saúde americanos, há três anos, pesquisadores examinaram o cérebro de mulheres por meio de ressonância magnética funcional (RMf) enquanto elas faziam apostas em máquinas caça-níqueis. Os cientistas descobriram que os circuitos de recompensa das mulheres ficavam mais ativos quando ganhavam prêmios durante a fase de predomínio de estrogênio que durante a fase que se segue, dominada pela progesterona. Ou seja: o fluxo e o refluxo dos hormônios femininos podem realmente ter amplos efeitos sobre a percepção de prazeres e incentivos, influenciando a motivação feminina para se envolver em situações que, em outros momentos, não as atrairia.

Mas o aumento artificial de níveis de progesterona na mulher é capaz de inibir a sensação obtida com as drogas. Durante um estudo, a equipe de Evans forneceu progesterona a 11 usuárias de cocaína quando os níveis naturais do hormônio em seu corpo estavam baixos. As pacientes tratadas relataram uma sensação de diminuição do “barato” em comparação com o que sentiram no mesmo ponto de seus ciclos, na ausência de progesterona adicional. Em contraste, a progesterona não influenciou a experiência subjetiva de usar cocaína nos dez dependentes do sexo masculino testados, embora os pesquisadores não estejam certos do motivo do resultado. Se a progesterona diminui o prazer das drogas, ela poderá auxiliar no tratamento da dependência em mulheres – algo que Evans vem testando atualmente em dependentes de cocaína do sexo feminino. 

Mas os cientistas sabem que o desafio é complexo. Se não fosse pela compulsão pela dose da substância química, bastaria prestar atenção ao calendário para ajudar as mulheres a ter sucesso na desistência do fumo, das bebidas ou das drogas. Em um estudo publicado em 2008, a médica Sharon S. Allen, especializada em medicina familiar pela Escola Médica da Universidade de Minnesota, e seus colegas pediram a um grupo de 202 mulheres fumantes que a metade tentasse parar com o cigarro durante a segunda fase de seu ciclo menstrual, quando os níveis de progesterona são altos, e que a outra metade fizesse a tentativa em fase anterior ao ciclo. Os resultados foram impressionantes: 34% das mulheres do primeiro grupo não voltadoram a fumar 30 dias depois, em comparação com 14% das que tentaram parar quando os níveis de progesterona estavam baixos. “Quando as mulheres fumam no início de seu ciclo, obtêm mais prazer com a nicotina, por isso pode ser mais difícil enfrentar o desafio de deixar o cigarro”, observa Allen. Nessa mescla de hormônios, substâncias químicas do cérebro e compulsão – além de questões emocionais e psíquicas que nem sempre têm como ser mensuradas –, começar ou parar na hora certa pode fazer grande diferença na história de vida de alguém.

CONSCIÊNCIA ALTERADA

O consumo de algumas drogas – conhecidas como psicodélicas ou alucinógenas, como o LSD, a cocaína e o crack – altera profundamente a percepção e a consciência dos estímulos internos e ambientais. Essas substâncias podem estar em plantas, produtos de origem animal ou compostos sintéticos. Sua ação sobre o sistema nervoso central causa três efeitos principais: delírio, ilusão e alucinação. O primeiro ocorre quando a pessoa percebe corretamente um estímulo (sonoro, visual e tátil), mas o interpreta erradamente, ou seja, tem uma percepção anormal dessa fonte. Exemplo: alguém sob o efeito de uma droga ouve a sirene de uma ambulância (percepção correta). Ou ainda: o usuário, ao ver duas pessoas conversando, julga que ambas o estão caluniando ou mesmo tramando a sua morte. Esses são exemplos de delírios persecutórios: o usuário percebe corretamente o estímulo, mas o interpreta de forma equivocada quando sob influência de um psicodisléptico. No caso da ilusão, a percepção de um dado estímulo fica incorreta, e a interpretação dele também é anormal. Em última análise, na ilusão o estímulo é percebido, mas a percepção é distorcida: no caso da sirene a pessoa diz ouvir, por exemplo, uma trombeta celeste. Já a alucinação é uma percepção sem estímulo algum (no exemplo, não há sirene tocando), mas o usuário tem certeza de que a ouve. As alucinações podem ser sonoras, visuais e gustativas, entre outras. Às vezes a pessoa tem a alteração, isto é, ouve o som ou vê algo inexistente, mas sabe que essas percepções não são reais. Nesses casos, o fenômeno pode ser chamado de alucinose, diferindo daqueles em que o usuário acredita que a percepção é real (alucinação) – isto é, que ela existe mesmo.

Disponível em http://www2.uol.com.br/vivermente/reportagens/perigo_para_elas.html. Acesso em 08 dez 2012

sábado, 24 de novembro de 2012

Seduções íntimas

Paola Emilia Cicerone

Há peças de roupa feminina que servem para cobrir, proteger ou esquentar – e existem aquelas que escolhemos para instigar o prazer daqueles que desejamos atrair. Qualquer que seja a motivação da escolha, aquilo que vestimos – ainda que junto à pele, longe do olhar da maioria das pessoas – faz revelações sobre nossos medos e fantasias. Embora hoje as rendas e os lacinhos já não estejam tão escondidos, até há poucos anos sutiãs, calcinhas, combinações, anáguas e corpetes, sempre em cores discretas, eram encontrados apenas em lojas de armarinhos ou nas prateleiras dispostas disfarçadamente nas grandes lojas. Atualmente a roupa íntima é um fenômeno de moda presente em campanhas publicitárias famosas; tornou-se um aspecto da cultura. Quem não se lembra, por exemplo, do comercial dos anos 80 cujo tema era o “primeiro sutiã”, ou do advento do modelo wonderbra, que inaugurou as curvas falsas? 

“Essas peças estão em uma posição ‘intermediária’ entre a pele e o tecido das roupas comuns; é essa carga simbólica que faz com que um corselete cause um impacto visual muito diferente daquele provocado por um maiô inteiro, que também cobre – ou deixa de cobrir – exatamente a mesma extensão do corpo de uma mulher”, afirma o semiólogo Ugo Volli, pesquisador da Universidade de Turim. Até o século 18, porém, eram os homens que usavam meias e ligas para deixar as pernas e até os genitais à mostra. As calcinhas também são uma invenção moderna. “No passado, acreditava-se que a mulher deveria ser ‘aberta embaixo’, uma ideia que ainda permanece disfarçadamente presente no imaginário erótico e é expressa por meio de imagens como a de Sharon Stone no filme Instinto selvagem, de 1992”, ressalta Volli. Segundo o estudioso de sistemas de signos e símbolos, essa crença, que estimula a fantasia de descobrir algo “secreto”, pode explicar por que os homens preferem, por exemplo, as meias femininas que vão até a altura das coxas, em vez dos modelos inteiriços. 

“O fascínio da roupa íntima está na brincadeira do vejo/não vejo que atrai a atenção para as zonas erógenas, o que faz com que estar vestido seja, em geral, mais erótico que ver o corpo completamente nu”, afirma o psicólogo e terapeuta de casais Giuseppe Rescaldina.

O pesquisador dinamarquês Per Ostergaard lembra que, em certas situações, usar determinada roupa é uma espécie de ritual, um momento de passagem: há peças que, na intimidade, despertam o imaginário erótico e permitem ao casal encarnar o que ele chama de “personagens de si mesmos”. Em geral a renda branca, por exemplo, evoca a ideia de pureza; já a cor preta costuma ser associada à ideia de mistério e sofisticação. Para grande parte das pessoas o vermelho vivo lembra tanto sensualidade quanto transgressão, enquanto estampas que imitam pele de animais podem remeter ao erotismo e à sensualidade. Embora não haja consenso, fatores culturais também entram em jogo, e persiste um imaginário erótico constantemente incrementado pela mídia. O fato é que a roupa íntima “fala de nós” e nos permite viver diferentes papéis. Talvez por isso a renda transparente, o corselete e as meias 7/8 continuem sendo tão atraentes por tantas décadas. Embora a tecnologia proponha cortes e tecidos confortáveis outrora inimagináveis, as imagens que realmente seduzem são as da roupa íntima que parece ser usada justamente para ser tirada.

LIMPO E CONFORTÁVEL

Já para os homens, a visão é um dos sentidos fundamentais para alimentar a excitação, enquanto mulheres costumam se voltar para o conjunto. Não é à toa que a maioria delas conseguem manter vários focos de atenção simultaneamente. “Trata-se de uma herança da época na qual o macho deveria escolher uma parceira com a qual propagar os próprios genes, por isso se voltava para detalhes, enquanto a fêmea precisava de um companheiro para criar a prole, e fazer essa avaliação exigia observar o conjunto com um olhar mais abrangente”, observa o sexólogo Fabrizio Quattrini, presidente do Instituto Italiano de Sexologia Científica, em Roma. É por isso que peças transparentes em cores que se destacam do tom da pele, cobrindo (e ao mesmo tempo evidenciando) as zonas erógenas excitam tanto os homens. Ou pelo menos grande parte deles. 

A cor da pele, em geral, é menos apreciada porque lembra demais a própria carne – e a suavidade, remetendo à realidade concreta, causando uma dicotomia entre carinho e paixão. “Simplificando, podemos afirmar que homens apreciam elementos que ‘forçam’ e ressaltam a imagem, que em nossa imaginação poderiam ser usados por um travesti ou uma prostituta. O vermelho forte, o sutiã que realça os seios ou a bota de salto fino superalto têm algo de tentador e ao mesmo tempo de proibido”, comenta a sexóloga Chiara Simonelli. “É uma espécie de fantasia que, para algumas pessoas, ajuda a acordar os sentidos, dá asas à imaginação e permite experimentações que, se estivessem vestidas de forma ‘comum’, dificilmente fariam”, diz. Neste contexto, a preparação até que a roupa seja exibida ao olhar alheio – a escolha da cor, dos detalhes, da maquiagem, a admiração da própria imagem antes, no espelho, e o momento da surpresa para o parceiro – compõe um ritual de apropriação de aspectos nem sempre óbvios da personalidade. A sexóloga ressalta que a característica arcaica da sensibilidade masculina é despertada por estereótipos, o que faz com que elementos eróticos pareçam especialmente interessantes. Essa produção pode, em determinados casos, apresentar-se para o homem como a sedutora imagem da mulher que se oferece a ele como um presente e, assim, o reafirma em seu papel dominante – na prática, um lugar cada vez menos efetivo. 

Já o olhar feminino costuma valorizar o conjunto, o que torna as mulheres mais benevolentes. Elas demonstram preferência por roupas íntimas masculinas que combinem conforto, elegância e higiene. Antigamente, um homem que dedicasse muita atenção à própria roupa de baixo seria classificado como pouco viril. Hoje, embora esse interesse exagerado continue a ser uma característica do universo homossexual masculino, a afirmação da própria imagem já comporta a descoberta do cuidado com o corpo e – algo antes impensável – maior preocupação com a roupa de baixo.

MELHOR SEM ROUPA?

Para muitas mulheres, o uso da lingerie pode ajudar a enfatizar ou resgatar a feminilidade: em muitos casos, admirar-se ao espelho com um conjunto bonito de calcinha e sutiã é um recurso para fazer as pazes com o próprio corpo – e aceitar que não é necessário ser perfeita para ser bonita, sensual e desejada. Segundo Ostergaard, porém, a roupa íntima sedutora traz contradições. Ao mesmo tempo que reforça a autoestima, pode exaltar inseguranças. Serve para realçar a feminilidade e tem o “poder mágico” de enfatizar a feminilidade, particularmente apreciada em uma época na qual as diferenças de gênero têm sido suplantadas. E existe quem se refira à lingerie como um estímulo a experimentações em relação à própria sexualidade. Essas peças, no entanto, têm sido um instrumento de controle do corpo feminino, aproximando-o do estereótipo imposto pela mídia: para se sentir bem com determinadas produções é indispensável aderir aos padrões estéticos oficiais. É como se as mulheres tivessem interiorizado certa imagem sem se dar conta de que ela não tem nada de natural, de que é apenas o resultado de recursos para aumentar o volume das formas ou sustentá-las. Isto também acontece porque aumentou a oferta de peças que antes pareciam reservadas a strippers ou garotas de programa. 

Parece, contudo, que a maioria não aprecia os excessos e prefere se mostrar sensual, em vez de declaradamente sexy. “Não seria exagero dizer que cada vez mais mulheres reconhecem o cérebro como o instrumento de sedução por excelência”, ressalta o sociólogo Francesco Morace, da empresa Future Concept Lab, especializada em pesquisas de opinião e comportamento. De qualquer forma, independentemente da classe socioeconômica, quase todas as mulheres têm alguma roupa íntima “especial”, embora o significado do termo seja subjetivo. Algumas valorizam seda e laços, enquanto outras preferem um conjunto clássico de calcinha e sutiã ou guardam com cuidado aquele que “deu sorte” em determinada ocasião. As peças adquirem valor simbólico, tanto que muitas vezes são guardadas de uma maneira diferente e não são emprestadas nem mesmo para as amigas mais íntimas com as quais se poderia tranquilamente dividir um biquíni, por exemplo. 

E não se pode esquecer que existe uma roupa íntima certa para cada ocasião. “Elas são escolhidas como um instrumento de comunicação com base em quem imaginamos encontrar”, observa Volli. Existe aquela para mostrar ao médico, às colegas da academia de ginástica e para o parceiro em uma noite especial. Não raro, as mulheres reservam a melhor calcinha para a noite em que sabem que irão para a cama com alguém. E há até aquelas que evitam um encontro íntimo quando não estão usando uma peça que não lhes pareça suficientemente adequada.

Parece não haver dúvida de que a roupa íntima serve para seduzir, “esquentar” o relacionamento ou, em alguns casos, simplesmente garantir mais segurança quando chega o momento de tirar a roupa. “De fato a escolha da lingerie pode ajudar a trazer de volta o componente lúdico de uma relação, o que é certamente positivo, mas é preciso que haja certa cumplicidade entre o casal para que ambos se divirtam”, afirma Volli. 

E obviamente há o risco de que a mulher que apostou numa roupa íntima sexy tenha alguma desilusão. Isto acontece quando, por exemplo, o conjunto comprado com tanto cuidado não recebe nenhum comentário, já que alguns homens (ainda) consideram os elogios como um sinal de fraqueza. E quando se recebe a lingerie de presente? “O gesto expressa desejo de intimidade e pode abrir possibilidades de diálogo”, acredita Rescaldina, embora muitas vezes os artigos escolhidos pelos parceiros sigam mais o próprio imaginário que as formas de quem deve usá-los. 

Na opinião do psicólogo, um look ousado, composto de meias aderentes, cinta-liga e sapatos de salto alto, exibido por quem sempre usou roupas folgadas tanto encanta quanto assusta o parceiro, principalmente se a relação passa por uma crise. A atitude feminina provocativa, principalmente quando surge de forma repentina, pode amedrontar homens mais inseguros, que tendem a ver a ousadia ou a sensualidade explícita de forma desvinculada do afeto que consideram “condizente” com uma relação estável. Apesar das transformações sociais e culturais, em alguns segmentos da sociedade o preconceito ainda ronda o imaginário coletivo marcado pelo machismo. E mesmo que inconscientemente, muitas vezes prevalece o conceito arcaico de que a fêmea é uma presa a ser dominada. Por isso, a maneira como uma mulher se veste (ou se despe) para se colocar no lugar de objeto de desejo do parceiro pode fazer com que ela seja vista como uma ameaça, um perigo, já que terá aquele que a quer sob seu domínio. Nesses casos, em vez de obter o resultado esperado, uma produção mais ousada pode surtir resultado oposto. E no lugar da atração, surgir o medo e, consequentemente, a rejeição. E poucas frases são menos bem-vindas do que a pergunta: “Mas o que você está vestindo?!”. 

Embora grande parte dos homens tenha ideias bastante precisas sobre seus gostos em relação ao vestuário feminino – , e não poderia ser de outra forma, tendo em vista a frequência com que certas imagens são alardeadas pela publicidade e oferecidas pela mídia – muitos realmente não se interessam por essas peças. Pensam que, quando se chega ao ponto de ver a lingerie, o jogo de sedução já está em andamento, e são sinceros quando afirmam que preferem a parceira simplesmente “sem roupa alguma”. 

A orientação dos especialistas para evitar decepções? Sondar a opinião do parceiro antes de fazer uma surpresa. De preferência, escolher peças que deixem quem usa à vontade – permitindo-se brincar com o imprevisível e com a sensualidade, porque talvez o mais importante não seja a roupa em si, mas o modo como ela é usada e toda a fantasia que evoca. Afinal, com atmosfera certa, até o agasalho macio e confortável pode mexer com a imaginação.

Disponível em <http://www2.uol.com.br/vivermente/artigos/seducoes_intimas.html>. Acesso em 15 nov 2012.

sábado, 29 de setembro de 2012

Interpretando o gênero

Linda Nicholson
Estudos Feministas, ano 8, 2.º semestre, fevereiro/2000

Resumo: Neste artigo a autora desconstrói significados dominantes de dois conceitos centrais da critica feminista: gênero e mulher. Muito do feminismo posterior aos anos 1960 ancorou-se na distinção entre sexo e gênero. Embora essa discussão tenha tido alguma utilidade (como a de permitir que as feministas desafiassem a ideia de um determinismo biológico), ela também permitiu que as feministas preservassem um tipo de pensamento dualista sobre a identidade da mulher e que analisassem a diferença entre mulheres como algo que pudesse ser separado daquilo que todas as mulheres compartilham. A autora argumenta que o marco teórico binário possibilitou a muitas feministas enfatizar profundas diferenças entre as experiências culturais dos homens e das mulheres. Porém, como o pensamento binário não é completamente estático nem permite uma perfeita articulação entre experiências masculinas e femininas e corpos masculinos e femininos, empregá-lo em nossas análises pode resultar em sérios problemas. O marco binário também não consegue captar o nível de desvio das normas do gênero que existe em muitas de nós, reforçando tanto estereótipos culturais em relação ao significado das experiências masculinas e femininas, bem como atuando politicamente na superessão de maneiras de ser que desafiam os dualismos do gênero. 

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quarta-feira, 12 de setembro de 2012

O clitóris interno

Lasciva 
02 de maio de 2012

Reflita: Em mais de cinco milhões de anos de evolução humana, apenas um órgão passou a existir com o único propósito de proporcionar prazer – o clitóris. Não é necessário para reprodução. Nem é como o pênis, através do qual passa a uretra, usado também para urinar. Sua única função – a sua finalidade singular – é fazer a mulher se sentir bem!

Infelizmente, é justamente porque o clitóris não tem nenhuma função além do prazer feminino que a ciência tem negligenciado estudá-lo tão detalhadamente quanto o órgão masculino. Demorou séculos até que a ciência alcançasse uma descoberta pertinente: o verdadeiro tamanho e anatomia do clitóris.

Pergunte à próxima pessoa que encontrar onde está localizado o clitóris. Provavelmente, a maioria das respostas vai ser algo como: “É aquele pequeno bulbo na ponta dos pequenos lábios”, ou “É o botão sob o capô”. Embora essas respostas não estejam exatamente erradas, a verdade é que a maior parte do clitóris está, de fato, no interior da pelve – ou seja, é muito mais interna do que externa. Mesmo mulheres bem informadas sobre seus próprios corpos, reagem com uma mistura de fascinação e confusão quando descobrem que seu clitóris se estende profundamente por dentro delas.

O nome científico para o “pequeno botão” externo ou “bulbo” é glande. Não deve ser confundido com glândula. Glande simplesmente se refere a uma pequena massa circular. Essa estrutura reduzida contém cerca de 8.000 fibras nervosas sensoriais – mais do que em qualquer outra parte do corpo humano e quase o dobro da quantidade encontrada na cabeça de um pênis! Equivocadamente, estudiosos pensavam que o clitóris era completamente composto da glande; e porque ele é super sensível e tudo que qualquer um pode ver do órgão, sua confusão é traduzida pela maioria das mulheres hoje em dia. O fato é que, no entanto, a maior parte do clitóris é subterrâneo. Consiste em dois corpos cavernosos (corpus cavernosum, quando se refere à estrutura como um todo), duas cruras (crus, quando se refere à estrutura como um todo), e os portais clitorianos ou bulbos.

A glande está ligada ao corpo ou eixo do clitóris interno, o qual é constituído por dois corpos cavernosos. Quando eretos, os corpos cavernosos envolvem a vagina de lado a lado, ao redor dela, como se dessem um grande abraço!

O corpo cavernoso também se estende além, bifurcando-se novamente para formar as duas cruras. Essas duas pernas estendem-se em até 9 centímetros; apontando para as coxas, quando em repouso, e voltando-se em direção à coluna quando clitóris fica ereto. Para visualizá-los em repouso, imagine a crura como o osso externo da galinha (conhecido popularmente como wishbone), juntando-se ao corpo do clitóris onde se fixam à cartilagem do púbis.

Próximo a cada uma das cruras, em ambos os lados da abertura vaginal, estão os portais do clitóris. Esses ficam localizados sob a grandes lábios, internamente. Quando se enchem de sangue, eles de fato ”algemam” a abertura vaginal, causando a expansão da vulva. Ao excitar esses pequeninos, você terá uma entrada vaginal sedenta, mais apertada e sensível para explorar!

O que significa tudo isso? Bem, para começar, podemos finalmente concluir o velho debate acerca de orgasmos vaginais vs. clitorianos.

Em 1953, Kinsey escreveu: “As paredes da vagina são muito insensíveis, na grande maioria das mulheres (…) Não há evidência de que a vagina é sempre a única fonte de excitação, ou mesmo a principal fonte de excitação erótica em qualquer mulher.”

Então, em 1970, Germaine Greer publicou O Eunuco Feminino, que zombou teoria de Kinsey. Ela escreveu: “É absurdo dizer que uma mulher não sente nada quando um homem está movendo seu pênis dentro da vagina. O orgasmo é qualitativamente diferente quando a vagina está preenchida por um pênis, em vez de vaga”.

Curiosamente, ambos estão certos. A vagina não é a única fonte de excitação, apesar de ser possível estimular o clitóris interno perfeitamente com a manipulação, deslocamento, e exploração da vagina com um pênis ou outro aparato.

Muitas mulheres podem chegar ao orgasmo sem nunca inserir nada dentro de si mesmas. Eles causam a ereção do clitóris interno estimulando a glande, bulbos e cruras, com o contato externo. O corpo cavernoso é o tecido erétil adicional que abrange a vagina, uma área altamente erógena quando estimulada internamente.

Vale lembrar que o orgasmo feminino não acontece apenas no clitóris e na vagina. É muito mais complexo e envolve também o funcionamento de múltiplos nervos, tecidos, músculos, reflexos e esforço mental. Algumas mulheres conseguem chegar ao orgasmo com o pensamento. Outras têm orgasmo simplesmente flexionando seus músculos pélvicos. Há muitas variáveis e componentes envolvidos, é extremamente importante lembrar que não existem duas pessoas iguais. O que funciona para uma mulher pode não funcionar para outra. Em outras palavras, tudo é personalizado sob o capô.

O que realmente assusta é a grande quantidade de desinformação que existe em livros didáticos, guias profissionais médicos, e na internet. O fato triste é que apenas a partir da década de 1990 os pesquisadores começaram a usar ressonância magnética para estudar a estrutura interna do clitóris. Até então, os detalhes intrínsecos do pênis já eram bem conhecidos.

A urologista Helen O’Connell, do Hospital Royal Melbourne, começou a entender melhor o constituição nervosa microscópica do clitóris usando ressonância magnética – algo que já havia sido feito em relação à função sexual dos homens nos anos 1970. Em 1998, ela publicou suas descobertas, informando ao mundo médico do verdadeiro alcance e tamanho do clitóris. No entanto, ironicamente, no mesmo ano, começavam a surgir na América o Viagra, para curar a disfunção eréctil masculina.

Em 2005, a Associação Americana de Urologia publicou um dos relatórios do Dr. O’Connell sobre a anatomia do clitóris. O próprio relatório ainda afirma: “A anatomia do clitóris não tem sido estável ao longo do tempo, como seria esperado. A maior extensão o seu estudo tem sido dominada por fatores sociais. (…) Alguns livros de anatomia recentes omitem a descrição do clitóris. Em comparação, há algumas páginas dedicadas à anatomia do pênis”. O relatório também explica como é aparentemente impossível entender a estrutura interna do clitóris com apenas um diagrama. Vários desenhos são necessários para realmente obter uma compreensão abrangente do mesmo.

Infelizmente, apenas recentemente em 2009, os pesquisadores franceses Dra. Odile Buisson e Dr. Pierre Foldes deram ao mundo da medicina a primeira e completa ultra-sonografia 3D do clitóris ereto. Eles fizeram esse trabalho durante três anos, sem financiamento adequado. Graças a eles, agora entendemos como o tecido eréctil do clitóris se enche, envolvendo a vagina – um avanço que explica como o que era considerado orgasmo vaginal é, na realidade, um orgasmo clitoriano interno.

Dr. Foldes realizou cirurgias em mulheres que sofreram mutilação clitoriana, restaurando o prazer de mais de 3.000 pacientes circuncidadas. Ele também fica assombrado com a falta de estudo em relação ao clitóris:

“Quando voltei para a França para tratar a mutilação genital, fiquei espantado que ninguém nunca havia sequer tentado. A literatura médica nos diz a verdade sobre o nosso desprezo pelas mulheres. Durante três séculos, há milhares de referências a cirurgia peniana, nada sobre o clitóris, exceto para alguns tipos de câncer ou dermatologia e nada para restaurar a sua sensibilidade. A própria existência de um órgão de prazer é negado, medicamente. Hoje, se você olhar para os livros de anatomia que todos os cirurgiões possuem, você vai encontrar duas páginas acima. Existe uma excisão intelectual real”.

Então, agora você sabe. Como se toda a repressão, as influências culturais, a culpa, as impressões da infância e os medos impostos pela sociedade não bastassem, temos também as políticas medicinais que nos mantêm no escuro. A grande notícia é que pesquisadores como o Dr. Buisson, Foldes Dr. e Dr. O’Connell estão pavimentando o caminho para um maior conhecimento … e maior prazer!

Disponível em <http://sweetlicious.net/gerais/o-clitoris-interno-21383>. Acesso em 07 set 2012.

quarta-feira, 21 de março de 2012

“Sem dar escândalo” – a construção social das travestilidades na adolescência

Tiago Duque
33º Encontro Anual da Anpocs
GT 36: Sexualidade, corpo e gênero



Resumo: Atualmente as mudanças na esfera da sexualidade se associam as novas tecnologias corporais e a uma ampliação do debate para além das heterossexualidades. Entre as travestis, as possibilidades de construção do feminino têm trazido novas implicações identitárias e tornado os corpos mais plásticos à construção e desconstrução do que se deseja para si. Essas novidades não se dão de forma desconectada de padrões e práticas já legitimadas por este grupo, o que contribui para a problematização do que é ser travesti nos dias atuais. Assim, este artigo foca na construção e desconstrução dos corpos, das identidades e suas relações com as experiências subjetivas das travestilidades na adolescência na cidade de Campinas (SP).


sábado, 28 de janeiro de 2012

Masculino e feminino na família contemporânea

Teresa Creusa de Góes Monteiro Negreiros e Terezinha Féres-Carneiro
Estudos e Pesquisas em Psicologia, UERJ, RJ, ano 4 N. 1, 1º semestre 2004


Resumo: Este trabalho tem como objetivo discutir questões referentes aos papéis de gênero nas relações familiares contemporâneas, onde coexistem o “modelo antigo” e o “modelo novo” de família, ressaltando a tensão existente nos registros identificatórios da “nova” mulher e do “novo” homem. Lançando mão de contribuições teóricas da psicologia social e da psicanálise, utilizamos os conceitos de papel, identidade, ideais, identificação e expectativas para compreender as mudanças na família e a transformação do masculino e do feminino na contemporaneidade.