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domingo, 16 de março de 2014

Transexual que espera cirurgia sonha em ganhar flores pelo Dia da Mulher

G1
08/03/2014

Um dos maiores desejos da agente de prevenção Riany Rodrigues Sabará, de 21 anos, é ganhar uma flor no Dia Internacional da Mulher. A entrega de rosas é algo corriqueiro em ambientes de trabalho e até nas ruas durante a data, mas a jovem nunca foi presenteada. Riany é transexual e se prepara para a fazer a readequação genital, conhecida como cirurgia de troca de sexo. Apesar de se encarar como uma mulher, ela ainda enfrenta a falta de compreensão das pessoas quando o assunto é identidade de gênero.

Desde outubro de 2012, Riany sai de Piracicaba (SP), onde vive e trabalha, e vai a São Paulo (SP) todas as sextas-feiras para receber tratamento psiquiátrico e psicológico no Hospital das Clínicas pela primeira fase de preparação para a cirurgia, que ainda não tem data para acontecer. Nesta etapa, os transexuais passam por consultas e discussões em grupo sobre o desejo de realizar a cirurgia, traumas e tudo que envolve o processo de alteração dos órgãos genitais.

"Desde os 17 anos procuro maneiras de realizar a cirurgia e há dois anos consegui o tratamento, mas não tem sido fácil. Depois do período com os psicólogos, vou passar pela parte física com o uso de hormônios para interromper a produção hormonal masculina e colocar a feminina no lugar e depois virá a cirurgia", contou.

Para Riany, a cirurgia irá apenas "oficializar" a sua identidade. "Já me sinto uma mulher desde que nasci. Quando eu era pequena, olhava no espelho e não reconhecia o garoto no reflexo como sendo eu. Acho que depois da cirurgia ninguém mais vai poder me impedir de ir ao banheiro feminino, não vão usar mais o meu nome de batismo nas repartições públicas e nem dizer que não sou mulher", disse.

A mãe, segundo Riany, é uma das pessoas que mais apoia o processo que antecede a cirurgia. "Ela criticava, mas aí um dia eu falei pra ela: 'imagina se você tivesse um pênis no meio das pernas? É assim que eu me sinto.' Depois disso ela começou a me ajudar com passagem e até mesmo com dinheiro para as viagens", contou.

Riany trabalha na Organização Não-Governamental Centro de Apoio e Solidariedade à Vida (Casvi) no projeto Esquinas da Noite, que faz trabalho de prevenção com garotas de programa (travestis, transexuais, homens e mulheres). Antes da instituição, já foi faxineira e babá. Com o dinheiro das limpezas ela fez a primeira modificação corporal efetiva, quando colocou silicone nos seios.

Preconceito

O banheiro é, segundo Riany, uma das maiores "resistências" do preconceito na sociedade. Desde a época da escola, quando passou a usar roupas e acessórios femininos, a jovem protagoniza discussões pelo simples fato de usar o banheiro.

"No colégio, eu usava o banheiro feminino escondida e ainda hoje tenho problemas para usar banheiros públicos. Eu fui faxineira dos terminais de ônibus e entrava e saía dos banheiros. Depois que mudei de emprego, os guardas não me deixam mais entrar no feminino. É uma humilhação", disse.

A perseguição na escola, a resistência e a indiferença de familiares e o preconceito nas ruas já fizeram a transexual até mesmo pensar em suicídio na adolescência. Apesar de não pensar mais na morte como alternativa, ela ainda considera difícil se "encaixar no mundo". "Às vezes eu penso que nesse mundo não tem lugar pra mim. Em lugar nenhum."

Dia da Mulher

Riany contou que chega a ser parabenizada no 8 de março, mas nunca recebeu flores. O gesto, aliás, nunca aconteceu com ela nem mesmo em outras ocasiões. "Quem não gosta de flores? Mas eu nunca tive uma relação séria, é muito difícil para um homem assumir que namora uma trans, pois eles se importam muito com a opinião dos outros."


Disponível em http://g1.globo.com/sp/piracicaba-regiao/noticia/2014/03/transexual-que-espera-cirurgia-sonha-em-ganhar-flores-pelo-dia-da-mulher.html. Acesso em 15 mar 2014.

quinta-feira, 13 de março de 2014

Como respeitar uma pessoa transexual

Chrystian Sales, Rafael Bemerguy, Eduardo Pinto Lara de Carvalho, Lean

Caso você recentemente tenha conhecido uma pessoa transexual, talvez você ainda não compreenda a sua identidade e, ainda, se sinta inseguro quanto à forma de agir quando está com ela de maneira a não ofendê-la ou magoá-la. O termo “transexual” neste artigo se refere a uma pessoa que não se identifica com o gênero que foi determinado ao nascimento. Há pessoas transexuais ao redor de todo o mundo, e em uma ampla variedade de culturas — na realidade, seria difícil citar um país ou cultura em que não se encontram transexuais. Para estas pessoas, nem sempre é fácil explicar sua situação de gênero na sociedade atual. Leia mais para aprender a entender e respeitar alguém que desafie as suas ideias sobre gênero e que não cai facilmente nas categorias “homem” ou “mulher”.

1 - Respeite sua identidade de gênero. De agora em diante, pense nesta pessoa de acordo com o gênero pelo qual ela se refere a si mesma, com o nome e o gênero gramatical ("o", "a", "ele", "ela" etc.) escolhidos, independente de sua aparência física (a menos que a pessoa ainda não tenha se assumido - pergunte, para saber com certeza, se há momentos inadequados).

2 - Cuidado com o pretérito imperfeito. Quando estiver discutindo o passado, tente não usar frases como “quando você estava no gênero anterior” ou “nascido homem/mulher”- ou, ao menos, tome cuidado quando fizer isso - pois muitos transexuais sentem que sempre foram do gênero com o qual se afirmam, mas tiveram que esconder isso por razões diversas. Pergunte à pessoa transexual como ela gostaria que falassem dela no passado. Uma solução é evitar referir-se ao gênero quando falar do passado, usando outros pontos de referência, como “no ano passado”, “quando você era criança”, “quando você estava no ensino médio”, etc. Se você precisa referir-se à transição de gênero quando estiver conversando a respeito do passado, diga “antes de você assumir o seu verdadeiro gênero” ou “antes do início de sua transição” (quando aplicável).

3 - Use uma linguagem apropriada ao gênero da pessoa. Pergunte qual gênero a pessoa transexual prefere que seja usado em referência a ela, e respeite a sua escolha. Por exemplo, alguém que se identifica como mulher pode preferir palavras e pronomes femininos, como ela, dela, atriz, garçonete, etc. Por outro lado, alguém que se identifique como homem pode preferir termos masculinos como ele, dele, etc. Use o nome que for da preferência da pessoa.
  • O seu amigo João acaba de se revelar como uma pessoa transexual e agora deseja ser chamado de Maria. A partir desse ponto, não diga “este é o meu amigo João, eu conheço ele desde a quinta série”. Ao invés disso, diga “esta é minha amiga Maria, eu conheço ela desde a quinta série”. Discuta qualquer estranheza que você sinta em outro momento, em que você e Maria possam conversar a sós. Definitivamente, se você quer manter a amizade da pessoa, é preciso respeitar o desejo de Maria e se referir a ela como quem ela é hoje, e não como aquela pessoa que você conhecia; apesar do fato de que a pessoa transexual é aquela que você conhecia: você só passou a conhecê-la ainda melhor agora.

4 - Não tenha medo de fazer perguntas[1]. Algumas das pessoas transexuais, mas certamente não todas, responderão a perguntas relacionadas à sua identidade e/ou gênero. Não espere, no entanto, que ela seja a sua única fonte de aprendizagem. É responsabilidade sua informar-se por conta própria. Além disso, se uma pessoa transexual não se sentir confortável respondendo às suas perguntas, não tente “forçá-la a se abrir”. Por último, perguntas sobre órgãos genitais, cirurgias e nomes anteriores devem apenas ser feitas caso você precise sabê-las para oferecer algum cuidado médico, ter relações sexuais com a pessoa transexual, ou caso necessite do nome original por razões legais.

5 - Respeite a busca por privacidade da pessoa transexual. Não exponha-a sem o seu consentimento explícito. Contar às pessoas que você é uma pessoa transexual é uma decisão muito difícil, e não deve ser tomada levianamente. “Tirá-la do armário” sem o devido consentimento é uma grande traição de sua confiança e pode possivelmente custar o seu relacionamento com a pessoa. Dependendo da situação, pode também colocá-la em risco de sofrer uma grande perda — ou até mesmo violência física. Ela contará a quem desejar, se ou quando estiver pronta. Este conselho é apropriado tanto àqueles que vivem como transexuais integralmente como aos que ainda não realizaram sua transição. Muitos dos que vivem integralmente em seu papel de gênero adequado desejarão que as pessoas que não os conheciam em seu gênero anterior não os conheçam em qualquer outro gênero que não seja o atual.

6 - Não pense que você já conhece a experiência da pessoa. Há muitas formas diferentes em que as diferenças de identidade de gênero podem se expressar. A ideia de se estar “aprisionado no corpo de um homem/de uma mulher”, a crença de que mulheres ou homens trans são excessivamente femininas ou masculinos, a crença de que todas as pessoas transexuais querem realizar o tratamento com hormônios e/ou cirurgia, todos são estereótipos, que se aplicam a algumas pessoas mas não a outras. Guie-se pelo que a pessoa lhe disser a respeito de sua própria situação, e escute-a sem noções preconcebidas. Não imponha teorias que você aprendeu, nem presuma que a experiência de outras pessoas transexuais que você conheceu ou a respeito de quem você ouviu falar se aplica à pessoa que está à sua frente. Não presuma que ela realizará a sua transição por traumas passados em sua vida ou que está modificando seu gênero como uma forma de escapar de seu próprio corpo.

7 - Comece a reconhecer a diferença entre identidade de gênero e sexualidade. Não presuma que o gênero de uma pessoa se correlacione à sua sexualidade —não é assim. Há pessoas transexuais heterossexuais, gays, lésbicas, curiosas e assexuais. Se a pessoa revela a você a sua orientação sexual, use os termos que ela usar.

8 - Trate pessoas transgênero mesma maneira. Enquanto ela pode gostar da atenção extra que você a dá, sem dúvida o ato de exagerar não será tão apreciado. Depois de estar bem informado, cuide para não se exceder. Pessoas transexuais têm essencialmente a mesma personalidade que tinham antes de sair do armário. Por isso, trate-as como você trataria qualquer outra pessoa.
  • Esteja disposto a ouvir. Muitas pessoas trans vivem em comunidades pequenas, onde o compartilhamento a sua experiência fica limitado aos seus semelhantes. Muitas vezes, para elas, ser capaz de explicar a sua experiência e instruir as pessoas sobre ela é construtivo tanto para elas quanto para você.
  • Seja direto. Se estiver achando alguma coisa difícil, avise. Para elas, uma reação honesta e direta é bem mais fácil de lidar do que um “corte”.
  • Saia com a pessoa transgênero. Faça disso algo normal – acostume-se com ela no jeito como ela se apresenta, e mais cedo ou mais tarde você vai perceber que não é uma pessoa estranha, mas sim uma pessoa como outra qualquer. No fim, você pode acabar ganhando um(a) grande amigo(a).


9 - Quem começa a expressar um gênero diferente daquele determinado no nascimento está, em geral, passando por um momento que alterará sua vida para sempre. Paciência, compreensão e disposição para discutir as questões trazidas por estas mudanças a ajudarão na passagem por este difícil e emocional período de sua vida. É melhor fazer perguntas abertas, que permitam à pessoa compartilhar tanto quanto lhe for confortável. Por exemplo: “Como vão as coisas”; “Você parece cansado. Quer conversar a respeito?”; “Você parece bastante feliz hoje. Aconteceu algo bom?”; “Como lhe posso ajudar neste período de mudanças?”; “Sou todo ouvidos, caso você queira conversar a respeito de algo”.

Dicas

  • Nem todas as pessoas transexuais buscam a cirurgia de redesignação sexual (CRS). CRS é quase sempre um termo mais apropriado para ser utilizado do que “operação de mudança de sexo”. Não presuma ser mais apropriado perguntar a respeito dos planos de uma pessoa quanto a cirurgias, hormônios etc., do que seria intrometer-se em quaisquer outras questões médicas de qualquer pessoa. Além disso, não presuma que haja apenas um caminho “certo” para a transição (i.e.: que para “realmente ser transexual” ou para “finalizar a transição”, uma pessoa deve realizar uma CRS).
  • A menos que você tenha um relacionamento pessoal e próximo com a pessoa, é rude perguntar qual é seu nome “verdadeiro” ou de nascença — eles consideram o nome escolhido para adequar-se a seu gênero (caso o tenham alterado) como seu nome real, e querem que você pense a respeito deles da mesma maneira.
  • Perguntar a respeito dos órgãos genitais de pessoas transexuais e sobre como elas têm relações sexuais não é apropriado, da mesma maneira que não o é perguntar a respeito da vida sexual aos cissexuais (pessoas cujo corpo naturalmente corresponde à sua preferência de gênero).
  • Muitos creem que a palavra “transexual” é um adjetivo, uma palavra descritiva, ao invés de um substantivo. Outros pensam de forma diferente: da mesma forma que você não chamaria uma pessoa mais velha de “velha” ou dizer que estão “envelhecidas”, é inapropriado se referir a uma pessoa transexual como “uma transexual” sem acrescentar “pessoa”, “mulher”, “homem” ou outro substantivo apropriado. Algumas pessoas transexuais ainda consideram isso como uma atitude objetificadora e desumanizadora.
  • Se você deixar escorregar um “ela” ou “ele” quando queria dizer o outro, logo depois de se conhecerem, não se desculpe excessivamente - só siga a falha com o termo correto e continue o que você estava dizendo.
  • A transexualidade era conhecida medicamente como transtorno de identidade de gênero, mas há demasiada polêmica circundando o termo. Alguns acreditam que o problema consiste na incapacidade da sociedade em reconhecer as variações de sexo e gênero encontradas na natureza (inclusive em seres humanos). Outros criticam esta denominação por tratar a comunidade transexual como patológica, pois implica fortemente que ser uma pessoa transexual é possuir um distúrbio ou problema saúde. Hoje em dia, o termo que possui melhor aceitação na comunidade transexual e médica é disforia de gênero.
  • Algumas pessoas acreditam que a única “cura” para uma pessoa transexual é corrigir a aparência física (com cirurgia e/ou hormônios) para se adequar à identidade de gênero mental. Segundo essa visão, o problema é com o corpo, e não com a mente. Evidências e autoridades médicas atuais apoiam a eficácia desses tratamentos. Alguns acreditam que o problema são as expectativas da sociedade relativas ao gênero e as limitações para homem e mulheres, e precisam refletir uma maior aceitação da variedade de expressões de gênero para ambos os sexos.
  • Algumas pessoas transexuais responderão a perguntas confortavelmente, enquanto outras não. Se uma pessoa transexual não parecer confortável com questionamentos ou não deseja responder a algo, não a force. Se você realmente precisa saber de algo, use os recursos aqui presentes.
  • Páginas como My True Gender, PlanetOut, Facebook e MySpace possuem grupos outras seções dedicadas a transexuais; vá até elas para manter contato ou aprender mais a respeito.

Avisos

  • Evite o uso de gírias transfóbicas, como “travesti”, “traveco”, “veado” ou “sapatão”. Estes termos são opressivos, objetificadores e desumanizantes.
  • Não realize comparações com pessoas não-transexuais, direcionando-se a elas como um garoto ou garota “reais” ou “normais”. O que faz de um homem um homem “de verdade” ou de uma mulher uma mulher “de verdade” é a forma com a qual se identificam a si mesmos, e não como outra pessoa percebe ou classifica seus corpos. Um homem transexual não é menos homem do que um homem cissexual, e uma mulher transexual não é menos mulher do que uma mulher cissexual.
  • Nunca diga a uma pessoa transexual que as pessoas não as compreenderão ou amarão por causa de sua identidade transexual. Isso é incrivelmente doloroso, e ainda mais, não é verdade. Muitas pessoas transexuais são compreendidas, aceitas e amadas.
  • Mesmo que você tenha objeções à identidade transexual da pessoa, você deve sempre respeitá-la e jamais envergonhá-la propositalmente em público. Causar vergonha ou humilhação à pessoa transexual jamais trará o bem a ninguém, e fazê-lo pode ser algo perigoso a ela.
  • Tome muito cuidado quando se referir à identidade transexual de alguém como uma “escolha”. A disforia de gênero, por sua própria definição, não é de forma alguma uma escolha .[2] Algumas pessoas transexuais descrevem à sua identidade como uma escolha, e algumas não. Para alguns, a “escolha” foi alterar seus corpos para adequar-se à mente. Encontre maneiras de respeitar a identidade de uma pessoa que não se baseiem no fato de ela optar ou não por ela.
  • Intersexual é um termo geral usado para diversas situações nas quais uma pessoa nasceu com uma anatomia sexual e/ou reprodutiva que não se adequa às definições típicas de masculino ou feminino.[3] Enquanto algumas pessoas intersexuais são também transexuais, os dois conceitos são distintos e não devem ser confundidos.[4]


Fontes e Citações
1.http://www.autostraddle.com/how-to-talk-to-a-transperson-76785/
2.http://en.wikipedia.org/wiki/Transsexuality#Gender_dysphoria
3.http://www.isna.org/faq/what_is_intersex
4.http://www.survivorproject.org/is-intro.html


Disponível em http://pt.wikihow.com/Respeitar-uma-Pessoa-Transexual. Acesso em 04 mar 2014.

sábado, 22 de fevereiro de 2014

A tutela jurídica da pessoa transexual

Marina Carneiro Leão de Camargo

Resumo: O presente trabalho analisa o fenômeno da transexualidade frente ao Direito, com base no princípio da dignidade da pessoa humana, que, por força da Constituição Federal de 1988, ilumina todo o ordenamento jurídico. Para tanto, traz uma reflexão acerca das categorias de gênero e sexo no que se refere à construção de corpos femininos e masculinos através dos discursos. A partir disso, situa-se a experiência transexual no processo por meio do qual são prescritos comportamentos aos indivíduos e naturalizadas as diferenças entre os corpos sexuados. Aborda-se, por fim, a tutela jurídica da pessoa transexual, através da legalização das cirurgias de transgenitalização e da possibilidade de alteração do registro civil no tocante ao prenome e ao sexo, em virtude da identidade de gênero, tendo por fundamento os direitos da personalidade e os direitos fundamentais.



sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Substitutivo do Código Penal abandona proteção à opção sexual

Luiz Carlos dos Santos Gonçalves
8 de fevereiro de 2014

A comissão de senadores[1] constituída para examinar o projeto de novo Código Penal acaba de entregar suas conclusões à presidência daquela Casa. Dali, o texto seguirá para a Comissão de Constituição e Justiça. Trata-se da segunda versão do substitutivo apresentado pelo senador Pedro Taques (PDT-MT) ao Projeto de Lei 236/2011, por sua vez originado de relatório da comissão externa de juristas, presidida pelo ministro Gilson Dipp, do Superior Tribunal de Justiça. Ao analisar esta segunda versão, a comissão de senadores procedeu a significativas alterações, entre elas o expurgo de qualquer referência à identidade de gênero ou orientação sexual em crimes como o homicídio, as lesões corporais, tortura e o racismo.

Embora existam linhas de continuidade entre o documento agora aprovado e o anteprojeto da comissão de juristas, as diferenças são expressivas. Os senadores apreciaram cerca de 800 propostas de modificação que vieram de seus colegas, de deputados federais, professores, acadêmicos, estudantes e organizações da sociedade civil. Grupos organizados de pressão não faltaram, notadamente os pró-criminalização do aborto — onde estavam vocês, feministas? — e os defensores dos direitos dos animais.

A comissão de senadores organizou audiências públicas e ouviu não apenas pessoas favoráveis ao anteprojeto, mas também críticos acerbos, como Miguel Reale Junior e Juarez Cirino dos Santos. Aquela proposição trazia contornos liberais em temas como drogas, aborto e a proteção da vida, mas não foi surpresa constatar que teses conservadoras têm grande trânsito no Brasil, mesmo na comunidade jurídica.

O texto que será agora examinado pela CCJ do Senado é tecnicamente mais aprimorado do que o apresentado pela comissão externa, que atuou premida por prazo escasso. Supre omissões — como as relativas aos crimes de invasão de domicílio, remoção de órgãos e tecidos humanos e contra a biossegurança — e corrige inconsistências — como a mantença da arcaica definição de causalidade, atual artigo 13 do CP, ao lado da menção à criação ou aumento do risco juridicamente relevante. Redesenha as regras sobre a prescrição, aproximando-as do comum encontrado em legislações estrangeiras e reorganiza os crimes de falso e contra a administração pública. Inovações ousadas — como a barganha processual e a presunção de que o encontro de certa quantidade de entorpecente faria presumir um usuário, não um traficante — foram afastadas.

Houve a preocupação em tornar proporcionais as sanções previstas, ora aumentando-as em relação ao anteprojeto — por exemplo, no homicídio doloso, cujo mínimo era de seis e agora foi a oito anos de prisão — ora diminuindo-as — como nos maus tratos contra animais, de um a quatro anos no projeto 236/2011 e de um a três no substitutivo.

Diversas tipificações propostas pela comissão externa — bullying, eutanásia, crimes de guerra, omissão de socorro contra animais — não vingaram[2].

A despeito deste esforço, persistem aperfeiçoamentos a fazer[3] — como reconheceram os senadores Eunício Oliveira, Pedro Taques e Jorge Viana —, o que nem de longe empalidece a seriedade e qualidade do trabalho efetuado. A comparação do substitutivo com o vetusto Código Penal vigente — oriundo de períodos de exceção — e com o emaranhado de leis penais hoje existentes no Brasil é muito favorável à proposição.

O substitutivo apresenta homogeneidade ideológica, ao contrário do que se criticava no anteprojeto. Enquanto o texto da comissão de juristas procurava conciliar medidas de defesa social com redução de penas e novas causas extintivas da punibilidade, a norma in fieri direciona-se para o incremento da guarda penal de diversos bens jurídicos. As penas do furto simples eram de seis meses a três anos no anteprojeto e, no substitutivo, são de um a quatro anos; a figura básica do roubo, de três a seis anos passou para quatro a dez; a fração mínima para a progressão de regime naquele texto originário era de um sexto da pena, para a nova proposição é de um quarto. A extinção da punibilidade do furto, estelionato e apropriação indébita pela reparação do dano, se aceita pela vítima, foi excluída, assim como a redução de pena no roubo praticado sem violência real.

Daí não decorre, porém, que a codificação planejada não tenha tido o cuidado de prever inovações relevantes para o respeito aos direitos fundamentais, como dão notícia o artigo 41, parágrafo 4º — direito ao recolhimento domiciliar, se não houver vaga no sistema semi-aberto — e o art. 49 — restrição às revistas íntimas dos visitantes, direito à cela individual e, para o preso provisório, direito ao voto. A duração da medida de segurança teve limites fixados, art. 95, e aos índios foram estendidas, presentes certas condições, as regras do erro de proibição, art. 33. Manteve o sistema de progressão de regime, favoreceu as penas alternativas e disciplinou de modo interessante o regime aberto, com recolhimento domiciliar.
É certo que o substitutivo receberá a crítica de que preconiza respostas ilusórias — por exemplo, o aumento das penas e do tempo mínimo de seu cumprimento — para o severo problema da (in)segurança pública no Brasil. Dirão também que, se aprovado, a situação dos nossos superlotados presídios se agravará.

Seriam críticas imerecidas.

O espaço meramente legislativo para solução de dificuldades complexas relacionadas à criminalidade é de hialina insuficiência. Leis devem ser acompanhadas de medidas administrativas, sociais e educacionais, de acesso a moradia e saúde, transporte e saneamento básico, entre outros, com qualidade padrão... (como se chama mesmo, aquela entidade sediada na Suíça?). Nesse sentido, vejam-se as recomendações do “Relatório de Desenvolvimento Humano Regional”, divulgado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento — PNUD — em 2013[4].

Todavia, assim como leis mais gravosas não são a resposta, leis menos gravosas também não se saíram bem. Fala-se muito que a Lei dos Crimes Hediondos não diminuiu a criminalidade, olvidando-se de dizer que leis como a dos crimes de menor potencial ofensivo (9.099/95) ou a que ampliou a aplicação de penas alternativas (9.714/98) também não o fizeram. Não há vetores nessa constatação de que normas jurídicas, por si sós, por melhores que sejam, contribuem apenas um pouco para a solução de problemas sociais.

Quanto aos presídios, não há necessidade de código novo para que sejam constatadas as inúmeras, seguidas e permanentes ofensas a direitos fundamentais que eles têm propiciado. Cabe ao Poder Executivo dos estados e da União construir estabelecimentos penais dignos e suficientes: não são razoáveis, no particular, os contingenciamentos de recursos orçamentários. Escrevemos, em outra sede[5], que esta é uma das grandes falhas de infraestrutura do Brasil; é, certamente, a primeira da lista na indicação de nosso estado civilizatório.

Por igual, nada justifica a inexistência de defensorias públicas fortes, com meios suficientes para assegurar o acesso à Justiça e a defesa dos direitos dos processados e condenados. Ainda: leis penais, rigorosas ou não, jamais dispensam polícias treinadas e bem remuneradas, formadas numa cultura de respeito às liberdades fundamentais e merecedoras da confiança da população, um Ministério Público atuante e cioso de seu papel de acusador constitucional, um Poder Judiciário acessível e eficiente, etc.

Outrossim, o problema dos presídios não pode ser desvinculado da gravíssima situação da segurança pública em nosso país, infelizmente um dos campeões mundiais em crimes dolosos contra a vida[6], violências contra a mulher e roubos. O unilateralismo de concepções deslegitimadoras da intervenção penal, se adotado pelo poder público, será interpretado pela população simplesmente como mais uma omissão estatal. Não convém descurar dos riscos de que uma sociedade desesperançada com a violência busque fazer justiça com as próprias mãos. Infelizmente, existem exemplos recentes.

O caminho do meio é o melhor caminho para a legislação penal e o substitutivo o trilha. Procede a intensa descriminalização e reserva a pena de prisão, em regime fechado e semi-aberto, apenas para a criminalidade de elevado potencial ofensivo[7].

Nesta fase do processo legislativo cabe, sem embargo, sugerir ao Poder Legislativo que não esmoreça na adaptação do Código Penal às generosas previsões da Constituição de 1988. A mesma Constituição que lhe dá a inatacável legitimidade para fazer as leis — inclusive e especialmente, as penais — mostra-se vigorosa na defesa da igualdade entre as pessoas “sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”, art. 3º, IV.

Preocupa que todas as menções a identidade e orientação sexual tenham sido retiradas do projeto[8]. Elas estavam ali, ladeadas por idêntica tutela oferecida contra o preconceito em face da religião, da cor, raça, procedência nacional ou regional de alguém.

Esclareça-se que a norma projetada não considera crime “a livre manifestação do pensamento de natureza crítica, especialmente a decorrente da liberdade de consciência e de crenças religiosas, salvo quando inequívoca a intenção de discriminar ou de agir preconceituosamente”, art. 486, parágrafo 3º. Vale dizer: os púlpitos permaneceriam livres, protegidos, ademais, pelo art. 5º, VI, da Constituição[9]. Coisa muito diversa são condutas que negam direitos, ferem, torturam ou matam pessoas simplesmente porque elas se entendem e se comportam sexualmente de modo distinto do preferido por outros, sem lesar ninguém. Há plena dignidade penal na previsão e no agravamento das sanções, nesses casos.

Num Substitutivo que traz a elogiável previsão de crimes contra a humanidade, que combate a exploração sexual e a pedofilia, o trabalho em condições análogas a de escravo, o tráfico de seres humanos e o desaparecimento forçado de pessoas, esta lacuna destoa do objetivo de oferecer a máxima proteção aos direitos humanos.
________________________________________
[1] Ela foi composta pelos senadores Eunício Oliveira, Presidente, Pedro Taques, Relator, Jorge Viana, Lídice da Mata, Ricardo Ferraço, Benedito de Lira, Aloysio Nunes Ferreira, Cicero Lucena, Magno Malta, Armando Monteiro, Eduardo Suplicy, José Pimentel, Ana Rita, Sérgio Souza, Vital do Rego, Eduardo Amorim e Osvaldo Sobrinho.
[2] Entre elas o “molestamento de cetáceos”, corretamente substituído pela vedação da pesca, art. 413. Sugere-se que o aumento de pena do parágrafo 2º — morte do animal — deveria ser reservado apenas à pesca em larga escala. O parágrafo 1ºdo art. 409 — promoção de confronto entre animais — poderia ser extinto, redefinindo-se o aumento de pena do § 2º para alcançar somente condutas habituais.
[3] De logo, além das mencionadas na nota anterior, podemos sugerir: i) a revisão do artigo 62, que fala em parcelamento da multa em 36 meses, solução distinta da constante no artigo 64 (60 meses); ii) a exclusão do parágrafo 4º do art. 38, que repete a regra do concurso de agentes, já constante do artigo 35; iii) a inclusão no rol dos crimes hediondos, art. 51, também do estupro e manipulação sexual de objetos contra vulneráveis; iv) os parágrafos segundo, terceiro e quarto do art. 43, deveriam estar no artigo 41, que fala na progressão de regime e não no 43, que cuida da regressão; v) a importante conduta do empréstimo vedado, art. 376, recebia mais clara definição no artigo 364 do anteprojeto e emula a dicção tortuosa do atual art. 17 da Lei 7.492/86; vi) a cláusula geral de aumento de penas do artigo 386 não condiz com as novas sanções dadas aos crimes financeiros pelo Substitutivo: um sexto a um terço seriam suficientes, em vez de metade até o dobro.
[4] As recomendações para a melhoria da segurança pública são: “ 1. Alinhar os esforços nacionais para reduzir o crime e a violência, incluindo um Acordo Nacional para a Segurança Pública como uma política de Estado; 2. Gerar políticas públicas para proteger os mais afetados pela violência e o crime; 3. Prevenir o crime e a violência ao promover o crescimento inclusivo, equitativo e de qualidade 4. Diminuir a impunidade ao fortalecer instituições de justiça com a adesão aos direitos humanos; 5. Promover a participação ativa da sociedade, especialmente das comunidades locais na construção da segurança cidadã; 6. Aumentar as oportunidades de desenvolvimento humano para os jovens; 7. Atender e prevenir de maneira integral a violência de gênero nos âmbitos doméstico-privado e público; 8. Salvaguardar os direitos das vítimas; 9. Regular e reduzir fatores que “desencadeiam o crime”, tais como álcool, drogas e armas, através de uma perspectiva integral de saúde pública; e 10. Fortalecer os mecanismos de coordenação e avaliação da cooperação internacional.” — http://www.onu.org.br/a-inseguranca-freia-o-desenvolvimento-na-america-latina-diz-relatorio-do-pnud/.
[5] Revista Brasileira de Estudos Constitucionais, ano 7, nº 25, jan/abril de 2013, Ed. Fórum, Belo Horizonte.
[6] “Relatório de Desenvolvimento Humano-Regional – 2013-214”, PNUD. A taxa no Brasil, no período de 2007/2011 foi de 21 homicídios para cada cem mil pessoas. Só para comparar com países que exercem justa influência nos estudos doutrinários penais brasileiros, a taxa de homicídios na Alemanha e na Espanha é de 0,8 a cada cem mil habitantes. Em Portugal, 1,2.
[7] Diz o mesmo relatório do PNUD: “...a percepção dos cidadãos latino-americanos de “prisão como uma solução para os problemas de segurança” limita o progresso das reformas para reduzir a população carcerária, das medidas alternativas e do incentivo à reinserção social...”.
[8] Especialmente porque se decidiu vincular a tramitação do PLC 122 — crimes de homofobia — ao debate do novo Código Penal.
[9] “VI — é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”.

Disponível  em http://www.conjur.com.br/2014-fev-08/luiz-goncalves-substitutivo-codigo-penal-abandona-protecao-opcao-sexual. Acesso em 10 fev2014.

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Escola violou direito de transgênero usar banheiro das meninas, diz justiça

G1
31/01/2014

O Tribunal de Justiça do estado de Maine, nos Estados Unidos, decidiu que uma escola da cidade de Orono violou os direitos civis de Nicole Maines ao impedir um estudante transgênero de usar o banheiro feminino quando era criança. Nicole, atualmente com 16 anos, nasceu menino, batizado com o nome de Wyatt, mas se reconhece como menina. O caso começou em 2009, Nicole foi ao tribunal em junho do ano passado, e a decisão foi anunciada na noite desta quinta-feira (30).

"Esta é uma decisão importante que marca um grande avanço para os jovens transexuais", disse Jennifer Levi, diretora de uma ONG de advogados que defende os direitos dos transgêneros.

A decisão do tribunal estadual derrubou uma resolução de uma instância inferior que havia decidido que a escola primária agiu corretamente ao determinar que Nicole usasse um banheiro administrativo em vez do banheiro das meninas. Pela primeira vez, uma decisão determinou que o aluno transgênero deve usar o banheiro com o qual mais se identifica.

O tribunal estadual concluiu que a escola violou a Lei de Maine dos Direitos Humanos, de 2005, que proíbe a discriminação com base no sexo ou orientação sexual. A polêmica se arrastou porque uma lei estadual de 1920 também exige banheiros separados para meninos e meninas nas escolas. A advogada do distrito escolar alegava que enquanto a lei sobre os banheiros separados não mudasse, era direito da escola não violá-la.

Na decisão, o tribunal teve que conciliar as duas leis distintas, e o juiz deixou claro que a decisão teve como base uma ampla documentação sobre a identidade de gênero de Nicole. "Ficou claro que o bem-estar psicológico e emocional do estudante depende do seu direito em usar o banheiro correspondente à sua identidade de gênero", escreveu o juiz Warren Silver. "Mas esta decisão não serve para as escolas deixarem os estudantes escolherem qual banheiro prefere usar.

Irmão gêmeo

Nicole tem um irmão gêmeo idêntico, Jonas, mas desde os dois anos de idade se identificava como uma menina. Quando criança, enquanto o irmão colecionava carrinhos e se fantasiava de super-heroi, Nicole preferia se vestir de princesa e brincar de bonecas. Aos quatro anos, perguntou à mãe quando iria se tornar uma menina. Aos 11 anos, Nicole passou por um tratamento médico que inibe a ação dos hormônios da puberdade.

Na escola primária os problemas começaram. Nicole começou a usar o banheiro das meninas. Os funcionários da escola, inicialmente, deixaram. Mas depois que o avô de um menino da quinta série reclamou, Nicole foi proibida. A direção da escola então mandou Nicole usar um banheiro separado.

Depois do anúncio da decisão do juiz, os colegas da atual classe de Nicole, que está no ensino médio, levantaram e bateram palmas. Nicole compareceu ao tribunal em junho do ano passado, quando disse que não desejaria a sua experiência de ninguém. "Espero que os juízes tenham entendido que tudo o que um estudante quer é ir para a escola se divertir e fazer amigos, e não sofrer bullying dos alunos ou da administração do colégio."

O pai de Nicole, Wayne Maines, disse que tudo o que ele queria era para a sua filha para ser tratada como seus colegas de classe . Ele disse que estava emocionado quando soube da decisão. "Isso serve de mensagem para os meus filhos que você pode acreditar no sistema e que pode funcionar", disse.

Melissa Hewey, advogada do distrito escolar, disse que a decisão vai resolver uma questão não só para Orono, mas para escolas de todo o estado . "O tribunal já esclareceu o que tem sido uma questão difícil e é uma vez mais comum nas escolas, e o Departamento Escolar de Orono vai fazer o que precisa para que se cumpra a lei", afirmou.


Disponível em http://g1.globo.com/educacao/noticia/2014/01/escola-violou-direito-de-transgenero-usar-banheiro-das-meninas-diz-justica.html. Acesso em 31 jan 2014.

domingo, 2 de fevereiro de 2014

Japão reconhece transexual como pai de bebê concebido por inseminação

 Associated France Presse 
12 de Dezembro de 2013

A Suprema Corte do Japão reconheceu, pela primeira vez, a um homem transexual (nascido mulher) a paternidade legal de uma criança concebida por uma mulher mediante inseminação artificial com o esperma de outro homem.

O tribunal japonês anula, assim, os julgamentos anteriores, que haviam rejeitado inscrever o homem como um dos dos dois progenitores da criança.

Segundo a Suprema Corte, o fato de utilizar o esperma de outro homem no processo de gestação não é um impedimento legal para reconhecer a paternidade do transexual.

Esta decisão abre caminho para que outros transexuais sejam reconhecidos como pais, apesar de não terem tido um papel biológico na concepção e no nascimento do filho que criam.

Em sua decisão, os juízes explicaram que levaram em conta uma lei de 2004, que permitia a mudança de sexo e de estado civil sob determinadas condições, como se submeter a uma intervenção cirúrgica, àquelas pessoas com problemas de identidade de gênero.

Em virtude desta lei, um transexual tem não apenas o direito de se casar, mas também de ser reconhecido como pai de uma criança concebida por sua mulher durante seu casamento, consideraram os juízes.


Disponível em http://noticias.terra.com.br/mundo/asia/japao-reconhece-transexual-como-pai-de-bebe-concebido-por-inseminacao,1e10401d0bfd2410VgnCLD2000000dc6eb0aRCRD.html. Acesso em 31 jan 2014.

sábado, 25 de janeiro de 2014

Educação e movimento homossexual: reflexões queer

Marcos Ribeiro de Melo
Revista Fórum Identidades
Ano 2, Volume 4 – p. 71-80– jul-dez de 2008

Resumo: As análises sobre os novos movimentos sociais apontam a importância das identidades coletivas para o seu funcionamento. Contudo, segundo os teóricos queer, as identidades coletivas devem ser reavaliadas pelos movimentos sociais, pois seu caráter unitário também propicia processos de exclusão. Partindo do pressuposto de que o movimento homossexual pode ser compreendido como educativo, na medida em que é um espaço de socialização e de produção de subjetividades, o presente artigo intenta, baseando-se nos trabalhos de Judith Butler, Joshua Gamson, Tamsin Spargo, entre outros teóricos queer, problematizar o fato de que as práticas educativas desenvolvidas pelo Movimento Homossexual estabelecem “marcas”, “modelos” e “verdades” sobre o que é ser homossexual. Conclui-se que, provavelmente, as práticas educativas dos grupos homossexuais estão vinculadas à compreensão da existência de identidades de gênero e sexuais fixas, muradas por uma pretensa estabilidade dos corpos, excluindo assim variações de subjetividade, corpos, desejos e ações.




sábado, 18 de janeiro de 2014

A regulação da sexualidade e da identidade de gênero através do riso: as piadas nas escolas.

Rodolfo Luiz Costa de Godoi
Departamento de Sociologia
Bacharelado em Ciências Sociais com Habilitação em Sociologia
Universidade de Brasília 

Resumo: A heteronormatividade é uma forma social, e estabelece a maneira correta de agir, pensar e ser. Parte-se de uma análise do preconceito contra lésbicas, gueis, bissexuais, travestis e transexuais no Brasil, para poder entender a dimensão macrossocial da heteronormatividade e da cisnormatividade. Foram entrevistados doze jovens, quatro homens cisgêneros homossexuais, quatro mulheres cisgêneras homossexuais, três mulheres transexuais heterossexuais, e um homem transexual heterossexual, que relataram suas experiências sobre sexualidade e identidade de gênero na escola. O preconceito contra pessoas LGBTs funciona como uma ação social, que responde a uma estrutura heteronormativa e cisgênera, materializando-se através das piadas. Essa ação visa sancionar e regulamentar aquelas que fogem de suas regras, mas também a legitimar, reafirmar, positivar e vigiar aquelas e aqueles que encontram-se em consonância com o padrão heteronormativo e cisgênero. A piada, a gozação e o escárnio apresentam-se na escola como uma forma de dinamizar e tornar a heteronormatividade e o padrão cisgenero insidiosos, corriqueiros e latentes.



terça-feira, 14 de janeiro de 2014

No corpo errado

Rafael Gregorio; Tory Oliveira
Publicado na edição 82, de dezembro de 2013

Desde a infância, David Cristian, 23 anos, sentia-se diferente das demais meninas. O jovem, natural de Florianópolis (Santa Catarina), começou a se vestir como um garoto aos 13 anos e há um ano e meio iniciou tratamento psicológico e hormonal para adequar seu corpo ao gênero masculino, com o qual se identifica. Cristian é um transgênero, como são chamados homens e mulheres que sentem inadequação extrema com o sexo biológico de nascimento. Identificado como transtorno de identidade de gênero pelos médicos, o fenômeno, frequente e erroneamente confundido com a homossexualidade, pode ser um atalho para depressão, discriminação e isolamento, em especial no caso de crianças e adolescentes em idade escolar.

Para Cristian, que hoje vive em Curitiba, a maior parte das lembranças da escola, quando ainda vivia como menina, são de ameaças de colegas e funcionários. “Uma inspetora disse para eu ir embora, porque ninguém gostava de mim lá”, conta ele. Além de lhe acarretar uma depressão, a hostilidade o fez interromper os estudos duas vezes. Formado, Cristian hoje espera a mudança do nome na carteira de identidade para começar uma faculdade.

Violência e preconceito explicam a incorreta associação entre identidade de gênero e vontade pessoal. São também as razões da alta evasão escolar identificada por profissionais da educação. “Muitos não conseguem concluir nem o Ensino Fundamental, e 99% não chegam à universidade”, explica a professora transgênero Marina Reidel, autora de dissertação de mestrado na UFRGS sobre a trajetória de professores travestis e transexuais (que buscam correção cirúrgica para o que veem como distorção anatômica). Sem acesso ao estudo e, consequentemente, ao mercado de trabalho, a maioria cai na prostituição.

Além das agressões físicas e verbais, discriminações cotidianas, como a negativa de uso do nome social (denominação pela qual preferem ser chamados no dia a dia) e a proibição de frequentar o banheiro reservado ao gênero de identificação, são obstáculos adicionais. Para Marina, em vez de disseminar valores de tolerância, a escola é, no mais das vezes, um ambiente aterrorizante para os transgêneros.

Leonardo Tenório, 17 anos, nasceu Letícia. Na adolescência, contudo, em nome de “ser quem eu era”, desistiu de agradar à mãe e abandonou as roupas e a aparência femininas. “Todo mundo repara em mim. Como sou tímido, tento me esconder ao máximo”, diz Tenório, hoje aluno do 3º ano do Ensino Médio em uma escola pública de Ituitaba, Minas Gerais. Ele também diz ser recriminado pela diretora da escola, que, ao pedido para ser chamado pelo nome social, respondeu-lhe que não havia lei que a obrigasse e que ele “queria aparecer”. O aluno mostra-se resignado: “Tento pensar que a escola já está acabando”.

Reminiscências amargas de apelidos e xingamentos também predominam para Brendda Montilla, 17 anos, que diz sentir-se diferente dos demais meninos desde as primeiras séries, em Almirante Tamandaré, no Paraná. “Os casos de tolerância que encontrei foram por boa vontade dos professores, porque nem eles nem os alunos foram preparados (para o tema)”, opina.

A falta de instruções é tida como a fonte principal da disseminação do preconceito. “O problema começa em colocar fundamentalismo religioso antes do saber pedagógico. (As pessoas) precisam compreender que a escola não é seu quintal ou sua igreja”, opina Laysa Carolina Machado, 42 anos, diretora do Colégio Estadual Chico Mendes, em São José dos Pinhais, na Grande Curitiba – a primeira transexual a ser eleita para cargo semelhante no Brasil ( depoimento nesta página). “Há um déficit muito grande na formação do professor e também um medo de abordar certas questões”, opina a professora Marina.

Episódios como as hostilidades contra transgêneros no último Enem corroboram o cenário de despreparo. “Quando cheguei, a fiscal ficou questionando em voz alta na entrada da sala por que meu documento trazia nome e foto de homem”, relata Ana Luiza Cunha da Silva, 17 anos, aluna do 3º ano do Ensino Médio em uma escola particular em Fortaleza. O RG dela ainda foi conferido outras três vezes por funcionários diferentes até que um superior solucionasse o caso, registrando-o em um formulário de perda de documento, ela diz. Antes, porém, outra fiscal “ficou colocando a foto ao lado do meu rosto e dizendo ironicamente que não podia ser a mesma pessoa”. A estudante foi liberada após 30 minutos e só não perdeu tempo de prova porque chegou uma hora antes do início do exame.

O relato é semelhante ao da paraense Beatriz Marques Trindade Campos, 19 anos, que hoje cursa o 2º período de Direito na Unifemm, em Sete Lagoas (MG). “Entreguei meus documentos e a fiscal não me reconheceu, ficou perguntando se era eu mesma e gritou meu nome de batismo para me expor. Ela realmente não estava preparada”, lamenta.

Apesar dos constrangimentos, Ana Luiza e Beatriz são pontos fora da curva no que diz respeito ao apoio familiar. “Foi um choque, mas procuramos dar todo o apoio em sua vida”, afirma Fábio Luiz Ferreira da Silva, 39 anos, médico veterinário e pai de Ana Luiza (depoimento à pág. 26). A colaboração mais recente foi o pedido de mudança de nome na Justiça, protocolado por ele. O segredo da compreensão, afirma, é simples: “A gente se gosta muito lá em -casa e eu aprecio o debate de ideias. Focamos em tratar a pessoa como você gostaria de ser tratado. Não tem nenhum ensinamento a não ser o amor e o diálogo”. A maioria dos transgêneros, porém, não tem a mesma sorte: “Uma amiga transexual de 18 anos foi há pouco expulsa de casa e teve de trabalhar na prostituição”, relata Ana Luiza.

Inexiste consenso sobre o número de estudantes que questionem o próprio gênero no Brasil, muito menos sobre as taxas de evasão escolar desse público. Também faltam dados sobre o número de transexuais e travestis adultos, em parte porque não há no formulário do Censo do ¬IBGE questão específica sobre a identidade de gênero do declarante. “Estima-se que haja atualmente 2 milhões de trans no Brasil”, afirma a professora Marina.

Professor da PUC-SP e coordenador do Ambulatório de Transtorno de Identidade de Gênero e Orientação Sexual do Hospital das Clínicas de São Paulo, o psiquiatra Alexandre Saadeh, 52 anos, dá outra estatística sobre o número de pessoas que questionam o sexo anatômico na juventude. “Nos países ocidentais, a média é de um a cada 100 mil homens e de uma para cada 400 mil mulheres.” Composto de, aproximadamente, 15 profissionais de saúde, o núcleo que ele comanda provê, desde 2010, tratamento psicoterápico para adolescentes – são hoje cerca de 30 pacientes, seis dos quais crianças – e, neste ano, começou a praticar terapias hormonais.

Também falta consenso sobre a natureza do fenômeno, no que especialistas e transgêneros alternam compreensões ligadas à psiquiatria, à psicologia ou mesmo a nenhuma delas, em um movimento de “despatologização” da transexualidade.

“Os transexuais têm pouco acesso aos serviços de saúde e, por isso, vivem uma vulnerabilidade e uma situação de exclusão social”, afirma Judit Lia Busanello, 48 anos, psicóloga e diretora-técnica do Ambulatório de Saúde Integral para Travestis e Transexuais. Vinculado ao Centro de Referência e Treinamento em DST/Aids da Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo, o núcleo oferece fonoaudióloga, endocrinologista, clínico geral, urologista, proctologista, psicólogo, psiquiatra e assistente social para um total de 1.860 pacientes cadastrados desde junho de 2009. Desses, 70% são mulheres transexuais (nascidas no sexo anatômico masculino), cujo tempo de acompanhamento chega, em média, a dois anos e meio. Sem contar a fila de três a seis meses: “hoje trabalhamos acima de nossa capacidade”, diz Judit.

“Até os anos 1980, as teorias em voga eram psicológicas. Hoje se correlaciona o transtorno de gênero ao desenvolvimento cerebral intrauterino”, defende Saadeh. Com base nesse entendimento de “um processo essencialmente biológico”, ele afasta a possibilidade de que crianças sejam transexuais por influência de outras pessoas ou questões sociais. O médico também rechaça a eventualidade de que transgêneros influenciem colegas. “Não acredito de maneira alguma nisso. Se assim fosse, todo mundo se contaminaria com a heterossexualidade, a orientação predominante”, afirma.

No Brasil, a cirurgia para mudança de sexo é feita pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e após os 21 anos, conforme parecer de 2010 do Conselho Federal de Medicina (CFM). O tratamento hormonal é possível a partir dos 18, mas, em 2013, outro parecer do CFM recomendou o bloqueio da puberdade do gênero de nascimento (não desejado). A favor do retardo, os especialistas apontam fatores como a prevenção a sofrimentos psicológicos comuns nesse público, como depressão, anorexia e tendência a suicídio, além da oferta de mais tempo para aprimorar o diagnóstico e da prevenção a cirurgias mais invasivas no futuro. O parecer não tem força de lei e já enfrenta resistências. Ainda assim, pode direcionar protocolos sobre o tratamento e ampliar a oferta de acompanhamento médico.

O tempo é mesmo um obstáculo para quem questiona o gênero. A maioria sente desconforto desde a primeira infância e assiste impotente ao desenvolvimento, na anatomia, de sinais contraditórios com relação ao próprio sentimento. “A identidade de gênero se manifesta por volta dos 3 ou 4 anos. Deve-se ficar atento e buscar orientação de centros especializados”, diz o psiquiatra Saadeh. Ele condiciona o diagnóstico à convicção “responsável, duradoura e consistente” e defende que a criança use o nome e as roupas que desejar. Também é importante, diz, que os pais orientem professores e assistam os filhos em sua transformação na escola. “Todas as crianças que acompanhamos estão bem adaptadas e vivem 24 horas assim. Se antes eram meninos deprimidos, irritados, agressivos, agora são meninas doces, que interagem com os outros. O ganho é o bem- estar psicológico de não mais sentir que se está fazendo algo errado”, ele diz.

Leonardo Tenório, da Associação Brasileira de Homens Trans, defende a criação de políticas específicas nas Secretarias de Educação. Para ele, a descentralização da educação pública brasileira atrapalha. “Cada escola tem seu próprio Plano Político Pedagógico. Dependemos da sensibilidade de cada gestor”, explica.

A criação de leis para articular a inclusão escolar dos transgêneros e proteger seus direitos nas escolas é um dos sonhos do estudante Leonardo Carvalho. “Este é o meu último ano na escola, mas sei que os muitos trans que virão depois vão sofrer também”, conta. “Penso que seria mais justo o Enem disponibilizar a opção para transgêneros já na ficha de inscrição”, defende Silva, o pai de Ana Luiza. Na visão dele, isso ajudaria a evitar constrangimentos amplificados pelo fato de que as salas do exame são usualmente divididas conforme o nome de candidatos e candidatas.

Para quem vive a causa ou a defende, a prioridade é combater a invisibilidade a que a sociedade submete quem questiona o sexo biológico. A demanda mais recorrente ouvida pela reportagem foi pela inserção da pergunta específica de gênero no Censo. Segundo o IBGE, antes da realização do próximo Censo, em 2020, o instituto vai, como de costume, consultar a sociedade para avaliar a necessidade e a conveniência de “revisão dos tópicos tradicionalmente investigados” e de “novas necessidades de dados, sempre observando as recomendações internacionais”. A diretora paranaense Laysa, que também é atriz e escritora, sintetiza esse sentimento comum: “Espero que em alguns anos possamos nos ver em novelas e em outros papéis que não sejam os da palhaça caricata ou da trans assexuada”.

Sempre soube da minha condição. Na infância era natural. Eu nunca achei errado. Foram os outros que colocaram na minha cabeça que vestir roupas femininas ou brincar de boneca era ruim.

Fui discriminada em todas as instituições em que estudei e tentei sublimar minha essência. No dia 31 de dezembro de 1999, porém, iniciei minha vida trans. Perdi empregos e busquei na estabilidade de um concurso público a chance de viver plenamente minha identidade de gênero.

Iniciei minha carreira como professora de História, Geografia e Teatro. Sou diretora desde 2009, quando fui eleita com meus dois amigos Gisele Dalagnol e Ivan Araújo. Cuidamos de, aproximadamente, 1,6 mil alunos dos Ensinos Médio e Fundamental. Minha relação com eles é ótima, e com os pais também. Sou respeitada e me sinto querida, acolhida e amada.

Há três anos, Ana Luiza nos contou que se sentia uma mulher em um corpo masculino. Já dava sinais, mas pensávamos que podia ser questão de influência, de andar só com meninas.

Conversamos em uma reunião em família. Foi uma semana sem dormir. Mas se para mim e minha esposa foi difícil, me coloco no lugar dela, alguém de 13, 14 anos que ensaia noites a fio como dizer algo tão difícil.

Nossa família é muito católica. Os mais próximos vão sabendo aos poucos. É um processo. O nome, por exemplo. Chamávamos de Luiz Claudio, depois de Lu. E meu filho mais novo me cobrava, mas achei melhor ser natural do que agir com hipocrisia. Liberamos aos poucos roupa,  maquiagem.

A aparência dela mudou muito no último ano. Tem psicóloga, mas é duro achar psiquiatra e endocrinologista que atendam o caso.

Alguns nos criticam por sermos apoiadores. Acham que desprezar ou botar pra fora de casa poderia resolver, como se fosse algo que a pessoa escolhe. Mas ninguém decide passar por isso. A vida é um fenômeno que acontece. Depois que você está instalado, aprende a viver.

Rejeição e intolerância

Uma das poucas aferições já realizadas no Brasil sobre a transfobia (aversão a transexuais e transgêneros) revelou que 24% das pessoas não gostariam de se encontrar com transexuais (10% disseram sentir repulsa/ódio e 14%, antipatia) e 22% não gostariam de dividir espaço com travestis (repulsa/ódio e antipatia foram citados por 9% e 13%, na ordem). Os dados são da pesquisa Diversidade Sexual e Homofobia no Brasil, da Fundação Perseu Abramo. De acordo com o 2º Relatório sobre Violência Homofóbica, em 2012 foram registradas 3.084 denúncias de violações à população LGBT, com 4.851 vítimas e 4.784 suspeitos – alta de 166% perante a 2011. No período, foram reportadas 27 violações homofóbicas de direitos humanos por dia. Em 2011, 10,6% das vítimas foram travestis, enquanto mulheres trans foram 1,5% e homens trans, 0,6%. Já em 2012, o porcentual de travestis e transexuais agredidos caiu para 1,4% e 0,49%, na ordem. Para a Secretaria de Direitos Humanos, contudo, a queda não denota diminuição da violência, mas crescente “invisibilização” de uma população vulnerável.

Serviço:
  • Ambulatório de Saúde Integral para Travestis e Transexuais do Centro de Referência e Treinamento DST/Aids-SPRua Santa Cruz, 81, Vila Mariana, São Paulo, SP. Tel (11) 5087-9833
  • Ambulatório de Transtorno de Identidade de Gênero e Orientação Sexual (Amtigos) – Hospital das Clínicas Rua Dr. Ovídio Pires de Campos, 785, São Paulo, SP. Tel (11) 2661-8045
  • Disque Direitos Humanos Disque 100 http://www.sdh.gov.br/
  • Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais Avenida Afonso Pena, 867, Sala 2.207, Belo Horizonte , MG. Tel. (31) 8817-1170. www.abglt.org.br
  • Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. E-mail: direitoshumanos@sdh.gov.br.Tel(61) 2025-9617


Disponível em http://www.cartanaescola.com.br/single/show/262. Acesso em 07 jan 2014.

sábado, 11 de janeiro de 2014

A constituição da identidade masculina: alguns pontos para discussão

Maria Juracy Toneli Siqueira
Departamento de Psicologia
Universidade Federal de Santa Catarina
Psicol. USP vol. 8 n. 1 São Paulo  1997

Resumo: Através da apresentação de alguns dados de um estudo de caso de uma família de classe subalterna urbana e suas famílias de origem, este artigo pretende discutir os elementos que contribuem para a constituição da identidade de gênero, em especial a masculina. Esta família foi escolhida por apresentar, ao menos temporariamente, uma inversão na divisão sexual do trabalho: o marido, desempregado, ocupava-se da lida doméstica e do cuidado dos filhos, enquanto a esposa, através de seu trabalho extra-doméstico, era responsável pela manutenção do grupo. A abordagem sócio-histórica nos ajuda a compreender a constituição do sujeito nas e pelas relações sociais. De uma maneira análoga, utilizamos esta abordagem para discutir a constituição da masculinidade e da feminilidade.

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Tratamento na escola afugenta transexuais, dizem especialistas

Portal Terra
05 de Dezembro de 2013

Pode ser o menino que prefere usar vestido ou a menina que usa um nome masculino, não importa: boa parte das escolas e dos professores ainda têm dificuldades em lidar com transexuais - condição de quem tem uma identidade de gênero diferente da designada no nascimento. Transexuais relatam que as escolas não aceitam o uso do seu nome social - diferente do que consta na carteira de identidade - e que muitas vezes são obrigados a usar banheiros que não são condizentes com o gênero que se identificam.

A vice-presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), Keila Simpson, acredita que as escolas precisam compreender e incluir três populações – travestis, homens transexuais e mulheres transexuais. “Se essa lógica passasse para escola, já teríamos um bom caminho andado”, destaca. Keila diz que transexuais e travestis não têm a sua identidade respeitada quando chegam na escola e a consequência drástica é o abandono da sala de aula. “Se a trans está na escola e tem uma aparência feminina, deve ser orientada para usar ambientes femininos na escola”, afirma. Para Keila, ainda há a ideia de que travestis e transexuais não estão interessados em estudar. “Quando a escola se abre, se recicla e se renova, o público transexual e travesti vai à procura da educação formal”, destaca.

Durante o Ensino Médio, em uma escola pública de Sete Lagoas (MG), a transexual Beatriz Trindade conta que a sua relação com os colegas dentro da sala de aula era tranquila. “Eles até me ajudavam quando tinha algum problema com professor, que às vezes me chamava pelo meu nome civil”, diz. Ao solicitar o uso o nome social na escola, teve seu pedido negado. Ela relata ter passado por dificuldades com a secretaria da escola e com a direção. “Eles têm a tradição de fazer faixas de comemoração para quem é aprovado no vestibular e eu pedi para usarem meu nome social, porque aquilo não era um documento, era simplesmente uma faixa e isso desencadeou uma discussão”, conta. “Eles estavam me desrespeitando, foi terrível”, relembra.

O caso Enem

Atualmente cursando o segundo período de direito do Centro Universitário de Sete Lagoas (Unifemm) Beatriz enfrentou dificuldades para a realização do Enem neste ano. “Eu não me senti ofendida, não me senti discriminada, senti constrangimento. A fiscal não sabia o que fazer”, afirma. Os fiscais da sala em que Beatriz estava desconfiaram da sua identidade, já que em seu documento continha uma foto na qual a jovem não se parece mais e também constava o nome de um menino.

A diretora auxiliar do Colégio Estadual Chico Mendes, de São José dos Pinhais (PR), e transexual, Laysa Machado, destaca que os objetivos dos transexuais ao fazer o Enem são os mesmos de qualquer outra pessoa. Ao sofrerem constrangimentos e discriminações ao longo da vida, a diretora auxiliar acredita que o único caminho que restará é o da prostituição. “Esse caminho agrega 90% das transexuais, principalmente as oriundas de famílias pobres”, destaca.


Disponível em http://noticias.terra.com.br/educacao/,6179ef60792c2410VgnVCM4000009bcceb0aRCRD.html. Acesso em 05 dez 2013.

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Clínica causa polêmica com tratamento de mudança de sexo em crianças

Portal Terra
17 de Novembro de 2013

Uma clínica pública da Inglaterra tem causado polêmica ao tratar crianças transexuais com menos de 12 anos, dando a elas bloqueadores hormonais que preparam mais cedo para a mudança de sexo. Segundo o site do jornal inglês Daily Mail, o procedimento é feito por outros médicos apenas após os 16 anos.

O tratamento, feito para frear os efeitos da puberdade e prevenir que as crianças desenvolvam as características sexuais do gênero que nasceram, foi realizado em mais de 20 jovens que sofrem com transtorno de identidade de gênero. O uso de medicação foi iniciado em 2011, na Tavistock Clinic, em Londres, como parte de um estudo em que os especialistas queriam avaliar os benefícios dos médicos caso começassem a ser introduzidos mais cedo na vida das crianças, de acordo com o jornal Sunday Times.

Na época, a iniciativa foi considerada controversa, já que muitos pacientes não tinham condições de entender e consentir com a terapia. No entanto, o local recebeu pedidos de 142 crianças entre 11 e 15 anos enviados por pais e profissionais de educação.

A diretora da clínica, Dra. Polly Carmichael, afirmou que continuará o tratamento com as crianças mesmo depois que o resultado do estudo seja divulgado, em abril de 2014. "Trinta e cinco crianças já foram aceitas no estudo e 23 delas receberam bloqueadores hormonais. Outras 12 também participam, mas não receberam o tratamento porque ainda estão muito no início da puberdade", afirmou. Segundo ela, quando completam 16 nos, as crianças têm duas opções: parar de receber bloqueadores hormonais ficando com o mesmo sexo do nascimento ou fazer uso de outros hormônios que levam a mudança de corpo e, aos 18 anos, a clínica pode encaminhar para cirurgia de mudança de sexo.

A abordagem da clínica se diferencia de outros procedimentos feitos no Reino Unido, onde as crianças não recebem nenhum tipo de hormônio até os 16 anos e, somente depois dessa idade, fazem tratamentos específicos e eficazes para a mudança de sexo. Mas, os defensores do tratamento argumentam que muitas delas já viveram o início da puberdade bem antes dos 16 anos o que dificulta a transição no futuro, uma vez que o corpo já recebeu cargas de hormônios do sexo de nascimento . "É melhor para as crianças que não tenham passado pela puberdade antes do tratamento de transição", explica a Dra. Carmichael.

Apesar do procedimento, a especialista reconhece que é um passo grande demais a ser tomado por crianças com esta idade e que isto exige certos cuidados. "Você está exigindo de uma criança de 11 anos para que decida sobre sua vida adulta e sua identidade, por isso temos que ter muito cuidado para manter as opções em aberto", afirma.

Recentemente, o adolescente de 12 anos Leo Waddell foi a público pedir que os médicos permitesse que ele use os bloqueadores de hôrmonio. Nascido como uma menina chamada Lili, ele vive como um garoto desde os cinco anos e pretende fazer uso de testosterona quando chegar aos 16 e, aos 18, passar pela cirurgia de mudança de sexo. Mas, até lá, ele acredita que é melhor usar os medicamentos para bloquear a puberdade e evitar que os hôrmonios femininos se espalhem pelo seu corpo.

No entanto, os especialistas recusaram o pedido de Leo ao alegar que não têm certeza sob os efeitos a longo prazo que o uso destes remédios podem causar. "O que as pessoas não entendem é que é muito mais perigoso para ele não receber os hormônios, porque este tormento está fazendo ele ficar cada mais triste", afirmou a mãe de Leo, Hayley.

Em 2009, aos 16 anos, Jackie Green foi a pessoa mais jovem do mundo a realizar a cirurgia de mudança de gênero. Ela havia nascido menino e recebia hormônios desde os 12 anos, em Boston, nos Estados Unidos. Três anos após o procedimento, ela tornou-se a primeira transexual a estar entre as finalistas do concurso Miss Inglaterra.


Disponível em http://saude.terra.com.br/doencas-e-tratamentos/clinica-causa-polemica-com-tratamento-de-mudanca-de-sexo-em-criancas,7ce2aefd16762410VgnVCM3000009af154d0RCRD.html. Acesso em 23 nov 2013